
Apelação Cível Nº 5011838-37.2023.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum, em que se postula benefício previdenciário por incapacidade, desde uma das DER (16/06/2021, 23/11/2021, 17/03/2022 ou 02/09/2022)
Processado o feito, sobreveio sentença de improcedência (evento 26 dos autos originários), cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Ante o exposto, julgo improcedente(s) o(s) pedido(s) veiculado(s) na petição inicial e declaro extinto o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, atualizado pelo IPCA-e, considerando o disposto no art. 85, § 3º, I, e § 4º, III, do CPC/2015.
Condeno a parte autora ao ressarcimento dos honorários periciais adiantados pela Seção Judiciária do Paraná, ressalvada a suspensão da exigibilidade, nos termos do art. 98, §§ 2º e 3º do Código de Processo Civil.
A execução das verbas sucumbenciais fica suspensa, dada a concessão da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 3º do CPC).
Os embargos de declaração opostos pela parte autora (evento 32) foram rejeitados (evento 37).
O demandante apela (evento 43). Relata que o INSS reconheceu a existência da incapacidade laborativa, porém os pedidos de auxílio-doença foram negados em razão da falta de qualidade de segurado. Aponta que sofre de doenças ortopédicas e psiquiátricas graves. Afirma que, após cessado o auxílio-doença, em 2016, o empregador não permitiu o retorno ao trabalho, por não o considerar apto, e não rescindiu o contrato de trabalho. Destaca que é obrigação do empregador recolher as contribuições previdenciárias. Conclui que permanece com a qualidade de segurado até os dias atuais. Assevera que houve cerceamento de defesa, pois não foi oportunizada a produção da perícia médica judicial. Pede, ao final, a anulação da sentença, com o retorno os autos à origem, para produção da prova técnica, ou a concessão do benefício pleiteado.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE - REQUISITOS
Inicialmente, consigno que, a partir da EC 103/2019, passou-se a denominar a aposentadoria por invalidez como "aposentadoria por incapacidade permanente" e o auxílio-doença como "auxílio por incapacidade temporária". Contudo, ainda não houve alteração na Lei 8.213/91. Diante disso, entendo possível adotar tanto as nomenclaturas novas, como as antigas.
Os benefícios de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença estão previstos nos artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
(...)
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Extraem-se da leitura dos dispositivos acima transcritos os três requisitos para a concessão dos aludidos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando for o caso; 3) a incapacidade para o trabalho de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
No tocante à incapacidade, se for temporária, ainda que total ou parcial, para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, caberá a concessão de auxílio-doença.
O auxílio-doença, posteriormente, será convertido em aposentadoria por invalidez, se sobrevier incapacidade total e permanente, ou em auxílio-acidente, se a incapacidade temporária for extinta e o segurado restar com sequela permanente que reduza sua capacidade laborativa, ou extinto, em razão da cura do segurado.
De outro lado, a aposentadoria por invalidez pressupõe incapacidade total e permanente e restar impossibilitada a reabilitação para o exercício de outra atividade laborativa.
Em ambos os casos, a incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado será averiguada pelo julgador, ao se valer de todos os meios de prova acessíveis e necessários para análise das condições de saúde do requerente, sobretudo o exame médico-pericial, e o benefício terá vigência enquanto essa condição persistir.
Em regra, nas ações objetivando benefícios por incapacidade, o julgador firma a sua convicção com base na perícia médica produzida no curso do processo, uma vez que a inaptidão laboral é questão que demanda conhecimento técnico, na forma do art. 156 do CPC.
Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o grau da incapacidade deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.
Dispõe, outrossim, a Lei 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
Ademais, é necessário esclarecer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas, sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor delas decorre.
CASO CONCRETO
O autor, nascido em 26/10/2961, atualmente com 63 anos de idade, esteve em gozo de auxílio-doença, nos seguintes períodos (evento 06, INFBEN3):
Em 16/06/2021, 23/11/2021, 17/03/2022, 02/09/2022, requereu a concessão de benefício por incapacidade temporária, pedidos que foram indeferidos (evento 06, INF4).
A ação foi ajuizada em 20/04/2023.
A controvérsia recursal cinge-se à qualidade de segurado e à necessidade de produção de prova pericial.
QUALIDADE DE SEGURADO
Sobre o tema, a sentença restou assim fundamentada (evento 26):
O
demonstra que a parte autora recebeu o benefício de auxílio-doença até 18/08/2016 (NB 6133423580).Após a cessação, não verteu novas contribuições ao RGPS ou recebeu qualquer benefício.
Ainda, infere-se que a parte autora ajuizou ação visando o restabelecimento do último auxílio-doença concedido, processo que foi julgado improcedente em razão de não ter sido constatada a incapacidade laborativa alegada (
).Posteriormente, em 2020, o autor ajuizou nova ação, na qual foi novamente constatada por perícia a ausência de incapacidade laborativa, ensejando a improcedência do pedido (
).Considerando a realização de duas perícias judiciais após a cessação do último benefício, nas quais foi atestada a capacidade laborativa da parte autora e proferidas sentenças de improcedência, transitadas em julgado, fica inviabilizada a discussão acerca de suposta incapacidade laborativa em momento anterior à última sentença proferida (
, proferida em 24/8/2021).O
demonstra que após a cessação do NB 6133423580, em 18/08/2016, não houve novas contribuições recolhidas em nome do autor.Tomando por base a data de recuperação da capacidade laborativa estabelecida na esfera administrativa, na DCB, em 18/08/2016, observa-se que mesmo que o período de graça tivesse sido prorrogado pelo prazo máximo de 36 meses (o que se admite apenas para efeito de argumentação, pois não houve comprovação específica de desemprego ou recolhimento de 120 contribuições sequenciais sem perda da qualidade de segurado), o autor teria perdido a qualidade de segurado em 2019.
Nesse contexto, considerando que houve reconhecimento judicial de que o autor esteve capaz para o trabalho até 24/08/2021, não faz jus ao benefício pleiteado, pois mesmo que se reconhecesse eventual incapacidade após essa última data, o autor não mais ostentaria qualidade de segurado e, por isso, não preencheria os requisitos para a concessão do benefício pretendido.
Por conseguinte, o feito merece juízo de improcedência.
No tocante à qualidade de segurado, embora não tenha sido juntado atestado médico de saúdo ocupacional indicando que o autor foi considerado inapto para retornar às suas atividades, de acordo com o extrato do CNIS, as contribuições previdenciários cessaram em 10/2014, porém não foi encerrado o contrato de trabalho com a Companhia de Saneamento do Paraná - SANEPAR, conforme consta na CTPS (evento 01, CTPS7).
De acordo com declaração firmada pelo gerente comercial da empresa, de 06/12/2022, o autor trabalhou até 17/09/2014 (evento 01, DECL11).
No caso, deve ser mantida a qualidade de segurado, após a última DCB, pois o autor se encontra no período denominado “limbo previdenciário” , conforme a seguinte tese firmada pela Turma Nacional de Uniformização (Tema 300):
“Quando o empregador não autorizar o retorno do segurado, por considerá-lo incapacitado, mesmo após a cessação de benefício por incapacidade pelo INSS, a sua qualidade de segurado se mantém até o encerramento do vínculo de trabalho, que ocorrerá com a rescisão contratual, quando dará início a contagem do período de graça do art. 15, II, da Lei n. 8.213/1991."
Assim, uma vez que o autor permanece com a qualidade de segurado, os autos devem retornar à origem para a produção da prova médica pericial.
Com efeito, em regra, nas ações objetivando benefícios por incapacidade, o julgador firma a sua convicção com base na perícia médica produzida no curso do processo, uma vez que a inaptidão laboral é questão que demanda conhecimento técnico, na forma do artigo 156 do CPC.
O laudo pericial tem por finalidade elucidar os fatos trazidos à lide e cabe ao magistrado, como destinatário da prova, aferir a suficiência do material probatório e determinar ou indeferir a produção de novas provas (arts. 370, 464, §1º, II e 480, todos do CPC).
O perito, profissional de confiança do juízo e equidistante das partes, deve examinar a parte autora com imparcialidade e apresentar as suas conclusões de forma clara, coesa e fundamentada. Tais conclusões, inclusive, gozam de presunção de veracidade e de legitimidade.
No caso em tela, observa-se que não foi realizada perícia médica neste feito, imprescindível para o deslinde da controvérsia e para esclarecer questões fundamentais trazidas pelas partes a respeito da inaptidão para o trabalho, sobretudo diante da divergência entre o laudo pericial produzido pelo perito do INSS e os atestados médicos apresentados pela parte autora.
Assim, em face da insuficiência da instrução probatória, é de ser anulada a sentença para que reaberta a instrução processual e realizada perícia médica.
Provido o apelo da parte autora.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelação da parte autora provida, sendo anulada a sentença e determinado o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual e realização de perícia médica.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004840401v7 e do código CRC 9eef0add.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5011838-37.2023.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. qualidade de segurado. limbo previdenciário. perícia médica. necessidade. anulação da sentença. reabertura da instrução processual.
1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
2. De acordo com o extrato do CNIS, as contribuições previdenciários cessaram em 10/2014, porém não foi encerrado o contrato de trabalho, conforme CTPS. No caso, deve ser mantida a qualidade de segurado, no período denominado “limbo previdenciário” , conforme a seguinte tese firmada pela Turma Nacional de Uniformização (Tema 300): “Quando o empregador não autorizar o retorno do segurado, por considerá-lo incapacitado, mesmo após a cessação de benefício por incapacidade pelo INSS, a sua qualidade de segurado se mantém até o encerramento do vínculo de trabalho, que ocorrerá com a rescisão contratual, quando dará início a contagem do período de graça do art. 15, II, da Lei n. 8.213/1991."
3. Nas ações objetivando benefícios por incapacidade, em regra, o julgador firma a sua convicção com base na perícia médica produzida no curso do processo, uma vez que a inaptidão laboral é questão que demanda conhecimento técnico, na forma do artigo 156 do CPC. O perito, profissional de confiança do juízo e equidistante das partes, deve examinar a parte autora com imparcialidade e apresentar as suas conclusões de forma clara, coesa e fundamentada.
4. In casu, não foi produzida perícia médica neste feito, indispensável para o deslinde da controvérsia. Sentença anulada e determinada a reabertura da instrução processual, para que seja produzida a perícia.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao apelo para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 10 de dezembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004840402v4 e do código CRC 222bb2a0.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/12/2024 A 10/12/2024
Apelação Cível Nº 5011838-37.2023.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/12/2024, às 00:00, a 10/12/2024, às 16:00, na sequência 309, disponibilizada no DE de 22/11/2024.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO APELO PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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