D.E. Publicado em 01/04/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018780-87.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | JANDIRA MUNIZ SILVA DOS REIS |
ADVOGADO | : | Giovana Gularte Ibanez |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS.
1. Diante do agravamento da situação da autora e da condição socioeconômica do casal, está caracterizada nova situação fática, afastando a identidade de partes, de objeto e de causa de pedir que configura a coisa julgada.
2. Inexiste litigância de má-fé por parte do autor, uma vez que não restou provada nenhuma das hipóteses previstas no rol taxativo previsto no art. 17 do Código de Processo Civil.
3. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
4. Atendidos os pressupostos, deve ser concedido o benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 15 de março de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8066000v2 e, se solicitado, do código CRC BC8E2992. | |
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Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
Data e Hora: | 21/03/2016 17:49 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018780-87.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | JANDIRA MUNIZ SILVA DOS REIS |
ADVOGADO | : | Giovana Gularte Ibanez |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS em face da sentença que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial devido à pessoa com deficiência.
Sustenta a autora, em síntese, que preenche os requisitos necessários à concessão da prestação continuada requerida.
Por sua vez, a autarquia previdenciária postula a aplicação da pena de litigância de má fé na forma do art. 18 do CPC, tanto para a parte quanto para os seus procuradores, honorários de sucumbência de R$ 5.000,00 e revogação da AJG.
Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo desprovimento do recurso da parte autora.
É o relatório.
VOTO
Da coisa julgada
Alega o INSS que a autora repete a ação já ajuizada em 17/10/2007 e julgada perante a Justiça Feral (processo nº 2007.71.50.028500-6).
A ação foi julgada improcedente por ausência de comprovação do quesito referente à situação de miserabilidade. Tal demanda transitou em julgado em 24/09/2008.
Sem ter formulado novo pedido administrativo, a autora, em 03/09/2008, ajuizou nova demanda (nº 0018780-87.2015.404.9999), objetivando a concessão de benefício assistencial.
Embora, ao ajuizar este feito, a autora não tenha feito alusão à demanda anteriormente proposta, é forçoso reconhecer que ela repete o pedido formulado naquela ação, reportanto-se, inclusive, ao mesmo requerimento administrativo (12/04/2004), o que, em uma primeira análise, poderia levar à conclusão de que estaria configurada a coisa julgada.
Porém, as novas perícias realizadas revelam que houve um agravamento no estado de saúde da demandante, o que seria possível ante a natureza degenerativa da patologia. Aliás, na Perícia Médica às fls. 82-83, a médica psiquiátrica esclarece que "no período de 06 (seis) anos a pericianda não obteve melhora, tendo, inclusive, havido piora da sua doença. O diagnóstico é de depressão (CID 10 - F32), sendo o tratamento ministrado adequado ao caso. Entretanto, considerando a evolução do quadro clínico (deterioração cognitiva lenta e progressiva) e ausência de resposta terapêutica, é pertinente pensar em demência (CID 10 - F02), como comorbidade associada.
Sendo assim, é possível afirmar que o problema que já era manifesto foi se agravando dia a dia, inclusive, tendo o marido da autora sido obrigado a abandonar suas atividades laborais para tomar conta da esposa, cujo estado de saúde inspira sérios cuidados.
É tranquilo nesta Corte o entendimento de que, nas ações previdenciárias, não se pode falar em coisa julgada quando houver o agravamento ou o surgimento de nova doença após a perícia judicial.
Penso que se trata da hipótese dos autos.
De outro lado, porém, já tendo sido estabelecido, em decisão transitada em julgado, que a situação da autora não se enquadrava no requisito de miserabilidade legal na época do requerimento administrativo (12/04/2004 - fl. 22), entendo que, na presente ação, resta viabilizada a verificação da eventual situação de risco, em razão do agravamento do quadro de saúde da autora, apenas a partir do trânsito em julgado da demanda proposta anteriormente, isto é, a partir de 24/09/2008 (fl. 175), na esteira do recente julgado deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. AJUIZAMENTO DE NOVA DEMANDA. AGRAVAMENTO DO QUADRO. POSSIBILIDADE. INCAPACIDADE COMPROVADA. Tendo a relação previdenciária natureza continuada, o eventual agravamento da doença que justificou o ajuizamento de ação anterior poderá ser invocado como nova causa de pedir em outra ação, presentes os demais requisitos para eventual benefício por incapacidade. Hipótese em que o ajuizamento desta ação ocorreu após sentença de improcedência em ação anterior, da qual a parte não recorreu. Afastadas do montante da condenação as parcelas pertinentes ao período sobre o qual houve decisão de improcedência na ação anterior. (AC nº 0021037-22.2014.404.9999, Rel. Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ, unânime, j. 28-07-2015).
Ademais, tratando-se de benefício assistencial de prestação continuada, que pode ser deferido se há alteração da situação fática, as modificações de estado de fato ou de direito, como in casu, permitem a rediscussão do tema na via judicial, de acordo com o art. 471, inc. I, do Código de Processo Civil.
Assim, diante do agravamento da situação da autora e da condição socioeconômica do casal, está caracterizada nova situação fática, afastando a identidade de partes, de objeto e de causa de pedir que configura a coisa julgada. No mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. 1. O direito ao benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e no art. 20 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) condição socioeconômica que indique miserabilidade; ou seja, a falta de meios para prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família. 2. Afastada a coisa julgada diante de novo requerimento administrativo e da mudança da situação de fato e de direito, com o agravamento da doença e da situação socioeconômica da família, o que permite a rediscussão da matéria na via judicial, em conformidade com o art. 471, I, do CPC. Precedentes. (TRF4, AC 0023039-62.2014.404.9999, Quinta Turma, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 16/03/2015)
Da litigância de má-fé
Em relação à litigância de má-fé, dispõe o art. 17 do CPC:
Art. 17 - Reputa-se litigante de má-fé aquele que:
I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II - alterar a verdade dos fatos;
III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
VI - provocar incidentes manifestamente infundados;
VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Por sua vez, o art. 18 do CPC estabelece o seguinte:
Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a 1% (um por cento) sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.
No caso, tenho que não merece acolhida o pedido de aplicação de multa por litigância de má-fé, porquanto não se fazem presentes quaisquer das hipóteses elencadas pela lei processual.
Importa destacar que a má-fé do litigante deve sempre ser demonstrada, uma vez que não se admite a condenação ao pagamento da multa por mera culpa.
Além disso, a condenação do litigante de má-fé ao pagamento de multa requer também a demonstração inequívoca do prejuízo sofrido pela parte contrária, o que não ocorreu.
Tal é o entendimento do STJ e desta Corte:
AUSÊNCIA DE OFENSA AO ARTIGO 535 DO CPC. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INDENIZAÇÃO DO ART. 18, § 2º, DO CPC. EXIGÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DOLO E DOS PREJUÍZOS. NULIDADE DE INTIMAÇÃO. INEXISTÊNCIA. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. LIMITES DA LIDE. COISA JULGADA. ART. 610 DO CPC.
(...)
2. A condenação prevista no Art. 18, § 2º, do CPC, pressupõe dolo da parte que litiga de má-fé, além de demonstração inequívoca do prejuízo causado à parte contrária.
(...) (STJ, REsp 756885, 3ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU 17/09/2007)
EMBARGOS À EXECUÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELA APADECO. LEGITIMIDADE. ALCANCE DOS EFEITOS DA SENTENÇA. JUROS REMUNERATÓRIOS. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. (...) - Inexistência de prejuízo aos exeqüentes, restando ausente um dos requisitos necessários à imposição das penalidades por litigância de má-fé. (TRF4, AC 2006.70.13001527-5, 3ª Turma, Rel. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida, DJU 22/08/2007)
Passo ao exame do mérito.
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de BENEFÍCIO ASSISTENCIAL, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011, e nº 12.470, de 31-08-2011.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar fosse superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora, especialmente medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.
Exame do caso concreto
Em relação à alegada incapacidade da autora, consta às fl. 82-83 Perícia Médica solicitada pela 2ª Vara da Comarca de Santo Antônio da Patrulha, assinada pela Dra. Francine Aguiar Gonçalves (CRM/RS 24210), em 13/04/2010, relatando que a autora iniciou tratamento em 2004 e desde então faz acompanhamento neurológico a cada dois ou três meses com médico particular. Na ocasião, a expert concluiu que, no período de 06 (seis) anos a pericianda não obteve melhora, tendo, inclusive, havido piora da sua doença. O diagnóstico é de depressão (CID 10 - F32), sendo o tratamento ministrado adequado ao caso. Entretanto, considerando a evolução do quadro clínico (deterioração cognitiva lenta e progressiva) e ausência de resposta terapêutica, é pertinente pensar em demência (CID 10 - F02), como comorbidade associada. De qualquer maneira, é possível dizer que a pericianda demonstra incapacidade total para qualquer tipo de atividade laborativa.
Ademais, vale ressaltar que a interdição do autor para os atos da vida civil, declarada na sentença prolatada pela Juíza de Direito da 2ª Vara da Comarca de Santo Antônio da Patrulha, em 28 de setembro de 2007, (certidão à fl. 13), basta para demonstrar a condição de pessoa com deficiência, já que é firme a jurisprudência deste Colegiado no sentido de que a sentença que decreta a interdição é suficiente para a comprovação da incapacidade para fins de benefício assistencial (TRF4, APELREEX 5006803-73.2012.404.7006, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, juntado aos autos em 22-09-2014), o que também encontra respaldo na jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (v.g., AREsp 573082, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 23-06-2015).
Logo, mostra-se preenchido o requisito sub examen desde 28/09/2007.
No tocante ao requisito econômico, foram elaborados pareceres sociais, em 21/07/2011; 26/07/2012 e 31/10/2014), nos quais se destacam os aspectos abaixo indicados (fls. 99-100; 110 e 150-151):
A - família composta por 02 (dois) membros, a autora, Jandira Muniz Silva dos Reis, 53 anos, incapaz, e seu marido, Sr. CláudioViana dos Reis, 55 anos;
B - renda bruta familiar: no momento, o Sr. Cláudio está impossibilitado de trabalhar em local fixo, pois a autora não pode mais ficar sozinha, colocando-se frequentemente em risco. Quando Jandira está mais calma, consegue combinar a realização de "bicos", como cortes de grama, podas de árvore e outros trabalhos manuais, pois a leva junto com ele, ficando sentada em alguma sombra sob seu olhar. Estes trabalhos rendem a Cláudio cerca de R$ 50,00 cada, não podendo precisar uma média devido à inconstância de Jandira, mas, afirma que são poucas. Recebem, eventualmente, auxílio financeiro da filha e dos cunhados;
C - residem em uma chácara localizada em área bem afastada do centro urbano. A casa é de madeira, em precárias condições;
D - de acordo com os estudos empreendidos, concluiu-se que sem o auxílio da filha e dos cunhados, o casal não teria como arcar com as despesas básicas do lar, tais como energia elétrica, gás e outras; deixando claro que mesmo Cláudio não sabendo afirmar qual a sua renda média, provavelmente resulta inferior a R$ 350,00. Já a Sra. Jandira não possui rendimentos.
Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto
Dessarte, o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui incapacidade, necessitando de cuidados permanentes para sobreviver com dignidade. Portanto, deve ser reconhecido o direito ao benefício assistencial, desde 03/07/2008 (data do ajuizamento da ação - fl. 02), impondo-se a reforma da sentença.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
Com base no posicionamento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei nº 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei nº 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento do STF no que se refere ao mérito. A relevância e transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que, no julgamento das ADIs em referência, a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que haja decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é aplicar o critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que advenha em sede de modulação de efeitos.
Juros de mora
Até 29-06-2009, os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei nº 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, os juros incidirão, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados uma única vez e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, não houve pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral, não apenas no que diz respeito à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas, também, à controvérsia relativa aos juros de mora incidentes.
Tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 461 do CPC (TRF4, Terceira Seção, QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper).
Por oportuno, vale ressaltar que não se cogita de ofensa aos artigos 128 e 475-O, I, do CPC, porque a hipótese, nos termos do precedente da 3ª Seção, não é de antecipação, de ofício, de atos executórios. A implantação do benefício decorre da natureza da tutela judicial deferida.
Dessa forma, em vista da procedência do pedido e do que estabelecem os artigos 461 e 475-I, caput, bem como dos fundamentos expostos no precedente referido alhures, e inexistindo embargos infringentes, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
Conclusão
Reforma-se a sentença que julgou improcedente o pedido formulado por Jandira Muniz Silva dos Reis para reconhecer o direito da autora ao recebimento do benefício assistencial de prestação continuada no valor de um salário mínimo a partir de 03/07/2008.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo e determinar a implantação do benefício.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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Data e Hora: | 21/03/2016 17:49 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/03/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018780-87.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00229515020088210065
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | JANDIRA MUNIZ SILVA DOS REIS |
ADVOGADO | : | Giovana Gularte Ibanez |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 15/03/2016, na seqüência 177, disponibilizada no DE de 25/02/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO APELO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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