Apelação Cível Nº 5003497-72.2017.4.04.7119/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: ADIVANEO BIGOLIN BRUM (AUTOR)
ADVOGADO: MILTON FRAGA GAIRA (OAB RS058944)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por ADIVANEO BIGOLIN BRUM em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a concessão de sua Reforma, sob a alegação de que, após vários anos de tratamento médico, não se recuperou da lesão que motivou anterior reintegração para tratamento de saúde.
Sentenciando o feito, o Magistrado a quo julgou improcedente o pedido, nos termos do seguinte dispositivo:
"Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado na inicial, extinguindo o processo, com julgamento de mérito, forte no artigo 269, I, do CPC.
Sem condenação a ressarcimento de custas, uma vez que a parte autora não as recolheu, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita. UNIÃO isenta (L 9.289/1996, art. 4º, I).
Condeno a parte autora, porque sucumbente: a) ao pagamento de honorários advocatícios da parte adversa, em valor equivalente a 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, forte no artigo 85, §2º, do CPC, observando-se o IPCA-E como critério de correção monetária; b) ao ressarcimento das despesas empreendidas pela SJRS com a realização de perícia médica; c) ao pagamento das custas processuais. Resta suspensa, contudo, a exigibilidade da condenação face à concessão do benefício de gratuidade de justiça.
Aguarde-se o prazo recursal. Havendo recurso e intimada a parte recorrida para contrarrazões, remetam-se os autos à Superior Instância; caso contrário, certifique-se o trânsito em julgado da presente.
Após o trânsito, sendo caso de improcedência da demanda, remetam-se ao arquivo, com as baixas necessárias. Em se tratando de procedência, intime-se às partes para requeiram o entenderem de direito. No silêncio, dê-se baixa e arquivem-se.
Publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se" (Evento 46 - SENT1).
Apela o autor, visando à reforma do provimento judicial a fim de ser julgado procedente o pedido. Preliminarmente, aponta a nulidade da perícia judicial, eis que a perita, médica do trabalho, não poderia ter atuado no processo por ser casada com militar do Exército, evidenciando seu impedimento. No mérito, argumenta, em síntese, que restou comprovada a incapacidade do autor pela auta de inspeção de saúde juntada, sendo que a Magistrada teria analisado somente o laudo pericial. De qualquer forma, o autor faria jus à Reforma de ofício, por ter permaneceido por mais de 02 anos agregado/adido, de acordo com o art. 106, III, do Estatuto dos Militares.
Apresentadas as contrarrazões, o feito foi encaminhado a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Destaco que a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- à análise da alegação de nulidade da perícia por impedimento da perita;
- à análise quanto ao pedido de reintegração e reforma do autor, considerando-se a alegada existência de incapacidade; e
- o direto à Reforma de ofício, por estar agregado há mais de 02 anos.
O autor, militar temporário, foi reintegrado às fileiras do Exército em 11/06/2012, na condição de adido, por força de liminar deferida na Ação nº 5000477-83.2011.4.04.7119. Em 07/06/2016, submetido à inspeção de saúde, foi novamente excluído do Exército. Por força do julgamento de recurso especial da União, o STJ determinou nova reintegração do autor, concretizada em julho de 2017.
Da nulidade da perícia e do impedimento da perita
Não procedem as alegações da parte autora com relação à nulidade da perícia em função do impedimento da perita, pelo simples fato de ser casada com um militar.
Acerca da suspeição e impedimento, prevê a Lei nº 9.784/99:
'Art. 18. É impedido de atuar em processo administrativo o servidor ou autoridade que:
I - tenha interesse direto ou indireto na matéria;
II - tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau;
III - esteja litigando judicial ou administrativamente com o interessado ou respectivo cônjuge ou companheiro.
Art. 19. A autoridade ou servidor que incorrer em impedimento deve comunicar o fato à autoridade competente, abstendo-se de atuar.
Parágrafo único. A omissão do dever de comunicar o impedimento constitui falta grave, para efeitos disciplinares.
Art. 20. Pode ser argüida a suspeição de autoridade ou servidor que tenha amizade íntima ou inimizade notória com algum dos interessados ou com os respectivos cônjuges, companheiros, parentes e afins até o terceiro grau.
Art. 21. O indeferimento de alegação de suspeição poderá ser objeto de recurso, sem efeito suspensivo.'
Portanto, nenhuma das hipóteses legais de impedimento ou suspeição estão presentes.
Dito isso, não há imparcialidade ou qualquer outro vício que macule o laudo pericial.
Por outro lado, levando-se em conta que o perito é assistente do juízo, a ele encontrando-se vinculado em face do compromisso assumido, e não havendo qualquer indicação de parcialidade na elaboração dos laudos, que trazem conclusão na mesma linha da prova produzida nos autos, não sobressai qualquer inconsistência na prova técnica.
O certo é que a discordância quanto às conclusões do laudo não autoriza a repetição ou a complementação da perícia, se as questões formuladas foram respondidas satisfatoriamente.
Nesse sentido, os seguintes precedentes:
"AGRAVO. PREVIDENCIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DO LAUDO PERICIAL. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA MÉDICA POR ESPECIALISTA EM FISIATRIA.
1. A discordância quanto às conclusões do laudo não autoriza a repetição, tampouco a complementação da perícia, estando as questões formuladas pela autora rebatidas no bojo do laudo.
2. Necessária a realização de nova perícia médica judicial por especialista em fisiatria para análise da dor no braço esquerdo referida pela Agravante e que poderia resultar na sua incapacidade laboral, principalmente tendo em vista que trabalha como costureira".
AI nº 2009.04.00.042088-0/RS; Rel. Des. Federal Celso Kipper; DJ de 05/03/2010)
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-ACIDENTE. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA MÉDICA. DESNECESSIDADE. INCAPACIDADE LABORAL. AUSÊNCIA.
1. A simples discordância da parte autora com as conclusões periciais, sem haver específica razão para tanto, não é o bastante para justificar a realização de nova perícia técnica. Afastada a possibilidade de anulação do decisum.
2. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
3. Hipótese em que o perito judicial concluiu no sentido da ausência de incapacidade para o exercício de atividades laborais, não é devido o benefício de auxílio-doença, tampouco o de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-acidente".
(AC nº 2009.72.99.002326-4/SC, Relator Juiz Federal Loraci Flores de Lima; DJ de 08/07/2010).
Outrossim, note-se que não houve qualquer manifestação da parte autora contrária à nomeação do perito judicial à época própria, sobressaindo a preclusão do seu direito de alegar eventual nulidade.
Nada a reparar, portanto.
DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Quanto ao tema, dispõe a legislação pertinente (Lei n.º 6.880/80, Estatuto dos Militares):
Art. 50. São direitos dos militares:
(...)
IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas:
(...)
e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários;
(...)
Art. 106. A reforma ex officio será aplicada ao militar que:
(...)
II - for julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas;
III - estiver agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável;
(...)
Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:
I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública;
II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações;
III - acidente em serviço;
IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço;
V - tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias que a lei indicar com base nas conclusões da medicina especializada; e
VI - acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço.
Art. 109. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos itens I, II, III, IV e V do artigo anterior será reformado com qualquer tempo de serviço.
Art. 110. O militar da ativa ou da reserva remunerada, julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos incisos I e II do art. 108, será reformado com a remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que possuir ou que possuía na ativa, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 7.580, de 1986)
§ 1º Aplica-se o disposto neste artigo aos casos previstos nos itens III, IV e V do artigo 108, quando, verificada a incapacidade definitiva, for o militar considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho.
(...)
Art. 111. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes do item VI do artigo 108 será reformado:
I - com remuneração proporcional ao tempo de serviço, se oficial ou praça com estabilidade assegurada; e
II - com remuneração calculada com base no soldo integral do posto ou graduação, desde que, com qualquer tempo de serviço, seja considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho.
Consoante o Estatuto dos Militares, pois, é reconhecido ao militar temporário ou de carreira que se torna definitivamente incapacitado para o serviço ativo das Forças Armadas, em decorrência das causas previstas nos incisos I a IV do art. 108 da Lei 6.880/80 - que contemplam hipóteses com relação de causa e efeito com as atividades castrenses -, o direito à reforma, com soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que recebia na ativa em relação às situações previstas nos incisos I e II, bem como em relação às situações previstas nos incisos III e IV, quando verificada a incapacidade definitiva, sendo impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho (art. 110, caput, e § 1°), sempre independentemente de seu tempo de serviço (art. 109).
Em relação aos incisos V e VI do art. 108 do Estatuto dos Militares - hipóteses em que não há nexo de causalidade entre a doença/moléstia e a atividade militar -, duas situações devem ser consideradas:
a) se a doença é daquelas referidas no inciso V, a incapacidade confere direito à reforma e, se ocasionar invalidez (incapacidade para qualquer trabalho), será com proventos do grau hierárquico imediato ao que o militar possuía na ativa (art. 110, § 1°);
b) se o caso enquadra-se no inciso VI (acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço), a reforma somente é garantida, com remuneração proporcional ao tempo de serviço, ao militar estável (art. 111, I); sem a estabilidade, os militares somente serão reformados mediante a prova da invalidez, ou seja, impossibilidade total e permanente para qualquer trabalho, inclusive de natureza civil, com qualquer tempo de serviço, hipótese em que a remuneração será calculada com base no soldo integral do posto ou graduação (art. 111, II).
Ademais, consoante prevê o disposto no art. 106, III, do Estatuto dos Militares, o direito à reforma é reconhecido quando o militar "estiver agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável".
Passo à análise desses respectivos fundamentos:
DO CASO CONCRETO
Da análise do direito à reforma (especificamente à luz do disposto no art. 106, II, c/c art. 108, IV e VI, Estatuto dos Militares):
Relativamente à prova produzida - e que diz respeito à situação de saúde do demandante, restou evidenciado que o autor foi reintegrado às fileiras do Exército, na condição de adido, desde 11/06/2012 por força de ação judicial, tendo sido excluído em 2016 e novamente reintegrado em julho de 2017.
Note-se que o autor foi submetido à perícia judicial, realizada em 26/02/2018, conclusiva pela presença de Artrose dos Joelhos e Dorsalgia (Evento 18 - PERÍCIA1).
Outrossim, não foi atestada incapacidade para todas as atividades militares e civis.
Em relação à incapacidade, o perito atestou que o quadro está compensado, nos seguintes termos:
"5. Discussão/Conclusão: Autor com quadro de doença degenerativa dos joelhos sintomática desde 2009, tendo sido submetido a 2 procedimentos cirúrgicos por ruptura do menisco medial do joelho direito. No momento apresenta joelhos com boa estabilidade, indolores ao movimento, com testes semiológicos negativos para patologias agudas. Possui apenas crepitação articular (esperado em uma articulação com degeneração), mas não necessariamente é a causa dos sintomas. Vale ressaltar que o excesso de peso do autor é um agravante importante da dor articular. RNM de coluna lombossacra apresenta abaulamento discal com leve compressão do saco dural, o que não caracteriza hérnia de disco. A queixa de dorsalgia provavelmente é de origem osteomuscular, certamente agravada pelo excesso de peso. Não realiza tratamento medicamentoso ou fisioterápico para dorsalgia. Importante observar que o excesso de peso (50kg nos últimos meses) é fator determinante da piora dos sintomas tanto dos joelhos quanto da coluna, sendo fundamental o emagrecimento para o tratamento adequado da patologia" ..
Na espécie, portanto, inexiste direito à reintegração para fins de tratamento com pagamento de soldo ou reforma, pois, tratando-se de militar temporário, isto é, que ainda não tenha atingido a estabilidade (10 ou mais anos de tempo de efetivo serviço, nos termos do art. 50, inciso IV, "a", da Lei nº 6.880/80), pode este ser licenciado a critério do Exército, salvo se acometido por doença causada pelo serviço militar ou acidente em serviço, causadores de incapacidade laboral definitiva, ou ainda doença sem relação com a atividade militar, porém causadora de invalidez.
Nesse sentido, merece transcrição trecho da sentença:
"MÉRITO
Do tratamento jurídico dado à matéria
Inicialmente, cumpre asseverar que, para o serviço militar, justamente por estarem inerentes peculiaridades que o diferenciam de outras atividades civis, exige-se plena capacidade física/mental, devendo o praça/oficial colaborar para o integral atendimento dos objetivos institucionais das Forças Armadas. Em caso de superveniente incapacidade, o militar será convenientemente afastado do serviço militar, por não atender mais à sua finalidade. Ademais, esta incapacidade muitas vezes não torna o militar inválido, isto é, incapaz para todo e qualquer trabalho, mas, sim, tão-somente para o serviço do Exército, Marinha ou Aeronáutica.
Sobre o ato de licenciamento, a Lei n° 6.880/80 regula especificamente o tema:
Art. 121 - O licenciamento do serviço ativo se efetua:
I - a pedido, e
II - "ex officio".
(...)
§ 3º o Licenciamento "ex oficio" será feito na forma da legislação que trata do serviço militar e dos regulamentos específicos de cada Força Armada:
a) por conclusão do tempo de serviço ou estágio;
b) por conveniência do serviço, e
c) a bem da disciplina.
§ 4º O militar licenciado não tem direito a qualquer remuneração e, exceto o licenciado "ex officio" a bem da disciplina, deve ser incluído ou reincluído na reserva.
(...)
Portanto, tratando-se o licenciamento de ato administrativo discricionário, não cabe ao Judiciário apreciar-lhe o mérito. Neste sentido, é esclarecedora a decisão da 1ª Turma do TRF da 2ª Região na Apelação Cível n.º 0227580-4, ano: 96/RJ, publicada no DJ de 12.11.1998, relatada pelo Desembargador Federal Sergio Feltrin Correa:
"ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIO. TAIFEIRO DA AERONÁUTICA. ADMISSÃO PRECÁRIA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO À ESTABILIDADE. O militar temporário não adquire direito à estabilidade, salvo se conservado na ativa por mais de dez anos consecutivos. Ao ingressar nas Forças Armadas, ele já sabe que sua admissão é precária, por tratar-se de servidor sujeito à legislação específica, que faculta à administração romper o vínculo a qualquer momento, sem que o licenciado possa alegar lesão ao "direito" de completar o tempo necessário à transformação do status de temporário em militar de carreira. Não pode o Judiciário censurar o administrador pelo fato de, usando do seu poder discricionário, haver deferido a uns e a outros não, o reengajamento no serviço ativo".
Contudo, ocorrendo uma das hipóteses que impõem a reforma "ex officio" do militar, é vedado o licenciamento. Assim, se comprovada a incapacidade para o serviço à época do licenciamento, exsurge o direito ao tratamento médico adequado, mantendo-o na ativa em caso de incapacidade temporária, ou se procedendo à sua reforma, tratando-se de incapacidade definitiva.
Antes de ingressar no exame da questão, transcrevo os dispositivos da Lei n.º 6.880, de 09.12.80, que interessam para o deslinde da controvérsia:
ART.104 - A passagem do militar à situação de inatividade, mediante reforma, se efetua:
I - a pedido, e
II - "ex officio".
ART.106 - A reforma "ex officio" será aplicada ao militar que:
(...)
II - for julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas;
III - estiver agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável;
(...)
ART.108 - A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:
I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública;
II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações;
III - acidente em serviço;
IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço;
V - tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias que a lei indicar com base nas conclusões da medicina especializada, e
VI - acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço.
§ 1º Os casos de que tratam os itens I, II, III e IV serão provados por atestado de origem, inquérito sanitário de origem ou ficha de evacuação, sendo os termos do acidente, baixa ao hospital, papeleta de tratamento nas enfermarias e hospitais, e os registros de baixa utilizados como meios subsidiários para esclarecer a situação.
§ 2º Os militar es julgados incapazes por um dos motivos constantes do item V deste artigo somente poderão ser reformados após a homologação, por Junta Superior de Saúde, da inspeção de saúde que concluiu pela incapacidade definitiva, obedecida à regulamentação específica de cada Força Singular.
ART.109 - O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos itens I, II,III, IV e V do artigo anterior será reformado com qualquer tempo de serviço.
ART.110 - O militar da ativa ou da reserva remunerada, julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes do incisos I e II do art. 108, será reformado com a remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que possuir ou que possuía na ativa, respectivamente.
§ 1º Aplica-se o disposto neste artigo aos casos previstos nos itens III, IV e V do art. 108, quando, verificada a incapacidade definitiva, for o militar considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho.
ART.111 - O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes do item VI do art. 108 será reformado:
I - com remuneração proporcional ao tempo de serviço, se oficial ou praça com estabilidade assegurada, e
II - com remuneração calculada com base no soldo integral do posto ou graduação, desde que, com qualquer tempo de serviço, seja considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho.
Ressai, dos dispositivos supracitados, que, para o deferimento da reforma remunerada, no caso do militar que sofreu lesão ou moléstia durante a prestação do serviço militar (com exceção daquelas elencadas nos incisos V e VI do art. 108), a incapacidade deve ser definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas e a lesão ou moléstia que a originou deve ter relação de causa e efeito com o serviço militar, devido a condições da própria atividade ou em decorrência de acidente de serviço.
Assim, nos termos do § 1º do artigo 110 da Lei n°. 6.880/80, o militar deve ser reformado "ex officio" com a remuneração calculada com base no soldo integral do posto ou graduação imediatamente superior ao que ocupava, quando, nas hipóteses dos incisos III, IV e V do art. 108, a incapacidade for considerada definitiva e for militar incapaz para qualquer trabalho.
Por outro lado, sendo constatada lesão ou enfermidade temporária durante o período de engajamento, deve, então, o militar permanecer agregado ou adido às Forças Armadas, sendo-lhe prestado todo auxílio pertinente ao tratamento médico-hospitalar, bem como devendo perceber remuneração equivalente ao posto ou grau hierárquico que ocupava na ativa, conforme reza o art. 149, do Decreto 57.654/66, in verbis:
Art. 149. As praças que se encontrarem baixadas a enfermaria ou hospital, ao término do tempo de serviço, serão inspecionadas de saúde, e mesmo depois de licenciadas, desincorporadas, desligadas ou reformadas, continuarão em tratamento, até a efetivação da alta, por restabelecimento ou a pedido. Podem ser encaminhadas a organização hospitalar civil, mediante entendimentos prévios por parte da autoridade militar.
Em síntese:
a) A legislação (Lei nº 6.880/80, art. 106) distingue incapacidade definitiva para o serviço ativo militar (apenas) e invalidez (equivalente à incapacidade para o serviço ativo militar e para todas as demais atividades laborais civis).
b) O militar, temporário ou não, tem direito à reforma quando julgado, no mínimo, incapaz definitivamente para o serviço ativo militar, desde que a incapacidade derive do exercício da função, vale dizer, nexo causal com as atividades militares nas hipóteses (Lei nº 6.880, art. 108, I, II, III, IV): I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública; II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações; III - acidente em serviço; IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço. A remuneração, nas duas primeiras hipóteses (I e II) ou no caso de invalidez (Lei nº 6.880, art. 110) é calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que o militar possuía na ativa.
c) O militar, temporário ou não, tem direito à reforma, independentemente do nexo causal, quando acometido das seguintes moléstias (Lei nº 6.880, art. 108, V): tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias indicadas pela lei.
d) No que respeita às enfermidades ou moléstias sem relação de causa e efeito com o serviço (fora das hipóteses acima), a lei dá tratamento diverso aos militares temporários e aos que possuem estabilidade assegurada: aos militares estáveis, assegura-se a reforma desde que presente a incapacidade para o serviço ativo (a remuneração é calculada proporcionalmente ao tempo de serviço); aos temporários, além da incapacidade, a concessão do benefício depende do reconhecimento da invalidez, ou seja, incapacidade laboral para toda e qualquer atividade na vida civil (remuneração calculada com base no soldo integral do posto ou graduação que ocupava na ativa).
Ainda, na AC nº 2005.71.02.005758-3, entendeu a 3ª Turma do TRF/4 que "os deveres e benefícios estabelecidos na Lei nº 6.880/80 são extensivos aos militares temporários, isto é, aqueles incorporados às Forças Armadas para prestação do serviço militar obrigatório, uma vez que tal legislação não os distingue dos militares de carreira (interpretação do art. 67, § 1.º, "d").”
Do caso em julgamento
O pedido de reforma formulado pelo autor foi fundado especificamente no art. 106, III, da Lei nº 6.880/80, verbis:
Art. 106. A reforma ex officio será aplicada ao militar que: (...) III - estiver agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável.
Determinada realização de perícia, o expert concluiu que (evento 18):
QUESITOS DO JUÍZO:
1. O periciado é portador de alguma doença ou incapacidade? Qual (especificar CID e descrever características)? Artrose dos joelhos (M17), no momento somente com limitação para o movimento de agachamento. Dorsalgia (M54.9) provavelmente de causa osteomuscular.
2. Em caso afirmativo, é possível diagnosticar a causa/origem da moléstia? Ela é préexistente à incorporação do autor ao serviço militar? O desgaste articular é um processo natural e esperado em todos os indivíduos desde os 20-30 anos de idade. Ocorre a partir a degeneração da cartilagem articular, expondo a superfície óssea. A presença de sintomas é inerente a cada indivíduo e não há como saber com precisão a data de seu início. No entanto sabe-se que atividades de impacto nos joelhos podem precipitar um quadro de dor em uma articulação previamente desgastada. É provável que o desgaste articular dos joelhos seja prévio à incorporação ao serviço militar, mas que tenha se tornado sintomático após o início das atividades físicas de maior impacto.
3. A moléstia diagnosticada é permanente e irreversível? No quesito da degeneração, é permanente e irreversível, mas passível de controle para evitar sua progressão.
4. Pelo atual estágio da moléstia, considerando-se a provável evolução do quadro clínico, pode-se dizer que o autor está incapacitado(a) total e permanentemente para qualquer trabalho? Não há incapacidade. O autor tem restrição somente ao movimento de agachamento.
5. Havendo incapacidade, é ela definitiva? Se não for, a que tratamentos ou cirurgias deve se submeter o periciado e quais as chances de êxito? Não é o caso.
6. Havendo incapacidade, quais os impedimentos traz ao dia-a-dia do periciado? Restrição às atividades que exijam agachamento.
7. Em caso de não haver incapacidade do periciado para o exercício de qualquer atividade remunerada, que tipo de trabalho ele pode exercer? Pode exercer qualquer tipo de trabalho.
8. Há incapacidade, total ou parcial, para o exercício da atividade militar? Neste caso, a incapacidade é definitiva? Incapacidade parcial: restrição aos exercícios que envolvam agachamento ou alto impacto em joelhos, como corrida. Não há como saber se será definitiva. *grifei
Em análise, vislumbra-se claramente que o autor não está incapacitado para atividades militares e civis, podendo perfeitamente exercer atividades laborativas. Outrossim, ainda conforme o laudo, parte da piora no quadro do autor se deve ao seu aumento excessivo de peso (50kg), situação que pode ser revertida.
Dessarte, impõe-se reconhecer que não há razão para a reforma do autor.
De fato, como referi alhures, o inciso III, do art 106, do Estatuto dos Militares prevê a reforma ex officio do militar, caso esteja "agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável". Destarte, a permanência na condição de adido, por mais de dois anos, importa, necessariamente, no direito à reforma, havendo incapacidade temporária e mesmo sendo possível a cura da doença.
Ocorre, contudo, que o intuito do legislador, ao prever tal possibilidade de reforma, foi evitar que o militar permaneça indefinidamente na condição de agregado, mesmo se tendo revelado, até então, infrutífera sua recuperação física. Assim, estabeleceu que, permanecendo o militar na condição de agregado por mais de dois anos, continuando incapacitado, ainda que esgotados todos os recursos terapêuticos, impõe-se sua reforma, até porque, ao que tudo indica, dificilmente dar-se-á a cura da moléstia.
Outra solução deve ser dada, entretanto, se o militar, ainda que tenha permanecido mais de dois anos na condição de agregado, recupera, plena e totalmente, sua higidez física, achando-se habilitado tanto ao desempenho de atividades militares quanto de atividades civis.
É o que a prova pericial revelou no caso vertente: o autor foi submetido a tratamento médico eficaz, pois que inexiste incapacidade.
Percebe-se grande progresso desde o resultado da perícia realizada em 21/02/2012, nos autos do processo nº 50004778320114047119, que embasou a sentença de procedência naquela ocasião. Ressalta-se o fato de que já naquela época havia boas perspectivas de melhora (evento 46, LAUDO1, daquele feito):
CONCLUSÃO:
O autor apresenta doença condral degenerativa no joelho esquerdo, ou seja, sem relação com o trabalho.
O autor apresentou lesão no joelho direito durante jornada de trabalho no exército ( vários documentos e laudos permitem atestar que houve uma lesão de joelho direito durante suas atividades no exército = ver em quadro clínico.
Ressonância de joelho direito realizada em 15.3.2010 atesta lesão / ruptura do menisco medial e estiramento do LCA.
Esse tipo de lesão requer cuidados pós operatórios, como fisioterapias, exercícios de reforço e alongamentos musculares.
O autor encontra-se ainda sem condições de trabalho, pois está em processo de recuperação pós operatória ( fisioterapias ).
O prognóstico do autor é bom, ou seja, há reais perspectivas de restabelecimento funcional após término do tratamento.
Ora, o corolário lógico é a impossibilidade de reforma, mormente quando se tem em conta que se trata de indivíduo jovem - tem só 29 anos de idade - e plenamente capaz de exercer qualquer atividade laboral que lhe garanta o sustento.
Portanto, é evidente que, tendo-se ofertado tratamento médico ao autor, não é razoável que esse seja colocado na condição de reformado, já que dispõe de condições para o desempenho de qualquer trabalho.
Em verdade, foi integralmente atingido o objetivo da reintegração do militar às fileiras do Exército, pois que, após tratamento médico, recuperou-se, sendo devolvido ao meio civil tal qual ingressou na seara castrense.
A corroborar este entendimento, colaciono precedente que se amolda perfeitamente ao caso dos autos:
MILITAR. TRATAMENTO DE SAÚDE. PERMANÊNCIA NA CONDIÇÃO DE ADIDO OU AGREGADO POR MAIS DE DOIS ANOS. CONCESSÃO DE REFORMA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. POSSIBILIDADE. LEI Nº 6.880/80.1) Caso infrutífera a recuperação física do autor e havendo a permanência na condição de adido, por mais de dois anos, deverá ser procedida sua reforma, com base nos artigos 106, III e 108, IV da Lei nº 6.880/80.2) Estando o autor plenamente recuperado, e ausente qualquer incapacidade, não há motivo para concessão de reforma pelo simples decurso do tempo. (TRF4, AC 5000847-57.2014.404.7119, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, juntado aos autos em 04/09/2015) *grifei" (Evento 46 - SENT1).
Do direito à reforma pela agregação (art. 106, III, do Estatuto dos Militares):
Sobre tal temática, o STJ pacificou entendimento no sentido de que o mero transcurso do lapso temporal previsto no inciso III do art. 106 da Lei 6.880/80 não assegura ao militar agregado o direito à reforma ex offício, exigindo-se, também, a demonstração de que a incapacidade persiste, estando ele incapacitado definitivamente para o serviço militar e para as atividades laborais civis (art. 108 da Lei 6.880/80), ainda que se trata de uma moléstia curável.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. MILITAR TEMPORÁRIO. AGREGADO. CAPACIDADE PARA O TRABALHO RESTABELECIDA. PRETENSÃO DE REFORMA EM RAZÃO DO DECURSO DO PRAZO MÁXIMO PARA AGREGAÇÃO. ART. 106, III, DA LEI 6.880/1980. IMPOSSIBILIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. DECISÃO MONOCRÁTICA. IMPRESTABILIDADE. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. Cinge-se a controvérsia em exame acerca da possibilidade de concessão de reforma ex offício prevista no art. 106, III, da Lei 6.880/1980, ao militar temporário que a despeito de ter permanecido agregado por mais de 02 (dois) anos para tratamento de saúde, recupera a sua higidez, não estando mais incapacitado para o serviço castrense.
2. O instituto da agregação, previsto na Lei 6.880/1980, busca, entre outras hipóteses, assegurar ao militar acometido de moléstia incapacitante temporária o direito ao devido tratamento médico-hospital, no intuito de restabelecer sua plena capacidade laborativa e, naqueles casos em que não seja possível a recuperação, a o direito à reforma ex offício (art. 106, III, da Lei 6.880/1980: "A reforma ex officio será aplicada ao militar que: [...] III - estiver agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável").
3. Da interpretação do dispositivo legal, percebe-se tratar-se de espécie de reforma ex officio por incapacidade de militar agregado por mais de dois anos, ainda que se trate de moléstia curável, ou seja, o reconhecimento do direito do militar agregado à reforma pressupõe que, ao tempo da inspeção de saúde, seja verificada a permanência da incapacidade laboral, ainda que se trate de moléstia que no futuro posso vir a ser curada. Assim, o militar agregado que venha a se recuperar da moléstia incapacitante, restabelecendo a sua condição laboral, não fará jus à reforma, nos moldes do art. 106, III, da Lei 6.880/1980, porquanto não está mais incapacitado.
4. "A outra espécie de reforma de ofício por incapacidade está no artigo 106, III, o qual trás a situação do agregado, a abranger tanto estáveis como temporários, e prevê reforma de ofício ao militar agregado por mais de dois anos, e que esteja temporariamente incapaz. [...] Nos termos deste artigo 106, III, cabe reforma de ofício se o militar estiver agregado por mais de dois anos, por ter sido julgado incapaz temporariamente, ainda que se trate de moléstia curável. Porém, também aqui a lei deve ser corretamente interpretada: em qualquer dos dois casos de reforma de ofício por incapacidade (art. 106, II - incapacidade definitiva - e III - incapacidade temporária, agregação), a incapacidade definitiva dada pelos artigos 108 e 109 deverá ser exigida, até mesmo em homenagem ao Princípio da Isonomia Constitucional. Caso contrário, o agregado, bastando-lhe a incapacidade temporária, terá um tratamento mais benéfico do que o incapaz definitivamente do artigo 106, II. Por isso, os artigos 108 e 109 devem ser aplicados a ambos. E, repita-se, naquele sentido antes exposto, ou seja, a incapacidade definitiva dos artigos 108 e 109 é mais do que a mera incapacidade para o serviço ativo das Forças Armadas, insculpida no artigo 106, II (eis que atinge também a capacidade laboral civil), embora não chegue a ser a invalidez dos artigos 110§ 1º e 111, II. [...] Concluindo, se o militar fica mais de dois anos agregado, por motivo de saúde que o incapacitou temporariamente, ele será reformado nos termos do artigo 106, III, mas em combinação com os artigos 108 e 109 do Estatuto, sendo inclusive necessária a incapacidade tanto para os atos da vida militar como civil; assim, tal situação irá, na prática, desembocar na mesma disciplina da incapacidade definitiva, portanto (que é a do 106, II c/c 108 e 109), em se interpretando o Estatuto de acordo com a isonomia constitucional, como aqui se propõe" (KAYAT, Roberto Carlos Rocha, Forças Armadas: Reforma, Licenciamento e Reserva Remunerada. In: Publicações da Escola da AGU: Direito Militar, 2010, p. 161-192).
5. Não havendo a incapacidade laboral não há o direito à reforma ex offício, não se podendo estender tal benefício àqueles que possuem incapacidade temporária e/ou parcial e ainda existe uma real possibilidade de recuperação da doença e da capacidade laboral, e muito menos àqueles que, mesmo estando agregado há mais de 02 anos, verifica-se o restabelecimento da sua capacidade plena por meio de posterior prova técnica.
6. A lógica por trás do art. 106, III, da Lei 6.880/1980 busca amparar o militar que, "diante do alargamento do período que possa se encontrar incapacitado para as atividades laborais, tenha uma fonte de subsistência segura e permanente, já que, afinal, os egressos na atividades militares não podem ser devolvidos à vida civil em condições diversas daquelas ostentadas no momento de ingresso na caserna. [...] Nesse norte, entendo que a aplicabilidade do art. 106, III, da Lei 6.880/80 deve ter sua abrangência restrita às hipóteses em que não atestada a plena capacidade posterior do militar, sob pena de por em xeque a racionalidade por trás do diploma legal em referência. Ao prevalecer entendimento inverso, estar-se-ia autorizando, por via oblíqua, que pessoas no auge de sua capacidade laborativa, possam passar à inatividade, recebendo proventos, onerando sobremaneira toda a sociedade brasileira" (acórdão regional).
7. O STJ já decidiu que o militar da ativa tem direito à agregação quando incapacitado temporariamente para o serviço castrense, e de, nessa condição, receber o adequado tratamento médico-hospitalar até a sua cura e, caso apurada, posteriormente, a incapacidade definitiva, o direito a reforma ex officio. Precedentes: REsp 1265429/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/02/2012, DJe 06/03/2012; REsp 1195149/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/04/2011, DJe 14/04/2011.
8. No caso ora em apreço, o Tribunal de origem, com base na análise das provas colhidas nos autos, consignou que o Autor teve sua capacidade física reestabelecida integralmente no período que permaneceu agregado, se encontrando plenamente apto ao serviço castrense. Desta forma, inexistindo qualquer incapacidade do autor para o trabalho civil ou militar, não merece prosperar o seu pedido para a reforma, sob pena de estabelecer-se tratamento diferenciado para a concessão desse instituto que tem como pressuposto básico a impossibilidade laborativa do militar, sob pena de violação ao princípio da isonomia.
9. É pacífico o entendimento no âmbito do STJ no sentido de que decisão monocrática não serve como paradigma para fins de demonstração de dissídio jurisprudencial, porquanto se trata de manifestação unipessoal do relator, não compreende o conceito coletivo de "Tribunal" almejado pelo art. 105, III, "c", da Constituição Federal ("der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal"). Precedentes.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido.
(REsp 1506737/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 27/11/2015)
Mais recentemente, in verbis (grifei):
PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE DEFINITIVA. REFORMA DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE.
1. De acordo com a jurisprudência do STJ, o direito à reforma de ofício do militar temporário está condicionada à demonstração da incapacidade definitiva para o serviço, o que não foi observado no caso concreto.
2. Em relação ao militar que se encontra agregado por mais de 2 (dois) anos, o STJ entende que o art. 106, III, da Lei 6.880/1980 deve ser interpretado conjuntamente com os arts. 108 e 109 do mesmo Estatuto, de modo que o direito à reforma imprescinde da demonstração da incapacidade definitiva.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no REsp 1515857/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/08/2017, DJe 15/08/2017)
MILITAR. TRATAMENTO DE SAÚDE. PERMANÊNCIA NA CONDIÇÃO DE ADIDO OU AGREGADO POR MAIS DE DOIS ANOS. CONCESSÃO DE REFORMA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. POSSIBILIDADE. LEI Nº 6.880/80. 1) Caso infrutífera a recuperação física do autor e havendo a permanência na condição de adido, por mais de dois anos, deverá ser procedida sua reforma, com base nos artigos 106, III e 108, IV da Lei nº 6.880/80. 2) Estando o autor plenamente recuperado, e ausente qualquer incapacidade, não há motivo para concessão de reforma pelo simples decurso do tempo. (TRF4, AC 5000847-57.2014.404.7119, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo)
Ou seja, o direito à reforma, nos termos do art. 106, III, da Lei nº 6.880/80, requer também a prova da incapacidade.
Merece ser mantida, portanto, a sentença de improcedência.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC/2015) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
No caso, considerada a sucumbência recursal e levando em conta o trabalho adicional realizado nesta Instância "no sentido de manter a sentença de improcedência", a verba honorária deve ser majorada em favor do patrono da parte vencedora.
Assim sendo, em atenção ao disposto no art. 85, § 2º c/c §§ 3º e 11, do novo CPC, majoro a verba honorária de 10% para 12% (doze por cento), devendo incidir sobre o valor atribuído à causa. Suspensa a exigibilidade, nos termos e limites do art. 98, § 3°, do CPC/2015, por gozar a parte autora do benefício da gratuidade da justiça.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001173116v9 e do código CRC 3e3b9e35.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 23/8/2019, às 12:9:40
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Apelação Cível Nº 5003497-72.2017.4.04.7119/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: ADIVANEO BIGOLIN BRUM (AUTOR)
ADVOGADO: MILTON FRAGA GAIRA (OAB RS058944)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
EMENTA
DIREITO ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIO. NULIDADE DA PERÍCIA. IMPEDIMENTO DA PERITA. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO À REFORMA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. ARTS. 106, II, 108, 109, 110 E 111 DA LEI Nº 6.880/80. DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO. TRANSCURSO DE LAPSO TEMPORAL. DIREITO À REFORMA. NECESSIDADE DE PROVA DA INVALIDEZ (ATIVIDADES CIVIS E MILITARES). PEDIDO IMPROCEDENTE.
I. Inexistente nos autos qualquer manifestação da parte autora contrária à nomeação do perito judicial à época própria, sobressai a preclusão do seu direito de alegar eventual nulidade.
II. São requisitos à reforma para o militar temporário: a existência de moléstia, sua relação de causa e efeito com o serviço do Exército ou a incapacidade permanente para o desempenho de qualquer atividade laboral, hipóteses inocorrentes no caso concreto.
III. A mera agregação por período superior a 02 (dois) anos nos casos de incapacidade não pode configurar direito à reforma ex officio. O STJ pacificou entendimento de que o art. 106, III, da Lei 6.880/80, deve ser interpretado conjuntamente com os arts. 108 e 109 do mesmo Estatuto, de modo que o direito à reforma depende da demonstração de incapacidade definitiva para as atividades castrenses e civis.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de agosto de 2019.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001173117v6 e do código CRC 205a0f43.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 23/8/2019, às 12:9:40
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:33:36.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 20/08/2019
Apelação Cível Nº 5003497-72.2017.4.04.7119/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PROCURADOR(A): JUAREZ MERCANTE
APELANTE: ADIVANEO BIGOLIN BRUM (AUTOR)
ADVOGADO: MILTON FRAGA GAIRA (OAB RS058944)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 20/08/2019, na sequência 373, disponibilizada no DE de 26/07/2019.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:33:36.