EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5008105-09.2013.404.7102/RS
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | RUBENS PAULO COPETTE |
ADVOGADO | : | RAFAEL GONCALVES VARALLO |
EMENTA
EMBARGOS INFRINGENTES. ACRÉSCIMO DE 25% PREVISTO NO ART. 45 DA LEI 8.213/91. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INAPLICABILIDADE.
1. É inaplicável o acréscimo de 25%, previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/91, às demais espécies de benefícios (aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, aposentadoria especial, aposentadoria por idade, pensão por morte, benefício assistencial), porquanto, sem a necessária alteração legislativa, tal proceder configura violação aos princípios constitucionais da legalidade e da contrapartida.
2. Precedente desta 3ª Seção (EIAC N.0017373-51.2012.404.9999, Rel. Des. Federal Vânia Hack de Almeida, julgado em 24-07-2014; EINF 0002780-80.2013.404.9999, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 19/09/2014; EINF 5022066-57.2012.404.7100, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 03/11/2014).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar provimento aos embargos infringentes, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de abril de 2015.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7421210v6 e, se solicitado, do código CRC 7AF958C2. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
Data e Hora: | 17/04/2015 17:55 |
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5008105-09.2013.404.7102/RS
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | RUBENS PAULO COPETTE |
ADVOGADO | : | RAFAEL GONCALVES VARALLO |
RELATÓRIO
Trata-se de embargos infringentes interpostos pelo INSS contra acórdão da 5ª Turma desta Corte que, por maioria, deu provimento à apelação da parte autora, por entender que o acréscimo de 25% ao valor percebido pelo segurado, caso necessite de assistência permanente, pode ser estendido a outras espécies de benefícios que não a aposentadoria por invalidez.
Pretende o recorrente a prevalência do voto minoritário, da lavra do eminente Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, que manifestou não estar o direito invocado amparado por previsão legal, de modo que não cabe a extensão do acréscimo de 25% para beneficiária de aposentadoria por tempo de contribuição.
Sem contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
O voto minoritário, da lavra do e. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, tem o seguinte teor:
O caput do artigo 45 da Lei 8.213/91 estabelece que "o valor da aposentaria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25%".
Parece-me que a concessão da vantagem postulada não decorre de uma simples interpretação da norma. A norma expressamente deixa de contemplar o benefício de aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição. De igual maneira, a hipótese não é de analogia, seja ela analogia legis ou analogia juris, na definição de Karl Larenz, que é utilizada também por Carlos Maximiliano. A extensão do acréscimo de 25% aos casos de aposentadoria, assim, implica reconhecimento da invalidade parcial da norma. Em outras palavras, acarreta reconhecimento da inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, ou seja, a redução para excluir a menção à aposentadoria por invalidez. Esta constatação, assim, estaria a reclamar o respeito à cláusula do full bench ou cláusula da reserva de plenário, na linha, a propósito, do que estabelece a Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal.
De qualquer sorte, não diviso inconstitucionalidade na norma.
Com efeito, estabelecido o pressuposto de que passa a questão pela análise da constitucionalidade da disposição que restringiu a aplicação do acréscimo somente aos casos de aposentadoria por invalidez, resta que se verifique se caracterizada ofensa à Constituição Federal, ou, em um sentido mais amplo, ao ordenamento jurídico vigente - notadamente aquele com status constitucional. E de rigor o reconhecimento da mácula desta norma somente se justificaria no caso em apreço, em última análise, com base em possível afronta ao princípio da isonomia.
Não me parece, todavia, que haja igualdade de situação entre o caso do segurado que desempenha atividade laborativa se depara com a contingência da incapacidade -e assim tem deferida aposentadoria por invalidez-, e o caso do aposentado que, tempos após obter sua aposentadoria por idade, tempo de serviço ou contribuição, vem a ficar doente ou sofrer acidente. Diversas as bases fáticas, o legislador não está obrigado a tratar os casos de forma idêntica.
Veja-se que a concessão do adicional no caso da denominada "grande invalidez" não decorre da Constituição; não é determinada pela Constituição Federal. Assim, não ofenderia a Constituição Federal a Lei 8.213/91 se não tivesse sequer criado este acréscimo previsto em seu artigo 45. Não se pode, assim, afirmar que inconstitucional a norma porque não contemplou outros benefícios que não a aposentadoria por invalidez que está prevista expressamente no art. 45.
A propósito, a se entender que a criação da vantagem não poderia se restringir à aposentadoria por invalidez, a sua extensão deveria ser feita a todos os benefícios previstos no artigo 201 da Constituição Federal, que é a regra matriz de tudo o que dispõe no particular a Lei 8.213/91. Não haveria por que deixar de contemplar, por exemplo, o auxílio-doença e a pensão, pois a necessidade de amparo de terceira pessoa pode atingir também, eventualmente, os titulares dos referidos benefícios.
Quanto à convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência, não nego sua força normativa. Pelo contrário, tem o referido ato força normativa e isso decorre inclusive do nosso sistema, notadamente após o advento da Emenda 45/2005. Não vejo no referido texto da convenção, disposição que contemple específica determinação para concessão de proteção adicional a segurado aposentado, que, em rigor, já está amparado pelo sistema.
Por outro lado, a se entender que o acolhimento do pedido não dependeria de declaração de inconstitucionalidade parcial da norma com redução de texto, mas sim decorreria de extensão do direito nela previsto a situação diversa, avultaria, a meu sentir, um outro problema. É que o reconhecimento do direito à vantagem para os casos de aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição, não adviria, neste caso, de mera interpretação extensiva, mas sim de processo de integração, mediante analogia, uma vez que partindo de norma existente, que regula caso diverso, se estaria a conceder a vantagem a pessoas que estão em outra situação. Com efeito, no caso não se trataria simplesmente de aplicação de norma a situação concreta, de modo a solver litígio instaurado acerca de bem da vida disputado por dois sujeitos relacionados juridicamente. A analogia seria utilizada para reconhecer direito no caso de situação que o legislador claramente não contemplou, pois o art. 45, como já disse, é claro, ele estabelece: O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento). O processo integrativo não se mostra apropriado, parece-me, quando a norma é taxativa.
Não cabe ao julgador sindicar os fundamentos de política jurídica que levaram o legislador a criar a norma; pode apenas analisar a sua compatibilidade à luz do ordenamento constitucional. Nesse ponto, não só pode como deve. Mas a sua atuação como legislador positivo no caso, conquanto não seja totalmente inviável, até consoante precedentes do Supremo Tribunal Federal, deve se reservada a situações muito especiais, notadamente quando a omissão estatal na produção legislativa esteja a inviabilizar direito que decorre ictu oculi da Constituição Federal.
Não me parece que esta seja a situação em foco, de modo que a atuação como legislador positivo, de toda sorte, não se mostraria adequada. Ou seja: só cogitaria de afastamento da norma se reconhecida a inconstitucionalidade com redução de texto. Não diviso, entrementes, essa inconstitucionalidade e, ainda que se reputasse que seria caso de aplicação analógica da norma, se estaria a criar, na verdade, uma nova norma para contemplar uma situação não prevista pelo legislador, o que não seria possível porque não decorre da Constituição esta determinação no caso concreto.
Oportuna também a transcrição do voto vista proferido pelo Des. Federal Cândido Alfredo Silva Leal por ocasião do julgamento por esta Turma do processo 0020609-17.2008.404.7100:
A norma legal do artigo 45 da Lei 8.213/91 pode discriminar, atribuindo o adicional apenas à aposentadoria por invalidez porque: (a) em várias outras situações há distinção entre os requisitos e os tipos de benefício de aposentadoria; (b) a própria renda inicial do benefício é diferenciado, conforme o tipo de benefício (sendo que no caso da aposentadoria por invalidez essa renda inicial é de 100%, enquanto em outras aposentadorias é variável).
Além disso, (c) existe motivo fático que justifique a discriminação porque a aposentadoria por invalidez é algo não-esperado, não se espera a incapacidade, não se pode prevê-la, ao contrário das outras aposentadorias que são relativamente previsíveis (a idade é certa; o tempo de contribuição também é certo). A lei pode discriminar, tratando de forma privilegiada apenas quem tenha se aposentado por invalidez, e não todo e qualquer benefício previdenciário ou toda e qualquer aposentadoria. Pede ser que um aposentado por idade ou por tempo de contribuição também venha a necessitar do benefício adicional, mas a lei não lhe dá esse direito e nisso não há discriminação.
Em suma, tenho que, a despeito dos relevantes fundamentos do eminente Relator, o direito invocado não encontra amparo no ordenamento jurídico. Assim, peço vênia para adotar a linha que norteou precedentes desta Corte. Refiro aqui AC nº 1999.04.01.1053417, da 5ª Turma, Rel. Juíza Ana Paula de Bortoli, AC 2006710006619, 6ª T., Rel. Des. Aurvalle. No mesmo sentido os seguintes precedentes da 1ª e da 2ª Região: AC 200438000001962, 2ª Turma TRF1, Rel. Des. Neuza Maria Alves da Silva e AGTAC 200451015371995, 2ª T Especializada TRF2, Rel. Des. Messod Azulay Neto.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, na forma da fundamentação supra.
O voto majoritário, por seu turno, da lavra do e. Des. Federal Rogério Favretto, foi assim redigido:
Com a vênia do eminente relator, ouso apresentar solução diversa daquela preconizada em seu voto.
No caso dos autos, postula a parte autora, beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição, o adicional de 25% previsto no artigo 45 da Lei de Benefícios, por necessitar da assistência permanente de outra pessoa, em virtude da gravidade da doença de que padece.
O art. 45 da Lei nº 8.213/91 estabelece a possibilidade do acréscimo de 25% nestes termos:
Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).
Parágrafo único. O acréscimo de que trata este artigo:
a) será devido ainda que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal;
b) será recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado;
c) cessará com a morte do aposentado, não sendo incorporável ao valor da pensão.
Conforme se verifica da redação desse dispositivo da Lei nº 8.213/1991, a possibilidade de acréscimo de 25% ao valor percebido pelo segurado, em caso de este necessitar de assistência permanente de outra pessoa, é prevista regularmente para beneficiários da aposentadoria por invalidez, sem a previsão de extensão nos casos de benefício diverso. E nessa direção foi a decisão do magistrado a quo, julgando improcedente o pleito do autor pela ausência de previsão expressa na lei.
Contudo, proponho reflexão mais ampliada do sentido da norma e sua finalidade, bem como a adoção de preceitos constitucionais e internacionais de proteção e concretização dos direitos humanos, em que se incluem os sociais, de natureza previdenciária e assistencial.
DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA E A PROTEÇÃO À VIDA:
Estender o adicional remuneratório para acompanhamento de terceiro à aposentadoria por tempo de contribuição, dentro de uma interpretação mais literal ou formalista, poderia indicar alcance além dos ditames legais, por não haver norma positiva autorizando a concessão do acréscimo ao aposentado por tempo de contribuição.
Todavia, entendo que além de uma análise sistêmica da norma, combinada com os preceitos basilares de proteção e finalidade do sistema previdenciário, o tema merece abordagem sob a ótica do direito que se busca proteger: o adicional de assistência de terceiro ao segurado inválido.
Nesse plano, a proteção complementar almejada pela norma é a vida, onde o norte deve ser a doença e suas decorrências, que importam na exigência do apoio de um terceiro para conferir o mínimo de dignidade humana e sobrevivência, segundo o preceito constitucional da cobertura do risco social - art. 201, inciso I, da Carta Federal. Para tanto, a lei criou um adicional financeiro no benefício previdenciário, objetivando dar cobertura econômica ao auxílio de um terceiro contratado ou familiar para apoiar o segurado nos atos diários que necessite de guarida, quando sua condição de saúde não suporte a realização de forma autônoma.
O fato de a Lei de Benefícios, no seu art. 45, associar o acréscimo de 25% no valor do benefício somente nas situações de invalidez, demonstra, por um lado, uma hipótese objetiva de cabimento, mas, de outra banda, indica que a origem da proteção foi lincar com a situação mais flagrante da necessidade de apoio suplementar pela condição de inválido. Entretanto, a melhor interpretação não pode ser restritiva ao direito de proteção da dignidade da pessoa humana, sob pena de estar em desconformidade com o conceito de proteção ao risco social previdenciário.
A melhor exegese da norma orienta, ainda, a interpretação sistemática do princípio da isonomia, em que o fato de a invalidez ser decorrente ou episódio posterior a aposentadoria, não pode excluir a proteção adicional ao segurado que passa a ser inválido e necessitante do auxílio de terceiro, como forma garantir o direito à vida, à saúde e à dignidade humana.
A aplicação restrita do dispositivo legal em debate acarreta violação ao princípio da isonomia e, por conseguinte, à dignidade da pessoa humana, posto que estaria se tratando iguais de maneira desigual, de modo a não garantir a determinados cidadãos as mesmas condições de prover suas necessidade básicas, em especial quando relacionadas à sobrevivência pelo auxílio de terceiros diante da situação de incapacidade física.
Qual a diferença entre o aposentado por invalidez que necessita do auxílio permanente de terceiro e de outro aposentado por qualquer das modalidades de aposentadoria previstas em lei, que sofre de uma doença diagnosticada depois e que remeta a necessidade do mesmo apoio de terceiro? NENHUMA, salvo o momento da ocorrência da "grande invalidez"!
Óbvio que pelo fato de a pessoa idosa ter uma tendência maior ao adoecimento ou agravamento de eventuais enfermidades, essa interpretação extensiva e conforme os preceitos basilares da proteção e efetividade dos direitos fundamentais da pessoa humana deve merecer a cautela de aplicação a situações excepcionais, em que a condição de invalidez é incontroversa, bem como com a necessidade de assistência permanente de terceiro.
Aliás, o caráter personalíssimo do acréscimo postulado (porque é calculado em relação ao benefício originário e cessa coma morte do aposentado), é complementado pelo rol de situações previstas no Anexo I, do Decreto nº 3.048/1999, sem falar que essa relação não pode ser considerada exaustiva, desde que comprovada outra hipótese por meio de perícia médica.
Compreender de forma diversa seria levar ao absurdo de exigir que o cidadão peça a conversão ou transformação da sua condição de aposentado por idade e/ou tempo de contribuição para aposentadoria por invalidez, já que mantém a qualidade de segurado por estar em gozo do benefício (art. 14 da Lei nº 8.213/91). Tudo isso com o objetivo posterior de pleitear o adicional de acompanhamento de terceiro.
Ou seja, por que usar uma maratona judicial para mudar sua natureza de beneficiário do sistema previdenciário, quando a causa que lhe confere o direto à proteção adicional decorre da gravidade de sua doença? Esta sim é o fundamento a ser protegido pelo direito normativo, a fim de garantir direito à vida com mínimas condições de saúde!
Nesse diapasão, merece registro passagem comentada pelo Ministro Peçanha Martins do Superior Tribunal de Justiça, ao defender a possibilidade de extensão do benefício com proventos integrais a servidor público que sofre de um mal de idêntica gravidade àqueles mencionados no rol do § 1º do 186, da Lei 8.112/90, citando o Ministro José Delgado:
"Não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e sim considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador, mormente perante o preceito maior insculpido na Constituição Federal garantidor do direito à saúde, à vida e à dignidade humana e, levando-se em conta o caráter social do Fundo que é, justamente, assegurar ao trabalhador o atendimento de suas necessidades básicas e de seus familiares." (Resp. 942.530-RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Dje 29.03.2010)
DA ANALOGIA E INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL DA LEI:
Afora a busca do tratamento isonômico entre iguais (segurados inválidos), tem-se ainda a possibilidade da interpretação sob o argumento da analogia ou o argumento a contrário. Sob a ótica desta interpretação, ficamos limitados à hipótese da proteção complementar prescrita expressamente pela lei, ou seja, na situação de aposentadoria por invalidez. Já pelo argumento da analogia, estende-se a interpretação para casos similares ou que possuam idêntica proteção, como a situação de invalidez posterior à aposentadoria, com incontroversa comprovação da necessidade de auxílio permanente de terceiro, como no caso em tela.
Portanto, no plano lógico-formal, esses dois argumentos, que conduzem a resultados completamente diferentes, têm a mesma legitimidade. Não se trata de mera escolha ao gosto e sabor do intérprete, mas verificação combinada com o fim jurídico-político do preceito protetivo da norma, mormente por versar de direito social (previdenciário) imanente à concretização do preceito maior da dignidade da pessoa humana.
E nesse sentindo é o ensinamento de KARL ENGISH ao estudar o pensamento jurídico, a partir de uma visão sistêmica e aplicação prática:
"Verificamos que a escolha entre o argumento da analogia e ao argumento a contrário não pode de fato fazer-se no plano da pura lógica. A lógica tem que combinar-se com a teleológica. Quer isto dizer: o processo formal de concludência, que, é claro, tem de ser logicamente correto, praticamente só funciona em ligação com determinados conhecimentos materiais que têm de ser adquiridos através duma metódica especificamente jurídica. Podemos mesmo avançar mais um passo e afirmar: o argumento jurídico da analogia nãos e nutre apenas da sua segurança lógica e da sua aplicabilidade jurídico-prática baseada na 'semelhança jurídica', mas mergulha as suas raízes ainda mais profundamente no chão do Direito ao pressupor que, para aplicação deste, os preceitos legais e consuetudinários podem e devem ser frutuosos não só direta como ainda indiretamente. Os juízos de valor gerais da lei e do Direito consuetudinário devem regular e dominar não só os casos a que imediatamente respeitam mas também aqueles que apresentam uma configuração semelhante." (Introdução ao Pensamento Jurídico. 6ª edição. Fundação Calouste Gulbenkian/Lisboa, 1983, pp. 292/3 - grifei).
Mesmo assim não é muito fácil determinar, em cada caso concreto, a justa relação entre o argumento de analogia e da interpretação mais literal (a contrário), até porque também existe uma linha fronteiriça entre interpretação e analogia.
Se a interpretação assenta-se na regra de que ela encontra o seu limite onde o sentido possível das palavras já não dá cobertura a uma decisão jurídica (HECK: "O limite das hipótese de interpretação é o 'sentido possível da letra'"), é neste ponto que começa a indagação de um argumento de analogia. Por isso que K. ENGISH defende que "de um modo geral podemos dizer: a analogia insere-se por detrás da interpretação, por detrás mesmo da interpretação extensiva" (Ob. Cit., p. 294)
Por isso que, mesmo entendendo que uma interpretação extensiva da regra legal solvesse a questão sub judice, acrescento o fundamento da aplicação analógica dos preceitos jurídicos, a fim de não deixar dúvidas sobre a aplicabilidade da proteção assistencial invocada pelo autor.
Dessa forma, utilizando uma analogia teleológica, pode-se descobrir o pensamento fundamental da vontade do legislador ou, melhor ainda, a finalidade objetiva da norma, que pelo seu significado tem os fins inerentes ao preceito da proteção da vida do cidadão (no caso, do aposentado), fundada na apreensão do seu respectivo sentido. Com isso, tanto se pode, pela analogia da lei, partir de uma regra isolada e dela retirar um pensamento fundamental aplicável a casos semelhantes, como pela analogia do Direito, que surge da pluralidade de normas jurídicas, desenvolver princípios mais gerais e aplicar a casos que não cabem em nenhuma norma jurídica.
Em qualquer das analogias interpretativas, seja da regra pontual (art. 45 da Lei de Benefícios), ou do direito protegido (vida do segurado pela assistência complementar de terceiro), obtêm-se elementos sólidos de extensão da norma para o aposentado que se torna inválido posteriormente, diante da sua finalidade de caráter social e proteção à vida.
Corrobora tudo isso o entendimento da interpretação mais favorável da norma, em especial quando se lida com a efetivação de direitos sociais, como no caso, os de natureza previdenciária, ainda mais com coloração assistencial. Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, também tem afirmado a interpretação teleológica e finalística da norma, mesmo que dispondo sobre temas diversos:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. INCIDÊNCIA SOBRE PROVENTOS DE APOSENTADORIA. CARDIOPATIA GRAVE. ISENÇÃO. TERMO INICIAL: DATA DO DIAGNÓSTICO DA PATOLOGIA. DECRETO REGULAMENTADOR (DECRETO Nº 3.000/99, ART. 39, § 5º) QUE EXTRAPOLA OS LIMITES DA LEI (LEI 9.250/95, ART. 30). INTERPRETAÇÃO.
(...)
6. A interpretação finalística da norma conduz ao convencimento de que a instituição da isenção de imposto de renda sobre proventos de aposentadoria em decorrência do acometimento de doença grave foi planejada com o intuito de desonerar quem se encontra em condição de desvantagem pelo aumento dos encargos financeiros relativos ao tratamento da enfermidade que, em casos tais (previstos no art. 6º, da Lei 7.713/88) é altamente dispendioso.
(...)
(STJ, Primeira Turma, Resp 812799 - 2006/0017416-6, Rel. Ministro José Delgado, j. 12/06/2006)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. ARTIGOS 25, 48 E 142 DA LEI 8.213/91. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ARTIGO 102, § 1º DA LEI 8.213/91. IMPLEMENTAÇÃO SIMULTÂNEA. PRESCINDIBILIDADE. VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS. IDADE MÍNIMA E RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS. PRECEDENTES.
ARTIGO 24, PARÁGRAFO ÚNICO. NÃO APLICABILIDADE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
(...)
VII - Ademais, cumpre relembrar que o caráter social da norma previdenciária requer interpretação finalística, ou seja, em conformidade com os seus objetivos.
(...)
(STJ, Quinta Turma, Resp 773371 - 2005/0134063-5, Rel. Ministro Gilson Dipp, j. 24/10/2005)
No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal: "A interpretação teleológica ao dispositivo supramencionado revela que a intenção do legislador foi o de punir aqueles que buscam furtar-se ao cumprimento da pena alternativa" (STF, Primeira Turma, HC 95370, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, j. 31/03/2009).
DO CARÁTER ASSISTENCIAL DO COMPLEMENTO AO BENEFÍCIO:
Se não bastasse essa compreensão, ainda poderia ser agregado que o acréscimo de 25% ao benefício previdenciário possui natureza assistencial, tanto que o próprio dispositivo legal remete à expressão "da assistência permanente de outra pessoa", que combinado com o princípio da "universalidade de atendimento significa, por seu turno, a entrega das ações, prestações e serviços de seguridade social a todos os que necessitem, tanto em termos de previdência social - observado o princípio contributo - como no caso da saúde e da assistência social." (Castro; Lazzari, 2010, p. 114 - g. n.).
Quanto à fonte de custeio do acréscimo de assistência complementar e da possibilidade ora sustentada, de aplicação extensiva ao art. 45 da Lei de Benefícios, a lei não faz menção a nenhum lastro contributivo específico, provavelmente pela sua natureza assistencial, que garante a prestação pelo Estado, independentemente de contribuição à seguridade social (art. 203, CF). Oportuna nesse aspecto, o registro anotado no trabalho acadêmico de Maria Eugênia Bento de Melo, produzido junto à Universidade do Sul de Santa Catarina:
"Assim, a aplicação do acréscimo de 25% da aposentadoria por invalidez não pode ser interpretada de forma isolada, vez que a fonte de custeio desse percentual é a mesma para todas as espécies de aposentadoria do RGPS. Neste norte, a medida plausível a se adotada seria a aplicação extensiva. Isto porque, se se entender que não há fonte de custeio para a extensão às demais espécies de aposentadoria, da mesma forma, dever-se-ia entender que não há fonte de custeio para a própria extensão da aposentadoria por invalidez. E assim seria porque, em momento algum a legislação aponta a fonte de custeio para o acréscimo dos aposentados por invalidez". (A Possibilidade de Extensão do Acréscimo de 25% Previsto no Artigo 45 da Lei nº 8.213/91 aos demais Benefícios de Aposentadorias do Regime Geral da Previdência Social: UNISUL, Tubarão/SC, 2010 - sublinhei).
No mesmo diapasão aponta outro estudo desenvolvido em especialização de Direito Previdenciário:
"Destarte, uma vez evidenciado que o artigo 45 da Lei 8.213/91 tem natureza puramente assistencial, a aplicação deste dispositivo exclusivamente aos aposentados por invalidez, viola não só os princípios da isonomia e o da dignidade da pessoa humana, como também os princípios que regem a assistência social no Brasil, quais sejam, supremacia do atendimento das necessidades sociais, universalização dos direitos sociais, respeito à dignidade do cidadão e igualdade de direitos no acesso ao atendimento." (Maurício Pallotta Rodrigues. "Da Natureza Assistencial do Acréscimo de 25% previsto no Artigo 45 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991").
Com isso, também fica afastada a eventual alegação de conflito com o § 5º do art. 195 da Lei nº 8.213/91 da CF: "Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total". Se não existe fonte específica para o principal - adicional de 25% aos aposentados por invalidez - nem para as demais hipóteses especiais a serem estendidas, incidirá tal exigência. E, como já dito, a falta de previsão específica de custeio decorre do seu caráter assistencial.
Diante desse enfoque, também entendo que independente da modalidade em que se tenha aposentado o segurado, uma vez comprovada a condição de inválido e a real necessidade permanente de assistência de outra pessoa, o segurado terá direito ao acréscimo previsto no art. 45 da Lei de Benefícios. Trata-se, como assinalado no tópico anterior, da busca da melhor interpretação da norma pela sua finalidade protetiva e com efeito prospectivo, objetivando conferir maior vigência aos princípios que regem a seguridade e assistência social.
Portanto, afora a busca da melhor efetividade ao direito protegido, em que caberá ao julgador solucionar a causa atento aos fins da norma aplicável ao caso concreto, incide adicionalmente o aspecto assistencial ao complemento do benefício de aposentadoria, redobrando a necessidade de flexibilização da regra, com norte na proteção à saúde e à vida do segurado.
DO DESCOMPASSO DA NORMA COM A REALIDADE:
É normal a lógica de a produção legislativa suceder às tendências e necessidades da sociedade. Por isso que as normas legais disciplinam as relações da comunidade a partir do diagnóstico pretérito e, mesmo devendo ser atualizadas com a evolução histórica, decorrente das mutações econômicas, sociais e políticas, de regra, não acompanham as mutações da vida em sociedade.
A disciplina previdenciária em apreço tem seu mérito ao agregar um plus remuneratório ao aposentado por invalidez que, por decorrência da gravidade da sua doença ou deficiência física, necessita do auxílio permanente de terceiro. Sem discutir a suficiência do acréscimo financeiro na aposentadoria, pelo menos propicia a contratação de terceiro ou compensação de disponibilização de familiar que abdica do seu trabalho (total ou parcial) para auxiliar o segurado inválido.
Entretanto, com o passar do tempo, apresentam-se situações novas que merecem idêntica proteção, como o caso de invalidez posterior à aposentadoria obtida por idade ou tempo de contribuição. Daí a necessidade de atualizar a norma previdenciária, a fim de conferir maior efetividade ao direito protegido, no caso, a vida pela gravidade da doença: invalidez.
Atento a esse descompasso, o atuante Senador Paulo Paim, com destaque no tema previdenciário pela sua permanente luta na defesa dos aposentados e pensionistas, já apresentou projeto de lei - PL nº 493/2011 - alterando o art. 45 da Lei de Benefícios, já remetido à Câmara dos Deputados (PL nº 4.282/2012). Vejamos a proposta da nova disciplina legislativa:
"Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez, por idade, por tempo de serviço e da aposentadoria especial do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa, por razões decorrentes de doença ou deficiência física, será acrescido de vinte e cinco por cento."
Assim, enquanto a atualização legislativa está a caminho, cabe a verificação da possibilidade de extensão do benefício, a partir da prova inconteste de cada caso concreto. E nesse ponto, se não contemplado o direito na via administrativa e judicializada a questão, cumpre papel de relevante sensibilidade social ao julgador, no sentido de melhor aproximar a norma da realidade social.
Com isso, antecipa-se o operador do direito à evolução legislativa, pautado pelo atendimento dos requisitos de fato e adotando princípios gerais de direito, como a analogia e a isonomia, antes sustentadas. Mais ainda, muitas vezes a jurisprudência contribui decisivamente para apressar o legislador no aperfeiçoamento do sistema normativo previdenciário.
Mesmo já suficientes as razões para o deferimento do pleito, esse registro constitui mais uma demonstração da necessidade de conferir interpretação mais favorável da lei para melhor solver o caso concreto, em especial quando a prova é induvidosa e estamos diante da concretização de direitos sociais, como os de natureza previdenciária e assistencial.
DA APLICAÇÃO DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA:
Além da utilização dos princípios estruturantes dos direitos sociais já incorporados à fundamentação dessa decisão, a não atualização da legislação ordinária pode ser resolvida, de forma complementar, com a aplicação das normas internacionais sobre os direitos das pessoas com deficiência.
A Constituição da República, pelo art. 5º, §§ 1º e 2º, atribui status diferenciado no plano do direito interno aos Direitos Fundamentais decorrentes de tratados internacionais, mediante sua incorporação ao ordenamento jurídico brasileiro e exigibilidade imediata e direta no campo do ordenamento jurídico nacional, na linha sustentada por Flávia Piovesan:
"A Constituição de 1988 recepciona os direitos enunciados em tratados internacionais de que o Brasil é parte, conferindo-lhes natureza de norma constitucional. Isto é, os direitos constantes nos tratados internacionais integram e complementam o catálogo de direitos constitucionalmente previsto, o que justifica estender a esses direitos o regime constitucional conferido aos demais direitos e garantias fundamentais. Tal interpretação é consonante com o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, pelo qual, no dizer de Jorge Miranda, a uma norma fundamental tem de ser atribuído o sentido que mais eficácia lhe dê."
(A Constituição brasileira de 1988 e os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos. In: TEMAS de Direitos Humanos. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2003. p. 58. )
Afora esse tratamento especial do constituinte de 1988 aos direitos e garantias individuais, a Emenda Constitucional nº 45/2004, ao inserir o § 3º no art. 5º da Carta Magna, alçou equivalência de emenda constitucional aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, se aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros.
Ao mesmo tempo, o Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, acolhida formalmente no ordenamento jurídico nacional pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que afirma que seu conteúdo, incluído o Protocolo Facultativo, "serão executados e cumpridos tão inteiramente como neles se contém" (art. 1º). Antes disso, o Governo brasileiro depositou instrumento de ratificação junto à Organização das Nações Unidas, em 1º de agosto de 2008, após aprovação do Congresso Nacional do Decreto Legislativo nº 186/08 (DOU DE 10/07/2008), observando o novo rito de maioria qualificada e votação em dois turnos, previsto no § 3º do art. 5º da Constituição Federal.
Com esses atos de efetivo exercício da soberania nacional, o Brasil reconhece que toda a pessoa faz jus a todos os direitos e liberdades estabelecidos na referida Convenção, "reafirmando a universalidade, a indivisibilidade e a inter-relação de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, bem como a necessidade de garantir que todas as pessoas com deficiência os exerçam plenamente, sem discriminação" (Preâmbulo, letra "c").
Em diversas previsões dessa Convenção, reiteram-se os comandos tradicionais da histórica Declaração Universal dos Direitos Humanos, com a particularidade de promover a igualdade, a partir do reconhecimento "que a discriminação contra qualquer pessoa, por motivo de deficiência, configura violação da dignidade e do valor inerentes ao ser humano" (Preâmbulo, letra "h").
Os fundamentos prosseguem na afirmação da igualdade, incorporando "que a família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem o direito de receber a proteção da sociedade e do Estado e de que as pessoas com deficiência e seus familiares devem receber a proteção e a assistência necessárias para tornar as famílias capazes de contribuir para o exercício pleno e eqüitativo dos direitos das pessoas com deficiência" (Preâmbulo, letra "x" - grifei).
Dentro do propósito (artigo 1) da Convenção, é destacada a necessidade de "promover, proteger e assegurar o exercício pleno e eqüitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência", sempre em respeito a dignidade humana.
E existe maior necessidade de dignidade humana que receber o apoio para enfrentar os encargos extras da invalidez? Nesse ponto, cabe anotar que o estado de invalidez atribui condição de pessoa deficiente, o que no caso em tela, é incontroversa pela prova presente nos autos.
A concretização dos direitos humanos e fundamentais da pessoa deficiente deve contemplar os diferentes aspectos, como de ordem econômica, social e cultural, a fim de que determinada deficiência - como a limitação para atos da vida civil decorrente da invalidez - não constitua discriminação contra essas pessoas. E como se deve dar a efetiva proteção legal contra a discriminação por qualquer motivo?
No caso em apreço a discriminação é constada na regra normativa (art. 45 da LBPS) que não contempla o direito de assistência adicional ao segurado somente porque a invalidez foi posterior à aposentadoria.
A solução para esse vácuo legal está na aplicação de diversos preceitos da Convenção Internacional sobre Direitos da Pessoa com Deficiência, quando: i) confere proteção da integridade física e mental da pessoa deficiente para ter igualdade de condições com os demais (art. 17); ii) assegura acesso a serviços de saúde, incluindo serviços de reabilitação ( art. 25 ); iii) prevê a inclusão na comunidade e em todas os aspectos da vida social (art. 26, b), que pode ser concretizada pelo auxílio de terceiros ao inválido.
Mais que essas previsões gerais e principiológicas, já suficientes a extensão do direito em debate, a Convenção, no seu artigo 28, ao dispor sobre o padrão de vida e proteção social adequados, reporta o dever de assegurar as pessoas com deficiência e suas famílias, particularmente mulheres, crianças e idosos, "à assistência do Estado em relação a seus gastos ocasionados pela deficiência, inclusive treinamento adequado, aconselhamento, ajuda financeira e cuidados de repouso" (letra "c"). E, prosseguindo, no plano da seguridade social, os Estados Partes da Convenção devem "assegurar igual acesso de pessoas com deficiência a programas e benefícios de aposentadoria" (letra "e") - grifei.
Claro que a defesa da transposição dos preceitos e disposições convencionais de origem internacional ao plano interno e concreto das relações interpessoais decorre de sua eficácia legal pela constitucionalização das normas de direitos humanos. Contudo, sou ainda mais radical no sentido de que a norma internacional prevalece sobre a norma constitucional, mormente quando subscrita pelo Estado e incorporadas depois da EC nº 45/2004.
No caso brasileiro, as proteções à pessoa deficiente e idosa não enfrentam contraposição no ordenamento constitucional brasileiro, mas sim complementação, como se observam dos arts.: i) 23, II e 24, XIV - competência legislativa comum e concorrente dos entes federados em cuidar da saúde e assistência da proteção e garantias das pessoas portadoras de deficiência; ii) 203, IV e V - dever do Estado prestar assistência social à pessoas portadoras de deficiência, para promoção de sua integração à vida comunitária e garantia de renda básica; e, especialmente, iv) § 1º do art. 201, que permite a adoção de critérios diferenciados na concessão de aposentadoria para segurados portadores de deficiência.
Afora a omissão legislativa na regulamentação desses preceitos constitucionais, verifica-se a restrição da legislação ordinária em debate - art. 45 da LBPS, ao prever o adicional ao valor da remuneração apenas ao aposentado por invalidez. Mas nesse ponto, a supremacia dos direitos e garantias individuais internacionalmente consagrados, conforme já registrado, remetem a aplicação da norma mais benéfica ao ser humano, seja ela interna ou internacional (MELLO, Celso A. O parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição Federal. In: TORRES, Ricardo Lobo. Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 27).
Em síntese, a proteção às pessoas com deficiência, como no caso de invalidez, agravada pela velhice e necessidade de apoio permanente de outra pessoa, deve ser efetivada com a aplicação dos direitos à saúde, combate à discriminação e respeito à dignidade, previstos e acolhidos na Convenção Internacional pelo Brasil, em complemento às disposições antes referidas, que atendem os objetivos fundamentais da Carta Federal de erradicar as desigualdades sociais e promover o bem de todos, sem quaisquer formas de discriminação (art. 3º, incisos III e IV, CF).
Por tanto, filio-me ao entendimento segundo o qual os tratados de direitos humanos - como a Convenção dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência - possuem estatura constitucional, ainda mais quando submetidos ao procedimento estabelecido pela EC nº 45/2004, tendo em vista que esta percepção melhor se coaduna com as concepções contemporâneas na ordem internacional. Considerando que equivalem às emendas constitucionais, são, em matérias de direitos humanos, cláusulas pétreas (art. 60, § 4º, IV, CF).
Nessa perspectiva, os conflitos ocasionados entre tratado e a Constituição devem ser solucionados pela aplicação da norma mais favorável à vítima da violação do direito humano, titular do direito, como tarefa hermenêutica de incumbência do julgador. Exemplo disso são as decisões das cortes internacionais pela prevalência da maior proteção aos direitos humanos, decidindo, inclusive, que um Estado tenha que adequar as suas normas constitucionais e legais aos valores consagrados na Convenção Americana, como foi ocaso "La Última tentación de Cristo" (Olmedo Bustos y otros Vs. Chile).
Portanto, esse derradeiro fundamento, mesmo que aparentemente dispensável por toda a fundamentação até aqui despendida, faz-se para demonstrar a grandeza e necessidade de afirmar a igualdade e isonomia no tratamento da assistência permanente de outra pessoa, previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/91, quando acometido de invalidez, mesmo que posterior à aposentação, em nome da proteção à vida e saúde do segurado, que a própria norma deve proteger e, por consequência, estender sua aplicação concreta.
DA JURISPRUDÊNCIA LOCAL:
Para arremate das conclusões, mesmo verificando pouca abordagem concreta da doutrina sobre o tema e jurisprudência desse Tribunal, não desconheço precedente de aplicação restritiva do benefício complementar previsto no art. 45 da Lei de Benefícios (Apelação cível nº 2001.72.07.002588-4, 5ª Turma - TRF4, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, d.j.u. 11/02/2004). Por outro lado, anoto recente decisão do Juiz Federal Andrei Pitten Velloso, que assim se manifestou:
"O recorrente é beneficiário de aposentadoria de contribuição (...), então de aposentadoria por invalidez, o que, em princípio, impediria a concessão do acréscimo previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/91.
Ocorre que se afigura possível a aplicação analógica do acréscimo previsto no art. 45, da LBPS para as aposentadorias por idade ou tempo de serviço, desde que cumpridos estes requisitos: a) comprovação da incapacidade definitiva, que justificaria a concessão da aposentadoria por invalidez, caso o beneficiário já não estivesse aposentado; e b) a necessidade de assistência permanente de outra pessoa.
A possibilidade da aplicação analógica do art. 45 da LBPS à espécie decorre, sobre tudo, do fato de a lei não exigir que a ajuda de terceiros seja necessária desde o início da incapacidade. Assim, se alguém que se aposentou por incapacidade e posteriormente passou a necessitar da ajuda permanente de terceiro faz jus ao benefício, com maior razão é de se assegurar tal benefício àquele que, após contribuir por toda a sua vida para a previdência, preencheu os requisitos legais para a aposentadoria e, posteriormente, se tornou definitivamente incapaz e passou a necessidade da ajuda permanente de terceiro."
(Recurso Inominado 2007.72.59.000245-5, 1ª Turma Recursal de Santa Catarina, Rel. Juiz Federal Andrei Pitten Velloso).
No mesmo sentido, destaco conclusão do voto-vista - mesmo que vencido - do Juiz Jose Antonio Savaris, que na esteira de diversos outros precedentes deste Tribunal e do Superior Tribunal de Justiça, sustentou um posicionamento pró-ativo do julgador na aplicação da lei aos casos concretos, mediante ajustamento das diretrizes gerais diante das exigências de justiça oferecidas pelo caso, para flexibilizar os requisitos legais em nome do postulado da igualdade e, em face de uma evidente situação de necessidade, bem como para evitar consequências iníquas ou desarrazoadas:
"Todavia, é desimportante a espécie de benefício de que se encontra em gozo o segurado. O que releva é a identidade de situação fática (incapacidade total e necessidade de assistência permanente de outra pessoa), o que me faz reconhecer, em nome da necessidade de recursos para subsistência e do postulado da igualdade, que faz jus ao acréscimo pretendido." (Incidente de Uniformização do JEF nº 0010550-56.2009.404.7254/SC).
Nesse quadro, associando-me à compreensão de que, na aplicação das normas legais, só pode ser buscado o seu fim social quando passível de mais de uma interpretação, hipótese em que o magistrado deverá optar pela que mais satisfaz a finalidade da norma e concretize os direitos sociais. E, no plano previdenciário, o papel do julgador reveste-se de maior compromisso com a realidade social, não devendo seguir de fronte baixa o que textualmente diz a legislação, mas utilizar o seu poder-dever de constituir a norma para o caso concreto, dentro do espaço de construção jurisprudencial pautada pela equidade, na tarefa de aperfeiçoamento do sistema de proteção social, com base na igualdade e viabilização de meios de subsistência do segurado.
Da mesma forma, o preenchimento de lacuna pode ser solvido com a aplicação dos princípios gerais da isonomia, igualdade e combate à discriminação à pessoa deficiente, previstos nas convenções internacionais reconhecidas pelo Brasil, como forma de garantir dignidade à pessoa humana.
DO CASO CONCRETO:
A parte autora, atualmente com 76 anos, percebe aposentadoria por tempo de contribuição, desde 06/12/1994.
Para demonstrar a condição de invalidez e a necessidade permanente de outra pessoa para conduzir e realizar os atos da vida civil foi realizada perícia médica (Evento 15 - LAUDPERI1), tendo sido diagnosticadas as seguintes doenças, segundo Classificação Internacional de Doenças: CID 10-G82.0 e I71.5
E mais, conforme anotado pelo perito, o parte autora está incapacitada para a realização dos atos da rotina diária, necessitando contar com o auxílio de terceiros para praticá-los.
Portanto, superado o atendimento destes requisitos materiais, resta definir se o adicional de apoio ao aposentado por invalidez pode ser estendido às demais hipóteses, como na categoria de aposentado por tempo de contribuição.
E neste plano, conforme extensivamente fundamentado no curso dessa análise, o adicional pleiteado é devido, porque:
i) objetiva proteger a vida do segurado, onde o evento da doença é que torna a invalidez dependente da necessidade de apoio de outra pessoa;
ii) a hipótese restritiva do art. 45 da Lei de Benefícios, deve ser afastada pelo direito de isonomia ao segurado, imanente à concretização do preceito maior da dignidade da pessoa humana;
iii) o fim jurídico-político do preceito protetivo da norma, mormente por versar de direito social (previdenciário), deve contemplar a analogia teleológica para indicar sua finalidade objetiva e conferir a interpretação mais favorável à pessoa humana;
iv) possui natureza assistencial, em face à ausência de nenhum lastro contributivo específico e na medida em que a Previdência deve cobrir todos os eventos da doença;
v) o julgador deve ter a sensibilidade social para se antecipar a evolução legislativa quando em descompasso com o contexto social, como forma de aproximá-la da realidade e conferir efetividade aos direitos fundamentais;
vi) a solução para esse vácuo legal também está na aplicação dos preceitos da Convenção Internacional sobre Direitos da Pessoa com Deficiência, já incorporados e internalizados ao ordenamento jurídico nacional, assegurando acesso à plena saúde e assistência social, em nome da proteção à integridade física e mental da pessoa deficiente, em igualdade de condições com os demais e sem sofrer qualquer discriminação.
Em suma, na esteira do ensinamento basilar do mestre Carlos Maximiliano, para o mesmo problema - necessidade de apoio permanente de terceiro - seja decorrente de incapacidade originária ou posterior, o remédio deve ser o mesmo: acréscimo do adicional de 25% ao benefício de aposentadoria, a fim de conferir tratamento igualitário.
Por fim, ressalvo que a aplicação extensiva deve ser adotada em situações especiais, como caso em tela, onde está incontroversa a condição de inválido do recorrente, pela comprovação do tratamento ortopédico e a exigência de ajuda de terceiros.
Nestes termos, merece reforma a sentença a fim de condenar o INSS ao pagamento do acréscimo de 25% a contar da data em que requerido administrativamente, qual seja, 27/09/2013 (Evento 2 - INDEFERIMENTO2).
Cinge-se, pois, a controvérsia em se saber se o acréscimo de 25%, previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/91, se aplica também ao caso de aposentadoria por tempo de contribuição.
Com a venia do ilustre prolator do voto vencedor, tenho compreensão na linha do voto vencido.
Com efeito, a Lei de Benefícios determina a concessão do adicional de assistência permanente nos seguintes termos:
Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).
Parágrafo único. O acréscimo de que trata este artigo:
a) será devido ainda que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal;
b) será recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado;
c) cessará com a morte do aposentado, não sendo incorporável ao valor da pensão.
Conforme se verifica da redação desse dispositivo da Lei nº 8.213/91, a possibilidade de acréscimo de 25% ao valor percebido pelo segurado, em caso de este necessitar de assistência permanente de outra pessoa, é prevista apenas para beneficiários da aposentadoria por invalidez, não cabendo essa concessão a benefício diverso. Estender tal vantagem à aposentadoria por tempo de contribuição acarretaria violação ao princípio da legalidade, ante a ausência de norma positiva autorizando a concessão do acréscimo ao aposentado por tempo de contribuição, além de constituir em majoração de benefício previdenciário sem a necessária contrapartida (artigo 195, § 5º, da Constituição Federal).
Recentemente, esta Terceira Seção, por voto de desempate proferido pelo seu Presidente, assentou o entendimento no sentido de ser aplicável o acréscimo de 25% apenas às hipóteses de aposentadoria por invalidez.
Referido acórdão restou assim ementado:
EMBARGOS INFRINGENTES. ACRÉSCIMO DE 25% PREVISTO NO ART. 45 DA LEI 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE. INAPLICABILIDADE.
1. O dispositivo do art. 45 da Lei 8.213/91 prevê a possibilidade de acréscimo de 25% ao valor percebido pelo segurado, quando este necessitar de assistência permanente de outra pessoa, apenas nos casos de aposentadoria por invalidez.
2. A extensão do benefício a casos outros que não a aposentadoria por invalidez viola os princípios da legalidade (artigo 5º, II e 37, caput, da Constituição da República) e da contrapartida (artigo 195, § 5º, da Constituição Federal).
3. A falta de igual proteção a outros beneficiários com igual necessidade de assistência não constitui necessária lacuna ou violação da igualdade, pela razoável compreensão de que ao inválido o grau de dependência é diretamente decorrente da doença motivadora do benefício - isto não se dando automaticamente nos demais benefícios previdenciários.
4. A extensão do auxílio financeiro pela assistência ao inválido para outros benefícios previdenciários é critério político, de alteração legislativa, e não efeito de inconstitucionalidade legal.
(EINF nº 0017373-51.2012.404.9999/RS, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Vânia Hack de Almeida, D.E. 21-08-2014)
Posteriormente, sobrevieram os seguintes julgados no mesmo sentido: EINF 0002780-80.2013.404.9999, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 19/09/2014; EINF 5022066-57.2012.404.7100, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 03/11/2014.
Assim, deve ser dado provimento aos embargos infringentes, restando mantidos os termos do voto vencido na Turma, que não vislumbrou inconstitucionalidade no disposto no art. 45 da Lei 8.213/91.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos infringentes.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7421209v8 e, se solicitado, do código CRC D6C97927. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
Data e Hora: | 17/04/2015 17:55 |
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5008105-09.2013.404.7102/RS
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | RUBENS PAULO COPETTE |
ADVOGADO | : | RAFAEL GONCALVES VARALLO |
VOTO DIVERGENTE
A controvérsia restringe-se à possibilidade de concessão do acréscimo de 25%, previsto no art. 45, caput, da Lei de Benefícios, no benefício que a parte autora recebe, aposentadoria por tempo de contribuição.
O art. 45 da Lei 8.213/91 estatui:
"O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).
No caso, discute-se se há ofensa à igualdade na ausência de previsão do acréscimo monetário a benefício decorrente de aposentadoria por idade. O princípio da igualdade impõe que se dê idêntico tratamento a indivíduos e situações semelhantes, exigindo um ônus de justificação para a imposição de tratamento diferenciado. Todo juízo de igualdade implica a eleição de um aspecto da realidade comparada. A norma jurídica deve, de modo justo, eleger qual o aspecto da realidade justifica tratamento igual e qual outro aspecto pode, eventualmente, justificar tratamento desigual. Assim, por exemplo, homens e mulheres merecem tratamento igual quanto à não-discriminação na remuneração pelo exercício de mesma atividade (aqui a desigualdade fática parcial - sexo - não justifica tratamento diferenciado), e merecem tratamento desigual quanto à licença-gestante (agora, a desigualdade fática parcial justifica o tratamento desigual).
Na hipótese sub judice, apresenta-se situação onde há igualdade quanto (a) à condição de segurado aposentado da Previdência Social e (b) ao fato de experimentarem a condição de invalidez, necessitando auxílio de terceiros.
Nos contornos em que discutida a matéria, a desigualdade parcial encontrada na legislação, que enseja valor de benefício diverso, é a origem do benefício de aposentadoria. Aqueles aposentados por invalidez percebem adicional; os demais, não. Qual a razão do tratamento diferenciado? Tal discrimen tem fundamento racional que justifique a diferenciação? Tal desigualdade está conforme o sistema jurídico vigente? No debate jurisprudencial, invoca-se que a aposentadoria por invalidez é, via de regra, imprevisível; aduz-se, ademais, que pode haver diferença de renda (na aposentadoria por invalidez, ela será de 100%, ao passo que nas demais, pode haver variações).
Como dito, ausentes razões que justifiquem o tratamento diferenciado, é obrigatório igual tratamento. Essa a síntese do mandamento normativo da igualdade. Privilegiar determinada prestação a pessoa em condição de invalidez em virtude da espécie de benefício outorgado na proteção previdenciária é, salvo melhor juízo, desarrazoado.
O motivo que justifica a proteção securitária como um todo é o risco social, fundamento de todo sistema de seguridade social. Os benefícios, previdenciários e assistenciais, informam-se, em sua gênese constitucional, configuração legislativa e concretização administrativa, pela mesma razão.
Se o sistema jurídico considera a necessidade decorrente da invalidez como pressuposto de benefício, daí extraindo regimes jurídicos e os respectivos direitos subjetivos, não pode desconsiderar tal elemento e eleger, como fatores mais importantes, outras circunstâncias e, na aferição de importância, secundários. Assim, elevar a espécie de benefício (por tempo de serviço ou de contribuição) como fator desigualador de determinado regime jurídico (acréscimo de 25% para quem necessita auxílio de terceiros, por motivo de invalidez, desde que aposentado por invalidez), não prima pela lógica. Incoerente, porque a situação de invalidez/deficiência é considerada num momento e desconsiderada em outro; incongruente, porque em desconformidade com a finalidade constitucional de toda a seguridade social e, com a razão de ser dos benefícios, sejam eles quais forem.
A propósito, assim consta da fundamentação da Rcl 4.374/PE, onde o STF alterou a interpretação da anterior ADI, em que afirmada a constitucionalidade do requisito econômico de 1/4 do salário mínimo per capita para a concessão de BPC, "...o legislador deve tratar a matéria de forma sistemática. Isso significa dizer que todos os benefícios da seguridade social (assistenciais e previdenciários) devem compor um sistema consistente e coerente. Como isso, podem-se evitar incongruências na concessão de benefícios, cuja consequência mais óbvia é o tratamento anti-isonômico entre os diversos beneficiários das políticas governamentais de assistência social." Saliente-se: "todos os benefícios da seguridade social (assistenciais e previdenciários) devem compor um sistema consistente e coerente."
Diante desse quadro normativo, apresentam-se dois caminhos: ou entender que a lei resolveu privilegiar aquele que ingressa no sistema por determinada espécie de aposentadoria (por invalidez), em detrimento dos demais segurados aposentados, ainda que experimentem a condição de invalidez ou vislumbrar lacuna legislativa, a ensejar a extensão, por analogia, aos segurados em mesma situação.
A primeira conclusão conduz à declaração de inconstitucionalidade, por privilégio odioso, com a supressão do benefício do acréscimo inclusive para quem hoje dele se beneficia; ou à inconstitucionalidade por omissão parcial, a ser declarada, ainda que sem pronúncia de inconstitucionalidade. A segunda conclusão, calcada numa interpretação finalística e sistemática do direito da seguridade social, afasta pechas de exclusão, de discriminação ou de tratamento privilegiado para o sistema legal securitário, adotando a analogia como critério de solução da lacuna legislativa. Nesta segunda hipótese, não há declaração de inconstitucionalidade qualquer, seja por eventual privilégio odioso, seja por omissão parcial inconstitucional.
Tomando como premissas (a) o fundamento constitucional da seguridade social, suas finalidades e princípios, (b) o princípio da igualdade e a proibição de discriminação entre segurados aposentados que experimentam invalidez e necessitam de cuidados de terceiros, (c) o sistema jurídico previdenciário infraconstitucional e (d) a relevância por ele atribuída ao fenômeno da invalidez como risco social protegido, conclui-se que se trata de lacuna legal, a ser suprida pela aplicação de igual direito ao caso concreto.
Exemplificam a solução por analogia os seguintes julgados:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE INSALUBRIDADE. LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 322/06. ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO LOCAL. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO DA SÚMULA N. 280 DO STF. PRECEDENTES. 1. O direito local acaso violado por decisão judicial não autoriza a interposição de recurso extraordinário. Precedentes: ARE n. 658.684-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Dje de 14.12.2011, e RE n. 470.188-AgR, Segunda Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, Dje de 25.06.2010. 2. In casu, o acórdão recorrido assentou: "ADMINISTRATIVO - SERVIDOR DO PODER JUDICIÁRIO - INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE INSALUBRIDADE - LCE Nº 322/06 - LEI QUE ABRANGE APENAS OS SERVIDORES DO PODER EXECUTIVO - POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO AOS SERVIDORES DO JUDICIÁRIO - EXEGESE DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - IMPROVIMENTO DA APELAÇÃO CÍVEL E DA REMESSA NECESSÁRIA. Em aplicação ao princípio constitucional da igualdade, é possível aplicar aos servidores do Poder Judiciário a possibilidade de incorporação da gratificação de insalubridade, concedida expressamente aos servidores do Poder Executivo por força da Lei Complementar Estadual n. 322/06. Esta interpretação constitucional da norma não implica em afronta ao disposto na Súmula n. 339 do STF, porque não há aplicação de regra de uma categoria em favor de outra por analogia, mas sim revelação do verdadeiro alcance da norma." 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 603107 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 28/08/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 12-09-2012 PUBLIC 13-09-2012)
Valendo-se da analogia em matéria securitária, exemplificativamente, decidiu o STJ:
ADMINISTRATIVO. MILITAR INATIVO. AUXÍLIO-INVALIDEZ. TERMO INICIAL. OMISSÃO DA LEI. ANALOGIA.
- As leis de natureza social devem ser interpretadas e aplicadas de modo teleológico, buscando, inclusive, luzes na analogia, de modo a atingir os seus elevados fins.
- Em face do silêncio da Lei nº 5.787/72 no tocante ao termo inicial do auxílio invalidez devido ao militar julgado definitivamente incapaz para o serviço, é razoável a decisão que defere o benefício a partir do requerimento administrativo, aplicando-se, por analogia, a legislação previdenciária.
- Recurso especial não conhecido. (REsp 271.845/SP, Rel. Ministro VICENTE LEAL, SEXTA TURMA, julgado em 17/04/2001, DJ 13/08/2001, p. 304)
Neste tribunal, também aplicando o critério da analogia e suprindo lacuna legal:
PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO ENTRE A DATA DA PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO E A DATA DA VIGÊNCIA DOS NOVOS PLANOS DE CUSTEIO E BENEFÍCIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. CRITÉRIOS DE CÁLCULO DO VALOR INICIAL DO BENEFÍCIO. CRITÉRIO DE REAJUSTE DO SEU VALOR. 1. A jurisprudência do TRF - 4ª firmou-se no sentido de não considerar auto-aplicável o art. 202, caput, da CF. 2. Aos benefícios concedidos após a data da promulgação da Constituição e antes da entrada em vigor das Leis n° 8.212/91 e n° 8.213/91 deve ser atribuído, por imperioso princípio de analogia, regime de reajustamento idêntico ao estabelecido pelo art. 58 do ADCT. 3. Recurso parcialmente provido. (TRF4, AC 91.04.23661-0, Segunda Turma, Relator Teori Albino Zavascki, DJ 05/08/1993)
Ante o exposto, com a vênia da E. Relatora, voto no sentido de negar provimento aos embargos infringentes.
Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16/04/2015
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5008105-09.2013.404.7102/RS
ORIGEM: RS 50081050920134047102
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
PROCURADOR | : | Dr. Fabio Nesi Venzon |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | pelo Dr. João Ernesto Aragones Vianna, representqando o INSS |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | RUBENS PAULO COPETTE |
ADVOGADO | : | RAFAEL GONCALVES VARALLO |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16/04/2015, na seqüência 60, disponibilizada no DE de 06/04/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª SEÇÃO, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A SEÇÃO, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA, COM RESSALVA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DES. FEDERAL ROGERIO FAVRETO. VENCIDO O DES. FEDERAL LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juiz Federal MARCELO MALUCELLI | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Jaqueline Paiva Nunes Goron
Diretora de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Sustentação Oral - Processo Pautado
Divergência em 16/04/2015 10:20:02 (Gab. Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON)
Voto em 16/04/2015 13:53:25 (Gab. Des. Federal ROGERIO FAVRETO)
Acompanho a relator,a face entendimento firmado por esta 3ª Seção(por maioria), com ressalva de entendimento pessoal quanto ao mérito.
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