
Apelação/Remessa Necessária Nº 5001575-19.2018.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: VALERIO NUNES CUTY (IMPETRANTE)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: OS MESMOS
APELADO: Gerente APS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - São Leopoldo (IMPETRADO)
RELATÓRIO
Cuida-se de mandado de segurança impetrado contra ato do Gerente Executivo do INSS em São Leopoldo/RS, objetivando provimento judicial que assegure a continuidade do pagamento, de forma cumulada, dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-acidente, bem como que vede a cobrança dos valores recebidos a esse título.
Foi concedida parcialmente a segurança pleiteada, unicamente para determinar à autoridade impetrada que se abstenha de levar a efeito qualquer cobrança/ressarcimento referente ao NB 115.890.566-9.
Ambas as partes apelam.
Em suas razões recursais, alega o INSS que deve ser ressarcidos os valores recebidos pela parte autora independentemente de boa-fé.
Por sua vez, a parte autora sustenta, em síntese, que é devido o auxílio-acidente tendo em vista que foi reconhecido o direito ao benefício a partir de 04/1996, na vigência da Lei nº 9.032/95, no qual havia previsão, no art. 86 §1º, de vitaliciedade, podendo ser cumulada com posterior aposentadoria por invalidez concedida em 2004.
Com contrarrazões, subiram os autos, inclusive, por força de reexame necessário.
Nesta instância, o MPF opinou pelo desprovimento dos recursos.
VOTO
Cumulação do auxílio-acidente com aposentadoria por invalidez
Conforme os artigos 1º e 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/09, os requisitos para a concessão da medida liminar em mandado de segurança são (1) prova preconstituída acerca dos fatos (direito líquido e certo), (2) relevância dos fundamentos alegados e (3) risco de ineficácia da medida.
Primeiramente, observa-se que o mandado de segurança foi interposto objetivando o restabelecimento do auxílio-acidente cessado em 10/2017 por conta de cumulação indevida deste benefício com aposentadoria por invalidez e o pagamento integral da aposentadoria por invalidez (evento 1, origem).
O magistrado originário indeferiu o pedido liminar por entender que não seria possível a cumulação do auxílio-acidente com auxílio-doença decorrente da mesma lesão, e, a partir da Lei nº 9.528/97, com qualquer espécie de aposentadoria (evento 8, origem).
Originariamente, o auxílio-acidente, previsto no artigo 86, da Lei nº 8.213/91 podia ser cumulado com qualquer outro benefício, conforme dispunha a redação original do §3º do art. 86, in verbis:
O recebimento de salário ou concessão de outro benefício não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente.
A Lei nº 9.032/95 trouxe alterações à disciplina do auxílio-acidente, tais como unificar o percentual para 50%, independente da maior ou menor redução da capacidade laborativa sofrida, mas ainda manteve a possibilidade de a cumulação de sua percepção com qualquer remuneração ou benefício, exceto com outro auxílio-acidente (inciso V do art. 124).
Entretanto, com o advento da Lei nº 9.528/97, que permitiu a inclusão dos valores percebidos a título de auxílio-acidente no cálculo do salário-de-contribuição, o acúmulo do auxílio-acidente com qualquer espécie de aposentadoria do regime geral passou a ser vedado, nos termos dos parágrafos do art. 86, a seguir transcritos:
O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
§ 1º - O auxílio-acidente mensal corresponderá a 50% do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado.
§ 2º - O Auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua a cumulação com qualquer aposentadoria .
§ 3º - O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria , observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente.
[...]
Logo, observa-se que a legislação estabelece que: (i) até 10/11/1997 o auxílio-acidente e a aposentadoria coexistiam sem qualquer regra de exclusão ou cômputo recíprocos; (ii) após 11/11/1997 a superveniência da aposentadoria extingue o auxílio-acidente, que passa a ser computado nos salários-de-contribuição daquele benefício, conforme artigo 31, da Lei nº 8.213/91.
A primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso Especial nº 1.296.673/MG, assentou o entendimento de que a cumulação de auxílio-acidente com aposentadoria é devida quando a lesão incapacitante e o início da aposentadoria forem anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.213/91, promovida pela Lei nº 9.528/97.
Posteriormente, foi editada a Súmula 507 do STJ que estabelece o seguinte:
A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho.
Nesse sentido, precedentes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. VEDADA A CUMULAÇÃO. LEI 9.528/97. SÚMULA 507 DO STJ. A cumulação de auxílio-acidente com aposentadoria por invalidez somente é possível se ambos os benefícios tenham sido concedidos anteriormente à entrada em vigor da Lei 9.528/97, o que não ocorre na hipótese. (TRF4, AC 5049346-60.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 27/07/2018)
PREVIDENCIÁRIO. ACUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE CONCEDIDO ANTES DA LEI 9.528/97 COM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONCEDIDA APÓS. IMPOSSIBILIDADE. A acumulação dos benefícios de auxílio-acidente e de aposentadoria somente é possível se ambos forem anteriores à vigência da Lei n. 9.528/97. Aplicação da Súmula 507 do STJ. (TRF4, AC 5061462-98.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JOSÉ ANTONIO SAVARIS, juntado aos autos em 18/07/2018)
No presente caso, conforme documento de comunicação de acidente de trabalho (CAT), verifica-se a ocorrência do acidente na empresa em 18/03/1996 (evento 16 - PROCADM2, pág. 01, origem), com a concessão do benefício de auxílio-acidente por acidente do trabalho nº 94/115.890.566-9 a partir de 01/02/2000 (evento 1 - OUT15, origem).
Todavia, a aposentadoria por invalidez nº 92/529.841.512-0 foi concedida apenas em 14/01/2008 (evento 1 - OUT11, origem), sob a égide da alteração legislativa promovida pela Lei nº 9.528/97, razão pela qual não é cabível a cumulação dos benefícios.
Devolução de valores
Cumpre observar que o recebimento do benefício por incapacidade não se deu por força de decisão judicial posteriormente revogada, nem de hipótese de interpretação errônea ou de má aplicação da lei por parte da Administração, situações que fazem presumir a boa-fé do beneficiário.
O Superior Tribunal de Justiça assentou no julgamento do REsp 1.381.734/RN, admitido como recurso representativo de controvérsia repetitiva sob o Tema n° 979, em 10/03/2021, a seguinte tese:
Os pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
No caso, como bem avaliou o juízo singular, a parte autora recebia o benefício desde 1996, quando era possível a cumulação de benefícios, devendo a autarquia na época de concessão da aposentadoria por invalidez ter vedado a cumulação.
Cabe transcrição de trecho da sentença, eis que pertinente a análise da controvérsia realizada pela magistrada a quo:
No caso, do procedimento administrativo (ev16 - procadm2) verifica-se que o impetrante foi inicialmente avaliado pelo INSS, que, por sua vez, considerou preenchidos os requisitos para a fruição do benefício acidentário. Somente depois de concedido o benefício de auxílio-doença fez jus o impetrante à percepção de aposentadoria por invalidez, momento em que o INSS - e não o segurado - deveria avaliar se o benefício poderia, ou não, ser cumulado com outros benefícios anteriormente concedidos, como o auxílio-doença.
Trata-se de providência que não compete ao segurado, pois ele apenas encaminha a solicitação à Autarquia, que, por sua vez, tem o poder-dever de apreciar a solicitação, o preenchimento dos requisitos e, principalmente, se há algum óbice à concessão - como ocorria in casu, já que a concessão da aposentadoria por invalidez se deu em 14.01.2008 (ev1 - out11), ou seja, após a vedação de cumulação posta na Lei nº 9.528/97.
O impetrante em nada colaborou com o ocorrido, já que somente deduziu o seu pedido junto à Autarquia Previdenciária, para que o INSS concedesse, ou não, o pretendido benefício.
O pedido do impetrante poderia ter sido imediatamente negado pelo INSS (o que seria feito em face de seu poder-dever de agir), o que não geraria o problema visualizado nestes autos. Todavia, o INSS optou por conceder a benesse previdenciária, ignorando a cumulação legalmente vedada. Nisso não contribuiu a parte impetrante, que se limitou a apresentar ao INSS, conforme indica o processo administrativo, o seu pedido administrativo, não se furtando a quaisquer perícias ou esclarecimentos solicitados.
Tanto isso é verdade que somente em posterior procedimento administrativo de revisão foi possível detectar o equívoco do INSS, com a fixação da inviabilidade da cumulação de benefícios.
Logo, o erro na cumulação dos benefícios não pode ser imputado ao impetrante, mas unicamente ao INSS, o que impede a sua pretensão ressarcitória, sem prejuízo, conforme já explicitei, do cancelamento do pagamento do benefício de auxílio-acidente (NB 115.890.566-9) por se tratar de benefício que não pode ser cumulado com aposentadoria por invalidez.
Assim, comprovada a boa-fé objetiva da parte autora, é incabível a repetição dos valores indevidamente recebidos.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixa-se de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento às apelações e à remessa oficial.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002494517v4 e do código CRC e68b1598.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5001575-19.2018.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: VALERIO NUNES CUTY (IMPETRANTE)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: OS MESMOS
APELADO: Gerente APS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - São Leopoldo (IMPETRADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUXÍLIO-ACIDENTE. ACIDENTE OCORRIDO ANTES DA LEI Nº 9.528/97. CUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ concedida após. IMPOSSIBILIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE FORMA INDEVIDA. tema 979/stj.
1. A cumulação de auxílio-acidente com aposentadoria somente é possível quando a lesão incapacitante e o início da aposentadoria forem anteriores à modificação da redação do art. 86, §§2º e 3º, da Lei nº 8.213/1991, promovida pela Lei nº 9.528/1997 (Súmula 507 do STJ e REsp. nº 1.296.673/MG).
2. Comprovada a boa-fé objetiva da parte autora, é incabível a repetição dos valores indevidamente recebidos. Orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema nº 979.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002494518v3 e do código CRC bf697823.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 11/05/2021 A 18/05/2021
Apelação/Remessa Necessária Nº 5001575-19.2018.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
APELANTE: VALERIO NUNES CUTY (IMPETRANTE)
ADVOGADO: Diego Guizzo Gonzalez Ortiz (OAB RS071464)
ADVOGADO: ELIANE MIRIAM VENITES (OAB RS074916)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: OS MESMOS
APELADO: Gerente APS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - São Leopoldo (IMPETRADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/05/2021, às 00:00, a 18/05/2021, às 14:00, na sequência 515, disponibilizada no DE de 30/04/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES E À REMESSA OFICIAL.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/05/2021 04:01:04.