
Apelação Cível Nº 5008619-88.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ELIZIA NUNES DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Elizia Nunes dos Santos interpôs apelação contra sentença que, em 20/11/2018, julgou improcedente o pedido de concessão de pensão por morte, em decorrência do falecimento de Flavio Boeira da Silva, com quem alega ter convivido em união estável por mais de treze anos, que perdurou até o óbito dele. Em face da sucumbência, foi condenada a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 800,00, ressalvada a suspensão de sua exigibilidade em virtude da gratuidade da justiça concedida (evento 3, SENT26, origem).
Sustenta a autora ser cabível a concessão de pensão por morte postulada na inicial. Alega, no tocante, haver prova documental suficiente, corroborada por oitiva de testemunhas a comprovar a união estável que manteve com o de cujus (evento 3, APELAÇÃO27, origem).
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Pensão por morte
A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) ocorrência do evento morte, b) condição de dependente de quem objetiva a pensão e c) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
O benefício independe de carência, regendo-se pela lei vigente à época do óbito (art. 26, I, da Lei nº 8.213).
No que é pertinente à dependência para fins previdenciários, assim dispõe o artigo 16 da Lei nº 8.213:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
IV - REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. [redação alterada pela MP nº 1.523/96, reeditada até a conversão na Lei nº 9.528/97]
§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
O dependente, assim considerado na legislação previdenciária, pode valer-se de amplo espectro probatório de sua condição, seja para comprovar a relação de parentesco, seja para, nos casos em que não presumível por lei, demonstrar a dependência. Importa referir que a dependência pode ser parcial, devendo, contudo, representar um auxílio substancial, permanente e necessário, cuja falta acarretaria desequilíbrio dos meios de subsistência do dependente (Enunciado n. 13, do Conselho de Recursos da Previdência Social).
A manutenção da qualidade de segurado, por sua vez, deve ser analisada de acordo com o disposto no artigo 15 da Lei nº 8.213:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Diante disso, o período de graça de 12 ou 24 meses, estabelecido no artigo 15, II e § 1º, da Lei nº 8.213, consoante as disposições do § 2º, pode ser ampliado em mais 12 meses, na eventualidade de o segurado estar desempregado, desde que comprovada essa condição.
Destaque-se que não será concedida a pensão aos dependentes do instituidor que falecer após a perda da qualidade de segurado, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria segundo as normas em vigor à época do falecimento.
Por fim, a Lei nº 13.135 trouxe importantes alterações no tocante ao dependente cônjuge ou companheiro, introduzindo nova redação ao art. 77, § 2º, V, da Lei 8.213, cuja vigência iniciou em 18/06/2015. Em síntese, foi instituída limitação do tempo de percepção do benefício (em quatro meses) se o casamento ou união estável for por período inferior a dois anos ou se o instituidor tiver menos de 18 contribuições mensais recolhidas. Caso superados tais aspectos, a duração dependerá da idade do beneficiário, de modo que a pensão por morte será vitalícia apenas se o cônjuge ou companheiro contar mais de 44 anos de idade na data do óbito.
Caso concreto
Discute-se acerca da prova em relação à união estável entre a autora e Flavio Boeira da Silva até o óbito deste, em 16/12/2014 (certidão de óbito - evento 3, ANEXOSPET4, página 8, origem).
As questões atinentes à condição de dependente da autora em relação ao falecido e à qualidade de segurado do instituidor do benefício foram examinadas pela magistrada de origem de forma pormenorizada e percuciente, razão pela qual, como o propósito de evitar tautologia, transcrevo os fundamentos lançados na r. sentença, os quais adoto como razões de decidir (evento 3, SENT26, origem):
A autora, quando do ajuizamento da demanda, acostou à petição inicial apenas 03 fotografias (fls. 43/44), por certo antigas em razão do estilo das roupas usadas, sendo que a de fl. 43, parte superior, é da mesma ocasião da que consta à fl. 44, como se pode observar pelas vestimentas e local onde estavam os indivíduos fotografados.
Além das 03 fotografias, nenhum outro documento veio aos autos a confirmar a existência de união estável entre a autora e o falecido, pelo que não restou comprovada, ante o sistema do livre convencimento da prova, que a convivência entre eles era duradoura, não se revestindo, pois, de todos os requisitos necessários à caracterização da alegada união estável.
A despeito de a lei não exigir decurso de lapso temporal mínimo para a caracterização da união estável, a relação não deve ser efêmera, circunstancial, mas sim prolongada no tempo, a ponto de ser detectada, no enlace afetivo, durabilidade, o que não se afigura no caso dos autos.
Neste particular, as testemunhas ouvidas não trazem segurança ao juízo sobre a estabilidade da relação vivida entre a autora e o de cujus:
Eva Luiza Alencastro Feijó Barcelos, testemunha compromissada, relatou que a autora era casada com o de cujus. Que ambos viviam como "marido e mulher", que moravam na mesma residência. Que se apresentavam como casal para a comunidade. Que o falecido trabalhava em "construção civil, que trabalhava por conta própria". Acha que o de cujus era quem sustentava a casa. Que não sabe se a união estável perdurou até o falecimento de Flávio. Que a autora tem irmãs que moram em Guaíba; que o casal as visitava junto.
Jorge Ataídes Lopes dos Santos narrou em juízo que conhece a autora desde o ano de 2002. Que a requerente e Flávio eram vizinhos do depoente. Que não sabe a data do óbito de Flávio. Que a autora e este "viviam como marido e mulher". Que ambos eram vistos na comunidade "como casal".
lvani Salete Espens relatou que conhece a autora desde 2002; que a requerente morava no bairro COHAB com Flávio. Que moravam juntos. Que viviam "como casal, como marido e mulher". Não tiveram filhos e não tinham outros relacionamentos. Que Flávio faleceu. Que na comunidade a autora e Flávio eram visto como um casal; que nunca se separaram.
Com efeito, restaram indemonstrados os requisitos caracterizadores da união estável, instituto compreendido como uma relação duradoura, pública e contínua entre as partes, estabelecida com objetivo de constituição de família, em consonância com o art. 1.9 da Lei n.9 9.278/96.
Isto porque é insuficiente a prova testemunhal vertida aos autos para comprovar a relação estável havido entre a autora e o de cujus, ante a ausência de outros documentos que confirmem que o relacionamento levado a efeito entre a autora e o de cujus teve o condão de constituição de uma família, não se entendendo esta, por óbvio, como necessariamente constituída de prole comum, mas de uma comunhão de afeto e responsabilidade, própria da vida adulta.
Neste sentido, salta aos olhos a absoluta inexistência de documentos comuns, tais como contratos de locação de imóveis, contas de luz, água, telefone, extratos bancários; outrossim, os endereços da parte autora, informados nos autos, são nesta cidade de Guaíba/RS, tendo que na certidão de óbito de fl. 23 consta como domicílio do falecido a cidade de Canoas/RS.
Assim, a prova dos requisitos autorizadores para o reconhecimento da relação havida entre as partes como "união estável" é franciscana, sendo que para tanto não basta a prova oral produzida e a juntada de apenas 03 fotografias, visto que nenhum outro documento convincente veio aos autos. Ora, não é crível que quaisquer pessoas que mantêm união estável não possuam o mínimo de vida em comum, que pode ser comprovado, novamente de forma exemplificativa, através de correspondências enviadas a endereço comum dos conviventes.
Dito isto, entendo haver razoáveis dúvidas sobre a espécie de relacionamento havido entre a autora e o de cujus, não restando assim caracterizada a existência da união estável alegada na inicial.
Não obstante a isto, no caso dos autos a controvérsia reside ainda na presença ou não da qualidade de segurado do de cujus na data do óbito, visto os argumentos trazidos pelo INSS em sede de contestação, de que este contribuiu com a Previdência Social até outubro de 2013, mantendo sua qualidade por 12 meses. tendo o falecimento se dado em 16 de dezembro de 2014.
Neste sentido, também não restou comprovado nos autos a situação de desempregado do falecido, não sendo acostada sequer cópia de sua CTPS ou ouvidas testemunhas que comprovassem sua condição de "desempregado", não fazendo jus, conforme pretende a parte autora, à prorrogação prevista no artigo 15, parágrafo 2º, da lei 8213/91, mantendo o de cujus a qualidade de segurado por apenas 12 meses, nos termos do inciso Il, do referido dispositivo legal, que se encerrou antes do óbito, ou seja. em outubro de 2014.
Em sendo assim, também mostra-se inviável a prorrogação da qualidade de segurado do autor por mais 12 meses, com base no §2°, do art. 15, da Lei nº 8.213.
Incabível, portanto, a concessão de pensão por morte à autora, por falta de comprovação dos requisitos de dependência econômica da demandante em relação ao de cujus e de qualidade de segurado do instituidor do benefício.
Diante disso, a sentença deve ser mantida.
Honorários de advogado
O Código de Processo Civil em vigor inovou de forma significativa a distribuição dos honorários de advogado, buscando valorizar a sua atuação profissional, especialmente por se tratar de verba de natureza alimentar (art. 85, §14, CPC).
Destaca-se, ainda, que estabeleceu critérios objetivos para arbitrar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do respectivo parágrafo terceiro, incisos I a V, do mesmo artigo 85.
A um só tempo, a elevação da verba honorária intenta o desestímulo à interposição de recursos protelatórios.
Considerando o desprovimento do recurso interposto pela parte autora, associado ao trabalho adicional realizado nesta instância no sentido de manter a sentença de improcedência, a verba honorária deve ser aumentada em favor do procurador da requerida, ficando mantida a inexigibilidade, contudo, por litigar ao abrigo da assistência judiciária gratuita.
Assim sendo, em atenção ao que se encontra disposto no art. 85, §4º, II, do CPC, os honorários advocatícios deverão contemplar o trabalho exercido pelo profissional em grau de recurso, acrescendo-se em relação ao valor arbitrado mais 20% para apuração do montante da verba honorária (art. 85, §11, do CPC).
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixa-se de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por negar provimento à apelação e, de ofício, majorar os honorários advocatícios.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002538083v8 e do código CRC 688096d5.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5008619-88.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ELIZIA NUNES DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. ausência de comprovação DA QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO e da união estável. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A concessão de pensão por morte, a par da comprovação documental do evento que pode lhe dar origem, exige também a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e a condição de dependente de quem pretende obter o benefício.
2. Para a caracterização da união estável, deve ser comprovada a contínua convivência, pública e não transitória do casal, com o propósito de constituir ou manter família.
3. O período de graça de 12 ou 24 meses, estabelecido no artigo 15, II e § 1º, da Lei nº 8.213, consoante as disposições do § 2º, pode ser ampliado em mais 12 meses, na eventualidade de o segurado estar desempregado, desde que comprovada essa condição.
4. Honorários advocatícios majorados para o fim de adequação ao disposto no art. 85, §11, do Código de Processo Civil, ressalvada a suspensão de sua exigibilidade em face da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e, de ofício, majorar os honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002538084v5 e do código CRC 7f7c4b98.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 11/05/2021 A 18/05/2021
Apelação Cível Nº 5008619-88.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
SUSTENTAÇÃO DE ARGUMENTOS: ALEX SANDRO MEDEIROS DA SILVA por ELIZIA NUNES DOS SANTOS
APELANTE: ELIZIA NUNES DOS SANTOS
ADVOGADO: ALEX SANDRO MEDEIROS DA SILVA (OAB RS078605)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/05/2021, às 00:00, a 18/05/2021, às 14:00, na sequência 641, disponibilizada no DE de 30/04/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, MAJORAR OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/05/2021 04:01:22.