Ação Rescisória (Seção) Nº 5029370-81.2023.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
RELATÓRIO
Cuida-se de ação rescisória ajuizada ajuizada por R. D. C. F. A. em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), pretendendo a desconstituição do acórdão proferido pela Egrégia 10ª Turma deste Tribunal, nos autos do processo n.º 50313753320154049999, com fundamento no artigo 966, inciso V, do Código de Processo Civil (violação manifesta de norma jurídica).
Relata a parte autora que ajuizou a ação n.º 0000288-04.2013.8.16.0120, pretendendo a comprovação da atividade rural, na função de empregado rural, no período de 11/03/1975 a 31/12/1993, sobrevindo decisão de improcedência, em 29/06/2015, em razão da não comprovação do labor rural. Decisão confirmada por acórdão, proferido em 18/12/2018, pela Décima Turma deste Tribunal.
Vem daí o ajuizamento da presente ação rescisória, alegando que a decisão rescindenda não observou o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, manifestado na Súmula 577 e no julgamento do Tema n.º 638, relativamente à interpretação conferida ao art. 55, §3º, da Lei 8.213/1991.
Indeferida a tutela antecipada, foi concedida à parte autora o benefício da gratuidade de justiça (ev.
).Devidamente citada, a parte ré contestou (ev.
). Alega, em abreviado, que tanto a Súmula 577 e 638, do Superior Tribunal de Justiça, trazem uma possibilidade, donde não decorre ao julgador uma obrigação de necessariamente reconhecer o período rural em período anterior ao documento mais antigo, sobretudo, quando, como é o caso do processo originário, houve apreciação da prova. Tendo a matéria sido enfrentada pelo acórdão rescindendo, entende que a parte autora está a valer-se da rescisória como sucedâneo recursal. Pede, ao fim, a improcedência do pedido.Com réplica (ev.
).Sem dilação probatória, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório do necessário. Peço dia para julgamento.
VOTO
Tempestividade
A decisão rescindenda passara em julgado em 15/02/2023 (
), ao passo que a presente demanda foi ajuizada em 22/08/2023.Em maneira que a parte autora exerceu o direito de pleitear a rescisão do julgado dentro no prazo decadencial bienal.
Juízo rescindente
Pretende a parte autora, em abreviado, fundar a pretensão rescisória em que o acórdão incorrera em violação direta ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, manifestado na Súmula 577 e no julgamento do Tema n.º 638, relativamente à interpretação conferida ao art. 55, §3º, da Lei 8.213/1991, ao deixar de reconhecer a atividade rural no período de 11/03/1975 a 31/12/1993.
Vem a propósito trazer para aqui as normas jurídicas supostamente violadas:
Súmula 577-STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório. STJ. 1ª Seção. Aprovada em 22/06/2016, DJe 27/06/2016.
Tema n.º 638 do STJ: Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.
Art. 55, §3º, da Lei 8.213/1991:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
Na conformidade do relatado, a parte autora ajuizara a ação n.º 0000288-04.2013.8.16.0120, pretendendo a comprovação da atividade rural, na função de empregado rural, no período de 11/03/1975 a 31/12/1993.
Sobreveio sentença de improcedência, proferida em 29/06/2015, nos seguintes termos, na parte pertinente (ev.
):(...)
Averbação do Período Rural
(...)
Relativamente ao período rural em que a autora afirma ter trabalhado, trouxe aos autos, como meio de prova, os seguintes documentos: cópia de sua CTPS, contendo anotações de vínculos empregatícios na área rural (seq. 1.6); cópia da folha de informação e entrevista de sua genitora, onde constam que era trabalhadora rural (seq. 1.11); cópia da certidão de casamento constando a profissão de “lavrador” de seu marido (seq. 1.7) e cópia da CTPS de seu marido onde contam os registros como trabalhador rural (seq. 1.8 e 1.9).
Friso inicialmente haver necessidade que os documentos sejam contemporâneos ao período em que se pretende reconhecer a atividade rural alegada, tudo isto na conformidade do disposto no Enunciado de Súmula de 34 da Turma Nacional de Uniformização, in verbis: “Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar.”
Também neste sentido o entendimento do colendo STJ:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL. RECONHECIMENTO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS DA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. REAVALIAÇÃO PROBATÓRIA QUE CONFIRMA ESSA CONCLUSÃO. PROVA MATERIAL INCONSISTENTE. TESTEMUNHAS CONTRADITÓRIAS. AGRAVO DESPROVIDO. 1. As instâncias ordinárias, com base no conjunto fático-probatório carreado aos autos, consignou a ausência de comprovação da atividade rural exercida pelo autor pelo período de carência exigido. 2. Não são considerados início razoável de prova material os documentos que não sejam contemporâneos à época do suposto exercício de atividade profissional, como no presente caso, em que as provas carreadas aos autos comprovam que a autora não encontra-se fixado no meio rural há décadas, tendo exercido atividade urbanas, com registro no CNIS, desde 1992 até 2010. 3. Neste caso, verifica-se, ainda, que o acervo testemunhal produzido apresenta-se inadequado, por contraditório, para evidenciar a pretendida situação de trabalhador rural da parte autora. 4. Dessa forma, sendo inservíveis os documentos apresentados pela parte autora e contradita a testemunha não faz jus ao benefício requerido. 5. Agravo Regimental desprovido.(AgRg no AREsp 577909/SP; Relator(a) Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO; Órgão Julgador 1ª TURMA; Data do Julgamento 16/04/2015; Data da Publicação/Fonte DJe 30/04/2015).
Na hipótese em apreço, os documentos trazidos pela autora e que são contemporâneos ao período que se pretende comprovar estão em nome de seu cônjuge. Ocorre que para o reconhecimento destes documentos em nome de terceiros há necessidade que a Requerente trabalhe em regime de economia familiar com àquele.
A possibilidade da utilização destes documentos decorre do fato de que, em nossa sociedade, de cunho eminentemente patriarcal, os atos negociais da entidade familiar, em regra, são formalizados em nome do “chefe da família”, que é o representante dos filhos e da esposa perante terceiros.
Nesse sentido a jurisprudência:
TRF-4 - APELAÇÃO CIVEL AC 2913 RS 2001.71.08.002913-6 (TRF-4) Data de publicação: 22/03/2006 Ementa: DOCUMENTOS EM NOME PRÓPRIO E DE TERCEIROS (PAIS E CÔNJUGE). VALOR PROBATÓRIO. MULHER RURÍCOLA. COMPROVAÇÃO DO LABOR AGRÍCOLA APÓS O CASAMENTO. CONTEMPORANEIDADE DA PROVA. DOCUMENTOS ANO A ANO. DESNECESSIDADE. PERÍODO NÃO REFERIDO EM NENHUM DOCUMENTO. NÃO-RECONHECIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TEMPO DE SERVIÇO POSTERIOR À EC N.º 20 /98. OPÇÃO PELA REGRA MAIS BENÉFICA AO SEGURADO. 1. Havendo início de prova documental, corroborada por prova testemunhal, é de se considerar plenamente comprovado o exercício da atividade rural. 2. É possível o cômputo da atividade rural entre 12 e 14 anos de idade, porque a norma constitucional pertinente à idade mínima para o trabalho é de cunho protetivo do menor, não sendo possível a interpretação em desfavor do trabalhador. 3. Os documentos apresentados em nome de terceiros, especialmente cônjuge ou genitores, são hábeis à comprovação do trabalho rural exercido pelos outros membros do grupo familiar, podendo dar suporte ao reconhecimento do tempo de serviço se complementados por prova testemunhal idônea e consistente. Entendimento consagrado na recente Súmula n.º 73 deste Tribunal (j. 19- 01-2006). 4. O fato de a maioria dos documentos apresentados estarem em nome do pai e do marido da autora não é óbice ao reconhecimento do tempo de serviço laborado por ela como rurícola, visto que, se caracterizado o regime de economia familiar, a condição de agricultor estende-se aos familiares, considerando-se que, em nossa sociedade, de cunho eminentemente patriarcal, os atos negociais da entidade familiar, em regra, são formalizados em nome do pater familias, que é o representante dos filhos e da esposa perante terceiros. 5. Após o matrimônio da segurada rurícola, a prova documental em nome do pai não basta, sendo necessários para a comprovação do labor campesino documentos em seu nome, ou de seu marido, ou ainda do sogro, tendo em vista que o casamento implica a formação de um novo núcleo familiar. 6. Embora não se exija, para a comprovação...
TNU - PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL PEDILEF 200872550036719 SC (TNU) Data de publicação: 25/03/2011 Ementa: PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO COMO TRABALHADORRURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DOCUMENTOSEM NOME DE MEMBRO DO GRUPO FAMILIAR. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO LABORRURAL. PROVA ORAL CONVINCENTE. PROVIMENTO DO INCIDENTE. 1. Documentos em nome de terceiros, como pais, cônjuge, avós, ou qualquer outro membro que compõe o grupo familiar, são hábeis a comprovar a atividade rural em virtude das próprias condições em que se dá o desempenho do regime de economia familiar. Precedentes: PEDILEF 200670510004305 e PEDILEF200772950014255). Incidência da Súmula n.º 06 da TNU. 2. In casu, dentre os documentos acostados pelo requerente, estavam a matrícula de imóvel rural em nome de seu avô e a certidão do INCRA também em nome de seu avô (e, posteriormente, em nome de seu espólio),as quais foram corroboradas por prova testemunhal coerente e idônea. 3. O fato de se tratar de documento em nome de terceiro não exclui a sua valia como início de prova material. 4. Pedido de Uniformização conhecido e provido, de forma a restabelecera r. sentença.
Ocorre que no caso em comento não há qualquer relato de que a Autora tenha trabalhado em regime de economia familiar com seu cônjuge, razão pela qual tais documentos não podem servir de início de prova material acerca da suposta atividade rural desenvolvida nestes anos, sendo certo inclusive que a certidão de casamento da Autora é expressa em destacar que a mesma exercia atividade domésticas, o que derruba sua assertiva de que desde antes de seu casamento era trabalhadora rural.
Ora, se a mesma desde criança exercia atividades campesinas, por qual motivo declarou perante a Serventia Extrajudicial de que exercia atividades domésticas. De se mencionar que nem mesmo suposta pouca instrução da Autora justificaria tal fato, na medida em que a diferenciação entre tais atividades é gritante e altamente conhecida independentemente do nível de escolaridade.
O documento juntado em nome da genitora também não é apto a servir como meio de prova, na medida em que com o casamento há formação de novo núcleo familiar, razão pela qual o documento deveria estar em seu nome ou de seu marido.
Assim, conquanto as testemunhas/informantes tenham confirmado o exercício de atividade rural pela autora, a existência de documentos que se contrapõem às afirmações da autora faz com que o material probatório angariado aos autos seja insuficiente para formação de juízo de certeza quanto ao efetivo exercício de atividade rural pela autora.
Desta forma, a improcedência do pedido é medida que se impõe.
Da sentença apelou a parte autora, sobrevindo acórdão que negou provimento ao recurso, em Sessão de 17/12/2018, nos seguintes termos (ev.
):(...)
CASO CONCRETO – LABOR RURAL
A autora, nascida em 11-3-1963 (evento 1 - OUT2) pretende o reconhecimento do exercício de labor rural na Fazenda Cachoeira no interregno compreendido entre 11-3-1975 a 31-12-1993. Para tanto, acostou aos autos os seguintes documentos:
a) Entrevista da mãe perante o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural em 1977 relatando que trabalha há 10 anos na Fazenda Cachoeira, possuindo uma filha menor de nome Dirce Aparecida (evento 1 - OUT12);
b) FUNRURAL em nome da mãe indicando que trabalhava como empregada entre 1967 a 1977, tendo uma dependente de nome Dirce Aparecida (evento 1 - OUT10 e OUT11);
c) Certidão de casamento datada de 22-5-1982, em que consta a profissão do marido como lavrador (evento 1 - OUT7);
d) CTPS do cônjuge com contrato como trabalhador rural firmado na Fazenda Cachoeira em 1-11-1979, com data de saída ilegível (evento 1 - OUT8, fl. 4);
e) CTPS da autora e do marido com vínculo de trabalho na Fazenda da Mata (evento 1 - OUT6, fls. 3, e OUT8, fl. 4).
A autora, em seu depoimento (evento 71 - VIDEO2), disse que começou na roça por volta dos 10 anos de idade na Fazenda Cachoeira até 1993, sendo registrada na carteira por uns 13 anos na Fazenda da Mata. Relata que no período que trabalhou sem registro carpia café, plantava soja, dentre outras atividades. Refere que estudou pouco e que nunca trabalhou na cidade, sendo que morava com a família na Fazenda Cachoeira.
A prova testemunhal produzida em juízo confirmou que a parte autora exerceu atividade rural na Fazenda Cachoeira (evento 71):
A testemunha Adélia, que mora na Fazenda Cachoeira, afirmou que conhece a autora da Fazenda Cachoeira e que começaram a trabalhar juntas lá desde os 12 anos de idade, sem registro na CTPS. Afirma que a autora trabalhava carpindo café e soja. Acrescenta que a autora casou na fazenda.
A testemunha Aparecido, morador da Fazenda Cachoeira, disse que conheceu a autora na fazenda em 1970 e que sempre viu ela trabalhando no local. Diz que não sabe explicar porque a autora não era registrada. Relata que a autora ajudava a mãe e o irmão, sendo que depois mudou com o marido para a Fazenda da Mata.
Embora as testemunhas relatem que a autora residia na Fazenda Cachoeira com sua mãe, os documentos dos autos contradizem esta informação, pois a genitora informou na entrevista perante o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural que trabalhou 10 anos na Fazenda Cachoeira, possuindo uma filha menor de nome Dirce Aparecida, a qual aparece como dependente no FUNRURAL. Ou seja, o nome da autora Rita de Cássia, não aparece na documentação apresentada pela mãe, o que compromete a validade dos depoimentos, pois faz acreditar que a filha Rita de Cássia não residia com a mãe no período.
Após o casamento ocorrido em 22-5-1982, presume-se que a autora passou a residir com o marido, o que, todavia, não comprova o exercício da atividade laboral agrícola pela autora.
Registro que a autora afirma que trabalhava na Fazenda Cachoeira juntamente com sua mãe e seu marido na condição de empregada. Ou seja, em tal período a autora não possui a condição de segurada especial (já que não trabalhava em regime de economia familiar e tampouco como boia-fria). O que se verifica em tal período é a existência de vínculo empregatício não registrado em CTPS e sem averbação nos sistemas do INSS (situação essencialmente diversa do segurado especial). Bem por isso, tenho que a documentação apresentada não se mostra suficiente para comprovar o labor rural no período, considerando que os únicos documentos contemporâneos apresentados são referentes ao contrato do marido - manifestamente insuficientes à comprovação do vínculo laboral da autora.
Ressalto a impossibilidade de reconhecimento de tempo rural, na condição de empregado, com fundamento somente na prova testemunhal, como já referido.
Confira-se o seguinte precedente de minha relatoria:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO - CONCESSÃO. LABOR RURAL - COMPROVAÇÃO - REQUISITOS. ATIVIDADE ESPECIAL. COMPROVAÇÃO - REQUISITOS LEGAIS. RUÍDO. 1. Em se tratando de empregado rural com vínculo empregatício não registrado em CTPS e sem averbação nos sistemas do INSS (situação essencialmente diversa do segurado especial, que trabalha em regime de economia familiar ou como bóia-fria), deve haver início de prova documental a respeito do vínculo alegado, não bastando para tanto apenas atas escolares da época. 2. De acordo com o entendimento fixado pelo STJ em sede de recurso repetitivo, não basta a prova exclusivamente testemunhal para a configuração do labor rural, sendo necessário início de prova material (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), DJe 15-4-2011). 3. Até 28-4-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29-4-1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; e a contar de 6-5-1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. 4. De acordo com o que restou decidido pelo STJ em sede de recurso repetitivo (REsp n° 1398260/PR, STJ, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 5-12-2014), o limite de tolerância para o agente nocivo ruído é de 80 dB(A) até 5-3-1997; de 90 dB(A) entre 6-3-1997 e 18-11-2003; e de 85 dB(A) a partir de 19-11-2003.
(TRF4, AC 5030655-03.2014.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 19-7-2018)
Nessa equação, conforme a fundamentação acima, deixo de reconhecer o labor rural pleiteado pela parte autora, mantendo a sentença.
Não reconhecido o trabalho rural, prejudicado o exame da especialidade.
Conforme refere a parte autora na petição inicial, no processo originário o acervo probatório consistiu nos seguintes documentos:
i) Entrevista da mãe perante o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural em 1977 relatando que trabalha há 10 anos na Fazenda Cachoeira, possuindo uma filha menor de nome Dirce Aparecida (evento 1 - OUT12);
ii) FUNRURAL em nome da mãe indicando que trabalhava como empregada entre 1967 a 1977, tendo uma dependente de nome Dirce Aparecida (evento 1 - OUT10 e OUT11);
iii) Certidão de casamento datada de 22-5-1982, em que consta a profissão do marido como lavrador (evento 1 - OUT7);
iv) CTPS do cônjuge com contrato como trabalhador rural firmado na Fazenda Cachoeira em 1-11-1979, com data de saída ilegível (evento 1 - OUT8, fl. 4);
v) CTPS da autora e do marido com vínculo de trabalho na Fazenda da Mata (evento 1 - OUT6, fls. 3, e OUT8, fl. 4).
O documento "i" estampa as seguintes informações (ev.
):
O documento "ii" traz as seguintes anotações (ev.
e ):Vem a talho, ainda, trazer para aqui o conteúdo - na parte pertinente - dos documentos "iii", "iv" e "v" (respectivamente eventos
, , p. 4, , p. 3 e , p. 4):Certidão de casamento, celebrado em 22/05/1982:
CTPS do cônjuge:
Anotações na CTPS da parte autora:
Tem-se, pois, em compêndio:
(i) Documento rural da genitora da parte autora, que alcança o ano de 1967;
(ii) FUNRURAL, ainda em nome da genitora, que demonstra a existência de atividade rural no lapso temporal de 1967 a 1977;
(iii) Certidão de casamento, celebrado em 22/05/1982, em que o cônjuge da parte autora é qualificado como lavrador;
(iv) Anotações em CTPS: (iv.i) do cônjuge, como trabalhador rural, na Fazenda Cachoeira , sendo o termo inicial a data de 01/11/1979, com data de saída ilegível; ainda, vínculo de emprego como trabalhador rural, com data de admissão em 01/01/1994, na Fazenda da Mata, sem indicação de data de saída; (iv.ii.) da parte autora: vínculo de emprego, como trabalhadora rural, na Fazenda da Mata, no período de 01/03/1995 a 30/11/2008.
Esse era essencialmente o acervo probatório.
Vem de molde, agora, estreitar a relação da prova com os argumentos lançados no acórdão rescindendo.
(i) O nome da filha dependente, no FUNRURAL da genitora, consta como Dirce Aparecida, e não Rita de Cassia;
Daí se segue que o nome da autora Rita de Cássia, não aparece na documentação apresentada pela mãe, o que compromete a validade dos depoimentos, pois faz acreditar que a filha Rita de Cássia não residia com a mãe no período.
(ii) Presumindo-se a convivência da autora com seu cônjuge, a partir do casamento, celebrado em 22/05/1982, não é possível o reconhecimento da condição de segurado especial, tendo em vista a afirmação da parte autora de que trabalhava na Fazenda Cachoeira juntamente com sua mãe e seu marido na condição de empregada.
Donde a conclusão de que se trata de vínculo empregatício não registrado em CTPS e sem averbação nos sistemas do INSS (situação essencialmente diversa do segurado especial).
O que tudo, nos termos da decisão, leva à conclusão de que os únicos documentos contemporâneos se referem ao cônjuge (registros na CTPS), que, a juízo do julgador, são insuficientes a comprovar o labor rural da autora no período.
Delineados os contornos da questão fática havida no processo originário, há-se de mister analisar a hipótese rescisória.
Como primeiro pressuposto, é notar que em nenhum momento, no processo originário, houve referência ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, manifestado na Súmula 577 e no julgamento do Tema n.º 638. Neste particular, convém lembrar que a Súmula 577 fora aprovada pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça em 22/06/2016, e publicada em 27/06/2016, ao passo que o julgamento da questão afeta ao Tema 638 dera-se em 28/08/2013, com trânsito em julgado em 04/03/2015. Tais marcos interpretativos são, pois, anteriores ao acórdão rescindendo, proferido em 17/12/2018. Neste mesmo tópico, não cairá fora de propósito lembrar que a questão não foi levantada em sede de embargos declaratórios (ev.
).Para além disso, o fundamento principal do não reconhecimento do tempo rural fora a impossibilidade de reconhecimento de tempo rural, na condição de empregado, com fundamento somente na prova testemunhal. Neste particular, fez-se, inclusive, referência à Súmula 149, do STJ, que dispõe: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Logo, a razão do desprovimento do recurso cingiu-se à inexistência de início de prova material.
A conclusão jurídica a que chegou o magistrado encontra amparo em precedentes deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA EX OFFICIO. INEXISTÊNCIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL COMO EMPREGADO. VÍNCULO TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF (TEMA 810) E STJ (TEMA 905). TUTELA ESPECÍFICA. 1. Hipótese em que a sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 2. Em se tratando de empregado rural com vínculo empregatício não registrado em CTPS e sem averbação nos sistemas do INSS (situação essencialmente diversa do segurado especial, que trabalha em regime de economia familiar ou como boia-fria), deve haver início de prova documental a respeito do vínculo alegado. 3. De acordo com o entendimento fixado pelo STJ em sede de recurso repetitivo, não basta a prova exclusivamente testemunhal para a configuração do labor rural, sendo necessário início de prova material (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), DJe 15-4-2011). 4. Critérios de correção monetária e juros de mora conforme decisão do STF no RE nº 870.947/SE (Tema 810) e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR (Tema 905). 5. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4, AC 5012269-80.2018.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 03/07/2020)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL COMO EMPREGADO. VÍNCULO TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. CALOR. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Em se tratando de empregado rural com vínculo empregatício não registrado em CTPS e sem averbação nos sistemas do INSS (situação essencialmente diversa do segurado especial, que trabalha em regime de economia familiar ou como boia-fria), deve haver início de prova documental a respeito do vínculo alegado. 2. De acordo com o entendimento fixado pelo STJ em sede de recurso repetitivo, não basta a prova exclusivamente testemunhal para a configuração do labor rural, sendo necessário início de prova material (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), DJe 15-4-2011). (...) (TRF4 5013079-89.2017.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator MARCELO MALUCELLI, juntado aos autos em 02/10/2019)
Relativamente à hipótese de violação de norma jurídica, dispõe o art. 966, V, do CPC:
Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V - violar manifestamente norma jurídica;
De modo que se exige, para ter cabimento a ação rescisória, que a violação da norma jurídica seja contra a literalidade da norma, ou em outras palavras, exige-se que a decisão aberre da literalidade da lei. Donde se extrai que a má eleição de posicionamento, ou, ainda, a má interpretação da norma não tem o condão de ensejar o cabimento da ação rescisória.
Nesta conformidade:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO MATERIAL. REGIMENTO INTERNO ESPECÍFICO DA AUTARQUIA. PARÁGRAFO 1º DO ART. 45 da LEI N.
8.212/1991. SÚMULA N. 343/STF. NÃO CABE RESCISÓRIA POR VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. MATÉRIA CONTROVERTIDA NOS TRIBUNAIS À ÉPOCA DO JULGAMENTO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ PACIFICADA. É DEVIDA A PENSÃO POR MORTE AOS DEPENDENTES DO SEGURADO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A APOSENTADORIA ATÉ A DATA DO ÓBITO. IMPOSSIBILIDADE DE REGULARIZAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS APÓS A MORTE DO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. REGIMENTO INTERNO DA AUTARQUIA. NÃO COMPETE AO STJ. INVIABILIDADE.
(...)
IV - No que se refere à alegada violação literal de dispositivo de lei, a orientação desta Corte é no sentido de que tal ofensa deve ser "direta, evidente, que ressai da análise do aresto rescindendo" e "se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se um mero 'recurso' com prazo de 'interposição' de dois anos." Confira-se: AR n. 4.516/SC, relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, julgado em 25/9/2013, DJe 2/10/2013; REsp n. 168.836/CE, relator Ministro Adhemar Maciel, Segunda Turma, julgado em 8/10/1998, DJ 1º/2/1999, p. 156. X - Agravo interno improvido. (AgInt na AR 6.304/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 01/12/2020, DJe 07/12/2020) Grifei.
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NA AÇÃO RESCISÓRIA. A AÇÃO RESCISÓRIA FUNDADA NO INCISO V DO ART. 966 DA LEI PROCESSUAL EXIGE QUE A VIOLAÇÃO DE NORMA JURÍDICA SEJA LITERAL, DIRETA, EVIDENTE, DISPENSANDO O REEXAME DOS FATOS DA CAUSA. MERO INCONFORMISMO COM O DESLINDE DA QUESTÃO, NÃO AUTORIZA A DESCONSTITUIÇÃO DA COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Cuida-se de Ação Rescisória que busca desconstituir a decisão exarada no REsp. 1.215.209/CE que julgou procedente o pedido rescisório do INSS ao fundamento de que não seria possível o reconhecimento simultâneo de duas uniões estáveis.
2. Em suas razões recursais a agravante defende que o acórdão rescindendo mal valorou as provas dos autos, vez que restou evidenciada uma dúvida razoável quanto aos contornos temporais das uniões, não se podendo afirmar com certeza se as uniões eram simultâneas ou sucessivas.
3. É certo que o cabimento da Ação Rescisória com base em violação literal à disposição de lei somente se justifica quando a ofensa se mostre aberrante, cristalina, observada primo oculi, consubstanciada no desprezo do sistema jurídico (normas e princípios) pelo julgado rescindendo.
4. Nesse sentido, esta Corte pacificou a orientação de não ser a Ação Rescisória meio adequado para corrigir suposta injustiça da sentença, apreciar má interpretação dos fatos, reexaminar as provas produzidas ou complementá-las.
5. Agravo Interno do Particular a que se nega provimento.
(AgInt na AR 6.092/CE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2020, DJe 16/09/2020) Grifei.
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PRIVATIVOS DE PROFISSIONAIS DA SAÚDE. JORNADA SUPERIOR A 60 HORAS. AÇÃO RESCISÓRIA. DESCABIMENTO. SÚMULA 343/STF. APLICABILIDADE TAMBÉM PARA AS QUESTÕES CONSTITUCIONAIS ONDE INEXISTENTE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE.
1. A desconstituição de decisão transitada em julgado fundada em violação manifesta de norma jurídica pressupõe que a interpretação adotada seja descabida, contrariando o dispositivo legal em sua literalidade, o que não ocorreu, no presente feito.
(...)
(AgInt nos EDcl na AR 6.396/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 04/05/2021, DJe 01/07/2021)
AÇÃO RESCISÓRIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA. CONDENAÇÃO POR ATO QUE CONFIGURA MERA INFRAÇÃO DISCIPLINAR. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RESCINDENDO QUE IDENTIFICOU E SANCIONOU A PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO. PUNIÇÃO ADMINISTRATIVA COM ADVERTÊNCIA. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. EXORBITÂNCIA DAS PENAS APLICADAS. NÃO OCORRÊNCIA. ERRO DE FATO. OPÇÃO CONCRETA POR UMA DAS VERSÕES DE FATO POSSÍVEIS. AUSÊNCIA DE ERRO PASSÍVEL DE ENSEJAR A RESCISÃO DO JULGADO.
I - A ação rescisória é ação de fundamentação vinculada. As hipóteses de cabimento encontram-se taxativamente previstas pelo legislador. Para o desfazimento da coisa julgada, deve o autor demonstrar a presença de alguma das causas endógenas ou exógenas de rescindibilidade (ver, a propósito, MEDINA, José Miguel Garcia. Código de processo civil comentado. 6ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2020, p. 1453).
(...)
IV - Não se capta da respeitável decisão colegiada questionável violação alguma à norma jurídica. E a rescisória, como se infere da própria leitura do art. 966, V, do CPC/15, tem cabimento apenas contra violações manifestas a normas jurídicas. A discordância do autor quanto à interpretação dada aos fatos e às normas pelo órgão julgador não autoriza o manejo da excepcional ação rescisória.
Precedentes: AgInt na AR 4.820/PB, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, j. em 17/03/2020, DJe 23/03/2020; AR 6.010/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, j. em 27/11/2019, DJe 10/12/2019; AgInt na AR 6.228/DF, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, j. em 27/11/2019, DJe 19/12/2019.
(...)
XII - Ação rescisória julgada improcedente.
(AR 6.657/DF, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/02/2021, DJe 30/03/2021)
Assim não tem em mira a ação rescisória o corrigir suposta injustiça, ou o reexaminar de provas, por maneira que a vulneração da norma tem de ser alcançada de primeira intuição.
De fato, adotar-se tese diversa não só malferiria a coisa julgada, capaz de ensejar a representação de uma observância regular, que tem a aptidão de inspirar na sociedade a sensação de segurança dos atos decisórios (certidumbre del derecho), como também afrontaria a tipologia legal em relação aos meios de impugnação das decisões judiciais, o que redundaria em recurso ordinário sui generis, com prazo bienal.
De mais a mais, a reiteração jurisprudencial per se não tem o condão de ensejar a pretensão rescisória, porque traduziria, na prática, uma observância necessária, porque vinculativa, do magistrado, que transborda o campo das súmulas vinculantes e dos reflexos das decisões definitivas de mérito nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas declaratórias de constitucionalidade.
Na lição de José Carlos Barbosa Moreira:
“ (...) decisão que se afaste da jurisprudência não terá de ser vista, só por isso, como necessariamente violadora da lei, ainda que o entendimento adotado divirja de proposição constante de Súmula” (Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, 1978, vol. 5, p. 155).
Portanto, a violação de norma jurídica pressupõe que o acórdão rescindendo contenha motivação manifestamente contrária às normas, princípios e regras que orientam o ordenamento jurídico, não havendo, portanto, como se reconhecer dita vulneração quando a decisão se estriba em interpretação razoável, máxime quando encontra eco na reiterada decisão de Tribunais.
Seguindo tal linha de raciocínio é, por exemplo, o pensar de Teori Albino Zavascki:
Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sempre houve a tendência de qualificar a ofensa à lei, ensejadora da rescisória, com forte adjetivação: é a “violação frontal e direta”, “é a que envolve contrariedade estridente ao dispositivo, e não à interpretação razoável ou a que diverge de outra interpretação, sem negar o que o legislador consentiu ou consentir o que ele negou”. [...] Se grassa nos tribunais entendimento divergente sobre o mesmo preceito normativo, é porque ele comporta mais de uma interpretação, a significar que não se pode qualificar, uma delas, como frontal ou gritantemente ofensiva ao teor literal da norma interpretada. [...] se interpretação razoável da norma (“ainda que não a melhor”) impede a revisão do julgado até mesmo por via de recurso, com muito mais razão tem de se negar acesso à rescisória (ZAVASCKI. Teori Albino. “Ação rescisória em matéria constitucional”. In: Interesse público. Porto Alegre: Notadez, n.º 12, ano 3, out./dez. 2001, pp. 46-65 [51]).
No caso versado, como ficou demonstrado com a simples revista das provas e conclusão do acórdão rescindendo, não é possível concluir tenha havido interpretação manifestamente contrária ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça. O que houve, ao revés, foi a conclusão, seguindo inclusive a Súmula 149, do STJ, de que não havia prova material suficiente para a comprovação do trabalho rural.
Note-se, neste ponto, que a interpretação decorreu da questão fática, procedendo o magistrado ao enquadramento jurídico que entendeu cabível à hipótese versada. Não se pode dizer que não reconheceu a possibilidade de reconhecer tempo rural anterior ao documento mais antigo, desde que diversa era a questão, não vindo de molde a invocação de suposta vinculação da apreciação do aresto ao que dispõem tanto a Súmula 577, quanto Súmula 638, do Superior Tribunal de Justiça.
É analisar as razões de decidir que guiaram o acórdão. Diz o aresto:
Registro que a autora afirma que trabalhava na Fazenda Cachoeira juntamente com sua mãe e seu marido na condição de empregada. Ou seja, em tal período a autora não possui a condição de segurada especial (já que não trabalhava em regime de economia familiar e tampouco como boia-fria). O que se verifica em tal período é a existência de vínculo empregatício não registrado em CTPS e sem averbação nos sistemas do INSS (situação essencialmente diversa do segurado especial).
Isto se deu depois de uma longa referência às provas coligidas. A decisão está, em primeiro lugar, justificada desde um ponto de vista lógico-dedutivo, pois que parte do acervo probatório, nem parte de uma petição de princípio, nem parte de pressupostos que não possam ser tidos por racionais, desde que decorrem de expressa interpretação da prova. Demais, há justificação externa normativa, porquanto a conclusão fática, obtida mediante reconstituição dos fatos por meio da prova, alcança, ao fim, o seu enquadramento normativo: impossibilidade de reconhecimento de tempo rural, na condição de empregado, com fundamento somente na prova testemunhal.
Poder-se-ia aventar a hipótese de erro de fato, ou ao entendimento de que não se queria o reconhecimento da atividade rural em regímen de economia familiar, ou ao entendimento de que não se pretendia a comprovação de vínculo trabalhista, como se alegou nos embargos declaratórios.
Entretanto, a questão fora ventilada nos autos originários, com expressa menção do acórdão no julgamento dos embargos (ev.
):Em exame dos autos, constatou-se que o período pretendido não se caracterizava como trabalho em regime de economia familiar ou como boia-fria, de modo que não preenchidos os requisitos para averbação como segurado especial, sem o recolhimento das contribuições previdenciárias.
Os documentos em nome de terceiros foram examinados, não sendo prova suficiente, no caso concreto.
A conclusão de que a pretensão era de comprovação de vínculo trabalhista, decorre das provas anexadas no processo e não do pedido inicial, razão porque inexiste contradição.
Assim, o que pretende o embargante, na verdade, é a rediscussão da matéria decidida, o que não é admissível nesta via recursal. Os Embargos de Declaração têm o propósito de aperfeiçoar o julgado, não de modificá-lo, o que se admite apenas em casos excepcionais, quando é possível atribuir-lhes efeitos infringentes, após o devido contraditório (artigo 1.023, § 2º, do CPC).
Nada há a prover, portanto, no restrito âmbito dos embargos de declaração.
Pretende-se, pois, em verdade, não indicar a heterodoxia da interpretação judicial, mas antes alterar a interpretação judicial dos fatos, a fim de que a causa mereça novo enquadramento jurídico, fim a que não mira a ação rescisória, quando fundada no inciso V, do artigo 966, do Código de Processo Civil.
Passando-se as coisas dessa maneira, entendo não estarem demonstradas as hipóteses de desconstituição do julgado.
Desta guisa, julgo improcedente a presente ação rescisória.
Honorários Advocatícios
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, observada, todavia, a suspensão da exigibilidade, em face da assistência judiciária gratuita.
Conclusão
Ação rescisória julgada improcedente.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por julgar improcedente a ação rescisória.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004686237v9 e do código CRC 2a27bc32.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 4/10/2024, às 14:30:35
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 22:52:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Ação Rescisória (Seção) Nº 5029370-81.2023.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
VOTO-VISTA
Diante do pedido de vista, examinei os autos e, após detida análise, decido acompanhar o ilustre Relator, Des. Márcio Antônio Rocha, que julga improcedente a ação rescisória.
Examinando atentamente o caso, observo que o julgador, efetivamente, não deixou de observar a Súmula 577/STJ nem o Tema 638/STJ, relativos à possibilidade de ampliação da eficácia da prova testemunhal para demonstrar o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo.
A decisão, na verdade, funda-se nos argumentos de que os documentos em nome de terceiro juntados aos autos não eram aptos a demonstrar concretamente o emprego rural da autora e de que não se mostrava possível o reconhecimento do trabalho rural com base exclusivamente na prova testemunhal.
Assim, não houve interpretação manifestamente contrária ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
Nunca é demais lembrar que o mero reexame da justiça da decisão (acerto ou desacerto do convencimento judicial sobre os fatos e a prova) não é admitido no âmbito da rescisória, sob pena de se a transformar em simples sucedâneo recursal com prazo estendido.
Ante o exposto, voto por acompanhar o i. Relator.
Documento eletrônico assinado por JOSÉ ANTONIO SAVARIS, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004782967v10 e do código CRC 68e5d92a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Data e Hora: 28/11/2024, às 16:13:28
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 22:52:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Ação Rescisória (Seção) Nº 5029370-81.2023.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA. INOCORRÊNCIA.
1. Tem a ação rescisória natureza de ação autônoma que visa a desconstituir decisão com trânsito em julgado, tendo hipóteses de cabimento restritas (art. 966 do CPC).
2. A violação manifesta de norma jurídica ocorre tanto na hipótese em que a decisão rescindenda aplica a lei em desacordo com o seu suporte fático, ao qualificar equivocadamente os fatos jurídicos, quanto no caso em que a decisão confere interpretação evidentemente equivocada ou visivelmente dissociada da norma.
3. Hipótese na qual o julgador, ponderando as provas, concluiu pela impossibilidade do reconhecimento de tempo rural, na condição de empregado, com fundamento somente na prova testemunhal. Não havendo, portanto, como se extrair o malferimento do entendimento do STJ manifestado nas Súmulas 577 e 638, tampouco se alcança violação do art. 55, §3º, da Lei 8.213/1991.
4. Ação rescisória julgada improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de novembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004686238v3 e do código CRC db95ad49.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 29/11/2024, às 15:18:27
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 22:52:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/09/2024 A 25/09/2024
Ação Rescisória (Seção) Nº 5029370-81.2023.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/09/2024, às 00:00, a 25/09/2024, às 16:00, na sequência 262, disponibilizada no DE de 06/09/2024.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRCIO ANTONIO ROCHA NO SENTIDO DE JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA, PEDIU VISTA O DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ. AGUARDAM A JUÍZA FEDERAL FLÁVIA DA SILVA XAVIER, A JUÍZA FEDERAL JACQUELINE MICHELS BILHALVA, A JUÍZA FEDERAL ADRIANE BATTISTI, A DESEMBARGADORA FEDERAL TAIS SCHILLING FERRAZ, O DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, O DESEMBARGADOR FEDERAL ALTAIR ANTONIO GREGORIO, O JUIZ FEDERAL ÉZIO TEIXEIRA, O DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, O DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER E A JUÍZA FEDERAL ANA PAULA DE BORTOLI.
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Pedido Vista: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Pedido de Vista - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ.
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 22:52:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 19/11/2024 A 27/11/2024
Ação Rescisória (Seção) Nº 5029370-81.2023.4.04.0000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/11/2024, às 00:00, a 27/11/2024, às 16:00, na sequência 188, disponibilizada no DE de 07/11/2024.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA DO JUIZ FEDERAL JOSÉ ANTONIO SAVARIS ACOMPANHANDO O RELATOR E OS VOTOS DA JUÍZA FEDERAL MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA, DO DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER, DO DESEMBARGADOR FEDERAL RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, DA DESEMBARGADORA FEDERAL CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI, DO DESEMBARGADOR FEDERAL SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, DO DESEMBARGADOR FEDERAL OSNI CARDOSO FILHO, DA DESEMBARGADORA FEDERAL TAIS SCHILLING FERRAZ, DO DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, DO DESEMBARGADOR FEDERAL ALTAIR ANTONIO GREGORIO E DO DESEMBARGADOR FEDERAL HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR NO MESMO SENTIDO, A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
VOTANTE: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Votante: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 22:52:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas