APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5000187-87.2014.404.7111/RS
RELATOR | : | PAULO PAIM DA SILVA |
APELANTE | : | DENI LOURDES RECH |
ADVOGADO | : | LIA LUCIANA JOST |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REPETIÇÃO VALORES RECEBIDOS EM ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. DANO MORAL.
A devolução dos valores, na forma do artigo 115 da Lei 8.213/91, somente é de ser feita nos casos em que comprovada a má-fé no recebimento, o que não é o caso dos autos em que o pagamento decorreu de antecipação da tutela em ação judicial.
O fato de o INSS cobrar valores que entende terem sido pagos indevidamente não enseja indenização por danos morais.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, negar provimento aos apelos e à remessa oficial, vencida a Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de abril de 2015.
Juiz Federal Paulo Paim da Silva
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7474573v6 e, se solicitado, do código CRC A040C50D. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5000187-87.2014.404.7111/RS
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RELATÓRIO
A parte autora busca o cancelamento de débito cobrado pelo INSS, referente benefício previdenciário recebido em antecipação de tutela benefício posteriormente cancelada, com a revogação da liminar. Requereu, ainda, indenização por danos morais.
A sentença foi de parcial procedência, determinando o cancelamento do débito, com improcedência do pedido de danos morais, com isso restou compensada a verba honorária pela sucumbência recíproca.
Apela a parte autora, requerendo a condenação por danos morais com total procedência da demanda.
Apela o INSS, defendendo a aplicação do artigo 273, § 2º, do CPC, com a devolução dos valores recebidos em antecipação da tutela, bem como do artigo 475-O do CPC e artigo 115 da Lei 8.213/91.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
VOTO
Repetição de valores recebidos em antecipação da tutela
O pedido do autor é acolhido por esta Turma, porquanto não cabe a devolução de valores recebidos de boa-fé, principalmente quando decorrentes de decisão judicial:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA ANTECIPADA. REVOGAÇÃO. PAGAMENTOS INDEVIDOS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS EM RAZÃO DA MEDIDA ANTECIPATÓRIA. DESNECESSIDADE. BOA-FÉ DO SEGURADO. 1. Incabível a devolução de valores percebidos pelo segurado em decorrência de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada, porquanto trata-se de boa-fé do segurado, além de presumida sua condição de hipossuficiência e a natureza alimentar dos benefícios previdenciários. E, como vem reconhecendo os Egrégios Tribunais Pátrios, as prestações alimentícias, onde incluídos os benefícios previdenciários, se recebidas de boa fé, não estão sujeitas à repetição. 2. A má-fé não pode ser presumida. Como da análise dos documentos juntados aos autos se depreende que não há prova da sua ocorrência, inviável a devolução. (TRF4, AC 5000671-67.2012.404.7113, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, D.E. 21/06/2013)
A cobrança prevista no artigo 115 da Lei 8.213/91 somente é de ser feita nos casos em que restar comprovada a má-fé no recebimento dos valores, o que não é o caso dos presentes autos, com o que se provê o recurso da parte autora, para declarar inexistente débito em favor da previdência social.
Indenização por dano moral
A sentença merece confirmação, porquanto não é o caso de condenação por dano moral, em relação a que adoto os fundamentos do magistrado:
Postulou a condenação da Autarquia em danos morais, no valor não inferior ao cobrado indevidamente.
Ocorre que a cobrança efetuada pelo INSS, por si só, não é capaz de gerar constrangimento ou abalo tais que caracterizem a ocorrência de dano moral. A Administração Pública apenas seguiu a legislação em vigor, sem extrapolar os limites de seu poder-dever, como já referido alhures.
Outrossim, para o deferimento de indenização por danos morais, é preciso provar a existência do dano, o ato da administração e o nexo de causalidade entre ambos, ônus que incumbe ao autor, nos termos do art. 333, inciso I, do CPC.
No presente caso, mesmo que se admita que a cobrança dos valores foi indevida, não há qualquer comprovação do indigitado dano extra patrimonial sofrido pela parte autora. Note-se que a requerente limita-se a alegar, genericamente, que sofreu abalo, sem, contudo, especificar ou provar tais alegações. Verifico que a Autora sequer apontou a existência de um dano concreto, tal como uma humilhação específica ou situação vexatória pela qual tenha efetivamente passado.
Nem mesmo o descumprimento da decisão liminar, de per si, caracteriza o abalo ou o constrangimento necessários para a concretização do dano moral.
Desta forma, considerando a inexistência de conduta ilícita por parte da Autarquia ré e a ausência de situação de constrangimento caracterizadora de dano moral, indefiro o pedido de indenização por danos morais.
Mantida a sentença em sua integralidade, mantém-se igualmente a compensação da verba honorária, ante a sucumbência recíproca.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Ante o exposto, voto por negar provimento aos apelos e à remessa oficial.
Juiz Federal Paulo Paim da Silva
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7474572v2 e, se solicitado, do código CRC 8E9F6F05. | |
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VOTO DIVERGENTE
Peço vênia ao eminente Relator para divergir em parte.
Cinge-se a divergência acerca da aplicação ou não, no caso concreto, do princípio da irrepetibilidade ou não-devolução de verba alimentar recebida por força de tutela antecipada, posteriormente revogada.
A Terceira Seção desta Corte firmou entendimento no sentido da irrepetibilidade de benefício previdenciário pago indevidamente, considerando tratar-se de verba alimentar e da percepção ser de boa-fé, conforme ementa que transcrevo:
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 58 DO ADCT. DL N.º 2351/87, ART. 4.º, II. UTILIZAÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO DE REFERÊNCIA (SMR) COMO DIVISOR DA RMI. VIOLAÇÃO LITERAL À DISPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL. OCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DO PISO NACIONAL DE SALÁRIOS (PNS). PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE.
(...)
4. Em face de sua natureza eminentemente alimentar, são irrepetíveis as parcelas indevidas de benefícios previdenciários recebidas de boa-fé. (TRF4, AÇÃO RESCISÓRIA Nº 1998.04.01.086994-6, 3ª SEÇÃO, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, D.E. 23/04/2010, PUBLICAÇÃO EM 26/04/2010 - grifei)
Tal posição jurisprudencial encontrava eco nos julgamentos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça há longa data:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. PENSAO POR MORTE. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇAO. IMPOSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO DA TERCEIRA SEÇAO. AGRAVO NAO PROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento quanto à impossibilidade de restituição de valores recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada.
(...)
(REsp 102.008/MT, Rel. Min ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/12/2012 - grifei)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA FÉ. IRREPETIBILIDADE.
1. As verbas previdenciárias, de caráter alimentar, percebidas de boa-fé, não são objeto de repetição.
2. Agravo regimental ao qual se nega provimento.
(AgRg no Ag 1386012/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2011, DJe 28/09/2011 - grifei)
"PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL AFASTADA. RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PREVIDENCIÁRIAS PAGAS POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA FÉ PELA SEGURADA. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(...)
2. O pagamento realizado a maior, que o INSS pretende ver restituído, foi decorrente de decisão suficientemente motivada, anterior ao pronunciamento definitivo da Suprema Corte, que afastou a aplicação da lei previdenciária mais benéfica a benefício concedido antes da sua vigência. Sendo indiscutível a boa-fé da autora, não é razoável determinar a sua devolução pela mudança do entendimento jurisprudencial por muito tempo controvertido, devendo-se privilegiar, no caso, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
3. Negado provimento ao recurso especial."
(REsp. 991030 - Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA - TERCEIRA SEÇÃO - DJe 15/10/2008 - grifei)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. DESCONTOS NO BENEFÍCIO. CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. IMPOSSIBILIDADE.
Uma vez reconhecida a natureza alimentar dos benefícios previdenciários, descabida é a restituição requerida pela Autarquia, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Recurso provido.
(REsp 627.808/RS, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/10/2005, DJ 14/11/2005, p. 377 - grifei)
Contudo, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, examinando o Recurso Especial nº 1.384.418, propôs entendimento distinto acerca do tema, assentando que benefício percebido por força de antecipação de tutela posteriormente revogada deve ser restituído ao Erário, considerando o caráter precário da medida, não obstante se tratar de verba alimentar e estar presente a boa-fé subjetiva. Segundo o Relator, "não é suficiente, pois, que a verba seja alimentar, mas que o titular do direito o tenha recebido com boa-fé objetiva, que consiste na presunção da definitividade do pagamento", definitividade esta que não estaria presente nas decisões que antecipam os efeitos da tutela.
O Relator do mencionado REsp definiu, ainda, que, para o ressarcimento, o INSS deve promover execução de sentença e, posteriormente, liquidado e incontroverso o crédito executado, pode a autarquia efetuar o desconto em folha de até 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção até a satisfação do crédito.
O acórdão restou ementado nas seguintes letras:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RECEBIMENTO VIA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. REALINHAMENTO JURISPRUDENCIAL. HIPÓTESE ANÁLOGA. SERVIDOR PÚBLICO. CRITÉRIOS. CARÁTER ALIMENTAR E BOA-FÉ OBJETIVA. NATUREZA PRECÁRIA DA DECISÃO. RESSARCIMENTO DEVIDO. DESCONTO EM FOLHA. PARÂMETROS.
1. Trata-se, na hipótese, de constatar se há o dever de o segurado da Previdência Social devolver valores de benefício previdenciário recebidos por força de antecipação de tutela (art. 273 do CPC) posteriormente revogada.
2. Historicamente, a jurisprudência do STJ fundamenta-se no princípio da irrepetibilidade dos alimentos para isentar os segurados do RGPS de restituir valores obtidos por antecipação de tutela que posteriormente é revogada.
3. Essa construção derivou da aplicação do citado princípio em Ações Rescisórias julgadas procedentes para cassar decisão rescindenda que concedeu benefício previdenciário, que, por conseguinte, adveio da construção pretoriana acerca da prestação alimentícia do direito de família. A propósito: REsp 728.728/RS, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, DJ 9.5.2005.
4. Já a jurisprudência que cuida da devolução de valores percebidos indevidamente por servidores públicos evoluiu para considerar não apenas o caráter alimentar da verba, mas também a boa-fé objetiva envolvida in casu.
5. O elemento que evidencia a boa-fé objetiva no caso é a 'legítima confiança ou justificada expectativa, que o beneficiário adquire, de que valores recebidos são legais e de que integraram em definitivo o seu patrimônio' (AgRg no REsp 1.263.480/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 9.9.2011, grifei). Na mesma linha quanto à imposição de devolução de valores relativos a servidor público: AgRg no AREsp 40.007/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 16.4.2012; EDcl nos EDcl no REsp 1.241.909/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 15.9.2011; AgRg no REsp 1.332.763/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28.8.2012; AgRg no REsp 639.544/PR, Rel. Ministra Alderita Ramos de Oliveira (Desembargador Convocada do TJ/PE), Sexta Turma, DJe 29.4.2013; AgRg no REsp 1.177.349/ES, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 1º.8.2012; AgRg no RMS 23.746/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 14.3.2011.
6. Tal compreensão foi validada pela Primeira Seção em julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, em situação na qual se debateu a devolução de valores pagos por erro administrativo: 'quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público.' (REsp 1.244.182/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 19.10.2012).
7. Não há dúvida de que os provimentos oriundos de antecipação de tutela (art. 273 do CPC) preenchem o requisito da boa-fé subjetiva, isto é, enquanto o segurado os obteve existia legitimidade jurídica, apesar de precária.
8. Do ponto de vista objetivo, por sua vez, inviável falar na percepção, pelo segurado, da definitividade do pagamento recebido via tutela antecipatória, não havendo o titular do direito precário como pressupor a incorporação irreversível da verba ao seu patrimônio.
9. Segundo o art. 3º da LINDB, "ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece", o que induz à premissa de que o caráter precário das decisões judiciais liminares é de conhecimento inescusável (art. 273 do CPC).
10. Dentro de uma escala axiológica, mostra-se desproporcional o Poder Judiciário desautorizar a reposição do principal ao Erário em situações como a dos autos, enquanto se permite que o próprio segurado tome empréstimos e consigne descontos em folha pagando, além do principal, juros remuneratórios a instituições financeiras.
11. À luz do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e considerando o dever do segurado de devolver os valores obtidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, devem ser observados os seguintes parâmetros para o ressarcimento:
a) a execução de sentença declaratória do direito deverá ser promovida; b) liquidado e incontroverso o crédito executado, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção até a satisfação do crédito, adotado por simetria com o percentual aplicado aos servidores públicos (art. 46, § 1º, da Lei 8.213/1991.
12. Recurso Especial provido.
(REsp 1.384.418/SC - Min. Herman Benjamin - DJe. 30/08/2013 - grifei)
Nesta esteira, em sessão realizada em 12/02/2014, sobreveio então o julgamento do REsp nº 1.401.560, ainda pendente de publicação, exarado em regime de recurso repetitivo, cujo Relator para o acórdão foi o Min. Ari Pargendler, que, entendendo ser repetível a verba percebida por força de tutela antecipada posteriormente revogada, em cumprimento ao art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, assim argumentou:
O pressuposto básico do instituto (tutela antecipada) é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (cpc, art. 273, §2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo que recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária.
Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrario sensu, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional.
Tratando-se de recurso julgado em regime repetitivo, impõe-se a esta Corte render-se aos argumentos do Superior Tribunal de Justiça, entendendo devido o ressarcimento dos valores recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada.
Ressalto, contudo, que tal interpretação deve ser observada com temperamentos, impondo-se a devolução apenas nos casos em que a medida antecipatória/liminar não tenha sido confirmada em sentença ou em acórdão, porquanto nas demais situações, embora permaneça o caráter precário do provimento, presente se fez uma cognição exauriente acerca das provas e do direito postulado, o que concretiza a boa-fé objetiva do segurado.
Aliás, argumentar que o segurado representado por advogado seria conhecedor de que a improcedência do direito implicaria na devolução dos valores recebidos precariamente, é fechar os olhos para a confiança na segurança das decisões judiciais, porquanto é evidente que o mais diligente advogado também era conhecedor da jurisprudência sufragada pela mais alta Corte infraconstitucional do país, que, por anos, sempre referiu ser irrepetível a verba alimentar, o que, a meu ver, já seria suficiente a configurar a boa-fé objetiva de quem percebe tais valores.
Nesta linha de raciocínio, examinando os Embargos de Divergência nº 1.086.154 sobre a matéria em questão, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em sessão realizada em 20/11/2013, por maioria, deixou assentado que "Não está sujeito à repetição o valor correspondente a benefício previdenciário recebido por determinação de sentença que, confirmada em segunda instância, vem a ser reformada apenas no julgamento de recurso especial" (EREsp. 1.086.154-RS - Min. Nancy Andrighi - D.J. 19/03/2014).
Sustenta a eminente Relatora que:
A dupla conformidade entre a sentença e o acórdão gera a estabilização da decisão de primeira instância, de sorte que, de um lado, limita a possibilidade de recurso do vencido, tornando estável a relação jurídica submetida a julgamento; e, de outro, cria no vencedor a legítima expectativa de que é titular do direito reconhecido na sentença e confirmado pelo Tribunal de segunda instância.
Essa expectativa legitima de titularidade do direito, advinda de ordem judicial com força definitiva, é suficiente para caracterizar a boa-fé exigida de quem recebe a verba de natureza alimentar posteriormente cassada, porque, no mínimo, confia - e, de fato, deve confiar - no acerto do duplo julgamento.
(...) a ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais.
Conforme referido linhas acima, tenho que o mesmo raciocínio deve ser conferido aos casos em que, embora não presente a dupla conformidade, haja confirmação do direito em sentença ou concessão do benefício em acórdão, por força da aplicação do art. 461 do CPC, eis que examinada a prova e o direito em cognição exauriente por magistrado.
Neste altura, importa referir que, se é dado ao homem médio criar expectativa legítima (boa-fé objetiva) na irrepetibilidade de verba paga por interpretação errônea ou inadequada da lei por servidor da administração, diga-se, da Autarquia - matéria reconhecida pela União por meio da edição da Súmula nº 34/AGU - com muito mais força se mostra presente a boa-fé objetiva nos casos em que o direito é confirmado por um magistrado em cognição exauriente.
De outro lado, calha mencionar que não se está fazendo letra morta aos artigos 273, §§3º e 4º, c/c art 475-O, I e II, que determinam a restituição ao estado anterior das partes em caso de reforma do julgado que ensejou execução provisória ou percepção de tutela antecipada, tampouco ao art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, porque tais dispositivos, embora constitucionais, devem ser lidos em interpretação conforme a Constituição, não maculando princípio fundamental da República, insculpido no art. 1º, III, da CF/88, que é a dignidade da pessoa humana, menos ainda afrontando a segurança jurídica consubstanciada na sedimentada jurisprudência que, repito, por anos, assentou a irrepetibilidade da verba alimentar.
Determinar-se a devolução irrestrita de valores previdenciários percebidos provisoriamente, sem qualquer reflexão sobre as consequências sociais que tal medida viria a causar, é, sem sombra de dúvida, ferir o que de mais básico é garantido ao cidadão brasileiro - o direito à vida digna-, pois compromete o direito à alimentação, à moradia, à saúde, enfim, à subsistência da família, deixando ao total desamparo aquele que um dia procurou o Judiciário e confiou seu futuro a este Poder na expectativa legítima de uma proteção. Advirto, ainda, que a insegurança de tal ordem poderia gerar um receio generalizado do segurado recorrer ao Judiciário e de postular medidas antecipadas, ensejando desprestígio ao instituto da antecipação de tutela, e, principalmente, a este Poder.
Assim, sopesando todas as questões acima delineadas, tenho que a melhor interpretação a ser conferida aos casos em que se discute a (ir)repetibilidade da verba alimentar previdenciária, deve ser a seguinte:
a) deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo, posteriormente não ratificada em sentença, forçoso é a devolução da verba recebida precariamente;
b) deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo e ratificada em sentença, ou deferida na própria sentença, tem-se por irrepetível o montante percebido;
c) deferido o benefício em sede recursal, por força do art. 461 do CPC, igualmente tem-se por irrepetível a verba.
Para os casos em que a devolução se impõe e permaneça o autor como titular de benefício previdenciário, eventual desconto em folha deverá ser limitado a 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção até a satisfação do crédito.
Por fim, apenas ressalto que "À míngua de lei expressa, a inscrição em dívida ativa não é a forma de cobrança adequada para os valores indevidamente recebidos a título de benefício previdenciário previstos no art. 115, II, da Lei n. 8.213/91 que devem submeter-se a ação de cobrança por enriquecimento ilícito. (...) Sendo assim, o art. 154, §4º, II, do Decreto n. 3.048/99 que determina a inscrição em dívida ativa de benefício previdenciário pago indevidamente não encontra amparo legal." (REsp Repetitivo 1.350.804/RS - Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES - Dje 28/06/2013). Portanto, inviável a inscrição em dívida ativa e, por consequencia, a propositura de execução fiscal, na esteira de precedente do STJ.
No caso dos autos, verifica-se que a parte percebeu benefícios previdenciários por força de tutela antecipada entendimento posteriormente não ratificado em sentença, de modo que as verbas devem ser ressarcidas ao erário (observado o limite de eventual desconto em folha), impondo-se a reforma do julgado.
Portanto, merece provimento o recurso do INSS para afastar a determinação de irrepetibilidade da verba recebida por força de antecipação de tutela não confirmada em sentença.
Ante o exposto, voto por, pedindo vênia ao Eminente Relator, dar provimento ao recurso do INSS para afastar a determinação de irrepetibilidade da verba recebida por força de antecipação de tutela não confirmada em sentença e negar provimento à apelação da parte autora.
É o voto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7509013v3 e, se solicitado, do código CRC 997E1042. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/04/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5000187-87.2014.404.7111/RS
ORIGEM: RS 50001878720144047111
RELATOR | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Marcus Vinicius de Aguiar Macedo |
APELANTE | : | DENI LOURDES RECH |
ADVOGADO | : | LIA LUCIANA JOST |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/04/2015, na seqüência 626, disponibilizada no DE de 15/04/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AOS APELOS E À REMESSA OFICIAL. VENCIDA A DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
: | Juiz Federal MARCELO MALUCELLI | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Destaque da Sessão - Processo Pautado
Divergência em 27/04/2015 19:20:42 (Gab. Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA)
Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7520604v1 e, se solicitado, do código CRC 16853199. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
Data e Hora: | 30/04/2015 15:21 |