D.E. Publicado em 03/11/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019674-97.2014.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | PATRICIA DE SOUZA LIMA |
ADVOGADO | : | Anderson Manique Barreto |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. QUALIFICAÇÃO DE AGRICULTOR.
1. É devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento do filho e do labor rural exercido no período de doze meses antecedentes ao início do benefício, ou nos dez meses precedentes ao parto (artigo 25, inciso III, c/c artigo 39, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, e no artigo 93, § 2º, do Decreto n.º 3.048/99).
2. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
3. A certidão de nascimento do filho em que aparece a própria requerente como agricultora é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedentes da Terceira Seção.
4. Apelo do INSS improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de outubro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8596639v2 e, se solicitado, do código CRC 710D14DC. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
Data e Hora: | 26/10/2016 10:51 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019674-97.2014.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | PATRICIA DE SOUZA LIMA |
ADVOGADO | : | Anderson Manique Barreto |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão de salário-maternidade formulado por PATRÍCIA DE SOUZA LIMA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, nos seguintes termos:
Posto isso, julgo PROCEDENTE o pedido inicial e extinto o processo com resolução de mérito, na forma do art. 269,1, do CPC, para o fim de condenar o
INSS a:
a) conceder à parte autora o benefício de salário-maternidade (NB 143.581.094-2) de que trata o art. 39, parágrafo único, da Lei n° 8.213/91, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste (26/05/2010).
b) pagar as parcelas do benefício salário-maternidade, as quais deverão observar o disposto no art. 73, inciso I I , da Lei n° 8.213/91, corrigidas monetariamente pelo IGP-DI (Lei n° 9.711/98, art. 10) e pelos mesmos índices que reajustam os benefícios mantidos pelo RGPS (Lei n° 10.741/03, artigo 31), acrescidas de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação (Súmula 75 do TRF/4a Região), sendo que, a partir da vigência da Lei n° 11.960/2009, que alterou o art. 1°-F da Lei n° 9.494/97, devem incidir tão somente os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.
Por fim, CONDENO o réu no pagamento das custas judiciais e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor das parcelas vencidas (Súmula 111, STJ), na forma do artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil.
Em suas razões, refere a autarquia recorrente que os documentos juntados aos autos não servem como início de prova material do exercício da atividade rural no período de carência, porque estão, em sua maioria, em nome do marido da requerente e desempenhou ele atividade urbana no período de carência, descaracterizando o regime de economia familiar. Refere que a extensão de prova material em nome de um cônjuge ao outro não é possível quando aquele passa a exercer atividade urbana, devendo a prova material apresentada ser em nome próprio. Requer que seja reformada a sentença e julgado improcedente o pedido formulado na inicial.
Com contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas, justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Do salário-maternidade à segurada especial
A Constituição Federal, nos artigos 6º e 201, inciso II, assegura proteção "à maternidade, especialmente à gestante", mediante a inclusão do direito de "licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias" (inc. XVIII do art. 6º, CF).
Posteriormente, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a matéria, na seção destinada aos benefícios, nos seguintes termos:
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Texto alterado pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003).
A trabalhadora rural, apesar de havida como segurada especial da previdência social, consoante previsão do art. 11, inc. VII, da Lei nº 8.213/91, somente foi contemplada com o benefício em questão pela edição da Lei nº 8.861, de 23-03-1994, que acrescentou o § único ao art. 39, Lei nº 8.213/91, com a seguinte redação:
"Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Com a edição da Lei nº 9.876, de 26-11-1999, regulamentada pelo Dec. nº 3.048, art. 93, § 2º, com a redação do Dec. 3.265, de 29-11-1999, foi acrescentado que a segurada especial deve comprovar o exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, ainda que de forma descontínua.
Portanto, para fazer jus ao benefício, a segurada especial deve comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, pelo período de 12 meses anteriores ao início do benefício (carência exigida), ou nos dez meses precedentes ao parto, consoante interpretação mais benéfica do próprio INSS, com fundamento no artigo 25, inciso III, c/c artigo 39, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, e no artigo 93, § 2º, do Decreto n.º 3.048/99.
De outra monta, a comprovação da atividade rural, no caso da segurada especial, pauta-se pelo disposto nos artigos 55, § 3º, e 106 da Lei nº 8.213/91, que dispõem:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o Art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Art. 106 - Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir de 16 de abril de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art. 12 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16 de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo Ministério Público ou por outras autoridades constituídas definidas pelo CNPS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural.
(Redação dada pela Lei n.º 9.063/95)
Não se exige prova plena da atividade rural em relação a todo o período de carência, mas somente início de documentação, que, aliada à prova testemunhal, viabilize a formação de conjunto probatório suficiente ao convencimento do Julgador. O artigo 106 relaciona documentos hábeis a esta comprovação; porém tal rol não é exaustivo, mas exemplificativo.
Estampa a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
1. Nos termos dos arts. 71 e seguintes da Lei n. 8.213/91, é devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural no período de dez meses que antecede o início do benefício.
2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira Seção.
3. Preenchidos os requisitos legais, é de se conceder o benefício à autora.
(AC: 0004805-66.2013.404.9999/PR;Relator Des. Fed. Celso Kipper; 6ª T, D.E. 14/06/2013).
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PERÍODO DE CARÊNCIA. CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL DEMONSTRADA.
1. A parte autora faz jus à concessão do salário-maternidade quando demonstradas a maternidade, a atividade rural e a qualidade de segurada especial durante o período de carência.
2. O exercício de atividades rurais, para fins previdenciários, pode ser demonstrado através de início razoável de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
3. Tratando-se de pedido de concessão de salário-maternidade à trabalhadora rural, deve ser mitigada a exigência de demonstração plena do exercício de atividades rurais sob pena de tornar impossível a concretização de um dos objetivos deste benefício, qual seja, a proteção à criança.
(AC: 0004209-82.2013.404.9999/ PR, Relator Des. Fed. Rogerio Favreto,5ª T. , D.E. 18/06/2013).
Observa-se, ainda, que as certidões da vida civil são eficazes a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Da contemporaneidade da prova material
É importante frisar que a Lei de Benefícios não exige que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê da transcrição do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213, que segue:
A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Não há justificativa legal, portanto, para que se exija prova material contemporânea ao período a ser reconhecido, nos termos reiteradamente defendidos pela Autarquia Previdenciária; tal exigência administrativa implica a introdução indevida de requisito, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.
Consequentemente, em ações desta natureza devem ser consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, sendo dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Do caso concreto
No caso em tela, a maternidade da autora restou comprovada a fls. 21, pela certidão de nascimento de ANA CAROLINA CATAFESTA, em 26/05/2010, filha também de Jocemar Catafesta.
O requerimento administrativo formulado em 02/06/2011 foi indeferido em 07/06/2011 (fls. 14), ao argumento de que não foram apresentados documentos comprovando o exercício da atividade rural no período de carência, não podendo ser aceitos para tal fim os documentos em nome do cônjuge que perdeu a condição de segurado especial.
Para a comprovação do trabalho rural, foram acostados aos autos, como início de prova material, os seguintes documentos:
- cópia da certidão de nascimento da filha da autora em que aparecem tanto ela quanto seu companheiro como agricultores (fls. 21)
- cópia de contrato de arrendamento rural firmado em 2008, em que aparece a demandante como arrendatária e Izolde Catafesta como arrendadora (fls. 06/07);
- notas fiscais de produtor rural em nome da autora e de seu marido, referentes à comercialização de leite in natura (fls. 16/17);
- termo de reconhecimento mútuo de união estável firmado pela autora e por seu companheiro em maio de 2011, em que ambos aparecem como lavradores e declaram viver juntos há mais de três anos (fls. 20).
Consta dos autos, ainda, cópia da entrevista rural realizada por servidor da autarquia com a demandante por ocasião do requerimento administrativo, em que ela afirmou trabalhar na agricultura, em uma área de 2,4 hectares, de propriedade de Izolde Catafesta, em regime de arrendamento, onde cultivam milho, feijão, mandioca, batata-doce e verduras e criam vacas, porcos e galinhas. Referiu a demandante, ainda, que comercializam o milho, o feijão e o leite, utilizando os demais produtos para consumo próprio.
A meu sentir, os documentos juntados aos autos - principalmente a certidão de nascimento da filha em que está a própria demandante qualificada como agricultora e as notas de produtor rural, também em nome da requerente - constituem o início de prova material do labor rural exigido pela legislação previdenciária.
A consideração de certidões como início de prova material é fixada expressamente como orientação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, 3ª Seção, REsp 1.321.493-PR, procedimento dos recurso repetitivos, j.10/10/2012). No referido julgado, concluiu-se imprescindível a prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, cabendo às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador, nos seguintes termos:
"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."(g.n.)
No mesmo sentido, a jurisprudência desta Casa Julgadora abaixo exemplificada:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. 1. Nos termos dos arts. 71 e seguintes da Lei n. 8.213/91, é devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural no período de dez meses que antecede o início do benefício. 2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira Seção. 3. Preenchidos os requisitos legais, é de se conceder o benefício à autora. (TRF4, AC 0015570-04.2010.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 16/06/2015)
Importante referir que a lei exige início de prova material, não prova documental plena, ano a ano ou mês a mês, podendo a prova testemunhal colhida em audiência, que, no presente caso, confirmou de modo seguro e convincente o exercício das lides rurais pela demandante, de forma individual, ampliar a eficácia probatória dos documentos juntados aos autos. Vejamos.
A autora, em seu depoimento pessoal, disse que trabalhava na lavoura até dois meses atrás, quando passou a trabalhar no Frigorífico; que durante a gestação, seu marido trabalhou por seis, sete meses em uma Fábrica de Fogões; que antes de se casar, trabalhou por poucos meses com Ari Ferrarini, em um mercado; que morava em Saudade, na cidade antes de se casar; que quando se casou com Jocemar Catafesta foi morar e trabalhar no campo, na Linha Creolin, em terras da sogra; que fez contrato de arrendamento com a sogra, Izolde Catafesta; que plantavam mandioca, milho, amendoim e criavam cinco vacas de leite, porcos, galinhas e dois cabritos; que permaneceu neste local, trabalhando na lavoura, por quatro, cinco anos; que o marido trabalhou em atividades urbanas, mas a depoente ficou permanentemente inserida na atividade do campo, cuidando das vacas de leite e da lavoura; que entregavam o leite para o Laticínio do Zurra.
MATILDE SALVADOR foi ouvida como informante e disse que conheceu a autora quando ela passou a morar na comunidade da Linha Creolin; que logo que foi viver com o marido, Jocemar, passou a demandante a trabalhar na lavoura; que, antes da união do casal, a autora residia na cidade e trabalhava em um mercadinho; que a demandante e o marido residiam e cultivavam terras cedidas pela sogra da requerente, com quem firmaram contrato de arrendamento; que a autora plantava milho, feijão e criava vacas de leite, galinhas e porcos; que ela comercializava leite para o Laticínio Santiago, do Zura; que o marido da autora trabalhava em uma fábrica de fogões; que quando ele chegava do trabalho e antes de ir, auxiliava a depoente nas lides rurais; que a autora trabalhou nestas terras até dois meses atrás e que, até então, ela não tinha qualquer outra atividade que não a rural; que viu, muitas vezes, a autora trabalhando na roça, inclusive durante a gestação e depois do nascimento da criança.
A testemunha FELIPE SALVADOR disse que conhece a autora da Linha Creolin, pois eram vizinhos; que a autora foi morar na Linha Creolin há cerca de cinco anos atrás, desde que passou a viver com o marido, Jocemar Catafesta; que eles moravam nas terras da sogra da autora, onde plantavam miudezas e criavam vacas de leite; que a autora vendia o leite para o Laticínio Santiago, do Zura; que o marido da autora trabalhou na cidade, em uma fábrica de fogões; que a autora, antes de casar, trabalhou na cidade; que viu a autora trabalhando, mesmo durante a gravidez e depois do parto.
EDIANE GRANDO, por fim, ao depor como testemunha, referiu que conhece a autora desde que ela veio morar na região; que ela começou a trabalhar na lavoura logo que passou a residir com o marido, que já morava na Linha Creolin; que a autora criava vacas de leite, plantava feijão, milho, mandioca; que o marido, inicialmente, trabalhava na lavoura mas, depois, foi trabalhar em uma fábrica de fogões; que viu a autora, mesmo grávida, trabalhando na lavoura muitas vezes; que a demandante vendia leite para o laticínio; que não se recorda o nome do laticínio; que a autora permaneceu nas terras da sogra, trabalhando na roça, até dois meses atrás.
Saliente-se, por fim, que o fato de o marido da requerente ter exercido atividade urbana em uma fábrica de fogões - TR Fundição de Ferro e Aço Ltda., em período que abrange a carência, de 12/01/2009 a 12/2010, com remuneração que variava entre R$ 387,25 e R$ 693,00 (conforme CNIS que ora peço a juntada), não afasta o direito invocado na inicial.
Ocorre que o legislador, quando elaborou os dispositivos que regem o tratamento previdenciário ao trabalhador rural, encontrou no campo espécies diversificadas de agricultores, lá não existindo apenas as figuras de patrão e empregado, mas também trabalhadores que refugiam à classificação tradicional de Direito do Trabalho, que labutavam autonomamente. Ao verificar a natureza destes últimos, encontrou, além do produtor, familiares que o auxiliavam, que se agregavam à atividade produtiva. Daí porque contemplou, também, aqueles cuja atividade gravitava em torno do chefe da unidade familiar. Mas não deixou de registrar o termo "individualmente", conforme está no art. 11, inc. VII, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 11.718/2008:
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (...)
Ademais, não logrou a autarquia demonstrar a condição de prescindibilidade do labor rural da autora para a subsistência do grupo familiar, sendo razoável admitir que o sustento da família não provinha exclusivamente da renda do marido obtida na fábrica de fogões. Com efeito, se observa das notas fiscais de produtor juntadas aos autos, correspondentes a R$ 255,60 e R$ 390,92, que os ganhos provenientes da comercialização de leite pela demandante eram importantes para a subsistência do grupo familiar, não podendo ser desprezados.
Por fim, é de referir-se que o fato de constar das notas de produtor rural não só o nome da demandante, mas também de seu marido, tampouco afasta a condição de trabalhadora rural individual da requerente, pois é comum que seja apareça o nome do cabeça do casal, mesmo quando o cônjuge varão dedica-se à atividade urbana.
Destarte, da análise do conjunto probatório, conclui-se que não merece reforma a sentença que reconheceu o direito da demandante ao benefício postulado, pois os documentos juntados constituem, efetivamente, o início razoável de prova material exigido pela legislação previdenciária, tendo sido corroborados pela testemunhal colhida em audiência, a qual forneceu detalhes acerca do exercício da atividade rural pela autora no período que antecedeu o nascimento da filha.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8596637v2 e, se solicitado, do código CRC B4106FC. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
Data e Hora: | 26/10/2016 10:51 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/10/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019674-97.2014.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00004267320138160183
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Marcante |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | PATRICIA DE SOUZA LIMA |
ADVOGADO | : | Anderson Manique Barreto |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/10/2016, na seqüência 280, disponibilizada no DE de 03/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8674787v1 e, se solicitado, do código CRC F6C3DAEC. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 25/10/2016 23:59 |