
Apelação Cível Nº 5093567-27.2019.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ERMES FERNANDO COSTA RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: ANDRÉ LUÍS SOARES ABREU (OAB RS073190)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação, em ação ajuizada em 04/12/2019, contra sentença proferida em 17/01/2021, que julgou o pleito nos seguintes termos finais:
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de:
a) reconhecer como tempo especial, a ser convertido em tempo comum pelo fator 1,4, os períodos de 17/01/1995 a 31/10/1997, 01/01/1998 a 28/02/1999, 01/09/1999 a 30/04/2000, 01/08/2000 a 30/04/2007 e de 23/10/2014 a 10/09/2018;
b) determinar que o INSS promova a averbação dos períodos acima reconhecidos;
c) condenar o INSS a
c.1) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a contar de 19/06/2018 (DER do NB 192.841.187-5), garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, nos termos do art. 29-C, inc. I, Lei 8.213/91;
c.2) efetuar o pagamento das parcelas vencidas e vincendas, desde 19/06/2018, sendo as vencidas atualizadas monetariamente e com juros de mora, conforme a fundamentação.
Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios do patrono da parte autora, fixados em 10% (dez por cento) do valor das parcelas vencidas até a sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Custas pelo INSS, que é isento do seu pagamento (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96), e sem ressarcimento, dado que não adiantadas, sendo a parte autora beneficiária de gratuidade da justiça.
Sem remessa necessária, tendo em vista que o valor da condenação não ultrapassará mil salários mínimos, conforme preceitua o art. 496 CPC.
Havendo recurso(s) voluntário(s) tempestivo(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões. Acaso suscitadas em contrarrazões as matérias referidas no artigo 1.009, § 1º, do CPC/2015, dê-se vista a(s) parte(s) contrária pelo prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do § 2º do referido dispositivo legal. Juntados os eventuais recursos e as respectivas contrarrazões apresentadas no prazo legal devem ser os autos remetidos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Transcorrido o prazo sem interposição de recursos, certifique-se o trânsito em julgado e, após cumpridas as determinações do julgado, dê-se baixa e arquivem-se.
Publique-se. Intimem-se.
DADOS PARA CUMPRIMENTO
( ) Implantação (X) Concessão ( ) Revisão ( ) Restabelecimento | |
NB | 192.841.187-5 |
Espécie | 42 - Aposentadoria por tempo de contribuição |
DIB | 19/06/2018 |
DIP | Primeiro dia do mês em que transitada em julgado a sentença. |
DCB | Vitalício |
RMI | A apurar *garantida a não incidência de fator previdenciário |
AVERBAÇÃO DE PERÍODOS E/OU SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO | |
Tempo especial | 17/01/1995 a 31/10/1997 01/01/1998 a 28/02/1999 01/09/1999 a 30/04/2000 01/08/2000 a 30/04/2007 23/10/2014 a 10/09/2018 |
Fator de conversão | ( ) 1,2 (X) 1,4 ( ) Não se aplica. |
O juízo a quo determinou a aplicação da correção monetária e dos juros de mora, nos seguintes termos:
Em face do que foi decidido pelo STF (ADIs 4.357 e 4.425) e pelo STJ (recurso repetitivo REsp 1.495.146), deve-se adotar os seguintes parâmetros:
* correção monetária: IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94; INPC a partir de 04/2006 (conforme a Lei n.º 10.741/03, combinada com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A na Lei n.º 8.213/91), sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03 determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso. Tratando-se de benefício assistencial, deve ser utilizado o IPCA-E.
* juros de mora: contados a partir da citação (Súmula 204 do STJ), são devidos no percentual de 1% (um por cento) ao mês, até 29/06/2009; e 0,5% ao mês, nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 (cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810, no RE 870.947), no período de julho/2009 a abril/2012, a partir de quando passam a seguir o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ou seja, 0,5% ao mês, enquanto a taxa SELIC seja superior a 8,5% ao ano, ou 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos (MP n. 567/2012, convertida na Lei n. 12.703/2012).
Na apelação (Evento 38), o INSS, representado pelo membro da Advocacia-Geral da União, apontou que o STJ já havia definido a possibilidade de enquadramento como atividade especial do agente nocivo eletricidade, todavia, de qualquer forma, destacou sustentou a necessidade da comprovação do contato habitual e permanente com o agente nocivo. Ressaltou que a Constituição Federal não abarca a periculosidade como agente caracterizador da especialidade das atividades, conforme o disposto no art. 201 e § 1º. Frisou a necessidade de custeio da atividade especial. Requereu a reforma da sentença, vez que restou considerado como especial período laborado em voltagem superior a 250 volts, sem o contato habitual e permanente com o agente nocivo. Em caso de manutenção da condenação, a aplicação da prescrição quinquenal.
Apresentadas contrarrazões (Evento 41).
No Evento 2, o autor requereu prioridade de tramitação do feito, porquanto acometido de doenças. Acostou atestado médico e receitas. Ao final, postulou a concessão de tutela específica, com a determinação de implantação do benefício.
É o relatório.
VOTO
Sentença não sujeita ao reexame necessário.
MÉRITO
Os pontos controvertidos no plano recursal restringem-se:
- à necessidade da comprovação do contato habitual e permanente com o agente nocivo eletricidade; ao fato de que Constituição Federal não abarca a periculosidade como agente caracterizador da especialidade das atividades, conforme o disposto no art. 201 e § 1º; à necessidade de custeio da atividade especial; ao afastamento do reconhecimento da atividade especial; e, em caso de manutenção da sentença, a aplicação da prescrição quinquenal.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
Segundo orientação adotada pela Terceira Seção do STJ, o tempo de serviço especial disciplina-se pela lei vigente à época em que exercido o labor, passando a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador como direito adquirido (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003).
Portanto, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova e, ante a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, torna-se necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto. Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações, e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou mesmo quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente por referência no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, passou a ser necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) após 06/03/1997, a partir da vigência do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Tal interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Eletricidade
Em se tratando de eletricidade (atividade periculosa), é ínsito o risco potencial de acidente, não se exigindo a exposição permanente. (TRF4, EINF nº 2007.70.05.004151-1, 3ª Seção, Rel. Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 11/05/2011)
A despeito da ausência de previsão expressa pelos Decretos nº 2.172/97 e 3.048/99, é possível o reconhecimento da especialidade do labor desenvolvido com exposição à eletricidade média superior a 250 volts após 05/03/1997, com fundamento na Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos e na Lei nº 7.369/85, regulamentada pelo Decreto nº 93.412/96. (TRF4, EINF n.º 2007.70.00.023958-3, 3ª Seção, Rel. Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 15/12/2010; STJ, EDcl no AgRg no REsp 1119586/RS, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 21/11/2011).
Intermitência na exposição aos agentes nocivos
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. A jurisprudência desta Corte volta-se à interpretação no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, Relator Rogerio Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Equipamento de Proteção Individual - EPI
Primeiramente, é importante pontuar que a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da entrada em vigor da MP n.º 1.729/98, convertida na Lei 9.732/1998, através da qual passou a existir a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso.
Quanto à matéria relativa ao uso de EPI, o Colendo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (ARE 664335, Relator Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, Acórdão Eletrônico DJE-029 Divulgação 11/02/2015 Publicação 12/02/2015), firmou as seguintes teses:
1 - o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;
2 - na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Como se vê, considerado o período a partir de 03 de dezembro de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade, em decorrência do uso de EPIs, é admissível desde que haja prova hábil afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou.
O questionamento sobre a suficiência do mero preenchimento dos campos específicos, no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?" para a caracterização da especialidade ou não da atividade, provocou a discussão estabelecida no IRDR 15, na 3ª Seção desta Corte, o qual teve o mérito julgado em sessão de 22/11/2017. No entanto, as teses nele firmadas não são aplicáveis de imediato, tendo em conta a interposição de recursos excepcionais contra o acórdão nele proferido, de acordo com o disposto nos artigos 982, § 5º e 987, § 1º, do NCPC.
Portanto, todos os aspectos supramencionados devem ser observados para avaliação da eficácia da utilização dos EPIs na elisão dos efeitos danosos dos agentes nocivos para a caracterização ou não do tempo especial.
Do Perfil Profissiográfico Previdenciário
Para validade da utilização do formulário Perfil Profissiográfico Previdenciário, este deve ter sido produzido com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, o qual deve figurar como responsável técnico. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que presume-se, ainda que de forma relativa, que o referido documento guarda fidelidade em relação às informações extraídas do laudo técnico (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0010952-16.2010.404.9999, 6ª Turma, Rel. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, D.E. 27/05/2011; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017107-59.2015.4.04.9999, 5ª Turma, Rel. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR UNANIMIDADE, D.E. 22/06/2017).
Da contemporaneidade do laudo técnico
Cumpre referir que a extemporaneidade do laudo técnico em relação ao período cuja especialidade o segurado pretende ver reconhecida não impede o enquadramento da atividade como especial, conforme se depreende do seguinte aresto:
"PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. EC 20/98. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO. LEI N. 9.711/98. DECRETO N. 3.048/99. LAUDO CONTEMPORÂNEO. DESNECESSIDADE. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HONORÁRIOS PERICIAIS. OMISSÃO SUPRIDA. MARCO INICIAL DO BENEFÍCIO.
1 a 4. Omissis. 5. O fato de o laudo pericial não ser contemporâneo ao exercício das atividades laborativas não é óbice ao reconhecimento do tempo de serviço especial, visto que, se em data posterior ao labor despendido, foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, reputa-se que, à época do labor, a agressão dos agentes era igual, ou até maior, dada a escassez de recursos materiais existentes para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho das tarefas. 6 a 12. Omissis. (TRF4, AC n.º 2003.04.01057335-6, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E de 02.05.2007)."
Assim, ainda que o LTCAT tenha sido elaborado após a efetiva prestação dos serviços, não havendo prova de alteração do layout da empresa desde o início da prestação dos serviços, não há óbice na sua utilização como prova da especialidade das atividades, uma vez que não há razão para se deduzir que as agressões ao trabalhador fossem menores ou inexistissem em época anterior, até porque a evolução tecnológica e da segurança do trabalho tendem a causar a redução e não o aumento da nocividade com o passar dos anos.
Da fonte de custeio
É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entende devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.
De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio(CF/88, art. 195, §5º).
Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Compulsando os presentes autos, tenho que a sentença do MM. Juízo "a quo" deu adequada solução à lide, merecendo ser mantida pelos seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, verbis:
Dos períodos pretendidos nestes autos
Prossigo ao exame das condições em que se deu o labor, a fim de verificar a ocorrência de atividades especiais. Analiso, a seguir, as provas produzidas e apresento as respectivas conclusões para cada período de trabalho requerido:
Período: 17/01/1995 a 31/10/1997, 01/01/1998 a 28/02/1999, 01/09/1999 a 30/04/2000, 01/08/2000 a 30/04/2007 e de 23/10/2014 a 10/09/2018
Empregador: Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica – CEEE-D
Provas: PPP (Evento 1, PPP9); Laudos por similaridade (Evento 1, LAUDO 10 e LAUDO11; Evento 13, LAUDPERI3 e LAUDPERI4)
Cargo/Setor/Atividades:
Agentes nocivos indicados nas provas:
Enquadramento legal:
- eletricidade: até 05/03/1997, havia enquadramento no código 1.1.8 do Decreto 53.831/64 (sujeição a tensões elétricas acima de 250 volts); possível, ainda, o enquadramento posterior a 05/03/1997, conforme decidido pelo STJ no julgamento no Tema n. 534 (trânsito em julgado em 26/06/2013): "É cabível o enquadramento como atividade especial do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, exercido após a vigência do Decreto nº 2.172/1997, para fins de aposentadoria especial, desde que a atividade exercida esteja devidamente comprovada pela exposição aos fatores de risco de modo permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais".
Exame de mérito:
Pelo reconhecimento da especialidade de todos os períodos em análise, em razão da comprovada periculosidade do labor (risco de choque elétrico decorrente do labor habitual com exposição a tensão elétrica superior a 250 volts).
A permanência da exposição aos fatores de risco somente passou a ser exigida para fim de enquadramento do labor como especial a contar da Lei n. 9.032/95, bastando, antes disso, que o contato fosse habitual e intermitente.
Não obstante, tratando-se de periculosidade decorrente do risco de contato com altas tensões, conclui-se pela permanência do perigo potencial ínsito à atividade, o qual é passível de concretização a qualquer momento.
A neutralização por EPI somente pode ser considerada para labor desempenhado a partir da Lei n. 9.732/98 (datada de 11/12/1998), que alterou o §2º do artigo 58 da Lei 8.213/91.
Além disso, nos termos do Voto Divergente condutor do Acórdão proferido pelo TRF4 no IRDR Tema 15, não há EPI eficaz para elidir a prejudicialidade causada pelo contato com agentes agentes periculosos.
Conclusão: período especial reconhecido nos intervalos de 17/01/1995 a 31/10/1997, 01/01/1998 a 28/02/1999, 01/09/1999 a 30/04/2000, 01/08/2000 a 30/04/2007 e de 23/10/2014 a 10/09/2018.
Portanto, cabível o reconhecimento da natureza especial dos períodos de 17/01/1995 a 31/10/1997, 01/01/1998 a 28/02/1999, 01/09/1999 a 30/04/2000, 01/08/2000 a 30/04/2007 e de 23/10/2014 a 10/09/2018, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Da Prescrição
São atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação, conforme os termos do parágrafo único do art. 103 da Lei nº 8.213/1991 e da Súmula 85/STJ.
Considerando que a DER da parte autora é de 19/06/2018 e que a presente ação foi ajuizada em 04/12/2019, não há prescrição a ser reconhecida no presente caso.
Correção monetária
Já fixada conforme entendimento da Turma (INPC).
Juros de mora
A partir de 30/06/2009, os juros incidem, de uma só vez, a contar da citação, de acordo com os juros aplicáveis à caderneta de poupança, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997.
Majoração dos honorários de sucumbência
Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo negado provimento ao recurso do INSS, mas alterados de ofício os consectários, majoro os honorários fixados na sentença em favor do patrono da parte autora em 10%, observados os limites das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85, tendo em vista o entendimento da Turma para o caso de apelação somente em consectários.
Não se desconhece a afetação pelo STJ do Tema 1059 - (Im) Possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte ou quando o Tribunal nega o recurso do INSS, mas altera de ofício a sentença apenas em relação aos consectários da condenação. Todavia, tenho que, em se tratando de questão acessória, e a fim de se evitar o sobrestamento do feito ainda na fase de conhecimento, caso o entendimento do Tribunal Superior venha a ser pela possibilidade de majoração, resta desde já fixado o percentual a ser utilizado, de forma a ser possível a futura execução do julgado no que diz respeito à majoração da verba honorária, cujo cumprimento fica diferido para o juízo da execução.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Prequestionamento
No que concerne ao prequestionamento, observe-se que, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Conclusão
Negado provimento à apelação.
Fixar, de ofício, a aplicação dos juros de mora, conforme fundamentação.
Majoração da verba honorária, se for o caso, o que será verificado por ocasião da execução do julgado, nos termos da fundamentação.
Determinada a imediata implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e por fixar, de ofício, a aplicação dos juros de mora, determinando a imediata implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5093567-27.2019.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ERMES FERNANDO COSTA RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: ANDRÉ LUÍS SOARES ABREU (OAB RS073190)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTE NOCIVO ELETRICIDADE. juros de mora. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.
2. A despeito da ausência de previsão expressa pelos Decretos nº 2.172/97 e 3.048/99, é possível o reconhecimento da especialidade do labor desenvolvido com exposição à eletricidade média superior a 250 volts após 05/03/1997, com fundamento na Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos e na Lei n.º 7.369/85, regulamentada pelo Decreto nº 93.412/96. (TRF4, EINF n.º 2007.70.00.023958-3, 3ª Seção, Rel. Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 15/12/2010; STJ, EDcl no AgRg no REsp 1119586/RS, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 21/11/2011).
3. A partir de 30/06/2009, os juros incidem, de uma só vez, a contar da citação, de acordo com os juros aplicáveis à caderneta de poupança, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997.
4. Determinada a imediata implantação do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e fixar, de ofício, a aplicação dos juros de mora, determinando a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002487147v3 e do código CRC de7613db.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 04/05/2021 A 11/05/2021
Apelação Cível Nº 5093567-27.2019.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ERMES FERNANDO COSTA RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: ANDRÉ LUÍS SOARES ABREU (OAB RS073190)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/05/2021, às 00:00, a 11/05/2021, às 14:00, na sequência 74, disponibilizada no DE de 23/04/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E FIXAR, DE OFÍCIO, A APLICAÇÃO DOS JUROS DE MORA, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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