
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000763-16.2022.4.03.6113
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: HAROLDO FERNANDO BUCIOLI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N, HELEN AGDA ROCHA DE MORAIS GUIRAL - SP243929-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, HAROLDO FERNANDO BUCIOLI
Advogados do(a) APELADO: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N, HELEN AGDA ROCHA DE MORAIS GUIRAL - SP243929-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000763-16.2022.4.03.6113
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: HAROLDO FERNANDO BUCIOLI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação proposta por Haroldo Fernando Bucioli em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pelo qual almeja a concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição.
Sentença pela parcial procedência do pedido.
Apelação interposta pela parte autora.
Decisão proferida no âmbito deste E. Tribunal anulou a sentença, por cerceamento ao direito de defesa do demandante, em razão da não produção de adequada prova pericial relativamente a todos os períodos em que supostamente executou atividades especiais.
Laudo pericial anexado aos autos.
O pedido foi julgado parcialmente procedente, para declarar como especial o período de 14.03.1989 a 31.01.1995.
Opostos embargos de declaração, estes foram rejeitados.
Apelação interposta pela parte autora, na qual pugna pela nulidade da sentença, por cerceamento ao seu direito de produzir provas necessárias à comprovação do direito alegado. No mérito, afirma ter comprovado o exercício de labor especial no período de 01.11.1996 a 06.11.1998. Requer, por fim, a concessão da aposentadoria.
Apelação interposta pelo INSS, por sua vez, tenciona afasta o reconhecimento da especialidade do período de 14.03.1989 a 31.01.1995.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000763-16.2022.4.03.6113
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: HAROLDO FERNANDO BUCIOLI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N, HELEN AGDA ROCHA DE MORAIS GUIRAL - SP243929-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, HAROLDO FERNANDO BUCIOLI
Advogados do(a) APELADO: EDNEI MARCOS ROCHA DE MORAIS - SP149014-N, HELEN AGDA ROCHA DE MORAIS GUIRAL - SP243929-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 24.02.1974, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 14.03.1989 a 31.01.1995, 11.11.1996 a 31.05.1997, 01.06.1997 a 30.04.1998, 01.05.1998 a 06.11.1998, 05.04.199 a 23.11.1999, 08.05.2000 a 06.12.2000, 02.05.2001 a 19.12.2005, 23.03.2006 a 14.12.2006, 17.04.2007 a 11.12.2007, 15.02.2008 a 07.04.2008, 12.05.2008 a 09.08.2008, 01.09.2009 a 11.02.2010, 29.03.2010 a 10.12.2010, 09.03.2011 a 13.12.2011, 04.01.2012 a 27.07.2012, 19.09.2012 a 16.08.2014, 06.01.2015 a 24.01.2020, 25.01.2020 a 17.12.2020 e 08.01.2021 a 10.09.2021, e a concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (DER 22.12.2020).
Da perícia.
Inicialmente, merece ser afastada a preliminar de nulidade da perícia realizada. Cabe destacar que a prova produzida foi suficientemente elucidativa, não merecendo qualquer complementação ou reparos a fim de reabrir questionamentos, os quais foram oportunizados e realizados em consonância com os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Do mérito.
Para melhor elucidação da controvérsia colocada em Juízo, cumpre distinguir a aposentadoria especial prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois enquanto a aposentadoria especial pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, e, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da E.C. nº 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, assim como não se submete ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição há tanto o exercício de atividade especial como o exercício de atividade comum, sendo que o período de atividade especial sofre a conversão em atividade comum aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da E.C. nº 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que (...) Art. 58. A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...).
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, o dispositivo legal acima mencionado teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
"Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
§ 2º Deverão constar do laudo técnico referido no parágrafo anterior informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador, e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica deste documento (...)".
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico.
No mesmo sentido:
"PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM - POSSIBILIDADE - LEI 8.213/91 - LEI 9.032/95 - LAUDO PERICIAL INEXIGÍVEL - LEI 9.528/97.
(...)
- A Lei nº 9.032/95 que deu nova redação ao art. 57 da Lei 8.213/91 acrescentando seu § 5º, permitiu a conversão do tempo de serviço especial em comum para efeito de aposentadoria especial. Em se tratando de atividade que expõe o obreiro a agentes agressivos, o tempo de serviço trabalhado pode ser convertido em tempo especial, para fins previdenciários.
- A necessidade de comprovação da atividade insalubre através de laudo pericial, foi exigida após o advento da Lei 9.528, de 10.12.97, que convalidando os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.96, alterou o § 1º, do art. 58, da Lei 8.213/91, passando a exigir a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário, na forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Tendo a mencionada lei caráter restritivo ao exercício do direito, não pode ser aplicada à situações pretéritas, portanto no caso em exame, como a atividade especial foi exercida anteriormente, ou seja, de 17.11.75 a 19.11.82, não está sujeita à restrição legal.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido, mas desprovido (...)". (STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482).
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. DESAFETAÇÃO DO PRESENTE CASO. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
1. Considerando que o Recurso especial 1.398.260/PR apresenta fundamentos suficientes para figurar como representativo da presente controvérsia, este recurso deixa de se submeter ao rito do art.543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.
2. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
3. O limite de tolerância para configuração da especial idade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ.
4. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço especial implica indeferimento do pedido de aposentadoria especial por falta de tempo de serviço.
5. Recurso especial provido (...)". (REsp 1401619/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 8.213/91 (incluído pela Lei n. 9.528/97), é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente que a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, a controvérsia se limita à natureza dos trabalhos exercidos pelo autor nos períodos de 14.03.1989 a 31.01.1995, 11.11.1996 a 31.05.1997, 01.06.1997 a 30.04.1998, 01.05.1998 a 06.11.1998, 05.04.1999 a 23.11.1999, 08.05.2000 a 06.12.2000, 02.05.2001 a 19.12.2005, 23.03.2006 a 14.12.2006, 17.04.2007 a 11.12.2007, 15.02.2008 a 07.04.2008, 12.05.2008 a 09.08.2008, 01.09.2009 a 11.02.2010, 29.03.2010 a 10.12.2010, 09.03.2011 a 13.12.2011, 04.01.2012 a 27.07.2012, 19.09.2012 a 16.08.2014, 06.01.2015 a 24.01.2020, 25.01.2020 a 17.12.2020 e 08.01.2021 a 10.09.2021.
Pois bem.
Em relação ao período de 14.03.1989 a 31.01.1995, conforme consta de cópia da CTPS (ID 274340731 – pág. 3), a parte autora exerceu atividade em estabelecimento do setor agropecuário, razão por que o trabalho deve ser enquadrado como especial, nos termos do código 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64.
No tocante aos intervalos de 11.11.1996 a 31.05.1997, 01.06.1997 a 30.04.1998 e 01.05.1998 a 06.11.1998, verifico que o demandante esteve exposto a ruídos acima dos limites legalmente admitidos, conforme PPP anexado aos autos (ID 274340737), motivo por que deve ter a especialidade reconhecida, na forma do código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79 e código 2.0.1 dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99.
Ressalta-se que o C. STJ, no tocante à metodologia adequada para aferição do agente ruído, ao julgar os recursos especiais representativos de controvérsia nºs 1.886.795/RS e 1.890.010/RS, fixou a seguinte tese (TEMA 1.083):
“O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.”.
A fim de melhor visualização da tese definida, colaciono abaixo a ementa do voto proferido pelo Relator, Ministro GURGEL DE FARIA:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. NÍVEL DE INTENSIDADE VARIÁVEL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. METODOLOGIA DO NÍVEL DE EXPOSIÇÃO NORMALIZADO – NEN. REGRA. CRITÉRIO DO NÍVEL MÁXIMO DE RUÍDO (PICO DE RUÍDO). AUSÊNCIA DO NEN. ADOÇÃO.
1. A Lei de Benefícios da Previdência Social, em seu art. 57, § 3º, disciplina que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência, ao segurado que comprovar tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado em lei, sendo certo que a exigência legal de habitualidade e permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho.
2. A questão central objeto deste recurso versa acerca da possibilidade de reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, considerando-se apenas o nível máximo aferido (critério "pico de ruído"), a média aritmética simples ou o Nível de Exposição Normalizado (NEN).
3. A Lei n. 8.213/1991, no § 1º do art. 58, estabelece que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por formulário com base em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT nos termos da legislação trabalhista.
4. A partir do Decreto n. 4.882/2003, é que se tornou exigível, no LTCAT e no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a referência ao critério Nível de Exposição Normalizado – NEN (também chamado de média ponderada) em nível superior à pressão sonora de 85 dB, a fim de permitir que a atividade seja computada como especial.
5. Para os períodos de tempo de serviço especial anteriores à edição do referido Decreto, que alterou o Regulamento da Previdência Social, não há que se requerer a demonstração do NEN, visto que a comprovação do tempo de serviço especial deve observar o regramento legal em vigor por ocasião do desempenho das atividades.
6. Descabe aferir a especialidade do labor mediante adoção do cálculo pela média aritmética simples dos diferentes níveis de pressão sonora, pois esse critério não leva em consideração o tempo de exposição ao agente nocivo durante a jornada de trabalho.
7. Se a atividade especial somente for reconhecida na via judicial, e não houver indicação do NEN no PPP, ou no LTCAT, caberá ao julgador solver a controvérsia com base na perícia técnica realizada em juízo, conforme disposto no art. 369 do CPC/2015 e na jurisprudência pátria, consolidada na Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos, observado o critério do pico de ruído.
8. Para os fins do art. 1.039, CPC/2015, firma-se a seguinte tese: "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço."
9. In casu, o acórdão do Tribunal de origem manteve a sentença que concedeu ao segurado a aposentadoria especial, consignando ser possível o reconhecimento do labor especial por exposição a ruído variável baseado nos picos de maior intensidade, quando não houver informação da média de ruído apurada segundo a metodologia da FUNDACENTRO, motivo pelo qual merece ser mantido.
10. Recurso da autarquia desprovido.”.
(STJ – Primeira Seção – REsp nº 1.886.795/RS, julgado em 18.11.2021, com publicação do acórdão em 25.11.2021).
Em resumo, decidiu o C. STJ não haver imposição normativa de técnica específica para medição da intensidade de ruído antes de 18.11.2003, quando foi editado o Decreto nº 4.882/2003. A partir de tal data, contudo, passou-se a exigir que o ruído fosse aferido pelo Nível de Exposição Normalizado (NEN). Todavia, no caso de inexistir no PPP ou no LTCAT, após 18.11.2003, a indicação do nível de ruído, pela técnica adequada, deverá ser produzida prova pericial, aplicando o perito do juízo critério diverso, qual seja, o pico de ruído.
Por fim, a parte autora não comprovou o exercício de atividades especiais nos períodos de 05.04.1999 a 23.11.1999, 08.05.2000 a 06.12.2000, 02.05.2001 a 19.12.2005, 23.03.2006 a 14.12.2006, 17.04.2007 a 11.12.2007, 15.02.2008 a 07.04.2008, 12.05.2008 a 09.08.2008, 01.09.2009 a 11.02.2010, 29.03.2010 a 10.12.2010, 09.03.2011 a 13.12.2011, 04.01.2012 a 27.07.2012, 19.09.2012 a 16.08.2014, 06.01.2015 a 24.01.2020, 25.01.2020 a 17.12.2020 e 08.01.2021 a 10.09.2021, conforme laudo pericial, tendo em vista que ficou exposta a intensidade de ruídos e vibração de corpo inteiro abaixo dos limites legalmente permitidos.
Somados os períodos especiais, o autor totalizou 07 (sete) anos, 10 (dez) meses e 14 (quatorze) dias de labor, insuficientes para a concessão da aposentadoria especial.
Por sua vez, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totalizou a parte autora 28 (vinte e oito) anos e 16 (dezesseis) dias de tempo de contribuição até 13.11.2019, data de início de vigência da EC nº 103/2019, e 29 (vinte e nove) anos e 19 (dezenove) dias, até a data do requerimento administrativo (DER 24.12.2020), também insuficiente para a concessão do benefício pleiteado.
Finalmente, no caso em tela, mostra-se impossível a reafirmação da DER para a concessão de aposentadoria, em razão da ausência de tempo contributivo necessário.
Tendo em vista a sucumbência recíproca, condeno o INSS e a parte autora em honorários advocatícios no importe de 10% do valor da causa, observada, quanto à segunda, a condição de beneficiária da Justiça Gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei 13.105/15).
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS, e dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do período de 11.11.1996 a 06.11.1998, tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA ESPECIAL DAS ATIVIDADES LABORADAS PARCIALMENTE COMPROVADA. TRABALHO EM SETOR AGROPECUÁRIO. ENQUADRAMENTO NORMATIVO. AGENTES FÍSICOS. RUÍDOS. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO INSUFCIIENTE. BENEFÍCIO INDEVIDO.
1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048/99). E a aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.
2. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
3. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
4. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
5. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
6. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes agressores à saúde, em níveis superiores aos permitidos em lei.
7. Em relação ao período de 14.03.1989 a 31.01.1995, conforme consta de cópia da CTPS, a parte autora exerceu atividade em estabelecimento do setor agropecuário, razão por que o trabalho deve ser enquadrado como especial, nos termos do código 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64. No tocante aos intervalos de 11.11.1996 a 31.05.1997, 01.06.1997 a 30.04.1998 e 01.05.1998 a 06.11.1998, verifica-se que o demandante esteve exposto a ruídos acima dos limites legalmente admitidos, conforme PPP anexado aos autos, motivo por que deve ter a especialidade reconhecida, na forma do código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79 e código 2.0.1 dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99. Por fim, a parte autora não comprovou o exercício de atividades especiais nos períodos de 05.04.1999 a 23.11.1999, 08.05.2000 a 06.12.2000, 02.05.2001 a 19.12.2005, 23.03.2006 a 14.12.2006, 17.04.2007 a 11.12.2007, 15.02.2008 a 07.04.2008, 12.05.2008 a 09.08.2008, 01.09.2009 a 11.02.2010, 29.03.2010 a 10.12.2010, 09.03.2011 a 13.12.2011, 04.01.2012 a 27.07.2012, 19.09.2012 a 16.08.2014, 06.01.2015 a 24.01.2020, 25.01.2020 a 17.12.2020 e 08.01.2021 a 10.09.2021, conforme laudo pericial, tendo em vista que ficou exposta a intensidade de ruídos e vibração de corpo inteiro abaixo dos limites legalmente permitidos.
8. Somados os períodos especiais, o autor totalizou 07 (sete) anos, 10 (dez) meses e 14 (quatorze) dias de labor, insuficientes para a concessão da aposentadoria especial. Por sua vez, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totalizou a parte autora 28 (vinte e oito) anos e 16 (dezesseis) dias de tempo de contribuição até 13.11.2019, data de início de vigência da EC nº 103/2019, e 29 (vinte e nove) anos e 19 (dezenove) dias, até a data do requerimento administrativo (DER 24.12.2020), também insuficiente para a concessão do benefício pleiteado.
9. Finalmente, no caso em tela, mostra-se impossível a reafirmação da DER para a concessão de aposentadoria, em razão da ausência de tempo contributivo necessário.
10. Tendo em vista a sucumbência recíproca, condeno o INSS e a parte autora em honorários advocatícios no importe de 10% do valor da causa, observada, quanto à segunda, a condição de beneficiária da Justiça Gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei 13.105/15).
11. Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
