
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5097826-52.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: JOSE MARCELINO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE MORAES DA SILVEIRA - SP230274-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5097826-52.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: JOSE MARCELINO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE MORAES DA SILVEIRA - SP230274-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o reconhecimento de atividade rural e especial e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou o pedido, nos seguintes termos:
“Ante o exposto, JULGO EXTINTO O FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do art. 485, VI e V do CPC, em relação ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 10/02/1994 até 30/06/1999 e pedido de reconhecimento do tempo de serviço rural.
Ainda, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de reconhecimento do período especial e aposentadoria por tempo de contribuição deduzido por JOSÉ MARCELINO DOS SANTOS em face do INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL INSS.
Ante a sucumbência, condeno o autor ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em importância equivalente a 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos moldes do artigo 85, § 3º, I, do NCPC, devendo ser observado o disposto no artigo 98, § 3º, NCPC. (...).” (ID n. 304667959)
De se destacar que o pedido para reconhecimento como rural, dos períodos de 27/04/1974 a 20/05/1981, de 17/07/1981 a 19/10/1984 e de 08/10/1987 a 30/09/1989, conforme se depreende da fundamentação do decisum, foi extinto sem julgamento de mérito, assim como o reconhecimento como especial do interregno de 10/02/1994 a 30/06/1999.
A parte autora opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados.
Inconformado, apela o requerente sustentando a ausência de litispendência e que faz jus ao reconhecimento do tempo rural (27/04/1974 a 20/05/1981, de 17/07/1981 a 19/10/1984 e de 08/10/1987 a 30/09/1989) e especial (10/02/1994 a 30/06/1999, de 06/03/1991 a 05/05/1991 e de 01/03/1993 até o final do ano de 2004, data da desativação da Lagoa de Tratamento), além da concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER. Pede a antecipação dos efeitos da tutela (ID n. 304667976).
É o relatório.
SM
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5097826-52.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: JOSE MARCELINO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE MORAES DA SILVEIRA - SP230274-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA
A teor do disposto no art. 485, V, do Código de Processo Civil/2015, caracterizada a perempção, litispendência ou coisa julgada, o processo será extinto sem julgamento do mérito, independentemente de arguição da parte interessada, uma vez que a matéria em questão pode e deve ser conhecida de ofício pelo Juiz, em qualquer tempo e grau de jurisdição (§ 3º).
Nos termos do art. 337, §4º, o mesmo código, considera-se efeito da litispendência a impossibilidade de repropositura de um mesmo pleito, ou seja, veda-se o curso simultâneo de duas ou mais ações judiciais iguais, em que há a identidade das partes, do objeto e da causa de pedir, tanto próxima quanto remota. A rigor, a litispendência propriamente dita nada mais é do que uma ação pendente que se mantém até o trânsito em julgado da sentença de mérito.
Igualmente, a coisa julgada material impede o ajuizamento de demanda idêntica à anterior, com fundamento no já citado inciso V do art. 485, entendendo-se como tal, de acordo com o art. 502, a eficácia "que torna imutável e indiscutível decisão de mérito não mais sujeita a recurso".
Assente a identidade de ação entre o atual processo e o anterior, imperativa a extinção sem resolução do mérito ante a presença de pressuposto processual negativo. Nesse sentido, já houve pronunciamento desta E. Turma em feito de minha Relatoria:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COISA JULGADA.
- A presente ação já foi apreciada em outro processo com resolução de mérito, tendo transitado em julgado a decisão em 12 de agosto de 2011. Presente a coisa julgada.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal, nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015 (TRF3, Nona Turma, Rel. Des. Fer. Gilberto Jordan, AC 0033740-07.2017.4.03.9999, v.u., j. e, 24.01.18, DJe 08.02.18).
No caso dos autos, verifica-se que o requerente ingressou com as seguintes ações:
- 5097826-52.2024.4.03.9999 – demanda atual; Pedido: reconhecimento de atividade rural e especial e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
- 1000457-19.2018.8.26.0411 – demanda anterior em que objetivava a concessão de aposentadoria por idade rural ou híbrida.
Sendo assim, tratando-se de pedidos de concessão de benefícios diversos, com causas de pedir também distintas, não há que se falar em identidade de ações (art. 337, § 2º, do CPC), ou seja, inexistente litispendência ou coisa julgada, razão pela qual de rigor o reconhecimento do interesse de agir na presente demanda.
Vale mencionar que na demanda anteriormente proposta (1000457-19.2018.8.26.0411), na qual pugnou pela concessão de aposentadoria por idade, a parte autora formulou pedido de desistência da ação, posteriormente à citação do INSS, o qual foi homologado pelo MM. Juiz a quo, com a consequente extinção do processo sem julgamento do mérito.
Contra tal decisão a autarquia previdenciária interpôs apelação (5528863-08.2019.4.03.9999) e, após o seu não provimento por decisão monocrática, interpôs agravo interno que foi improvido e, ao final, houve a oposição dos embargos de declaração os quais foram rejeitados. Nota-se que consta a certidão de trânsito em julgado.
Por certo, tendo em vista que o processo se encontra em condições de imediato julgamento, passo à apreciação do meritum causae, com fundamento no artigo 1.013, § 3º da Lei nº 13.105, de 16.03.2015, in verbis: "Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. (...) § 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485;”
ILEGITIMIDADE DO INSS AFASTADA
De se observar que na r. sentença foi julgado extinto sem julgamento de mérito, o pedido de reconhecimento do tempo especial de 10/02/1994 a 30/06/1999, no entanto, foi carreada a certidão de tempo de contribuição, expedida pelo Regime Próprio de Previdência Social, em que consta o reconhecimento do período como especial.
Nesse contexto, o INSS é parte legítima para examinar o reconhecimento desse lapso, para fins de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social, sendo assim, afasto a extinção sem julgamento de mérito e, considerando-se que o processo se encontra em condições de imediato julgamento, passo a análise do mérito.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº 8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
2. DA ATIVIDADE RURAL:
2.1 INTRODUÇÃO
A Lei nº 4.214, de 2 de março de 1963, que dispunha sobre o "Estatuto do Trabalhador Rural", já considerava como segurado obrigatório o trabalhador rural, inclusive os pequenos produtores, conforme art. 160, in verbis:
"Art. 160. São obrigatoriamente, segurados: os trabalhadores rurais, os colonos ou parceiros, bem como os pequenos proprietários rurais, empreiteiros, tarefeiros e as pessoas físicas que explorem as atividades previstas no art. 30 desta lei, estes com menos de cinco empregados a seu serviço".
A Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, tanto na redação original, como após a alteração introduzida pela Lei Complementar nº 16, de 30 de outubro de 1.973, manteve sob a responsabilidade do produtor o recolhimento de contribuição para o custeio do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRO-RURAL).
É o que dispunha o seu art. 15, a saber:
"Art. 15. Os recursos para o custeio do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural provirão das seguintes fontes:
I - da contribuição de 2% (dois por cento) devida pelo produtor, sobre o valor comercial dos produtos rurais, e recolhida:
a) pelo adquirente, consignatário ou cooperativa que ficam sub-rogados, para esse fim, em todas as obrigações do produtor;
b) pelo produtor, quando ele próprio industrializar seus produtos ou vendê-los, no varejo, diretamente ao consumidor pelo produtor, quando ele próprio industrializar seus produtos, vendê-los ao consumidor, no varejo, ou a adquirente domiciliado no exterior" (redação dada pela LC nº 16, de 3/10/73 )".
O reconhecimento ou não do tempo de serviço rural prestado sob o regime de economia familiar ou como diarista/boia-fria, está jungido à lei, razão pela qual, ab initio, transcrevo o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91:
"O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§3º: A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
2.2 REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
A Lei nº 8.213/91, ao disciplinar o regime de economia familiar, assinalou que a atividade rural deve ser exercida pelos membros da família em condições de mútua dependência e colaboração, bem como ser indispensável à própria subsistência do núcleo familiar.
Frise-se que o fato da parte autora contar, eventualmente, com o auxílio de terceiros em suas atividades, não descaracteriza o regime de economia familiar, conforme ressalva feita no art. 11, VII, in verbis:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro, e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
§ 1º. Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados."
2.3 DOCUMENTOS PARA A COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURÍCOLA
Observo que o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado, cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
Acerca do tema, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento desta Corte no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais somente fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins colimados, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
2.3.1 INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Outro aspecto relevante diz com a averbação do tempo de serviço requerida por menores de idade, em decorrência da atividade prestada em regime de economia familiar. A esse respeito, o fato da parte autora não apresentar documentos em seu próprio nome que a identifique como lavrador, em época correspondente à parte do período que pretende ver reconhecido, por si só não elide o direito pleiteado, pois é sabido que não se tem registro de qualificação profissional em documentos de menores, que na maioria das vezes se restringem à sua Certidão de Nascimento, especialmente em se tratando de rurícolas. É necessária, contudo, a apresentação de documentos concomitantes, expedidos em nome de pessoas da família, para que a qualificação dos genitores se estenda aos filhos, ainda que não se possa comprovar documentalmente a união de esforços do núcleo familiar à busca da subsistência comum.
Em regra, toda a documentação comprobatória da atividade, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais ou outros membros da família que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos, mormente no presente caso em que não se discute se a parte autora integrava ou não aquele núcleo familiar à época em que o pai exercia o labor rural, o que se presume, pois ainda não havia contraído matrimônio e era, inclusive, menor de idade.
2.3.2 RECONHECIMENTO DE LABOR RURAL ANTERIOR AO DOCUMENTO MAIS ANTIGO (Resp 1.348.633)
No tocante ao critério de fixação do termo inicial para contagem do tempo a ser reconhecido, o recente posicionamento do E. Superior Tribunal de Justiça, em decisão proferida em sede de recurso especial representativo de controvérsia repetitiva (REsp 1.348.633/SP, 1ª Seção, j. 28.08.13), admitiu a possibilidade de reconhecimento de labor rural anterior ao documento mais antigo juntado como prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos.
2.3.3 MENOR DE 12 ANOS
É certo que o regime de repercussão geral, previsto na Emenda Constitucional n. 45/2004 e instituído na legislação processual pela Lei n. 11.418/06, tem por finalidade uniformizar e estabilizar a jurisprudência, de forma sistematizada e de fácil referenciação - mediante a simples citação do julgamento paradigma.
Dessa forma, a jurisprudência uniformizada e estabilizada, anteriormente à instituição do regime de repercussão geral é passível do mesmo tratamento ainda, que não tenha sido objeto de submissão da matéria ao referido regime.
Sob este prisma, saliento ser possível o reconhecimento de tempo de serviço em períodos anteriores à Constituição Federal de 1988, nas situações em que o trabalhador rural tenha iniciado suas atividades antes dos 14 anos. É histórica a vedação constitucional ao trabalho infantil. Em 1967, porém, a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que nossos constituintes viam, àquela época, como realidade incontestável que o menor efetivamente desempenhava a atividade nos campos, ao lado dos pais.
Nesse sentido:
Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.04.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86 5. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(AI 529694, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 15/02/2005, DJ 11-03-2005 PP-00043 EMENT VOL-02183-09 PP-01827 RTJ VOL-00193-01 PP-00417 RDECTRAB v. 12, n. 129, 2005, p. 176-190)
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. COMPROVAÇÃO DO DISSÍDIO.
PROVA DE ATIVIDADE RURÍCOLA EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. MENOR DE 14 ANOS. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. POSSIBILIDADE.
I - Em se tratando de matéria por demais conhecida da Egrégia Seção, dispensáveis se mostram maiores exigências formais na comprovação da divergência, bastando a transcrição de ementas. Precedente.
II - In casu, ao tempo da prestação dos serviços - entre 17.08.68 e 31.12.69 - vigorava o art. 165, inciso X, da CF/67, repetido na E.C.
nº 1/69, que admitia o trabalho do menor a partir dos 12 (doze) anos.
III - Reconhecendo a Lei 8.213/91, art. 55, § 2º, o tempo de serviço rural pretérito, sem contribuição, para efeitos previdenciários - não para contagem recíproca - não podia limitar aos 14 (quatorze) anos, sem ofensa à Norma Maior. É que o tempo de serviço, para fins de aposentadoria, é disciplinado pela lei vigente à época em que efetivamente prestado, passando a integrar, como direito autônomo, o patrimônio jurídico do trabalhador.
IV - Comprovada a atividade rurícola de menor de 14 anos, antes da Lei 8.213/91, impõe-se seu cômputo para fins previdenciários. A proibição do trabalho aos menores de catorze anos foi estabelecida pela Constituição em benefício do menor e não em seu prejuízo.
V - Embargos acolhidos.
(EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221)
Antes dos 12 anos, porém, ainda que o menor acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é crível que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante. Dessa forma, é de se reconhecer o exercício pleno do trabalho rurícola apenas a partir dos 12 anos de idade.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados Especiais Federais, que editou a Súmula nº 5:
"A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (DJ 25.09.2003).
2.4 DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTOS ATÉ 24/07/1991
A teor do § 2º do artigo 55 da Lei n.º 8.213/91, permite-se o cômputo do tempo de serviço do segurado trabalhador rural, independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, somente em relação ao período que antecede a vigência desta Lei, não havendo, entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a 24/07/1991.
Na ausência de comprovação pela parte autora do recolhimento dessas contribuições, a averbação de período reconhecido em período posterior a 24/07/1991 há que ser adstrita à data da edição da reportada Lei.
Nesse sentido, já decidiu esta Egrégia Corte, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. DECLARATÓRIA. RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO PARCIAL DE TEMPO DE SERVIÇO. INEXIGIBILIDADE DA COMPROVAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES.
(...)
5- Inexigível o recolhimento das contribuições previdenciárias do trabalhador rural com relação ao cômputo do tempo de serviço que antecede a 24/07/1991, data da edição da Lei n.º 8.213/91, não havendo, entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a essa data, que deve ser considerada como termo ad quem do período a ser averbado, obrigando sua restrição no caso sob exame. Aplicação do enunciado da Súmula n.º 272 do E. Superior Tribunal de Justiça.
6- Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida".
(TRF3, 9ª Turma, AC 2004.03.99.003417-6, Desembargador Federal Santos Neves, DJU 17/05/2007, p. 598).
Destaco, entretanto, que a obrigação de se efetuar o recolhimento das contribuições previdenciárias ao Instituto Autárquico e promover seu desconto da remuneração do empregado a seu serviço, compete, exclusivamente, ao empregador, por ser este o responsável pelo repasse de tal valor aos cofres da Previdência.
A fiscalização do cumprimento da obrigação previdenciária cabe ao INSS, inclusive, tendo ordenamento jurídico disponibilizado ação própria para haver o seu crédito, a fim de exigir do devedor o cumprimento da legislação.
Na hipótese de diarista/boia-fria, há determinação expressa no art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91, segundo a qual o tempo de serviço do trabalhador rural laborado antes da sua vigência, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para fins de carência.
Em relação ao período em que o segurado laborou em regime de economia familiar, é certo que ao mesmo cabe o dever de recolher as contribuições tão-somente se houver comercializado a produção no exterior ou no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
A pretensão da parte autora, concernente ao mero reconhecimento do tempo de serviço e a respectiva expedição da certidão, independe de indenização relativamente aos períodos que se pretende ver reconhecidos, ainda que para fins de contagem recíproca; contudo, merece destaque a observação trazida pelo eminente Desembargador Federal Sérgio Nascimento, em seu voto-vista desenvolvido por ocasião do sentido de que "a falta de pagamento da indenização em discussão não afasta o direito do autor de que seja expedida certidão que conste a averbação do tempo de serviço rural, reconhecido no presente feito, com a ressalva de que não foi efetuado o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, tampouco o pagamento da indenização de que trata o artigo 96, IV, da Lei n.8.213/91".
Frise-se, ainda, que a contagem recíproca constitui direito do segurado da Previdência Social, tanto para somá-la ao tempo de atividade laborativa exercida unicamente na atividade privada, quanto para acrescentá-la ao tempo em que também trabalhou no setor público.
2.5 DA FONTE DE CUSTEIO
Ressalto que no julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux, a Corte Suprema, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial.
Na ementa daquele julgado constou:
A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição.
Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998.
Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da
Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou evinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra que se deve adotar ao afirmar:
"Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
3. DA CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM
3.1 DO DIREITO À CONVERSÃO ANTES DA LEI 6.887/80 E APÓS A LEI 9.711/98
A teor do julgamento do REsp 1.310.034 e do REsp 1.151.363, ambos submetidos ao regime do art. 543-C do CPC/1973, inexiste óbice para se proceder à conversão de tempo de serviço especial em comum, seja antes da Lei 6.887/80 seja após Lei n. 9.711/1998.
3.2 DO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE EXERCIDA EM ATIVIDADE ESPECIAL
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse intervalo especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
3.2.1 PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95
No período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e à conversão do tempo trabalhado em atividades especiais é reconhecido em razão da categoria profissional exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação de SB 40, sem a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao ruído.
3.2.2 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que as circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo, portanto, imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de tolerância para nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e dos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, em vigor até o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, fora substituído pelo Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é mais possível o reconhecimento da atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
3.2.3 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997 E DEMAIS CONSIDERAÇÕES
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198 de 18/11/2014). Súmula 68 TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades penosas e perigosas não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
3.3 USO DO EPI
Em razão do julgamento do Tema 1090 pelo STJ é importante tecer alguns esclarecimentos sobre a questão atinente ao uso e eficácia de EPI - equipamento de proteção individual para fins de neutralizar o agente insalubre a fim de descaracterizar a natureza especial da atividade exercida pelo empregado.
No que concerne ao uso de EPI, é certo que o STF, no julgamento do ARE 664335 (tema 555), assentou a tese de que o reconhecimento de atividade especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o equipamento de proteção individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento. Além disso, restou assentado que, em relação ao ruído o uso de protetor auricular para reduzir o nível aos limites toleráveis não é eficaz para evitar os outros danos ao organismo.
Sobre a prova da eficácia do EPI o STJ em recente julgamento do Tema 1090 firmou a seguinte tese:
I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor.
DO CASO DOS AUTOS
Nesta seara recursal, cumpre examinar a possibilidade de reconhecimento da atividade rural (27/04/1974 a 20/05/1981, de 17/07/1981 a 19/10/1984 e de 08/10/1987 a 30/09/1989) e especial (10/02/1994 a 30/06/1999, de 06/03/1991 a 05/05/1991 e de 01/03/1993 até o final do ano de 2004) e a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo.
Inicialmente, de se destacar que, de acordo com a certidão de tempo de contribuição (id 304667685) o autor exerceu a função de ajudante geral e que o período de contribuição compreendido na certidão é de 10/02/1994 a 30/06/1999, exercido sob condições especiais (agentes biológicos).
Acrescente-se que a declaração emitida pela Prefeitura Municipal de Pacaembu (id 304667691) informa que o autor prestou serviços nos períodos de 06/03/1991 a 05/05/1991 pelo regime da CLT e a partir de 01/03/1993 até a presente data regida pelo Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais, contribuindo de 06/03/1991 a 05/05/1991, de 01/03/1993 a 09/02/1994 para o INSS e de 10/02/1994 a 30/06/1999 para o FPM (Fundo de Previdência Municipal) e de 01/07/1999 até a presente data para o INSS.
De se observar ainda que, a Autarquia Federal ao analisar os pedidos de concessão de aposentadoria, indeferiu-os, tendo em vista que o autor totalizou apenas 30 anos, 07 meses e 20 dias na DER em 06/07/2020 e 32 anos, 05 meses e 14 dias na DER em 01/05/2022 (id 304667802 – pág. 120).
Passo a análise da questão controvertida.
DA ATIVIDADE ESPECIAL
Inicialmente, de se tecer alguns pontos no que tange à possibilidade de utilização no RGPS do tempo especial exercido e reconhecido em RPPS, devidamente comprovado através de Certidão de Tempo de Contribuição.
Não obstante a existência de precedentes em sentido diverso, entendo que deve ser garantido o direito ao servidor público ver reconhecido o tempo especial e sua conversão em tempo comum no regime próprio e a sua utilização no regime geral, em que pese o disposto no artigo 96, I da Lei 8.213/91 a respeito da contagem recíproca de tempo de serviço ("não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais").
Nesse sentido, extrai-se de tese fixada pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU):
“I - O(A) segurado(a) que trabalhava sob condições especiais e passou, sob qualquer condição, para regime previdenciário diverso, tem direito à expedição de certidão desse tempo identificado como especial, discriminado de data a data, ficando a conversão em comum e a contagem recíproca à critério do regime de destino, nos termos do art. 96, IX, da Lei n.º 8.213/1991; II - Na contagem recíproca entre o Regime Geral da Previdência Social - RGPS e o Regime Próprio da União, é possível a conversão de tempo especial em comum, cumprido até o advento da EC n.º 103/2019.” (Tema 278)
Da fundamentação da decisão que fixou referida tese, consignou-se que:
"(...) a vedação da conversão de tempo especial em comum, na contagem recíproca, vem de longa data, desde o inciso I do art. 4º da Lei n.º 6.226/1975 até o inciso I do art. 96 da Lei n.º 8.213/1991. E isso era perfeitamente legal e constitucional, pois a contagem recíproca exige, como o próprio nome já diz, reciprocidade e bilateralidade entre os diversos regimes de previdência.
Só seria possível ao segurado levar tempo especial do RGPS para RPPS e convertê-lo em tempo comum se, ao mesmo tempo, a recíproca fosse verdadeira. Em outras palavras, enquanto a matéria não fosse regulada no Regime Próprio dos servidores públicos, não havia como viabilizar a contagem recíproca com reconhecimento de tempo especial e conversão em tempo comum em desfavor apenas do Regime Geral da Previdência Social – RGPS. Faltava reciprocidade e bilateralidade.
E o servidor público, por décadas, não teve amparo legal para o reconhecimento do tempo laborado no Regime Próprio como especial e, muito menos, a possibilidade de convertê-lo em tempo comum. A promessa consignada na redação original do § 1º do art. 40 da Constituição Federal de 1988 (“Lei complementar poderá estabelecer exceções ao disposto no inciso III, "a" e "c", no caso de exercício de atividades consideradas penosas, insalubres ou perigosas”) nunca foi atendida pelo Poder Legislativo.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, chamado a reconhecer a omissão do legislador em diversos mandados de injunção, acabou por declarar a inconstitucionalidade por omissão deste estado de coisas e aprovar, em 09/04/2014, a Súmula Vinculante n.º 33: Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica. A partir de então, o servidor público poderia ter reconhecido o seu tempo de labor como especial.
Uma vez atendido o requisito da reciprocidade e da bilateralidade, não é a toa que a Lei n.º 13.846/2019 incluiu o inciso IX ao artigo 96 da Lei n.º 8.213/1991, passando a prever que “para fins de elegibilidade às aposentadorias especiais referidas no § 4º do art. 40 e no § 1º do art. 201 da Constituição Federal, os períodos reconhecidos pelo regime previdenciário de origem como de tempo especial, sem conversão em tempo comum, deverão estar incluídos nos períodos de contribuição compreendidos na CTC e discriminados de data a data”.
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal foi além, e no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 1.014.286 (Tema n.º 942 da Repercussão Geral), datado de 31/08/2020, admitiu a conversão de tempo especial em comum para o servidor público:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 40, § 4º, III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PEDIDO DE AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM ATIVIDADES EXERCIDAS SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS QUE PREJUDIQUEM A SAÚDE OU A INTEGRIDADE FÍSICA DO SERVIDOR, COM CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM, MEDIANTE CONTAGEM DIFERENCIADA, PARA OBTENÇÃO DE OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. POSSIBILIDADE ATÉ A EDIÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 103/2019. DIREITO INTERTEMPORAL. APÓS A EDIÇÃO DA EC 103/2019, O DIREITO À CONVERSÃO OBEDECERÁ À LEGISLAÇÃO COMPLEMENTAR DOS ENTES FEDERADOS. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONFERIDA PELO ART. 40, § 4º-C DA CRFB.
1. A Constituição impõe a construção de critérios diferenciados para o cômputo do tempo de serviço em condições de prejuízo à saúde ou à integridade física, conforme permite verificar a interpretação sistemática e teleológica do art. 40, § 4°, CRFB.
2. Desde a edição das Emendas Constitucionais 20/1998 e 47/2005, não há mais dúvida acerca da efetiva existência do direito constitucional daqueles que laboraram em condições especiais à submissão a requisitos e critérios diferenciados para alcançar a aposentadoria. Nesse sentido é a orientação desta Suprema Corte, cristalizada no verbete de n.º 33 da Súmula da Jurisprudência Vinculante: “Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica.”
3. Ao permitir a norma constitucional a aposentadoria especial com tempo reduzido de contribuição, verifica-se que reconhece os danos impostos a quem laborou em parte ou na integralidade de sua vida contributiva sob condições nocivas, de modo que nesse contexto o fator de conversão do tempo especial em comum opera como preceito de isonomia, equilibrando a compensação pelos riscos impostos. A conversão surge, destarte, como consectário lógico da isonomia na proteção dos trabalhadores expostos a agentes nocivos.
4. Após a EC 103/2019, o § 4º-C do art. 40 da Constituição, passou a dispor que o ente federado poderá estabelecer por lei complementar idade e tempo de contribuição diferenciados para aposentadoria de servidores cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação. Não há vedação expressa ao direito à conversão do tempo comum em especial, que poderá ser disposta em normativa local pelos entes federados, tal como operou a legislação federal em relação aos filiados ao RGPS, nos termos do art. 57, da Lei 8213/91.
5. Recurso extraordinário desprovido, com fixação da seguinte tese: “Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC n.º 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República”.
(RE 1014286, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 31/08/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-235 DIVULG 23-09-2020 PUBLIC 24-09-2020)
Os requisitos da reciprocidade e da bilateralidade estão integralmente atendidos, inclusive com a particularidade de que a legislação aplicável tanto no RGPS como no RPPS é exatamente a mesma.
Portanto, há de se dar nova interpretação ao artigo 96, I, da LBPS, excluindo aquela que vedava ao segurado que trabalhava sob condições especiais e passou, sob qualquer condição, para regime previdenciário diverso, o direito à conversão do tempo de atividade especial em tempo comum, para efeito de contagem recíproca".
Revendo anterior posicionamento, passando a admitir a possibilidade de utilização de tempo especial em regime previdenciário diverso, inclusive com sua conversão em comum, colhe-se de decisão do STJ:
"CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AVERBAÇÃO NO REGIME PRÓPRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA, PELO STF (RE 1.014.286/TEMA 942). JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ART. 1.040, II, DO CPC/2015. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL NEGADO PROVIMENTO EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO.
1. Discute-se nos autos a possibilidade, para fins de contagem recíproca de conversão de tempo especial, exercido sob o Regime Geral de Previdência Social - RGPS por servidora pública estatutária, em tempo comum, com a respectiva expedição de Certidão de Tempo de Contribuição, para fins de averbação no Regime Próprio de Previdência Social - RPPS.
2. Quando da prolação do acórdão objeto do Recurso Extraordinário, prevalecia jurisprudência dominante contrária à tese sustentada pela ora recorrente. O posicionamento desta Corte Superior, externado nos EREsp 524.267/PB, rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 24.3.2014, apontava para a impossibilidade de conversão do tempo de serviço especial em tempo comum, tendo em vista expressa vedação legal (arts. 4º, I, da Lei 6.226/1975, e 96, I, da Lei 8.213/1991).
3. Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 1.014.286 (Tema 942), com Repercussão Geral reconhecida, encerrado na sessão de 31.8.2020, enfrentou a tese jurídica trazida no presente feito, firmando posicionamento contrário ao postulado pela Terceira Seção do STJ. Em síntese, reconheceu a Suprema Corte que, "até a edição da EC 103/2019, não havia impedimento à aplicação, aos servidores públicos, das regras do RGPS para a conversão do período de trabalho em condições nocivas à saúde ou à integridade física em tempo de atividade comum".
4. Revisitando os autos, verifico que os fundamentos do acórdão, quando do julgamento do Recurso Especial, não mais se impõem em razão do precedente vinculante do STF. Nessa vertente, precedentes análogos no âmbito da colenda Primeira Seção, em ambas as Turmas de Direito Público.
5. Há que se exercer o juízo de retratação nos termos do art. 1.040, II, do CPC/2015, para reposicionar o acórdão anteriormente promulgado, em observância ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema n. 942.
6. Recurso Especial não provido em juízo de retratação".
(RE nos Edcl no AgInt no Resp 1692293, Segunda Turma, DJ 21/11/2023).
Sendo assim, em consonância com os entendimentos esposados e diante da atual reciprocidade dos diferentes regimes previdenciários, entendo que deve ser garantido o direito ao servidor público ver reconhecido o tempo especial prestado no RPPS, com sua devida conversão em tempo comum e utilização no RGPS, cabendo aos diferentes regimes a devida compensação financeira decorrente.
Nesse sentido, vale mencionar o seguinte julgado da c. Décima Turma deste Tribunal:
"PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. CONVERSÃO DE TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO EM COMUM PARA APOSENTAÇÃO NO RGPS. POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO. DER. RECURSO PROVIDO.
1. Não se pode cogitar de coisa julgada. As ações não possuem identidade de partes, de causa de pedir e de pedido (artigo 337, §2º, do CPC): a primeira vem fundada na especialidade da atividade de guarda municipal (periculosidade) e tem por objeto o reconhecimento/averbação do tempo de serviço de 17/01/1990 a 31/12/2012 e a revisão da aposentadoria NB 42/160.280.671-0, ao passo que a segunda demanda possui por causa de pedir Certidão de Tempo de Contribuição – CTC de atividade especial já expedida pela Municipalidade de Araras e, por pedido, a revisão da aposentadoria NB 42/160.280.671-0.
2. Ainda que se conclua pela identidade dos elementos, o primeiro processo foi extinto sem resolução do mérito em relação ao INSS, o que possibilita nova propositura de ação por ausência de coisa julgada (artigo 486 do CPC).
3. A coisa julgada não pode ser invocada nem pelo autor – a procedência da averbação do tempo de serviço não é oponível ao INSS -, nem pela autarquia – além da extinção do processo sem resolução do mérito, o autor não requereu a averbação de tempo de atividade municipal pelo INSS, mas a averbação de CTC já expedida pela municipalidade para efeito de contagem recíproca de tempo de contribuição.
4. O pedido de revisão de aposentadoria fundado na possibilidade de averbação de CTC municipal pelo INSS, como fruto da ilegalidade de ato administrativo que vedou a conversão de tempo especial em comum na contagem recíproca de tempo de serviço, procede.
5. O Supremo Tribunal Federal, após decidir, em diversos mandados de injunção com eficácia restrita a cada impetrante (teoria concretista direta individual), que a mora na regulamentação de aposentadoria especial de servidor público não pode impedir o exercício do direito, mediante aplicação do RGPS, e editar a Súmula Vinculante 33, como garantia de oponibilidade geral e vinculante da posição, fixou a tese de repercussão geral de que a fruição, pelas regras do RGPS, também deve se estender à contagem abonada de tempo de serviço exercido em condições prejudiciais à saúde e à integridade física, até a edição de lei complementar específica (Tema 942, DJ 24/09/2020).
6. O Superior Tribunal de Justiça, em função da decisão do STF no Tema 942, reviu posicionamento adotado nos Embargos de Divergência nº 524.267, passando a autorizar a conversão de tempo de atividade especial de servidor público em comum, inclusive para efeito de contagem recíproca de tempo de contribuição.
7. A Turma Nacional de Uniformização, em incidente posteriormente confirmado pelo STJ (Tema 278, DJ 27/09/2021), já tinha decidido pela possibilidade de conversão de tempo de atividade especial de servidor público em comum com vistas à aposentação no RGPS ou no regime próprio de previdência.
8. A vedação da conversão do tempo de atividade especial em comum no âmbito da contagem recíproca de tempo de contribuição, como previsto no artigo 96, I, da Lei nº 8.213/1991, não pode mais subsistir, diante da razão determinante de que: 1) o servidor público faz jus à concessão de aposentadoria especial e à contagem abonada de tempo de serviço executado em condições insalubres, perigosas ou penosas, independentemente de regulamentação do direito, superando o vácuo normativo que impedia o compartilhamento de tempo de contribuição especial para aposentação no RGPS e no regime próprio de previdência; e 2) a vedação da contagem de tempo de serviço fictício, em dobro ou em condições especiais – justificada pela redução do tempo convencional de contribuição de 30/35 anos e pela ausência de compensação de custeio no regime próprio de previdência, similarmente às alíquotas adicionais da aposentadoria especial do RGPS – não pode prejudicar o direito constitucional do servidor público, sendo que cabe à regulamentação faltante ponderar os fatores de equilíbrio atuarial e financeiro da aposentadoria especial e do cômputo diferenciado de tempo de serviço.
9. Com a averbação do tempo de serviço de guarda municipal no Serviço de Previdência Social do Município de Araras – ARAPREV e com a consequente expedição de Certidão de Tempo de Contribuição - CTC, o INSS deve rever o valor da aposentadoria em vigor, promovendo a contagem abonada do período de trabalho, sem que possa se valer do artigo 96, I, da Lei nº 8.213/1991, dos artigos 447, II, e 459, I, da IN INSS 77/2015 ou da EC nº 103/2019 – o segurado já havia preenchido os requisitos para o cômputo diferenciado.
10. O INSS está eximido apenas de averbar o tempo de serviço, mas não de averbar CTC expedida pela Prefeitura e da qual conste a qualificação especial do trabalho de guarda municipal. Esse capítulo, inclusive, está sob o alcance da coisa julgada – a sentença proferida no processo nº 1000187-18.2016.8.26.0038 (autos nº 0036986-11.2017.4.03.9999 no TRF3) reconheceu a periculosidade da atividade e ordenou a averbação pelo Serviço de Previdência Social do Município de Araras – ARAPREV.
11. A condição de segurado do RGPS e a correlata contagem do tempo de serviço decorrem do mero exercício de atividade remunerada, gerador de filiação automática à Previdência Social. A relação de seguro social resta caracterizada com o desempenho de trabalho pago, protegendo imediatamente o trabalhador contra contingências sociais e ativando a relação de custeio da seguridade social, com a exigibilidade das contribuições correspondentes (artigos 9º, §12, e 20, §1º, do Decreto nº 3.048/1999).
12. Embora as obrigações acessórias sejam exigíveis, impedindo o cômputo do tempo de serviço, enquanto não forem cumpridas (artigo 19-B, §1º, do Decreto nº 3.048/1990 e artigo 48 da IN INSS nº 128/2022), a demonstração posterior não prejudica os efeitos da relação de seguro social, extraídos do mero exercício de atividade remunerada, da filiação automática ao RGPS, em direito já incorporado ao patrimônio do titular. Precedentes do STJ.
13. O termo inicial dos efeitos financeiros da revisão de aposentadoria deve ser fixado na DER (14/01/2014), sem prejuízo, naturalmente, da prescrição quinquenal.
14. O fato de o Tema 942/STF apenas ter sido julgado em 24/09/2020, após a DER, não exerce influência. O STF não promoveu modulação de efeitos do julgamento (ED no RE 1014286, DJ 10/06/2021), em continuidade da orientação fixada em precedentes anteriores – concessão de mandados de injunção e edição de súmula vinculante para fruição imediata de aposentadoria especial pelo servidor público -, de modo que a conversão pode alcançar períodos de atividade anteriores, com a projeção dos efeitos financeiros na data do requerimento administrativo.
15. O Tema 1124/STJ não se aplica à controvérsia, seja porque o próprio STJ confere um tratamento diferencial à revisão de benefício previdenciário, como se extrai dos precedentes citados, seja porque a revisão se situa na lógica da outorga do benefício mais vantajoso, enquanto dever de ofício do INSS, implicando o reconhecimento tardio de um direito e refletindo a filiação automática do trabalhador ao RGPS, como mero produto do exercício de atividade remunerada.
16. Correção monetária e juros na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal. Condenação do INSS em verba honorária. Súmula 111 do STJ.
17. Apelação do autor a que se dá provimento".
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001327-36.2021.4.03.6143, Rel. Desembargador Federal MARCOS MOREIRA DE CARVALHO, julgado em 10/09/2025, DJEN DATA: 12/09/2025) (grifo nosso)
Com efeito, considerando-se que a CTC expedida pelo órgão competente (ID 304667685) informa que o autor, durante o período de 10/02/1994 a 30/06/1999, exerceu atividade sob condições especiais (agentes biológicos), é assegurado a ele que tal lapso integre na contagem do tempo de contribuição, com contagem diferenciada, conforme explicitado.
Por sua vez, para comprovar a especialidade da atividade desenvolvida nos interregnos de 06/03/1991 a 05/05/1991, de 01/03/1993 a 09/02/1994 e de 01/07/1999 a 31/12/2004 foi carreado o Perfil Profissiográfico Previdenciário (id 304667699) indicando exercer a atividade de trabalhador braçal/ajudante geral, com as seguintes funções:
“Conservar a limpeza de logradouros públicos, inclusive banheiros, por meio de coleta de lixo, varrições, lavagens, pintura de guias, aparo de gramas, manutenção de vias públicas com operações de tapa buracos, etc. Lavam vidros de janelas e fachadas de edifícios e limpam recintos e acessórios dos mesmos. Executam instalações, reparos de manutenção e serviços de manutenção em dependências de edificações. Atendem transeuntes, visitantes, reparos de moradores, prestando-lhes informações. Zelam pela segurança do patrimônio e das pessoas solicitando meios e tomando providencias para a realização dos serviços.”.
De acordo com o documento, o campo referente ao fator de risco não foi preenchido, pois o Laudo de Insalubridade e Periculosidade elaborado consta a presença de fator de risco a partir de 23/03/2011. De se acrescentar que nas observações ainda há a informação da presença de agente biológico. Por certo, também foi confeccionado o laudo judicial (id 304667878 e complementado no id 304667943 – p. 2) indicando a presença de agentes biológicos de modo habitual e permanente.
No entanto, em que pese o laudo pericial indicar a presença de agente nocivo de modo habitual e permanente, ao analisar as atividades exercidas pelo segurado, depreende-se que a exposição a agentes agressivos biológicos ocorria de forma ocasional, o que afasta a possibilidade de enquadramento, de acordo com o artigo 57, da Lei n. 8.213/91.
DA ATIVIDADE RURAL
Por seu turno, a demonstração do labor rural nos lapsos de 27/04/1974 a 20/05/1981, de 17/07/1981 a 19/10/1984 e de 08/10/1987 a 30/09/1989, foi realizada pelo autor (nascimento em 05/04/1956) com os seguintes documentos que destaco: a CTPS com registros de 21/05/1981 a 16/07/1981, como ajudante, de 20/10/1984 a 07/10/1987, como trabalhador rural e de 06/03/1991 a 05/05/0991, como trabalhador braçal na Prefeitura de Pacaembu, a certidão de casamento e de nascimento de filhos, em que figura como lavrador em 1974, 1976, 1978, 1979 e 1981 e o contrato de parceria agrícola durante o período de 30/09/1987 a 30/09/1989.
Além do que, foram ouvidas testemunhas que confirmam o alegado labor campesino.
Sendo assim, não se pode olvidar a existência de prova material do trabalho rurícola alegado, corroborado pelo relato das testemunhas, o que possibilita o reconhecimento nos períodos de 27/04/1974 a 20/05/1981, de 17/07/1981 a 19/10/1984 e de 08/10/1987 a 30/09/1989.
De se observar que, a teor do § 2º do artigo 55 da Lei n.º 8.213/91, permite-se o cômputo do tempo de serviço do segurado trabalhador rural, independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, somente em relação ao período que antecede a vigência desta Lei, não havendo, entretanto, dispensa dessas contribuições para o período posterior a 24/07/1991.
DO DIREITO À APOSENTADORIA
Prosseguindo, com a somatória do tempo incontroverso (id 304667788 – pág. 70: 30 anos, 07 meses e 20 dias), o labor rural ora reconhecido e o período especial enquadrado pela Prefeitura Municipal de Pacaembu, devidamente convertido, contava o autor até 13/11/2019, data da entrada em vigor da EC n. 103/2019, com mais de 35 anos, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, com renda mensal inicial correspondente a 100% (cem por cento) do salário de benefício, em valor a ser devidamente calculado pelo Instituto Previdenciário.
Também restou amplamente comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos, a carência prevista na tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Cabe ressaltar que, o tempo de trabalho rural ora reconhecido não está sendo computado para efeito de carência, nos termos do §2º, do artigo 55, da Lei nº 8.213/91.
OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n° 630.501/RS-RG, firmou o entendimento de que o segurado, quando preenchidos os requisitos mínimos para a aposentação, tem direito de optar pelo benefício mais vantajoso. Assim, dentre aquelas três hipóteses citadas, ou ainda se existente outra hipótese não aventada, mas factível e lícita, pode o segurado optar por qualquer uma delas que entender ser a mais vantajosa.
Confira-se no mesmo sentido:
"Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Previdenciário. Desconstituição da aposentadoria integral. Opção pela aposentadoria proporcional. Direito adquirido ao benefício mais vantajoso após a reunião dos requisitos. Possibilidade. Precedentes.
1. O segurado tem direito adquirido ao benefício mais vantajoso, consideradas as datas a partir das quais a aposentadoria proporcional poderia ter sido requerida e desde que preenchidos os requisitos pertinentes.
2. Agravo regimental não provido."
(STF, AG.REG. NO RE 705.456/RJ, Primeira Turma, Min. Dias Toffoli, 28/10/2014).
TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo em 06/07/2020, não havendo parcelas prescritas.
CONSECTÁRIOS
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
DA APLICAÇÃO ÚNICA DA SELIC A PARTIR DA EC 113, DE 08/12/21
Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 08/12/21, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
CUSTAS
Conquanto a Lei Federal nº 9.289/96 disponha no art. 4º, I, que as Autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal, seu art. 1º, §1º, delega à legislação estadual normatizar sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da competência delegada. Note-se que, em se tratando das demandas aforadas no Estado de São Paulo, tal isenção encontra respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03 (art. 6º).
A isenção referida não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; contudo, uma vez que a pretensão do segurado somente foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da presente decisão ou acórdão, atendendo ao disposto no § 11 do artigo 85, do CPC.
TUTELA ANTECIPADA
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art. 497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, visando assegurar o resultado concreto buscado na demanda e a eficiência da prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado, determino ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social que efetue as providências necessárias para a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias, fazendo constar que se trata de aposentadoria especial, deferida a JOSE MARCELINO DOS SANTOS, com data de início do benefício - (DIB: 06/07/2020), com renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS.
DISPOSIÇÕES RELATIVAS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Na liquidação da obrigação de fazer a que o INSS foi condenado nestes autos serão observadas as seguintes determinações:
Caberá ao INSS calcular o tempo de serviço para a concessão do benefício de acordo com os períodos reconhecidos nos autos, vinculado aos termos da coisa julgada, somando-se ao tempo de contribuição incontroverso.
Deixo consignado, também, que não cabe ao Poder Judiciário, através de sua contadoria, elaborar cálculos para a identificação de qual benefício é o mais vantajoso para o segurado, cabendo ao INSS orientar quanto ao exercício deste direito de opção.
Fica o INSS autorizado a compensar valores pagos administrativamente ao autor no período abrangido pela presente condenação, efetivados a título de benefício previdenciário que não pode ser cumulado com o ora deferido.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para afastar a ocorrência da coisa julgada e ilegitimidade de parte e, com fundamento no artigo 1.013, § 3º , do CPC, reconhecer a atividade campesina nos períodos de 27/04/1974 a 20/05/1981, de 17/07/1981 a 19/10/1984 e de 08/10/1987 a 30/09/1989, além da inclusão na contagem do tempo de contribuição do lapso de 10/02/1994 a 30/06/1999, já reconhecido como especial pelo órgão competente e conceder a aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, com os consectários conforme fundamentado.
Deferida a tutela antecipada para determinar a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias.
Comunique-se ao Instituto Autárquico.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL E ESPECIAL. REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO PREENCHIDOS. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO.
I. Caso em exame:
- Apelação da parte autora em face da sentença que julgou extinto o processo sem julgamento de mérito quanto ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 10/02/1994 até 30/06/1999 e do tempo de serviço rural e, ainda, julgou improcedente o pedido de reconhecimento do período especial e aposentadoria por tempo de contribuição.
II. Questão em discussão:
- Há três questões em discussão: (i) analisar a caracterização de litispendência/coisa julgada e a ilegitimidade de parte; (ii) possibilidade de reconhecimento da atividade rural e especial; (iii) analisar a possibilidade de utilização de tempo especial reconhecido em regime próprio para aposentadoria no regime geral, (iv) saber se preenchidos os requisitos para o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição.
III. Razões de decidir:
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- A Emenda Constitucional n. 103 de 15 de novembro de 2019 trouxe inúmeras alterações ao sistema de Previdência Social, que passaram a vigorar na data da sua publicação em 13/11/2019.
- In casu, o requerente ingressou com as seguintes ações: 1) 5097826-52.2024.4.03.9999 – demanda atual; Pedido: reconhecimento de atividade rural e especial e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. 2) 1000457-19.2018.8.26.0411 – demanda anterior em que objetivava o reconhecimento de tempo rural e o deferimento de aposentadoria por idade rural ou híbrida. A r. sentença julgou improcedente o pedido. O autor formulou o pedido de desistência, o qual foi acolhido, com a extinção do feito sem resolução de mérito. Em grau recursal, foi negado provimento ao apelo autárquico. O INSS interpôs agravo interno e posteriormente embargos de declaração, os quais foram rejeitados. Houve o trânsito em julgado do decisum.
- Não há que se falar em litispendência ou coisa julgada, restando evidenciada causa de pedir e pedido diversos efetuados pelo demandante, é de se reconhecer o interesse de agir na presente demanda.
- Na r. sentença foi julgado extinto sem julgamento de mérito, por ilegitimidade de parte, o pedido de reconhecimento do tempo especial de 10/02/1994 a 30/06/1999, no entanto, foi carreada a certidão de tempo de contribuição, expedida pelo Regime Próprio de Previdência Social, em que consta o reconhecimento do período como especial.
- O INSS é parte legítima para examinar o reconhecimento desse lapso, para fins de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social, sendo assim, afasto a extinção sem julgamento de mérito.
- A declaração emitida pela Prefeitura Municipal de Pacaembu informa que o autor prestou serviços nos períodos de 06/03/1991 a 05/05/1991 pelo regime da CLT e a partir de 01/03/1993 até a presente data regida pelo Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais, contribuindo de 06/03/1991 a 05/05/1991, de 01/03/1993 a 09/02/1994 para o INSS e de 10/02/1994 a 30/06/1999 para o FPM (Fundo de Previdência Municipal) e de 01/07/1999 até a presente data para o INSS.
- Tempo de serviço rural reconhecido. Há início de prova material, que foi corroborado com o relato das testemunhas, o que possibilita o reconhecimento do labor campesino. No entanto, o tempo especial não pode ser reconhecido, uma vez a exposição de modo ocasional a agentes biológicos.
- Em consonância com os entendimentos dos Tribunais Superiores, deve ser garantido o direito ao servidor público ver reconhecido o tempo especial e sua conversão em tempo comum no regime próprio e a sua utilização no regime geral, em que pese o disposto no artigo 96, I da Lei 8.213/91 que estabelece que "não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais", uma vez que a ausência de legislação sobre o tema não pode impedir o exercício do direito, cabendo a aplicação das regras constantes no Regime Geral de Previdência Social.
- A certidão de tempo de contribuição expedida pelo órgão competente informa que o autor durante o período de 10/02/1994 a 30/06/1999, exerceu atividade sob condições especiais (agentes biológicos), portanto, lhe é assegurado que tal lapso integre na contagem do tempo de contribuição, com contagem diferenciada.
- A somatória do tempo de contribuição autoriza a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data do requerimento administrativo em 06/07/2020.
- Os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 08/12/21, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
- A isenção de custas, pela Autarquia Federal, não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
IV. Dispositivo e tese:
- Apelação do autor parcialmente provida.
Tese de julgamento:
Aplica-se a lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o princípio tempus regit actum, no que tange ao reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a sua conversão.
Jurisprudência relevante citada: Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal
