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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001648-24.2022.4.03.6115 RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA APELANTE: DOMINGOS ANTONIO LOPES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: CHRISTIAN DE SOUZA GOBIS - SP332845-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DOMINGOS ANTONIO LOPES Advogado do(a) APELADO: CHRISTIAN DE SOUZA GOBIS - SP332845-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OO EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento do labor rural, do tempo comum e de período(s) trabalhado(s) em atividades especiais, sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer o labor urbano de 01/09/1990 a 13/09/1990 e como laborado(s) em atividades especiais o(s) período(s) de 23/10/1986, 26/11/1986 a 26/01/1987 e 02/08/1994 a 04/03/1997, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS sua averbação. Em razão da sucumbência mínima da ré, condenou a parte autora ao pagamento das custas proporcionais ao proveito econômico obtido pela parte ré e ao pagamento de honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo do § 3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao atualizado da causa, de modo a possibilitar sua eventual majoração, nos termos do § 11 do mesmo dispositivo, e observado, ainda, seu § 5º, por ocasião da apuração do montante a ser pago. Sua exigibilidade, contudo, deverá ficar suspensa em razão do deferimento de gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, § 3º do CPC. Dispensado o reexame necessário, nos termos do § 3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando, a impossibilidade do enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como especiais no período de 02/08/1994 a 04/03/1997, notadamente em razão do(a) ausência de comprovação da habitualidade e permanência da exposição e laudo técnico contemporâneo. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença quanto à observância da prescrição quinquenal; que a parte seja intimada a firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; à fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111-STJ; à declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; e ao desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada. Apela a parte autora, alegando, preliminarmente, a nulidade da sentença, ante o cerceamento de defesa, porquanto não foi deferida a produção de prova pericial para os períodos 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13, 15, 16 e 29 da tabela da inicial. No mérito, pleiteia o reconhecimento do labor rural no período de 01/01/1971 e 09/07/1986 e como especial(is) do(s) período(s) rejeitado(s) na r. sentença, de 02/02/1987 a 18/07/1987, 01/08/1987 a 09/08/1990, 01/09/1990 a 13/09/1990, 01/03/1991 a 25/11/1992, 01/12/1992 a 08/01/1993, 02/01/2001 a 24/02/2001, 04/06/2001 a 27/08/2001, 10/09/2001 a 12/01/2002, 02/09/2002 a 11/07/2003, 02/09/2004 a 07/06/2006, 03/07/2006 a 02/02/2015 e 24/08/2020 a 19/01/2022, bem como a concessão da aposentadoria mais benéfica ao autor, aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, com o termo inicial dos efeitos financeiros na DER (24/01/2022) ou, caso necessária, na DER reafirmada. Contrarrazões pela parte autora. É o relatório.
V O T OO EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação. O compulsar dos autos revela ter a parte autora, na petição inicial, protestado pela produção de provas, em especial a prova pericial para os períodos 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13, 15, 16 e 29 da tabela da inicial (02/02/1987 a 18/07/1987, 01/08/1987 a 09/08/1990 (Manzutti Material para Construcao Ltda), 01/09/1990 a 13/09/1990 (Serveng Civilsan), 01/03/1991 a 25/11/1992 (Edilson Transportes de Cargas Ltda), 01/12/1992 a 08/01/1993 (Unigel Distribuidora Ltda), 02/01/2001 a 24/02/2001 (Conserv Servicos Empresariais S/C Ltda) colhedor, 04/06/2001 a 27/08/2001 (Edson & Emerson Servicos Rurais Ltda) encarregado, 10/09/2001 a 12/01/2002 (Santa Edwiges Colheitas Rurais SS Ltda) encarregado, 02/09/2002 a 11/07/2003, 02/09/2004 a 07/06/2006 (Liderplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda) motorista, 03/07/2006 a 02/02/2015 (Danplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda) e 24/08/2020 a 19/01/2022 (Luperplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda), cujo fragmento destaco: “Per. 4 a 7 → O autor exerceu atividade de MOTORISTA para as empresas especificadas na tabela acima. Ficou exposto a diversos agentes insalubres provenientes de suas profissões, tais como ruído, calor, poeira etc. Assim, tais períodos devem ser considerados especiais. As certidões retiradas do site da Receita Federal (documentos anexos) comprovam que as empresas estão BAIXADAS, o que impossibilita a juntada de qualquer documento do labor especial da atividade. Ressalta-se que a atividade em questão possuía enquadramento na legislação previdenciária, no código 2.4.4 do Decreto 53831/64. Não sendo possível o reconhecimento por enquadramento, requer a prova pericial por equiparação; Per. 8 → O autor exerceu atividade de MOTORISTA para a empresa UNIGEL DISTRIBUIDORA LTDA. Ficou exposto a diversos agentes insalubres provenientes de suas profissões, tais como ruído, calor, poeira etc. A certidão retirada do site da Receita Federal (documento anexo) comprova que a empresa está ATIVA. Foi enviado requerimento de PPP à empresa, mas até o momento não houve a entrega do documento. Dessa forma, requer seja deferida a intimação da empregadora para juntada aos autos dos laudos técnicos. Ressalta-se que a atividade em questão possuía enquadramento na legislação previdenciária, no código 2.4.4 do Decreto 53831/64. Não sendo possível o reconhecimento requer a prova pericial; (...) Per. 10 a 12 e 14 → O autor exerceu atividades de COLHEDOR APONTADOR E ENCARREGADO RURAL para as empresas especificadas na tabela acima. Ficou exposto a diversos agentes insalubres provenientes de suas profissões, tais como ruído, calor, poeira etc. Assim, tais períodos devem ser considerados especiais. As certidões retiradas do site da Receita Federal (documentos anexos) comprovam que as empresas estão BAIXADAS, o que impossibilita a juntada de qualquer documento do labor especial da atividade. Dessa forma, requer a realização da prova pericial por equiparação em empresa paradigma. Per. 13 e 15 → O autor exerceu atividades de MOTORISTA para a empresa LIDERPLAS INDUSTRIA E COMERCIO DE PLASTICOS LTDA. Ficou exposto a diversos agentes insalubres provenientes de suas profissões, tais como ruído, calor, poeira etc. Assim, tal período deve ser considerado especial. A certidão retirada do site da Receita Federal (documento anexo) comprova que a empresa está BAIXADA, o que impossibilita a juntada de qualquer documento do labor especial da atividade. Dessa forma, requer a realização da prova pericial por equiparação em empresa paradigma. Per. 16 → O autor exerceu atividade de MOTORISTA para a empresa DANPLAS INDUSTRIA E COMERCIO DE PLASTICOS LTDA. Ficou exposto a diversos agentes insalubres provenientes de suas profissões, tais como ruído, calor, poeira etc. A certidão retirada do site da Receita Federal (documento anexo) comprova que a empresa está ATIVA. O PPP anexado à fl. 159 do PA, afirma que o autor ficou exposto a ruído de 75,8 dB(A), calor de 24,3 a 25,2 ºC e vibração. O nível de ruído informado não condiz com a realidade vivida pelo demandante, já que a exposição se dava a valores muito maiores que o declarado. Assim, pugna-se pela realização da prova pericial; Per. 29 → O autor exerceu atividade de MOTORISTA para a empresa LUPERPLAS INDUSTRIA E COMERCIO DE PLASTICOS LTDA. Ficou exposto a diversos agentes insalubres provenientes de suas profissões, tais como ruído, calor, poeira etc. A certidão retirada do site da Receita Federal (documento anexo) comprova que a empresa está ATIVA. Foi enviado requerimento de PPP à empresa, mas até o momento não houve a entrega do documento. Dessa forma, requer seja deferida a intimação da empregadora para juntada aos autos dos laudos técnicos e prova pericial. (...) 3.5. Protesta e pretende provar o alegado por todos os meios de prova em direito adquiridos, especialmente pelo depoimento pessoal do representante legal do INSS, oitiva de testemunhas, juntada de documentos, realização de perícias, e outras que possam elucidar o alegado, bem como a requisição dos autos do procedimento administrativo e de documentos em poder de terceiros. 3.6. Requer-se a expedição de ofícios para os empregadores mencionados na CTPS, requisitando-se o fornecimento dos formulários e laudos técnicos referentes à constatação da insalubridade no ambiente de trabalho, os quais deverão estar em seu poder por força de lei, excetuando-se os que já foram obtidos pela parte autora, que seguem em anexo. 3.7. Requer a realização de PERÍCIA TÉCNICA em relação aos períodos de atividades descritos na planilha de tempo de serviço acima alinhada, a fim de que se reconheça a insalubridade e periculosidade do ambiente de trabalho. Protesta-se, desde já, por esclarecimentos, apresentação de quesitos e pela oportunidade de se indicar assistente técnico para acompanhamento dos trabalhos.” Distribuída a ação, foi determinada a citação do INSS e oportunizado à parte autora a juntada das provas documentais que pretende produzir, nos termos do art. 435, do CPC (ID 326862483). O autor emendou a inicial, não se opondo ao juízo 100% digital e reiterando o resumo da inicial, no tocante ao pedido de expedição de ofício e deferimento de prova pericial, sobretudo em empresas paradigmas, no caso de empresas inativas (ID 326862484). Ofertada contestação (ID 326862487), a parte autora apresentou réplica, reiterando o pedido de expedição de ofícios e de deferimento de prova pericial requerida na inicial (ID 326862489). O MM. Juiz a quo deferiu a oitiva de testemunhas em audiência, para fins de comprovação do período de trabalho rural (ID 326862491). Realizada audiência de instrução, ocasião em que ouvida a parte autora e suas testemunhas, além de deferida a expedição de ofício para as empresas indicadas na petição de ID 326862494 (São Carlos S.A., Unigel Distribuidora Ltda. e Italpa Industria e Comercio de Plásticos Ltda). Foram anexados aos autos PPPs pelas empresas São Carlos S/A Ind. de Papel e Embalagens (ID 326862519), Unigel Distribuidora Ltda (ID 326862684 e anexos), Italpa Industria e Comercio de Plásticos Ltda (ID 326862700). Foi proferida decisão, rejeitando a impugnação genérica aos PPPs para fim de realização de prova pericial, indeferindo a realização de prova pericial por similaridade em relação às empresas baixadas, e deferindo o pedido de expedição de ofício à empresa Italpa Industria e Comercio de Plásticos Ltda. para trazer aos autos PPP completo com indicação do nível de ruído a que o autor esteve exposto (ID 326862706). A perícia judicial foi deferida na empresa Italpa Industria e Comercio de Plásticos Ltda (ID 326862720) e foi anexado aos autos laudo pericial que indica que o autor esteve exposto no período de 02/08/1994 a 27/05/1998 a ruído de 82,29 decibéis de forma habitual e permanente (ID 326862730). Verifica-se que em relação aos períodos de 02/02/1987 a 18/07/1987, 01/08/1987 a 09/08/1990 (Manzutti Material para Construcao Ltda), 01/09/1990 a 13/09/1990 (Serveng Civilsan) e 01/03/1991 a 25/11/1992 (Edilson Transportes de Cargas Ltda), laborados como motorista, conforme anotações em CTPS (ID 326862378/12-14), não há necessidade de produção de prova pericial, por se tratar de período de enquadramento pela categoria profissional. Ademais, a prova pericial produzida por similaridade não seria capaz de demonstrar se o autor era motorista de caminhão. Por outro lado, no tocante aos períodos de 02/01/2001 a 24/02/2001 (Conserv Servicos Empresariais S/C Ltda), 04/06/2001 a 27/08/2001 (Edson & Emerson Servicos Rurais Ltda), 10/09/2001 a 12/01/2002 (Santa Edwiges Colheitas Rurais SS Ltda), 02/09/2002 a 11/07/2003 e 02/09/2004 a 07/06/2006 (Liderplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda), procede a alegação da parte autora de cerceamento de defesa, à vista da impossibilidade de emissão e fornecimento de documentos (PPP, laudo técnico) das empresas inativas. Configurado o cerceamento de defesa, não pode prevalecer a r. sentença. Justifica-se a necessidade da produção de provas sempre que exista um fato que escape do conhecimento do julgador e cuja aferição dependa de conhecimento especial, seja testemunhal, técnico ou científico. Dessa forma, necessária a dilação probatória tal como requerida, a fim de que se estabeleça o devido contraditório, bem como permita a melhor instrução processual, permitindo um completo convencimento do julgador sobre a matéria de fato controvertida. Entretanto, saliento que para os períodos de 01/12/1992 a 08/01/1993 (Unigel Distribuidora Ltda), 03/07/2006 a 02/02/2015 (Danplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda) e 24/08/2020 a 19/01/2022 (Luperplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda), em que houve a apresentação de prova documental, a perícia é desnecessária. Deve, portanto, ser anulada a sentença e devolvidos os autos para o Juízo de origem para que oportunize às partes a produção de perícia técnica e o regular processamento, notadamente em relação aos períodos de 02/01/2001 a 24/02/2001 (Conserv Servicos Empresariais S/C Ltda), 04/06/2001 a 27/08/2001 (Edson & Emerson Servicos Rurais Ltda), 10/09/2001 a 12/01/2002 (Santa Edwiges Colheitas Rurais SS Ltda), 02/09/2002 a 11/07/2003 e 02/09/2004 a 07/06/2006 (Liderplas Industria e Comercio de Plasticos Ltda), para os quais fora pleiteado o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas. Ante o exposto, acolho parcialmente a preliminar de cerceamento de defesa, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de Origem para regular processamento, com a devida dilação probatória, restando prejudicadas, no mérito, a apelação da parte autora e a apelação do INSS. É como voto. E M E N T APREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA PERICIAL IMPRESCINDÍVEL PARA A COMPROVAÇÃO DO DIREITO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. 1. Cerceamento de defesa configurado. Necessária a produção de provas sempre que exista um fato que escape do conhecimento do julgador e cuja aferição dependa de conhecimento especial, seja testemunhal, técnico ou científico. 2. Violação ao princípio da ampla defesa. Nulidade da sentença. 3. Preliminar de cerceamento de defesa parcialmente acolhido para anular a sentença. Apelação da parte autora e do INSS prejudicadas. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu acolher parcialmente a preliminar de cerceamento de defesa, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de Origem para regular processamento, restando prejudicadas, no mérito, a apelação da parte autora e a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARCELO VIEIRA
Relator |
