O Juiz Federal Convocado Ney Gustavo Paes de Andrade (Relator):
Trata-se de apelação interposta em ação objetivando o reconhecimento de tempo especial de trabalho para fins previdenciários. A r. sentença julgou procedente o pedido para (1) reconhecer a especialidade dos períodos laborados pelo autor; e (2) conceder a aposentadoria especial.
Apelou o INSS sustentando, em suma: (1) a inexistência de interesse processual diante do ajuizamento da ação com documentação diversa da anexada nos autos administrativos; e (2) a improcedência dos pedidos por ausência dos requisitos para o enquadramento por categoria profissional.
Não assiste razão ao apelante.
Relativamente à preliminar de falta de interesse processual, o fato de os Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPPs) terem sido apresentados apenas em Juízo não configura ausência de interesse de agir, mas reflete no termo inicial dos efeitos financeiros. A apresentação de prova somente no âmbito judicial encontra guarida na consequência jurídica definida no Tema 1124 do STJ, não ensejando extinção do processo sem julgamento do mérito.
Embora tenham sido apresentados novos documentos na ação judicial para comprovação da atividade especial, permaneceu a resistência da autarquia previdenciária à pretensão. Nesse contexto, resta caracterizado o interesse processual. Nesse sentido é o entendimento deste Tribunal: ApCiv 5001538-36.2019.4.03.6113, Rel. Des. Fed. MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, DJe 03/07/2024.
Superada a questão preliminar, passo ao exame do mérito.
Não prosperam as alegações de ausência dos requisitos para o enquadramento por categoria profissional. No caso concreto, foi reconhecida a especialidade de todos os períodos descritos na inicial, ante o enquadramento ocupacional dos cargos exercidos pelo autor como trabalhador rural polivalente (tratorista), de serviços gerais rurais e de auxiliar de empacotamento, com exposição a diversos agentes agressivos físicos e biológicos.
Para comprovar a exposição aos agentes nocivos e o tempo de atividade especial, o autor apresentou cópia da CTPS, do CNIS e dos PPPs.
Conforme os documentos acostados, restou demonstrado que o autor laborou em atividades rurais exposto a agentes biológicos (fungos e bactérias) nos períodos de 26/03/1985 a 01/12/1985, de 02/12/1985 a 15/06/1991, de 25/02/1994 a 18/03/1996, de 01/06/1995 a 29/02/1996 e de 01/07/2017 até a data da DER em 13/09/2017, pleiteando enquadramento conforme o item 2.2.1 do Anexo do Decreto 53.831/1964.
De acordo com o quadro de ocupações referido no artigo 2º do Decreto 53.831/1964, considerava-se insalubre a atividade "Código 2.2.1 - Agricultura - Trabalhadores na Agropecuária". O regime previdenciário do Trabalhador Rural não contemplava a aposentadoria especial nem aposentadoria por tempo de serviço.
Todavia, a CLPS de 1989 incluiu o empregado de empresa agroindustrial ou agrocomercial - "que, embora prestando exclusivamente serviço de natureza rural, vem contribuindo para esse regime pelo menos desde 25 de maio de 1971" -, no regime de Previdência Social Urbana. Nesse caso, esses empregados têm direito ao reconhecimento da atividade rural especial.
O enquadramento como tempo especial do labor rural deve ser mantido com base na legislação vigente, tanto pelo enquadramento por categoria profissional quanto pela comprovação mediante os PPPs.
No período de 01/11/1991 a 09/12/1994, o autor comprovou seu labor na função de auxiliar de empacotamento na usina, exposto a agentes físicos agressivos à saúde, devendo ser mantido o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas, conforme o código 1.1.6 do Decreto 53.831/1964 e o código 1.1.5 do Decreto 83.080/1979. Nesse sentido tem sido o entendimento desta Corte: ApCiv 5000183-89.2022.4.03.6111, Rel. Des. Fed. NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, DJe 29/10/2024.
A aposentadoria especial foi originalmente prevista no artigo 31 da Lei 3.807/1960, sendo concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 anos de idade e 15 anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15, 20 ou 25 anos, conforme a atividade profissional, em serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos. O artigo 162 do mesmo diploma previu o reconhecimento de atividade especial prestada anteriormente à sua edição, quando mais benéfico ao segurado.
A Lei 5.890/1973 disciplinou a matéria em seu artigo 9º, alterando apenas o período de carência de 15 para 5 anos de contribuição. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada no artigo 57 da Lei 8.213/1991, sendo devida ao segurado que trabalhasse durante 15, 20 ou 25 anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais prejudiciais à saúde ou integridade física, assegurada a conversão em tempo de contribuição comum.
No presente caso, verifica-se que o autor preencheu os requisitos para concessão do benefício de aposentadoria especial antes da entrada em vigor da EC 103/2019, sendo necessária a comprovação do tempo de atividade especial e a carência mínima de 180 meses.
Computando-se os períodos de atividade especial comprovados nos autos, verifica-se que, na data da DER em 13/09/2017, o autor demonstrou o exercício de atividades consideradas especiais pelo tempo exigido em lei, preenchendo todos os requisitos para a concessão da aposentadoria especial nos termos dos artigos 57 e 58 da Lei 8.213/1991.
Tratando os consectários legais de matéria de ordem pública, o efeito translativo do recurso permite a reapreciação da questão pelo órgão ad quem, ainda que de ofício. Nesse ponto, a sentença merece correção.
As parcelas vencidas deverão ser objeto de um único pagamento e serão corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora em conformidade com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (Tema 810 da Repercussão Geral), até a entrada em vigor da EC 113/2021, quando então passará a incidir, de forma exclusiva, a taxa Selic, conforme disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal e na Nota Técnica 02/2025 do CJF, emitida após a entrada em vigor da EC 136/2025.
Considerado o trabalho adicional realizado pelo advogado em decorrência da apelação, os honorários advocatícios a cargo do INSS, por ocasião da liquidação, deverão ser acrescidos de percentual de 1%, nos termos do artigo 85, §11, do CPC, observados os termos da Súmula 111 e de acordo com o decidido no Tema 1105, ambos do STJ.
Ante o exposto, nego provimento à apelação. Corrijo, de ofício, o capítulo da sentença referente aos consectários legais.
É como voto.