PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. PROVA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO JUNTADA FORA DO PRAZO. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. AÇÃO AJUIZADA HÁ MAIS DE 20 ANOS. REQUERENTE COM MAIS DE 75 ANOS DE IDADE. RETORNODOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA COLHEITA DA PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.1. Cinge-se a controvérsia à possibilidade ou não de prosseguimento do feito, uma vez que a parte apresentou a prova do requerimento administrativo do benefício de forma extemporânea.2. Tendo o INSS, em contestação que não adentrou o mérito da demanda, questionado a ausência de requerimento administrativo do benefício, o Juízo a quo, em atenção ao quanto decidido pelo STF no RE 631.240, sobrestou o feito e, em seguida, determinou aintimação da parte autora para regularizar tal pendência junto à autarquia previdenciária em trinta dias e trazer aos autos o respectivo comprovante, sob pena de extinção do processo. Intimada pessoalmente, a requerente quedou-se inerte, o queocasionoua extinção do feito.3. Após a sentença, a parte autora comprovou a postulação administrativa e afirmou tê-la feito no prazo assinalado, deixando, por lapso, de acostar aos autos o comprovante.4. Trata-se de feito em trâmite desde 2009, e que a parte autora já conta hoje com 76 anos de idade. Verifica-se, ainda, que, após a sentença, foi comprovada a realização do requerimento administrativo, que, segundo afirmou a requerente, foi feitodentro do prazo fixado. Assim, considerando o tempo de trâmite do feito e o caráter social do Direito Previdenciário, bem como o fato de não haver irregularidades pendentes, julgo que a solução que mais adequada é determinar o retorno dos autos aoJuízode origem para o devido prosseguimento.5. Apelação da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja colhida a prova testemunhal, uma vez que não se aplica ao caso o disposto no art. 1.013, § 3º, do CPC.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO . AUXÍLIO-DOENÇA . TRABALHADORRURAL. INDÍGENA. QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez de trabalhadora rural indígena.
- A parte autora juntou Registro Administrativo de Nascimento de Índio (RANI), emitido pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), atestando que a autora é indígena da etnia Terena.
- Comunicação de decisão informa o indeferimento de pedido de auxílio-doença, formulado em 30/01/2017, por parecer contrário da perícia médica.
- A parte autora, contando atualmente com 47 anos de idade, submeteu-se à perícia médica judicial.
- O laudo atesta que a parte autora apresenta dermatite de contato, doença de pele não infecciosa, crônica e irritante, que necessita de tratamento ambulatorial medicamentoso para controle clínico da evolução. Há incapacidade total e temporária, por um período de 6 meses, para tratamento e recuperação. Fixou a data de início da incapacidade em 24/01/2017 (data do atestado apresentado).
- Realizado mandado de constatação, no qual foi verificado que a autora reside na Aldeia Lagoinha, onde há plantio de mandioca e batata em agricultura familiar, utilizados para sustento próprio, além de pequenos animais, como porcos e galinhas, também para consumo próprio.
- Foram ouvidas duas testemunhas, que informaram conhecer a parte autora há muitos anos e que sempre laborou como rurícola.
- Neste caso, tratando-se de autor indígena, há que ser reconhecida sua condição de segurado especial, de acordo com o disposto na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45.
- Quanto à incapacidade, o laudo pericial é claro ao descrever as patologias das quais a parte autora é portadora, concluindo pela incapacidade total e temporária para o labor.
- Assim, neste caso, a parte autora comprovou o cumprimento da carência, com o exercício de atividade rural, e que está incapacitado total e temporariamente para qualquer atividade laborativa, justificando a concessão do auxílio-doença.
- Por fim, cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos do art. 300 c.c. 497 do CPC, é possível a antecipação da tutela para a imediata implantação do auxílio-doença, que deverá ser mantido, até o trânsito em julgado da presente ação, ou até decisão judicial em sentido contrário.
- Reexame necessário não conhecido. Apelação improvida. Mantida a tutela antecipada.
PROCESSUAL CIVIL: PREVIDENCIÁRIO . APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. INDÍGENA. ARTESÃO. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CARÊNCIA. ART. 142 DA LEI Nº 8.213/91. PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. CARACTERIZAÇÃO. SENTENÇA ANULADA.I - De acordo com a Lei 8.213/91, é segurado especial o indígena reconhecido pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, incluindo o artesão que utilize matéria-prima oriunda do extrativismo vegetal, desconsiderando se é aldeado, não-aldeado, em vias de integração, integrado ou isolado. É dizer, os povos indígenas, perante a legislação previdenciária, são considerados segurados especiais.II - Não é só o indígena que desempenha atividades de agricultura que é considerado segurado especial, tendo a legislação também abrangido nesse conceito o indígena que desempenha atividade de artesanato.III - A certidão fornecida pela FUNAI, certificando a condição do indío como trabalhadorrural constitui início de prova material constitui início de prova material do exercício de atividade rural do segurado especial da etnia indígena.IV - Além da certidão da FUNAI , a autora colacionou inúmeros documentos que denotam tratar-se de indígena e que constituem início de prova material da condição de segurada especial, a saber: Cartão da FUNAI em seu nome, expedida em 21/06/1993 onde consta que é aldeada em Aldeinha/Anastácio (fl. 268); certidão de nascimento de indígena, da autora na Aldeinha/Anastácio/MS (fl. 202); identidade de indígena da autora (fl. 185 e 201); Declaração da FUNAI (fl.190 e 197); carta de concessão de aposentadoria por velhice (rural) do seu companheiro, com DIB em 15/03/1991 (fl. 259) e que resultou na concessão de pensão rural em seu favor (fl. 273/274- óbito em 14/03/2000).V - Considerando que os documentos trazidos constituem início de prova material do labor rural exercido pela autora, o julgamento antecipado da lide, quando se mostrava indispensável a produção das provas devidamente requeridas pela parte, importa em cerceamento de defesa e, consequentemente, em nulidade do julgado.VI - De rigor a anulação da r. sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem para regular instrução da lide.VII - Recurso provido. Sentença anulada.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO . AUXÍLIO-DOENÇA . TRABALHADORRURAL. INDÍGENA. QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. MANUAL DE CÁLCULOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez de trabalhador rural indígena.
- A parte autora juntou carteira de identidade emitida pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, além de CTPS, constando vínculo empregatício em atividade rural, de 02/01/2015 a 04/02/2016.
- A parte autora, contando atualmente com 34 anos de idade, submeteu-se à perícia médica judicial.
- O laudo atestaque a parte autora apresenta hanseníase dimorfa com neurite de membros inferiores em tratamento clínico para controle da fase ativa. Conclui pela existência de incapacidade total e temporária para o trabalho. A incapacidade teve início em 15/02/2016, conforme documento médico apresentado.
- Foram ouvidas duas testemunhas, que informaram conhecer a parte autora há muitos anos e que sempre laborou como rurícola.
- Neste caso, tratando-se de autor indígena, há que ser reconhecida sua condição de segurado especial, de acordo com o disposto na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45.
- Quanto à incapacidade, o laudo pericial é claro ao descrever as patologias das quais a parte autora é portadora, concluindo pela incapacidade total e temporária para o labor.
- Assim, neste caso, a parte autora comprovou o cumprimento da carência, com o exercício de atividade rural, e que está incapacitado total e temporariamente para qualquer atividade laborativa, justificando a concessão do auxílio-doença.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data seguinte à cessação administrativa (21/07/2016), já que o conjunto probatório revela a presença das enfermidades incapacitantes àquela época.
- Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
- A verba honorária deve ser mantida em 10% sobre o valor da condenação, até a data da sentença.
- Reexame necessário não conhecido. Apelação parcialmente provida.
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE SEGURADO DO "DE CUJUS". TRABALHADOR RURAL INDÍGENA.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão.
2. Não será concedida a pensão aos dependentes do instituidor que falecer após a perda da qualidade de segurado, salvo se preenchidos, à época do falecimento, os requisitos para obtenção da aposentadoria segundo as normas então em vigor.
3. A comprovação do exercício de atividade rural da segurada especial indígena é feita mediante certidão fornecida pela FUNAI, atestando a condição da indígena como trabalhadorarural.
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. RECONHECIDA. TRABALHADOR INDÍGENA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. LIMITE ETÁRIO. AFASTADO.
1. O salário maternidade é devido à trabalhadora que comprove o exercício da atividade rural pelo período de 10 meses anteriores ao início do benefício, este considerado do requerimento administrativo (quando ocorrido antes do parto, até o limite de 28 dias), ou desde o dia do parto (quando o requerimento for posterior). 2. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea. 3. A comprovação do exercício de atividade rural do segurado especial de etnia indígena é feita mediante certidão fornecida pela FUNAI, atestando a condição do índio como trabalhador rural. 4. Não se aplica o limite etário em desfavor da segurada especial componente de comunidade indígena definido na lei previdenciária sob pena de ferir-se a proibição constitucional de discriminação por sexo, etnia e idade, bem como de desrespeitar o direito à diversidade cultural. Precedente da Corte.
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORARURALINDÍGENA. SEGURADA ESPECIAL. SEGURADA MENOR DE 16 ANOS DE IDADE. NORMA DE GARANTIA DO MENOR. VEDADA INTERPRETAÇÃO DESFAVORÁVEL. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE DO NASCITURO E DA FAMÍLIA.1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses,ainda que descontínuos, deve ser comprovado mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27), casoexternado neste particular.2. O INSS reconhece os direitos previdenciários a indígenas, na qualidade de segurados especiais, em razão das atividades rurícolas e de caça e pesca. Assim, o salário-maternidade é devido às mulheres indígenas de forma congênere ao da seguradaespecialque exerce atividade rural em regime de economia familiar.3. Nos termos da jurisprudência deste TRF da 1ª Região e do STJ, é possível reconhecer o direito ao benefício previdenciário à mãe indígena menor de 16 anos, uma vez que a vedação constitucional ao trabalho ao absolutamente incapaz, constante do art.7º, XXXIII da CF/88, é norma de garantia do trabalhador, que visa à proteção da criança, não podendo ser interpretada em seu desfavor quando efetivamente comprovada a atividade rural.4. Não se admite, portanto, que o benefício seja indeferido pelo não preenchimento do requisito etário para filiação ao RGPS, prejudicando o acesso ao benefício previdenciário e desamparando não só a adolescente como também o nascituro, que seriaprivado, a um só tempo, da proteção social e do convívio familiar, posto que sua genitora seria compelida a voltar às lavouras após o nascimento, o que prejudicaria o fortalecimento de vínculos, os cuidados na primeira infância e colocaria o nascituroem situação de risco.5. Apelação que se nega provimento.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CESSAÇÃO. INDÍGENA. AÇÃO DE RESSARCIMENTO. RECONVENÇÃO.
1. Demonstrado o efetivo exercício das atividades rurais, é de se reconhecer a ilegalidade do ato de cessação da aposentadoria rural por idade do indígena.
2. Ação de ressarcimento improcedente. Reconvenção procedente.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADA ESPECIAL. AUTORA INDÍGENA. PROVA MATERIAL SATISFATÓRIA. CERTIDÃO EMITIDA PELA FUNAI. VALIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. RECURSO PROVIDO.1. São requisitos para aposentadoria do trabalhadorrural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual aonúmero de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).2. O INSS reconhece os direitos previdenciários aos indígenas, na qualidade de segurados especiais, em razão das atividades rurícolas e de caça e pesca (IN 77/2015 - Art. 39, §4º). Assim, comprovando-se o preenchimento aos requisitos legais são devidosaos indígenas o benefício previdenciário de forma congênere ao do segurado especial que exerce atividade rural em regime de economia familiar. No caso dos autos, a autora implementou o requisito etário em 2007 (nascida em 05/04/1952), de modo que, aoteor do art. 142 da Lei 8.213/91, deve fazer prova do labor rural de subsistência exercido pelo período de 156 meses, ainda que descontínuos, em período imediatamente anterior ao requisito etário (1994 a 2007) ou ao requerimento administrativo, DER:05/08/2009 (período 1996 a 2009).3. Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial apresentou aos autos, dentre outros de menor relevo, os seguintes documentos: Registro Administrativo de Nascimento Indígena, em nome da autora, emitida pela FUNAI em 1996; certidão deexercício de atividade rural, emitida pela FUNAI, atestando que a autora exerceu agricultura de subsistência pelo período de 07/1992 a 10/2013; declaração de atividade agrícola, emitida pelo representante da Aldeia Terra Vermelha, informando atividaderural da autora exercida de 07/1992 a 10/2013. Dessa forma, diversamente do que consignou o Juízo sentenciante, há prova idônea a constituir início de prova material, razão pela qual, havendo confirmação do labor rural, de forma segura, pela provatestemunhal, resta satisfatoriamente preenchidos os requisitos para o benefício almejado.4. A propósito, calha registrar que o Decreto 7.778/2012, que institui o Estatuto da FUNAI, indica que compete às Coordenações Regionais da Fundação o monitoramento territorial, de políticas de educação e saúde e de promoção dos direitos socioculturaisdos povos indígenas (art. 21). Assim, tratando-se de segurada indígena, deve-se levar em conta que a FUNAI é o órgão de atuação direta junto aos povos originários, sendo a certidão por ela emitida válida para fins de comprovação de residência eatividade rural de subsistência.5. Apelação a que se dá provimento.
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. QUALIDADE DE SEGURADA. TRABALHADORARURAL. INDÍGENA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
1. O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser analisado, complementada por prova testemunhal consistente e idônea.
2. Hipótese em que não apresentado documento algum que indique o trabalho rural.
3. O fato de tratar-se de indígena residente em aldeia, por si só, não comprova o desempenho de atividade rural.
4. Manutenção da sentença de extinção do feito sem resolução de mérito.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INDÍGENA. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. TRABALHO RURAL COMPROVADO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. A comprovação do exercício de atividade rural do segurado especial de etnia indígena é feita mediante certidão fornecida pela FUNAI, atestando a condição do índio como trabalhador rural.
2. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência , nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO . PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TRABALHADORRURAL. INDÍGENA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Não há que se falar em nulidade da sentença, pois o magistrado se ateve ao pedido formulado pela parte autora na petição inicial, de forma que não houve condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do que foi demandado, respeitando-se os preceitos dos artigos 141 e 492 do CPC/2015.
- Pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez de trabalhadora rural indígena.
- A autora juntou carteira de identidade emitida pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, além de certidão de exercício de atividade rural emitida pela FUNAI, em 15/06/2007, atestando que a requerente desenvolve atividade rural em regime de economia familiar.
- Extrato do CNIS informa a concessão de auxílios-doença à parte autora, de 19/05/2007 a 31/07/2007 e de 23/05/2010 a 30/11/2010. Consulta ao sistema Dataprev informa que a requerente recebeu os auxílios-doença como segurada especial.
- A parte autora, atualmente com 50 anos de idade, submeteu-se à perícia médica judicial.
- O laudo atestaque a parte autora apresenta diabetes mellitus não insulino dependente. Faz acompanhamento mensal para controle glicêmico. Não foi apresentado nenhum exame complementar, atestado ou laudo médico que comprovasse qualquer outra patologia e nem mesmo durante o exame físico foi evidenciada a presença de outra doença. Portanto, fica comprovado que a paciente é portadora apenas de diabetes mellitus, a qual não a impossibilita de realizar sua atividade laboral habitual declarada. Em esclarecimentos, foi ratificada a conclusão da perícia judicial.
- A parte autora juntou documentos médicos informando que realiza tratamento com diagnóstico de pênfigo foliáceo endêmico (CID 10 L10.3), desde 2001.
- Foi realizado laudo complementar, atestando que a parte autora apresenta pênfigo foliáceo e diabetes mellitus tipo II. Há comprometimento físico suficiente para causar incapacidade total e permanente para o trabalho. Fixou a data de início da incapacidade em julho de 2013 e a data de início da doença em 2001. Afirmou que não há possibilidade de reabilitação profissional.
- Foram ouvidas duas testemunhas, que informaram conhecer a parte autora há muitos anos e que sempre laborou como rurícola. Afirmam que parou de trabalhar em razão dos problemas de saúde.
- Em consulta ao sistema Dataprev, verifiquei que o primeiro auxílio-doença foi concedido no período de 19/05/2007 a 31/07/2007 em razão de neoplasia maligna do corpo do útero (CID 10 C54) e que o segundo auxílio-doença foi concedido no período de 23/05/2010 a 30/11/2010 em razão de pênfigo brasileiro (CID 10 L10.3).
- Neste caso, tratando-se de autora indígena, há que ser reconhecida sua condição de segurada especial, de acordo com o disposto na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45.
- Assim, verifico que a requerente juntou início de prova material de sua condição de rurícola, o que foi corroborado pelo testemunho, justificando o reconhecimento de sua condição de segurada especial, tendo deixado de laborar em razão da doença, não havendo que se falar em perda da qualidade de segurado.
- Quanto à incapacidade, o laudo judicial é claro ao descrever as patologias das quais a parte autora era portadora, concluindo pela incapacidade total e definitiva para o labor.
- Assim, neste caso, a parte autora comprovou o cumprimento da carência, com o exercício de atividade campesina, e que estava incapacitada total e permanentemente para qualquer atividade laborativa, justificando a concessão da aposentadoria por invalidez.
- O termo inicial da aposentadoria por invalidez deve ser fixado na data seguinte à cessação do segundo auxílio-doença (01/12/2010), já que o conjunto probatório revela a presença das enfermidades incapacitantes àquela época.
- Cumpre observar que não é possível fixar o termo inicial a partir de 2007, como pretende a parte autora, pois recebeu auxílio-doença àquela época em razão de patologia diversa da constatada na presente demanda, inexistindo qualquer documento que comprove que se encontra incapacitada desde então.
- A verba honorária deve ser mantida em 10% sobre o valor da condenação, até a data da sentença.
- Observe-se que a autarquia decaiu de maior parte do pedido, de modo que deve responder por inteiro pela verba honorária e despesas, a teor do artigo 86, parágrafo único, do CPC.
- Apelação da autarquia improvida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. trabalhadorARURALINDÍGENA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. honorários. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. Comprovada a morte e a qualidade de segurada da instituidora, e a relação de dependência econômica com as pretendentes do benefício, é devida a pensão por morte.
2. A comprovação do exercício de atividade rural da segurada especial indígena é feita mediante certidão fornecida pela FUNAI, atestando a condição da indígena como trabalhadora rural.
3. Correção monetária e juros nos termos do artigo 1º-F da Lei 9.494/1991, com a redação da Lei 11.960/2009, quanto ao período após junho de 2009, como estabelecido em sentença, por não haver recurso da parte pretendente do benefício contra essa decisão. Aplicação da Súmula 45 do Superior Tribunal de Justiça.
4. Os honorários de advogado são fixados em dez por cento sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas nos termos da Súmula 76 desta Corte e da Súmula 111 do STJ.
5. Ordem para a implantação do benefício. Precedente.
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. AFASTAMENTO DE REGRA NORMATIVA EM CONTROLE DIFUSO. POSSIBILIDADE. OIT. CONVENÇÃO 169. ESTATUTO DO ÍNDIO. LEI 6.001/73. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PROTEÇÃO SOCIAL. GENITORA INDÍGENA COM IDADE INFERIOR A 16 ANOS. SEGURADA ESPECIAL. SALÁRIO-MATERNIDADE. DIREITO. RECONHECIMENTO.
1. De acordo com Supremo Tribunal Federal, o Ministério Público detém legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos, quando presente evidente relevo social, independentemente de os potenciais titulares terem a possibilidade de declinar a fruição do direito afirmado na ação. 2. No caso, não está em discussão, apenas e tão somente, o direito, e respectivos limites, à concessão de determinado benefício previdenciário. A discussão revela transcendência, delimitando a pertinência da atuação ministerial na tutela de direitos indígenas (art. 129, V da CF), ainda que veicule pretensão de matéria de natureza previdenciária. 3. Mostra-se possível a utilização da Ação Civil Pública, assim como qualquer outro instrumento processual, a fim de obter pronunciamento que declare, incidentalmente, a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, particularmente quando esta declaração constituir-lhe a sua causa de pedir e não o próprio pedido. 4. No presente feito, o pedido do MPF não visa declaração de inconstitucionalidade - em abstrato e com efeito erga omnes - de ato normativo, mas tão somente o afastamento da incidência dos artigos 9º e 11 do Decreto 3.048/99, para que se garanta auxílio maternidade às adolescentes indígenas grávidas e menores de 16 anos. 5. A pretensão veiculada na presente demanda visa, tão somente, à luz dos demais princípios protetivos, que seja desconsiderado o limite de idade como requisito necessário à concessão do salário-maternidade às mulheres indígenas. Inexiste na exordial, portanto, impugnação de ato normativo abstrato que corresponda à ineficácia de qualquer diploma legislativo, de modo que, deve ser rejeitada esta preliminar. 6. Ao cotejar a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, a Declaração das Nações Unidas, a Constituição e Estatuto do Índio - Lei 6001/73, é possível extrair um núcleo básico de proteção social ao trabalho indígena contendo, dentre outras garantias, o direito à não discriminação (direitos trabalhistas e previdenciários em igualdades de condições com não índios e igualdade de oportunidades entre homens e mulheres indígenas e mais desdobramentos quanto ao acesso ao emprego, isonomia salarial, assistência médica e social, segurança e higiene no trabalho, seguridade social, habitação e direito de associação. Logo, a proteção previdenciária, também, impõe-se aos indígenas. 7. A norma do art. 7°, inciso XXXIII, da CF tem caráter protetivo, visando coibir a exploração do trabalho das crianças e adolescentes, preservando o seu direito à educação, ao lazer e à saúde. Não se coaduna, portanto, com a finalidade da lei valer-se dessa regra para negar aos trabalhadores menores direitos previdenciários e trabalhistas reconhecidos aos trabalhadores maiores de idade. 8. Assim, sob pena de estabelecer uma discriminação à mulher indígena impúbere, comprovada a maternidade e a qualidade de segurada especial da mulher indígena durante o período de carência, deve ser concedido o benefício de salário-maternidade. 9.
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. AFASTAMENTO DE REGRA NORMATIVA EM CONTROLE DIFUSO. POSSIBILIDADE. OIT. CONVENÇÃO 169. ESTATUTO DO ÍNDIO. LEI 6.001/73. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PROTEÇÃO SOCIAL. ETNIA KAINGANG. GENITORA INDÍGENA COM IDADE INFERIOR A 16 ANOS. SEGURADA ESPECIAL. SALÁRIO-MATERNIDADE. DIREITO. RECONHECIMENTO.
1. De acordo com Supremo Tribunal Federal, o Ministério Público detém legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos, quando presente evidente relevo social, independentemente de os potenciais titulares terem a possibilidade de declinar a fruição do direito afirmado na ação. 2. No caso, não está em discussão, apenas e tão somente, o direito, e respectivos limites, à concessão de determinado benefício previdenciário. A discussão revela transcendência, delimitando a pertinência da atuação ministerial na tutela de direitos indígenas (art. 129, V da CF), ainda que veicule pretensão de matéria de natureza previdenciária. 3. Mostra-se possível a utilização da Ação Civil Pública, assim como qualquer outro instrumento processual, a fim de obter pronunciamento que declare, incidentalmente, a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, particularmente quando esta declaração constituir-lhe a sua causa de pedir e não o próprio pedido. 4. No presente feito, o pedido do MPF não visa declaração de inconstitucionalidade - em abstrato e com efeito erga omnes - de ato normativo, mas tão somente o afastamento da incidência dos artigos 9º e 11 do Decreto 3.048/99, para que se garanta auxílio maternidade às adolescentes indígenas grávidas e menores de 16 anos. 5. A pretensão veiculada na presente demanda visa, tão somente, à luz dos demais princípios protetivos, que seja desconsiderado o limite de idade como requisito necessário à concessão do salário-maternidade às mulheres indígenas. Inexiste na exordial, portanto, impugnação de ato normativo abstrato que corresponda à ineficácia de qualquer diploma legislativo, de modo que, deve ser rejeitada esta preliminar. 6. Ao cotejar a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, a Declaração das Nações Unidas, a Constituição e Estatuto do Índio - Lei 6.001/73, é possível extrair um núcleo básico de proteção social ao trabalhoindígena contendo, dentre outras garantias, o direito à não discriminação (direitos trabalhistas e previdenciários em igualdades de condições com não índios e igualdade de oportunidades entre homens e mulheres indígenas e mais desdobramentos quanto ao acesso ao emprego, isonomia salarial, assistência médica e social, segurança e higiene no trabalho, seguridade social, habitação e direito de associação. Logo, a proteção previdenciária, também, impõe-se aos indígenas. 7. A norma do art. 7°, inciso XXXIII, da CF tem caráter protetivo, visando coibir a exploração do trabalho das crianças e adolescentes, preservando o seu direito à educação, ao lazer e à saúde. Não se coaduna, portanto, com a finalidade da lei valer-se dessa regra para negar aos trabalhadores menores direitos previdenciários e trabalhistas reconhecidos aos trabalhadores maiores de idade. 8. Assim, sob pena de estabelecer uma discriminação à mulher indígena impúbere, comprovada a maternidade e a qualidade de segurada especial da mulher indígena, no caso da etnia Kaingang, durante o período de carência, deve ser concedido o benefício de salário-maternidade. 9. Remessa necessária e apelação conhecidas e desprovidas.
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEGITIMIDADE ATIVA. DIREITOS INDÍGENAS. SALÁRIO-MATERNIDADE. REQUISITO ETÁRIO. IDADE MÍNIMA. DESCONSIDERAÇÃO. MULHERES INDÍGENAS. ETNIA KAINGANG. SEGURADAS ESPECIAIS. PROTEÇÃO SOCIAL CONSTITUCIONAL. PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA. MULHER INDÍGENA. DISCRIMINAÇÃO POR ETNIA, SEXO E IDADE. DISCRIMINAÇÃO MÚLTIPLA OU INTERSECCIONAL. DIREITOS CULTURAIS. DIVERSIDADE CULTURAL. DIREITO AO RECONHECIMENTO. DIREITO PROBATÓRIO. DISCRIMINAÇÃO INDIRETA. PODER JUDICIÁRIO. LEGISLADOR NEGATIVO. ATUAÇÃO CONCRETIZADORA. DIREITOS FUNDAMENTAIS. APLICAÇÃO IMEDIATA. DIREITOS SOCIAIS DERIVADOS. PRESTAÇÃO SOCIAL POSITIVA. PROIBIÇÃO DO TRABALHO. MENORES DE DEZESSEIS ANOS. NORMA PROTETIVA. TRATAMENTO DIFERENCIADO. POSSIBILIDADE.
1. O MPF tem legitimidade para a defesa, por meio de ação civil pública, de direitos individuais homogêneos em matéria previdenciária, notadamente em defesa das comunidades indígenas, nos termos do art. 129, V, da Constituição.
2. Direito à proteção previdenciária em favor de mulheres mães indígenas, ainda que com idade inferior a 14 anos de idade.
3. A Constituição da República reconhece "aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam" (art. 231). O Estatuto do Índio prevê que "o regime geral da previdência social será extensivo aos índios, atendidas as condições sociais, econômicas e culturais das comunidades beneficiadas" (art. 55).
4. A Constituição de 1988, atenta às diferenças culturais presentes na sociedade brasileira, previu tratamento específico quanto às culturas e etnias indígenas. Toda a legislação infraconstitucional deve ser interpretada conforme o comando do artigo 231, que prevê verdadeiro direito ao reconhecimento da organização social, costumes, línguas, crenças e tradições indígenas.
5. Inaplicabilidade ao caso do art. 11, VII, "c", da Lei n.º 8.213/1991, que estipula a idade de 16 anos, para o filho ou quem for a este equiparado, como segurado obrigatório da Previdência Social, porque não se trata de condição de segurada decorrente da qualidade de filha, mas sim de cônjuge ou companheira de segurado especial, uma vez que a mulher indígena em questão estabelece relação conjugal.
6. Mesmo no paradigma do Código Civil, direito legislativo próprio da cultura não-indígena, permite-se o casamento aquém dos 16 anos de idade, em caso de gravidez (CC, art. 1520). Se assim é em norma jurídica cuja aplicação divorciada da cultura indígena seria inadequada - e que poderia levar à condição de segurada, como cônjuge, abaixo dos 16 anos -, com muito mais razão diante do mandamento constitucional de respeito às diferenças culturais.
7. No plano dos fatos, a literatura especializada não deixa dúvida quanto à idade de casamento na cultura kaingang ser não só inferior aos 16 anos, como serem consideradas adultas e, portanto, aptas para casarem desde a menarca (que ocorre entre os 9 e 15 anos, acontecendo em média aos 12 anos; dentre os Kaingang, há registro científico de 13 anos como idade média.
8. Na cultura indígena em questão, como em geral nas culturas indígenas espalhadas pelo Brasil, por volta dos 12 anos surgem não somente a menarca, como também a vida adulta. Junto com a vida adulta, não há como não reconhecer, igualmente, a participação ativa e relevante destas indígenas nas atividades vitais para o desenvolvimento de sua comunidade, expressão que utilizo objetivando aproximar-me da categoria "trabalho", como entendida desde a modernidade.
9. Não bastasse a proibição constitucional de discriminação sexista quanto à compreensão do que seja trabalho, a proibição de discriminação étnica também incide, fazendo ver que as atividades desempenhadas por mulheres indígenas casadas e mães, independentemente de idade, são culturalmente relevantes e valorizadas na cultura kaingang. É preciso, portanto, evitar qualquer tentação colonialista de desprezar o trabalho indígena, sob pena de violação da proibição de discriminação por motivo étnico, bem como em face do artigo 231 da CF/88.
10. Assim, ficam superadas alegações quanto à falta de comprovação de trabalho ou, do "costume de trabalhar" (sic). Tal argumentação parece padecer, ainda que involuntariamente, das representações preconceituosas, decorrentes do etnocentrismo, em particular, quanto às atividades produtivas na cultura indígena, e, mais ainda, quando se entrecruzam etnia, sexo e idade.
11. Diante de fatos históricos, passados e presentes, bem como da organização social da cultura indígena, estamos diante de fato púbico e notório, que não pode se confundir somente com aquilo que é disseminado no senso comum e, mais grave ainda, no senso comum da cultura branca ocidental. A dificuldade probatória decorrente da chamada discriminação institucional indireta, vale dizer, de efeitos discriminatórios involuntários originados da dificuldade que a cultura dominante e os grupos privilegiados tem para perceber a sua posição de vantagem e a naturalização, como se neutra fosse, sua visão de mundo.
12. A jurisprudência, inclusive aquela do Supremo Tribunal Federal, assentou que não podem ser prejudicados em seus direitos trabalhistas e previdenciários os menores de idade que exerçam efetivamente atividade laboral, ainda que contrariamente à Constituição e à lei, no tocante à idade mínima permitida para o referido trabalho. O limite mínimo de idade para que alguém possa trabalhar é garantia constitucional em prol do menor, vale dizer, norma protetiva do menor norteadora da legislação trabalhista e previdenciária. A mesma norma editada para proteger o menor não pode, no entanto, prejudicá-lo naqueles casos em que, não obstante a proibição constitucional, efetivamente trabalhou.
13. Não se sustenta o argumento de que o Estatuto do Índio apenas estende aos índios o regime previdenciário em vigor, o que significaria tornar letra morta o art. 55. Fosse correta tal interpretação, bastaria ao Estatuto dizer que a Previdência Social deve abranger os índios, sem necessidade de atender suas condições sociais, econômicas e culturais. Este argumento não ultrapassa, ainda pelo menos duas ordens de razões. A primeira diz respeito mesmo à letra da lei, aplicada no contexto cultural em causa. A mulher indígena aqui não é filho nem menor a tanto equiparada. Ela é, no mínimo, cônjuge, quando não trabalhadora segurada especial. A segunda, a partir e mesmo além da letra da lei, pelo chamado "espírito da lei", no caso, a sua finalidade protetiva.
14. De outro lado, não se está a aplicar tratamento diferenciado com base em critérios não razoáveis. Pelo contrário, o critério de diferenciação é perfeitamente razoável, tendo em vista as peculiaridades da cultura indígena, em especial da etnia Kaingang, e está expressamente previsto em Lei (Estatuto do Índio). Trata-se de normativa, a propósito, que deve ser vista como especial, prevalecendo diante das disposições da Lei n.º 8.213/1991, que ignoram os costumes das comunidades indígenas.
15. É superável igualmente o argumento de que a permissão da concessão de benefício a menores de dezesseis anos equivale a política assistencialista, cuja atribuição é da FUNAI. Não se trata de política propriamente assistencialista, mas sim de conceder benefício previdenciário também a menores de dezesseis anos, assim como já é concedido às maiores, desde que satisfeitos os demais requisitos.
16. Também não se sustenta o argumento de que a flexibilização do limite etário incentivará o trabalho infantil e a gravidez precoce. A um, porque tais elementos já ocorrem há muito tempo, fazendo parte da cultura dos índios, havendo ou não cobertura previdenciária; a dois, porque não se concebe a impossibilidade de se conceder qualquer benefício previdenciário ao argumento de que poderá abstratamente incentivar alguém a preferir a situação de risco coberta pela Previdência. A possibilidade de recebimento de salário-maternidade de forma alguma incentivará a gravidez precoce e muito menos pode servir de argumento para flexibilizar o requisito etário.
17. Não se trata de atuação do Poder Judiciário como legislador positivo. Primeiro, porque o artigo 231 da CF/88, que é norma de direito fundamental, a proteger liberdade e igualdade fundamentais aos povos indígenas, bem como a reconhecer sua dignidade, tem eficácia direta e imediata. Ainda que não se empreste tal eficácia direta e aplicabilidade imediata do direito de igualdade, estamos diante de direito fundamental derivado a não-ser discriminado no sistema previdenciário. Deste modo, o tribunal está agindo não como legislador positivo, não está inovando. Ele está aplicando a clássica proteção antidiscriminatória, de natureza negativa, ao dizer o que o legislador, no sistema que ele mesmo erigiu, não pode fazer: ele não pode excluir direito derivado à proteção social para uns e favorecer outros. Dito de outro modo: não há espaço para opção legislativa que viole o dever de observância à igualdade, seja diretamente, seja, como no caso, de direito derivado a prestação social.
18. Apelação e remessa necessária desprovidas, mantendo-se a sentença que determinou ao INSS que admita o ingresso no RGPS e se abstenha de indeferir benefício de salário-materinidade em razão do requisito etário para mulheres indígenas residentes em comunidades Kaingang abrangidas pela Subseção Judiciária de Palmeira das Missões/RS.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS LEGAIS. INCAPACIDADE PERMANENTE COMPROVADA. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL COMO TRABALHADORARURALINDÍGENA. CERTIDÃO DA FUNAI. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade.
2. Caracterizada a incapacidade laborativa permanente da segurada para realizar suas atividades habituais, mostra-se correta a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
3. A comprovação do exercício de atividade rural do segurado especial de etnia indígena é feita mediante certidão fornecida pela FUNAI, atestando a condição do índio como trabalhador rural. Não obstante, sendo comparados aos trabalhadores em regime de economia familiar, é necessário que este início de prova material seja cotejada com a prova testemunhal.
4. As provas testemunhais são válidas para complementar o início de prova material do tempo rural. A prova testemunhal, desde que idônea e convincente, é apta a comprovar os claros não cobertos por prova material.
5. Honorários advocatícios majorados, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO . APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADORRURAL. INDÍGENA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CORREÇÃO MONETÁRIA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/1991.
- À concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, exige-se: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo n. 1.354.908).
- A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ).
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural. Precedentes do STJ.
- Admite-se como início de prova material cópia da certidão de nascimento do autor e declaração, ambas emitidas pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, que revelam ser indígena não integrado na comunhão nacional, residente em área rural, sendo cediço que o indígena residente em aldeia é trabalhador rural.
- A prova testemunhal complementou esse início de prova documental ao asseverar perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório e sem contraditas, que conhece o autor há vários anos, sempre trabalhando na atividade rural.
- Em decorrência, preenchidos os requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido desde a data do requerimento administrativo.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR). Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Apelação parcialmente provida.
PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO. SALÁRIO-MATERNIDADE. QUALIDADE DE SEGURADA. RURAL. INDÍGENA. LIMITE ETÁRIO. AFASTADO.
1. Não corre a prescrição contra os incapazes, aplicando-se tal expressão até os 18 anos de idade. Deve, ainda, ser respeitada a suspensão do prazo prescricional por conta do ingresso do pedido administrativo, nos termos do art. 4º do Decreto nº 20.910/32, desconsiderando-se a condição de indígena da autora, pertencente a comunidade plenamente integrada.
2. O salário maternidade é devido à trabalhadora que comprove o exercício da atividade rural pelo período de 10 meses anteriores ao início do benefício, este considerado do requerimento administrativo (quando ocorrido antes do parto, até o limite de 28 dias), ou desde o dia do parto (quando o requerimento for posterior).
3. Consoante orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Resp n. 1.321.493-PR, aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário"), sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Apresentado o início de prova material, corroborada pela prova testemunhal, presente a qualidade de segurada da autora.
4. Não se aplica o limite etário em desfavor da segurada especial componente de comunidade indígena definido na lei previdenciária sob pena de ferir-se a proibição constitucional de discriminação por sexo, etnia e idade, bem como de desrespeitar o direito à diversidade cultural. Precedente da Corte.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SALÁRIO MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. MENOR DE 16 ANOS. INDÍGENA. ART. 7º, XXXIII, DA CF. NORMA PROTETIVA.
1. Tratando-se de norma protetiva, incabível evocar a proibição do art. 7º, XXXIII, da Constituição Federal para obstar o acesso ao reconhecimento de direito previdenciário.
2. Viável reconhecer a condição de segurado especial aos que exercem atividades rurícolas, mesmo que menores de 16 anos de idade, inclusive no caso de indígenas, sob pena de se estabelecer uma discriminação à mulher indígena impúbere.