
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:FREDERICO FARIA DE MELO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: LAURTE LEANDRO LESSA FILHO - TO9598-B e BALTAZAR DONIZETE DE SOUZA - GO27301
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1020524-74.2021.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FREDERICO FARIA DE MELO
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de sentença, alterada por embargos de declaração, que julgou procedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC, para declarar especial o tempo de contribuição nos períodos de 05/12/1993 a 31/12/1995 e de 17/01/1996 a 19/03/2020, na Prefeitura de Colmeia/TO, devendo ser aplicado o fator de 1,4 (um vírgula quatro) referente à profissão de motorista de ambulância nos períodos reconhecidos, bem como determinar ao INSS a apresentação do demonstrativo com todo o tempo trabalhado, considerando a conversão do tempo especial reconhecido em tempo comum, utilizando o fator 1,4 (um vírgula quatro).
Determinou ao ente previdenciário a implementação da aposentadoria por tempo de contribuição a partir do requerimento administrativo, efetuando o pagamento das parcelas vencidas, com a devida correção monetária, nos termos da Lei nº 11.960/2009, que alterou art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, havendo incidência, uma única vez, até o efeito pagamento, dos índices oficiais da remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.
Condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a prolação da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ, bem como o pagamento das custas processuais (Súmula 178/STJ).
Nas razões recursais (ID 144861063), a parte apelante sustenta, inicialmente, isenção do pagamento de custas e dispensa do preparo, em razão da Lei Estadual/TO nº 3.296/2017.
No mérito, afirma que a atividade alegada como especial exercida pela parte autora não pode ser assim reconhecida, uma vez que ausente a observância dos requisitos legais, pois o simples fato de executar atividades em ambiente hospitalar, com eventual contato com agentes biológicos, não enseja enquadramento como especial, salientando que o perfil profissiográfico juntado aos autos não pode ser considerado.
Aduz, ainda, que a parte autora é filiada a regime próprio de previdência, de modo que não cabe a concessão da aposentadoria em questão pelo regime geral.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 144861063).
É o relatório.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1020524-74.2021.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FREDERICO FARIA DE MELO
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa da remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp 1.735.097/RS; REsp 1.844.937/PR).
Consigno, ainda, que a prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ.
O pleito da parte autora consiste na concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com o reconhecimento do tempo de serviço laborado em condições especiais e o pagamento das prestações daí advindas.
Anoto que a sentença recorrida reconheceu a especialidade da atividade desenvolvida pela parte autora, tendo em vista a exposição aos fatores de risco biológico, na qualidade de motorista de ambulância.
Foi acostada aos autos documentação comprobatória do tempo de trabalho prestado pela parte autora, qual seja, declaração de tempo de contribuição para fins de obtenção de benefício junto ao INSS expedida pela Prefeitura de Colmeia/TO, termo de posse junto a Prefeitura de Colmeia/TO em 05/03/1996, CTPS (ID 144861062), extratos de pagamentos salariais, demonstrativo de cálculo de tempo de contribuição (ID 144861063) e PPP (ID 144861057).
A Lei 8.213/1993, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências, ao tratar da aposentadoria especial, estabelece em seu art. 57 o seguinte:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
A classificação das atividades sob condições especiais ou a comprovação da efetiva e habitual exposição do segurado aos agentes nocivos para fins de aposentadoria especial é definida pela legislação previdenciária então em vigor (Decreto nº 53.831, de 25/03/1964; Decreto nº 83.080, de 24/01/1979; Lei nº 8.213, de 24/07/1991; Lei nº 9.032, de 29/04/1995; Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 e Decreto nº 3.048, de 06/05/1999).
Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Infere-se do PPP emitido pela Prefeitura Municipal de Colmeia/TO que a parte autora desde 17/01/1996, até a data da emissão do referido documento (17/01/2019), exerceu a função de motorista de ambulância, estando em contato com pacientes.
O PPP informa que, durante o período mencionado, a parte autora exercia a atividade de “conduzir veículo de transporte de pacientes (ambulância) até as localidades onde haja atendimento de saúde, seja em vias municipais, estaduais ou federais. Possui atribuição de acomodar o paciente na maca e no interior da ambulância” (ID 144861057). No referido documento, consta responsável pelos registros ambientais e pela monitoração biológica.
Para que seja considerado regular, o PPP deve apresentar as informações básicas referentes a (a) dados administrativos da empresa e do trabalhador; (b) registros ambientais; (c) resultados de monitoração biológica, quando exigível; (d) dados referentes a EPC (para o período posterior a 13/10/1996) e EPI (para o período posterior a 03/12/1998), se for o caso; (e) responsável(is) pelas informações (Responsável Técnico habilitado, com registro no CREA, tratando-se de engenheiro de segurança do trabalho, ou CRM, no caso de médico do trabalho) e (f) assinatura do representante legal da empresa ou seu preposto.
Também deve ser considerado regular o PPP nas seguintes hipóteses, conquanto, nesse caso, apresente meramente valor de formulário de informações sobre atividades exercidas em condições especiais (do mesmo modo que os formulários que o precederam, SB-40, DIRBEN-8030 e DSS-8030): a) quando, emitido apenas para comprovar o enquadramento por categoria profissional para as atividades exercidas até 28/04/1995, deixar de apresentar dados referentes a registros ambientais; b) quando, destinado a comprovar a submissão a agentes nocivos, à exceção do ruído, para o período até 05/03/1997, deixar de indicar o responsável pelos registros ambientais; c) quando, destinado a comprovar a submissão a agentes nocivos para o período até 13/10/1996 e 03/12/1998, deixar de apresentar informações acerca de EPC e EPI eficaz, respectivamente, em descompasso com os registros ambientais da empresa; e d) quando nele constar nome de responsável técnico pelos registros ambientais, ainda que não abarque integralmente o período de labor, e nas observações finais haja referência ao fato de que a exposição a fatores de risco foi extraída de laudo elaborado anterior ou posteriormente (aplicação da Súmula nº 68 da TNU), situação em que se considera que a empresa responsabiliza-se pela informação de que as condições aferidas no laudo extemporâneo (LTCAT, PPRA, etc.) retratam fielmente o ambiente de trabalho existente no período efetivamente laborado, isto é, que não houve alteração significativa no ambiente de trabalho ou em sua organização entre o tempo de vigência do liame empregatício e a data da confecção do documento.
As funções efetivamente exercidas pelo segurado, as quais já foram devidamente descritas acima, notadamente de contato com os pacientes que transportava, lhe conferem risco potencial de contaminação e contágio, uma vez que se trata de atividade que habitualmente demanda o contato do trabalhador com pacientes doentes, secreções e materiais contaminados.
O fato de o segurado realizar algumas tarefas que não o exponham ao contato direto com agentes biológicos durante a sua jornada de trabalho não elide o reconhecimento da especialidade do labor, pois a especialidade do trabalho não existe em virtude do desgaste que o agente nocivo provocaria à integridade do profissional, mas sim em virtude do risco dessa exposição. Nesse sentido, trago à colação precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF. TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS. AMBIENTE HOSPITALAR. CONCEITOS DE HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA QUE COMPORTAM INTERPRETAÇÃO. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO QUALITATIVO. RISCO IMINENTE. AVALIAÇÃO DA REAL EFETIVIDADE E DA DEVIDA UTILIZAÇÃO DO EPI. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM ESPECIAL. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO VIGENTE QUANDO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO BENEFÍCIO PRETENDIDO. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC.
1. É deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegação de ofensa ao art. 535 do CPC se faz de forma genérica, sem a demonstração exata dos pontos pelos quais o acórdão se fez omisso, contraditório ou obscuro. Aplica-se, na hipótese, o óbice da Súmula 284 do STF.
2. A circunstância de o contato com os agentes biológicos não perdurar durante toda a jornada de trabalho não significa que não tenha havido exposição a agentes nocivos de forma habitual e permanente, na medida que a natureza do trabalho desenvolvido pela autora, no ambiente laboral hospitalar, permite concluir por sua constante vulnerabilidade. Questão que se resolve pelo parâmetro qualitativo, e não quantitativo.
3. Na hipótese, a instância ordinária manifestou-se no sentido de que, sendo evidente a exposição a agentes de natureza infecto-contagiosa, não há como atestar a real efetividade do Equipamento de Proteção Individual - EPI. Rever esse entendimento, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice da Súmula 7/STJ.
4. No julgamento do REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, processado nos termos do arts. 543-C do CPC, o STJ firmou entendimento no sentido de que, para fazer jus à conversão de tempo de serviço comum em especial, é necessário que o segurado tenha reunido os requisitos para o benefício pretendido antes da vigência da Lei n. 9.032/95, independentemente do regime jurídico reinante à época em que prestado o serviço.
5. Recurso especial do INSS parcialmente provido, para se afastar a pretendida conversão de tempo de serviço comum em especial.
(REsp 1.468.401/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Sérgio Kukina, unânime DJe 27/03/2017).
No mesmo sentido, decidiu esta Corte, confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTE NOCIVO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE E LEI 9.032/95. APELAÇÃO DESPROVIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS.
1. As condições especiais de trabalho demonstram-se: a) até 28/04/1995 (dia anterior à vigência da Lei nº 9.032/95), pelo enquadramento profissional, ou mediante formulários da própria empresa ou laudos técnicos; b) a partir de 29/04/1995, por formulários próprios (SB-40 e DSS-8030, padronizados pelo INSS), preenchidos pela empresa, ou mediante laudo (todavia, no caso do engenheiro civil e do engenheiro eletricista, a sistemática anterior persistiu até 11/10/96, quando foi revogada a Lei 5.527/68 pela MP 1.523/96); c) a partir da vigência do Decreto nº 2.172/97, publicado em 06/03/1997, por Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT), expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, devendo as empresas, desde então, elaborar e manter Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) das atividades desenvolvidas pelos trabalhadores. A exposição a agentes químicos, físicos e biológicos insalubres, confere ao trabalhador o direito ao cômputo do tempo de serviço especial, relativamente ao período comprovado, consoante previsão constante dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, para as atividades desempenhadas até a entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97 (cf. art. 292 do Dec. 611/92), e com base nos agentes indicados nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, observados os respectivos períodos de vigência. De qualquer modo, mesmo após 06/03/1997 tem a jurisprudência reconhecido que o formulário PPP, desde que subscrito por engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, pode ser utilizado como prova de trabalho prestado sob condições especiais (vide STF, ARE 664335, e TNU, PEDILEF 50379486820124047000).
2. "Não devem receber interpretação retroativa as alterações promovidas no Art. 57, da Lei nº 8.213/91 pela Lei nº 9.032/95, especialmente a regra estabelecida pelo parágrafo terceiro do referido art. 57, que introduziu a exigência do caráter permanente, não ocasional nem intermitente do labor em condições especiais." (AC 2001.01.99.041623-9/MG, Rel. Desembargador Federal Carlos Moreira Alves, Segunda Turma, DJ de 12/05/2009, p. 380). Assim, a exigência legal referente à comprovação sobre ser permanente a exposição aos agentes agressivos somente alcança o tempo de serviço prestado após a entrada em vigor da Lei nº 9.032/95. De qualquer sorte, a constatação do caráter permanente da atividade especial não exige que o trabalho desempenhado pelo segurado esteja ininterruptamente submetido a um risco para a sua incolumidade.
3. No caso concreto, o PPP de fls. 15v/16 revela que o Autor laborou, no período compreendido entre 09/02/1990 a 05/10/2016, junto a Prefeitura do Município de Pimenta Bueno, ocupando o cargo de "motorista de ambulância", estando exposto de forma habitual e permanente a agentes biológicos, recebendo, inclusive, adicional de insalubridade, conforme PPP e folha de salário de fls. 17. Consta da descrição das atividades do autor, que "o titular do cargo efetua serviços de condução de veículos automotor (Ambulância) requerente de habilitação de categoria "D", trabalho qualificado, na área de saúde, que consiste em conduzir ambulância a fim de transportar pacientes a ambulatórios, laboratórios, hospitais e a outras cidades; zelar pela limpeza e conservação do veículo e seus equipamentos; mantê-lo em perfeitas condições de uso; auxiliar na locomoção do paciente e desembaraço da documentação necessária a internações e realização de exames. Ficando exposto aos Riscos Biológicos, recebendo insalubridade em Grau Médio de 20% sob o Salário Mínimo", pelo que, devido o enquadramento da atividade como especial, tendo em vista o contato com pacientes doentes e materiais contaminados que o expunha ao risco de doenças infectocontagiosas durante a jornada de trabalho, a exemplo do que ocorre no ambiente hospitalar, o que torna o trabalho especial, conforme item 1.3.2 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964, itens 1.3.4 e 1.3.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979 e item 3.0.1, alínea "a", do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/1997 e 3.048/1999.
4. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida e, por conseguinte, conceder o benefício nos termos consignados na sentença recorrida.
5. Os honorários advocatícios ficam majorados em 1% (um por cento), a teor do disposto no artigo 85, §§ 2º, 3º e 11º do CPC, totalizando o quantum de 11% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.
6. Apelação desprovida.
(AC 0000655-25.2018.4.01.9199/RO, Primeira Câmara Regional Previdenciária da Bahia, Rel. Juiz Federal convocado Saulo José Casali Bahia, unânime, e-DJF1 15/06/2021).
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO: EXPOSIÇÃO EM PATAMAR SUPERIOR AOS LIMITES LEGAIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. AGENTES BIOLÓGICOS. MOTORISTA DE AMBULÂNCIA. EPI. POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO DEFERIDO. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. CUSTAS.
1 O tempo de serviço especial é aquele decorrente de labor prestado sob condições prejudiciais à saúde ou em atividades com riscos superiores aos normais para o segurado e, cumpridos os requisitos legais, confere direito para todos os fins previdenciários.
2. Consiste em atividade especial aquela desenvolvida em ambiente com ruído médio superior a 80dB (oitenta decibéis), no período de vigência simultânea e sem incompatibilidades dos Decretos nº 53.831/1964 e 83.080/1979; superior a 90dB (noventa decibéis) com o advento do Decreto nº 2.172 em 05/03/1997; e superior a 85dB (oitenta e cinco decibéis) a partir da edição do Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, sem retroatividade (STJ, recurso repetitivo, REsp nº 1398260/PR).
3. O laudo técnico pericial é imprescindível para caracterização e comprovação do tempo de atividade sob condições especiais, quando se trata dos agentes agressivos ruído e calor.
4. Para o agente nocivo biológico não há estabelecimento de nível máximo de tolerância pela legislação de regência, bastando a simples constatação de sua presença (análise qualitativa) para ser caracterizada a nocividade, bem assim, a exposição não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que suficiente o contato de forma eventual para que haja risco de contração de doenças.
(...)
6. (...) Entretanto, o mesmo PPP comprova que em todo o período controverso o impetrante exerceu a função de motorista da Prefeitura Municipal de João Monlevade/MG, sendo o responsável pelo transporte de pacientes e acompanhantes das residências para os estabelecimentos de saúde em geral em veículos do tipo ambulância, tendo contato com pacientes doentes, o que o expunha ao risco de doenças infectocontagiosas, a exemplo do que ocorre no ambiente hospitalar, o que torna o trabalho especial, conforme item 1.3.2 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964, item 1.3.4 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979 e item 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/1997 e 3.048/1999.
7. Constatado que o segurado computou, até a data de entrada do requerimento administrativo, tempo de serviço especial superior a 25 (vinte e cinco) anos, deve ser mantida a sentença que lhe concedeu o benefício de aposentadoria especial.
(...)
12. Apelação do INSS parcialmente provida (item 10). Remessa necessária prejudicada.
(AMS 0006504-70.2014.4.01.3814/MG, Segunda Câmara Regional Previdenciária de Minas Gerais, Rel. Juiz Federal convocado Rodrigo Rigamonte Fonseca, unânime, e-DJF1 1º/10/2019).
Destaco que eventual extemporaneidade na elaboração do PPP ou de Laudo Técnico, por si só, não é relevante, entendimento este que se encontra em compasso com a Súmula 68 da TNU: “O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”.
A extemporaneidade dos formulários e laudos técnicos não afasta a validade de tais conclusões, valendo destacar que a contemporaneidade não é requisito previsto em lei. Além disso, não se pode perder de vista que a evolução tecnológica propicia melhores condições ambientais de trabalho, menos agressivas à saúde do empregado, diferentemente daquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
Noutro passo, o mero fornecimento de equipamentos de proteção individual - EPI ao empregado não é suficiente para afastar o caráter insalubre da prestação do trabalho se não houver a inequívoca comprovação de que houve a neutralização da nocividade do agente ao qual a parte autora esteve submetida, conforme decisão do STF no julgamento do ARE 664.335/SC, com repercussão geral reconhecida (Tema 555).
Na esteira desse entendimento, este Tribunal também se posicionou no sentido de que há efetiva dúvida sobre a eficácia neutralizante dos EPIs utilizados, pois “A indicação do uso eficaz de EPI não descaracteriza a especialidade da atividade exposta a agentes biológicos, pois nenhum EPI é capaz de neutralizar totalmente os efeitos nocivos da exposição. (...)” (AC 1006297-59.2019.4.01.3400/DF, Primeira Turma, Rel. Des. Fed. Marcelo Velasco Nascimento Albernaz, unânime, PJe 25/09/2023).
Assim, na hipótese dos autos, a parte autora logrou êxito em comprovar o exercício de atividade em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, nos períodos de 05/12/1993 a 31/12/1995 e 17/01/1996 a 19/03/2020, estando exposto ao agente nocivo, devendo os referidos períodos ser reconhecidos como especiais.
No rumo dessa orientação, todos os períodos foram corretamente reconhecidos como tempo de serviço especial pela sentença recorrida, que deve ser mantida quanto ao ponto.
Por fim, não merece prosperar a alegação do INSS no tocante à impossibilidade de concessão da aposentadoria à parte autora em razão de estar filiada a regime próprio de previdência, pois não há nos autos comprovação do fato impeditivo do direito alegado, com a demonstração da existência do citado regime próprio, tampouco de obtenção de benefício previdenciário pelo segurado junto à Prefeitura de Colmeia/TO.
Quanto à alegada isenção ao pagamento de custas e dispensa do preparo, assiste razão ao INSS, haja vista que “Nos feitos processados perante a Justiça Estadual, no exercício de jurisdição federal, o INSS é isento do pagamento de custas (inclusive despesas com oficial de justiça) quando prevista a referida isenção em lei estadual específica, a exemplo do que ocorre nos Estados do Acre, Tocantins, Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso e Piauí” (TRF1, AC 0007928-94.2014.4.01.9199/MG, Primeira Turma, Rel. Des. Fed. Carlos Augusto Pires Brandão, unânime, e-DJF1 21/02/2018).
A correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados, conforme entendimento do STJ (AgInt no REsp 1.663.981/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 17/10/2009). Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculo da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221/PR (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
Majoro os honorários de sucumbência em 2% (dois por cento) ante o oferecimento de contrarrazões, nos termos do § 11 do art. 85 do CPC e determino a sua incidência com base na Súmula 111 do STJ.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para, reformando parcialmente a sentença, isentá-lo do pagamento das custas processuais e ALTERO, de ofício, a sentença, para determinar que a atualização monetária das parcelas atrasadas observe os termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, obedecendo aos parâmetros estabelecidos no RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221/PR (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
É o voto.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1020524-74.2021.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FREDERICO FARIA DE MELO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTE NOCIVO. MOTORISTA DE AMBULÂNCIA. APRESENTAÇÃO DE PPP. ISENÇÃO DE CUSTAS. LEGISLAÇÃO ESTADUAL. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. ÍNDICES DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA ALTERADOS DE OFÍCIO.
1. O pleito da parte autora consiste na concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com o reconhecimento do tempo de serviço laborado em condições especiais e o pagamento das prestações daí advindas.
2. A prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ.
3. A classificação das atividades sob condições especiais ou a comprovação da efetiva e habitual exposição do segurado aos agentes nocivos para fins de aposentadoria especial é definida pela legislação previdenciária então em vigor (Decreto nº 53.831, de 25/03/1964; Decreto nº 83.080, de 24/01/1979; Lei nº 8.213, de 24/07/1991; Lei nº 9.032, de 29/04/1995; Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 e Decreto nº 3.048, de 06/05/1999).
4. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
5. Infere-se do PPP que a parte autora desde 17/01/1996, até a data da emissão do referido documento (17/01/2019), exerceu a função de motorista de ambulância, estando em contato com pacientes. O PPP informa que, durante o período mencionado, a parte autora exercia a atividade de “conduzir veículo de transporte de pacientes (ambulância) até as localidades onde haja atendimento de saúde, seja em vias municipais, estaduais ou federais. Possui atribuição de acomodar o paciente na maca e no interior da ambulância”.
6. As funções efetivamente exercidas pelo segurado, notadamente de contato com os pacientes que transportava, lhe conferem risco potencial de contaminação e contágio, uma vez que se trata de atividade que habitualmente demanda o contato do trabalhador com pacientes doentes, secreções e materiais contaminados.
7. O fato de o segurado realizar algumas tarefas que não o exponham ao contato direto com agentes biológicos durante a sua jornada de trabalho não elide o reconhecimento da especialidade do labor, pois a especialidade do trabalho não existe em virtude do desgaste que o agente nocivo provocaria à integridade do profissional, mas sim em virtude do risco dessa exposição.
8. O mero fornecimento de equipamentos de proteção individual - EPI ao empregado não é suficiente para afastar o caráter insalubre da prestação do trabalho se não houver a inequívoca comprovação de que houve a neutralização da nocividade do agente ao qual a parte autora esteve submetida, conforme decisão do STF no julgamento do ARE 664.335/SC, com repercussão geral reconhecida (Tema 555).
9. Na hipótese dos autos, a parte autora logrou êxito em comprovar o exercício de atividade em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, nos períodos de 05/12/1993 a 31/12/1995 e 17/01/1996 a 19/03/2020, estando exposto ao agente nocivo, devendo referidos períodos ser reconhecidos como especiais.
10. “Nos feitos processados perante a Justiça Estadual, no exercício de jurisdição federal, o INSS é isento do pagamento de custas (inclusive despesas com oficial de justiça) quando prevista a referida isenção em lei estadual específica, a exemplo do que ocorre nos Estados do Acre, Tocantins, Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso e Piauí” (TRF1, AC 0007928-94.2014.4.01.9199/MG, Primeira Turma, Rel. Des. Fed. Carlos Augusto Pires Brandão, unânime, e-DJF1 21/02/2018). Com razão no ponto o apelante.
11. A correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados, conforme entendimento do STJ (AgInt no REsp 1.663.981/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 17/10/2009). Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculo da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221/PR (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
12. Apelação do INSS a que se dá parcial provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS e ALTERAR, de ofício, os índices de juros e correção monetária, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão de julgamento.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora
