
POLO ATIVO: VERA LUCIA ALVES DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: SIMONE FATIMA DE PAULA SILVA - GO34178 e NAYANA DE PAULA OLIVEIRA - GO54937-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1000674-29.2024.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: VERA LUCIA ALVES DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente seu pedido de benefício de aposentadoria por idade rural e a condenou ao pagamento de multa por litigância de má fé.
Sustenta a parte apelante que a prova constante dos autos é suficiente para caracterizar sua condição de rurícola, e pede, ao fim, a reforma da sentença, com a concessão do benefício postulado. Pede, ainda, a exclusão da multa e da condenação em honorários advocatícios, fixados em razão da suposta litigância de má fé.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1000674-29.2024.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: VERA LUCIA ALVES DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (cento e oitenta contribuições) correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
A concessão do benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material outros documentos além daqueles da Lei 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
No presente caso, não há dúvidas quanto ao preenchimento do requisito etário.
Para comprovar a qualidade de segurado especial, foram acostados aos autos: escritura de propriedade rural em nome dos pais da autora; certidão de casamento dos pais da autora, na qual o genitor está qualificado como lavrador (1978); certidão de casamento da autora, na qual seu esposo está qualificado como lavrador (1984); certidão de nascimento dos filhos da autora (1985 e 1988); requerimento de matrícula escolar dos filhos da autora; ficha médica na qual a autora está qualificada como lavradora; certidão de óbito do pai da autora, Geraldo Alves de Fontes; declaração assinada pela autora e seus irmãos na qual informam terem recebido como herança do pai uma propriedade rural (Fazenda Estiva); carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, com data de filiação em 02.06.2021; recibo de ITR da Fazenda Estiva, em nome do pai da autora e notas fiscais de produtos agrícolas emitidas entre 2019 e 2021.
A documentação acostada não constitui início de prova material da condição de segurado especial. Embora tenha sido demonstrado que a autora recebeu parte de uma fazenda como herança de seu pai, disso não se conclui, automaticamente, que tenha se dedicado à agricultura familiar pelo período de carência. Não há indicativo do efetivo exercício da atividade agrícola, sendo insuficientes para tanto as notas fiscais emitidas a partir de 2019 (sendo que a autora completou 55 anos em 2022).
Ademais, conforme destacado na sentença, o CNIS do esposo da autora comprova que ele manteve vínculo empregatício urbano por quase vinte anos e aufere, atualmente, renda superior a R$ 8.000,00 (dados de 2023) – fato que não foi impugnado pela apelante. Confira-se:
“Pelos autos, entendo que a autora ofendeu a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, pois não trouxe documentação apta a ser considerada como meio de prova material, visto que grande parte dos documentos (certidões e fichas de matrícula escolar), são lavrados com base em informações prestadas pela parte interessada. Além disso, o seu registro é muito antigo, se comparado com o período de trabalho que a autora pretende provar. As notas fiscais, apesar de serem relacionadas a produtos utilizados no trabalho rural, são muito recentes (2019, 2020 e 2021), também sendo insuficientes para adequar-se ao período de carência mínima. Outrossim, o fato da parte estar filiada a sindicatos rurais não comprova que efetivamente exerceu atividade rural em regime de subsistência. Analisando o CNIS da autora, vejo que ela possui anotações em 1993 por vínculo com o Município de Jaraguá-GO, que perdurou pelo período de 11 (onze) meses. Convém destacar tal informação, visto que em sua petição inicial afirmou ter exercido atividade rural por toda sua vida. Ademais, o seu esposo Adão Aparecido da Silva, possui vínculo urbano, pois em análise ao seu CNIS vejo anotação realizada em 1992 que perdurou até 2018. Em consulta ao portal da transparência do Município de Jaraguá-GO, constatei que atualmente, o esposo da requerente é servidor efetivo (PROFISSIONAL DO MAGISTÉRIO (PEDAGOGO)). Sua remuneração no ano de 2023 é acima de R$ 8.000,00 (oito mil reais). Desse modo, evidente que a requerente não exerciam atividade rural em regime de economia familiar. Pelo contrário, as anotações no CNIS do marido da requerente comprovam que contribuía como segurado obrigatório, visto que exercia função junto ao Município de Jaraguá. O que se extrai de toda essa documentação é que a renda do casal, ao que tudo indica, era auferida pelo trabalho do marido e não da requerente. Por fim, durante a instrução, não houve prova segura de que a autora exerça trabalho rural em regime de subsistência, haja vista que as testemunhas também confirmaram que o marido tem vínculos urbanos. Portanto, a parte autora não se caracteriza como segurado especial em regime de subsistência, sendo indevido o benefício.” - Grifei
Assim, os elementos de prova constantes dos autos deixam claro que a autora não se enquadra como segurada especial, razão pela qual julgo ter agido com acerto o juízo a quo ao indeferir o benefício.
Quanto à condenação em litigância de má fé, reputo não estarem presentes os requisitos necessários à sua fixação.
Com efeito, a autora, além de ter alcançado a idade mínima para obtenção da aposentadoria rural por idade, acostou documentos que comprovam a propriedade de imóvel rural, a residência na zona rural e a aquisição de insumos agrícolas. Ocorre que o conjunto de provas, nisso incluído a vida profissional de seu esposo e a renda por ele obtida, terminou por afastar, apesar da relação com a terra, a alegada qualidade de segurado especial.
Assim, não é possível afirmar que houve alteração da verdade dos fatos para obtenção de objetivo ilegal, inclusive porque, na própria inicial, houve menção ao trabalho urbano da autora, nos seguintes termos: “No ano de 1994, o esposo da requerente começou a trabalhar como urbano, indo e voltando da zona rural para a cidade de Jaraguá-GO diariamente.”
Assim, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação da parte autora para excluir a condenação por litigância de má fé, a qual abrange a multa de dez por cento sobre o valor da causa.
Em razão da sucumbência da parte autora, mantenho os honorários advocatícios fixados em dez por cento sobre o valor atualizado da causa, os quais ficarão suspensos, em razão da concessão do benefício da gratuidade da justiça.
É o voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1000674-29.2024.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: VERA LUCIA ALVES DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. DOCUMENTOS QUE DESCARACTERIZAM A PARTE AUTORA COMO SEGURADA ESPECIAL. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ NÃO CARACTERIZADA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovação de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (180 contribuições mensais) correspondentes à carência do benefício pretendido a teor do art. 48, §§ 1º e 2º, c/c art. 142 da Lei 8.213/91.
2. O trabalho rural, observado o período de carência, deve estar demonstrado por início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
3. Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material, outros documentos além daqueles constantes do art. 106 da Lei 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
4. Ressalte-se, ainda, que “..para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea.”. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 16/11/2021, DJe de 9/12/2021.).
5. No presente caso, a documentação acostada não constitui início de prova material da condição de segurado especial. Embora tenha sido demonstrado que a autora recebeu parte de uma fazenda como herança de seu pai, disso não se conclui, automaticamente, que tenha se dedicado à agricultura familiar pelo período de carência. Não há indicativo do efetivo exercício da atividade agrícola, sendo insuficientes para tanto as notas fiscais emitidas a partir de 2019 (sendo que a autora completou 55 anos em 2022). Ademais, conforme destacado na sentença, o CNIS do esposo da autora comprova que ele manteve vínculo empregatício urbano por quase vinte anos e aufere, atualmente, renda superior a R$ 8.000,00 (dados de 2023).
6. Excluída a condenação em litigância de má fé, uma vez que não configurados os requisitos para a sua caracterização.
7. Apelação da parte autora parcialmente provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
