
POLO ATIVO: JOAQUIM JOSE DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: EMERSON MARQUES TOMAZ - GO54450-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1034843-47.2021.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação, interposta por Joaquim José da Silva em face de sentença (ID175740022 págs. 76 a 77) proferida pelo Juiz de Direito da Vara Cível da Comarca de Flores de Goiás/GO, que, em ação em que se pretendia a concessão de aposentadoria por idade rural em regime de economia familiar, julgou improcedente o pedido pelo reconhecimento da decadência (superação do prazo de 10 anos), por entender que se tratava de pedido de "conversão de benefício de prestação continuada em aposentadoria por invalidez na condição de segurado especial".
Não foi concedida tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos (§ 1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015).
Nas razões recursais (ID175740022 - págs. 81 a 91), a parte recorrente pediu a reforma da sentença para a obtenção do benefício negado pela sentença recorrida, sob a alegação de comprovação do direito ao benefício previdenciário por prova idônea e suficiente, na forma da legislação de regência e do entendimento jurisprudencial que mencionou. Alegou, concretamente, que o recorrente possui início de prova material, qual seja, a certidão de nascimento (1942) em que consta a profissão do pai como lavrador (ID175740022 - pág. 17).
Intimada, a parte recorrida não apresentou contrarrazões (ID175740022 - pág. 92).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1034843-47.2021.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão benefício previdenciário com base em atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII; 39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar: 1) necessidade de produção de prova documental plenaou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991; 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tema 2 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tema 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) imediatidade da atividade ao tempo do requerimento, ressalvado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmula 54 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 7)extensão da prova material da condição de rurícula em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Temas 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 8) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tema 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 9) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tema 23 da TNU). 10)qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, no prazo de carência do segurado especial; 11)possibilidade de consideração das atividades rurais exercidas por menor de idade em regime de economia familiar, nos termos da Súmula 5 da TNU e da Tese 219 da TNU (entre 12 e 14 anos até o advento da Lei 8.213/1991, e a partir de 14 anos após a referida data); 12) inclusão da situação do “bóia-fria” como segurado especial (Tese 554 do STJ); 13) possibilidade de estabelecimento de residência do grupo familiar do segurado especial em aglomerado urbano, fora do local de exercício das atividades agrárias (inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, redação dada pela Lei 11.718/2008); 14) possibilidade de utilização do tempo rural para fins de carência de aposentadoria urbana ou do RPPS (Súmulas 10 e 24 da TNU c/c Tese 1007 e 168 da TNU).
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois o conjunto de situações excepcionais em dado caso concreto pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar e, consequentemente, permitir a exclusão dos períodos descaracterizados do prazo de carência do referido benefício.
O reconhecimento da qualidade de segurado especial, como trabalhadora rural, desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: o implemento da idade, a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por prova testemunhal.
No caso dos autos, o Autor, nascido em 25/05/1942, preencheu o requisito etário em 25/05/2002 (60 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurado especial em 21/08/2007 (ID 175740022 págs. 14 e 15).
Pleiteia a recorrente a concessão do benefício de aposentadoria por idade no contexto da atividade rural em regime de economia familiar. Com o intuito de comprovar sua condição de trabalhadora rural, anexou aos autos: certidão de nascimento do recorrente em que consta a profissão do seu pai como lavrador (1942).
A sentença julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, pelos seguintes fundamentos (ID 175740022 - pág. 76):
Cuida-se de Ação Previdenciária em que a parte autora pleiteia conversão de benefício de prestação continuada em aposentadoria por invalidez na condição de segurado especial. É o relatório.
Decido.
Antes de ingressar ao mérito, apesar de tão ter sido confeccionado o laudo médico pericial, entendo que não há prejuízos em razão da sua ausência, conforme passo a decidir. Em preliminar, a parte requerida arguiu a decadência do direito. Com razão, pois no caso dos autos, o direito do autor decaiu. O prazo de decadência do direito ou da ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício é de 10 (dez) anos, contado do dia primeiro do mês subsequente ao do recebimento da primeira prestação ou da data em que a prestação deveria ter sido paga com o valor revisto.
O benefício assistencial foi concedido ao autor em 21/08/2007. Assim, noto que já decorreu mais de 10 (dez) anos desde o mês subsequente ao recebimento da primeira prestação.
Portanto, pela ausência de requerimento administrativo (o que foi justificado pelo autor, em razão da já concessão de benefício), a decadência alcançou o direito autoral. Assim, deve ser reconhecida a decadência.
DISPOSITIVO.
Diante do exposto, julgo extinto o feito, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, II do Código de Processo Civil, pelo reconhecimento da decadência.
A parte autora formulou o seguinte pedido: "Seja julgado procedente o pedido, com a condenação inicialmente do INSS a converter o benefício assistencial em aposentadoria por idade rural, desde a data da concessão do LOAS, com a correção monetária e os juros de mora pertinentes" (ID 175740022 - Pág. 9).
Importante destacar que a parte recorrente não pretende a revisão do ato administrativo de benefício assistencial (LOAS) e sim a concessão originária da aposentadoria por idade rural. Portanto, não houve decadência, tal como previsto no art. 103 da Lei 8.213/1991. Aplica-se, subsidiariamente, a Tese 350 do STF. Trata-se de pedido de concessão originária de aposentadoria por idade rural em que os créditos por eventual condenação das prestações pretéritas estaria sujeita à prescrição quinquenal (Súmula 85 STJ) e à compensação com os valores já recebidos de LOAS.
O Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que “para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se quer comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido” (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
Nesse contexto, o único documento acostado aos autos (certidão de nascimento (1942), não atende ao requisito legal necessário para demonstrar a efetiva participação da parte autora em atividades rurais.
Portanto, diante da ausência de um início de prova material e considerando a necessidade de respaldo documental para amparar a pretensão da parte autora, entendo que não se configuram, até o momento, os requisitos legais para a concessão do benefício requerido.
Destaca-se a Súmula 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Dessa forma, a prova produzida não é suficiente para a concessão do benefício pedido, em razão das limitações probatórias impostas pela legislação de regência (§ 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991), conforme Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1.
Em face das aludidas circunstâncias (falta de comprovação de atividade rural, em regime de economia familiar, por prova idônea e suficiente, pelo prazo necessário à aquisição do direito referido na pretensão recursal, em situação concreta de possibilidade de prática de atos processuais supervenientes para o exaurimento da produção probatória), a conduta processual mais adequada (razoável, proporcional e justa) é a aplicação da Tese 629 do STJ, mediante a extinção do processo, sem a resolução do mérito, a fim de oportunizar à parte interessada meios para a renovação da demanda e o exaurimento da produção probatória, em termos mais amplos, inclusive apresentação de documentos adicionais e a oitiva de parte e testemunhas.
Tese 629 do STJ - A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Ante o exposto, julgo extinto o processo sem resolução do mérito e prejudicada a apelação (arts. 485, IV, do CPC/2015 c/c Tese 629 do STJ).
Possível será a renovação da demanda, porque inaplicável a decadência.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em razão da assistência judiciária concedida.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1034843-47.2021.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 5738969-07.2019.8.09.0182
RECORRENTE: JOAQUIM JOSE DA SILVA
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. RGPS. RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS. INSUFICIÊNCIA DE PROVA. APLICAÇÃO DA TESE 629 DO STJ. EXTINÇÃO PROCESSUAL. AFASTAMENTO DA PRESCRIÇÃO, NOS TERMOS DO TEMA 350 DO STF. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. A concessão do benefício previdenciário em face de atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (testemunhal com ao menos início de prova material contemporânea à prestação laboral), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII; 39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
2. Insuficiência da prova documental e testemunhal para comprovar o exercício de atividade rural, na condição de segurado especial, durante todo o período de carência.
3. Aplicação da inteligência da Tese 629 do STJ, porque não houve esgotamento da produção probatória, a situação é de insuficiência de prazo de carência e não houve afastamento categórico de trabalho rural durante todos os períodos laborais pretendidos, o que possibilita complementação da prova (documental e testemunhal) por ação judicial superveniente.
4. Processo extinto sem resolução do mérito com afastamento da decadência (aplicação da Tese 350 do STF). Apelação Prejudicada.
5. Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação de regência (§11 do art. 85, do CPC c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, julgar extinto o processo sem a resolução do mérito e julgar prejudicada a apelação, conforme Tese 629 do STJ, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
