
POLO ATIVO: FRANCISCO CHAGAS ALVES DE MORAES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: RAFAEL CARDOSO DE MORAES - MT15294-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1004383-43.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por Francisco Chagas Alves de Moraes em face de sentença (ID 191086065 - Pág. 75 a 76) que não concedeu a pensão por morte rural pelo RGPS.
Não foi concedida tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos (§ 1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015).
Nas razões recursais (ID 191086065 - Pág. 81 a 86), a autora requereu a reforma da sentença para que lhe seja concedido o benefício negado, sob a alegação de comprovação do direito ao benefício previdenciário por prova idônea e suficiente, na forma da legislação de regência e do entendimento jurisprudencial que mencionou. Alegou, concretamente, que: "A instituidora do benefício era segurada da previdência social na data do óbito, pois era aposentado por idade como trabalhador rural" e o recorrente "juntou aos autos prova documental que comprova a relação de união estável: cartão da família – Secretaria Municipal de Saúde – Aragarças/GO, onde consta o Recorrente como esposo da falecida (doc. anexo), documento de origem pública, tem fé pública em seu favor” (ID 191086065 - Pág. 83).
Intimada, a parte recorrida não apresentou contrarrazões (ID 191086065 - Pág. 87 e 90).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1004383-43.2022.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão do benefício previdenciário da pensão por morte rege-se pelo princípio do tempus regit actum, isto é, pela lei vigente na data de falecimento do instituidor e necessita da demonstração da qualidade de dependente, por prova idônea e suficiente, além da observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 5º, V; 16, §5º; 74 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
Os requisitos exigidos pela Lei 8.213/91 são: a) prova de que a pessoa falecida mantinha a qualidade de segurado ao tempo do óbito ou, na hipótese de já tê-la perdido, fazia jus ao gozo de aposentadoria; b) dependência econômica de quem postula a pensão, segundo a qualificação posta no art. 16 do referido diploma legal: (original sem destaque).
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida (...)
Ressalta-se que não há carência para o benefício de pensão por morte, nos termos do art. 26, I, da Lei n. 8.213/91.
Conforme documento apresentado pela parte autora (companheiro), o óbito da instituidora da pensão por morte ocorreu em 01/03/2019 (ID 191086065 - Pág. 14) e o requerimento administrativo foi apresentado em 02/07/2019 (ID 191086065 - Pág. 21).
Pleiteia o Autor a concessão do benefício de pensão por morte no contexto da atividade rural. Com o intuito de comprovar a condição de trabalhadora rural da companheira falecida, a parte autora anexou aos autos os seguintes documentos (ID 191086065 - Pág. 14 a 20): certidão de casamento da falecida, datada de 1988, com registro de averbação de divórcio, efetuado em 2017, em relação ao ex-cônjuge; cartão da família (2016 e 2017), sem constar a profissão, consta endereço urbano, consta o autor como esposo, não há registro em cartório; nota fiscal em nome do autor emitida após o óbito em comento (2019); receita de medicação de controle especial em nome da falecida, sem identificação de profissão, sem constar endereço e sem constar a data de emissão (o nome da medicação prescrita consta da nota fiscal referida anteriormente); certidão de óbito (2019), na qual consta a falecida como divorciada, sem identificação de profissão e sem referência à união estável (o declarante foi o ex-cônjuge da falecida).
O acervo documental anexado aos autos não é suficiente a comprovar o exercício da atividade de trabalhadora rural da falecida, visto que não são contemporâneos ao período de carência exigida em lei.
Ademais, não há comprovação da convivência duradoura com intuito familiar, uma vez que os documentos juntados aos autos não demonstram a existência de união estável à época do óbito e a prova testemunhal colhida (ID 191095520) não foi suficientemente para demonstrar o período de convivência alegado nos autos.
Adicionalmente, é relevante destacar que no lapso temporal compreendido entre os anos de 2003 e 2013 a 2019, a vinculação com o RGPS se deu na qualidade de contribuinte individual (ID 191086065 - Pág. 31).
A sentença recorrida negou o benefício pelos seguintes fundamentos (ID 191086065 - Pág. 76):
(...)
Com relação a dependência econômica, a tese da parte autora não se confirma. Muito embora se diga a existência de união estável entre Francisco e Flaviana, a prova produzida não foi suficiente para formar a convicção deste julgador de que existia uma relação pública, duradoura e com objetivo de constituir família. Os dois únicos documentos apresentados se tratam de cartão família que não produzem relevância para a comprovação da união estável. Tenho que não ficou provado como se deu o início do relacionamento, tampouco se demonstrou efetiva convivência sobre o mesmo teto. A prova testemunhal foi divergente em vários pontos e a prova documental é deveras enfraquecidas em razão do registro de óbito ser realizado pelo ex-esposo da falecida (Sr. Irineu Lemes Cardoso), e não mencionar qualquer referência a existência do companheiro. Por esta razão, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, resolvendo o feito com mérito na forma do artigo 487, I, do CPC. Custas pela parte requerente. Fixo como honorários advocatícios devidos a parte contraria o montante de 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 8º, do CPC. Defiro à autora a assistência judiciária, devendo ser considerada a aplicação do artigo 98, § 3º, do CPC. Publicada em audiência.
Nesse contexto, a documentação acostada não atende ao requisito legal necessário para demonstrar a efetiva participação da instituidora do benefício de pensão por morte em atividades rurais.
Existe o entendimento consolidado na Súmula 34, TNU, de que “para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar”. Nesse passo, embora não se exija que a prova abarque todo o período de carência, é necessário, no mínimo, que seja contemporânea.
Importante registrar que no âmbito do Superior Tribunal de Justiça a necessidade de contemporaneidade da prova restou pacificada após o julgamento da Pet. nº 7475/PR, em cuja sede restou firmado que “Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se quer comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido". Na mesma linha de compreensão: AgRg no AREsp 635.476/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 30.4.2015; AgRg no AREsp 563.076/MS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 3.9.2015; AgRg no REsp 1.398.410/MT, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 24.10.2013; AgRg no AREsp 789.773/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 14.3.2016; AgRg no AREsp 380.664/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 11.10.2013; AgRg no AREsp 385.318/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 4.10.2013; AgRg no AREsp 334.191/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 12.9.2013; AgRg no REsp 1.148.294/SP, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 25.2.2016; AR 3.994/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, DJe 1º.10.2015.” (STJ – 1ª Seção; Pet 7475 / PR; PETIÇÃO 2009/0171149-0; Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN (1132), Data do Julgamento: 09/11/2016; Data da Publicação/Fonte: DJe 29/11/2016).
Portanto, diante da ausência de um início razoável de prova material, não se configuram, até o momento, os requisitos legais para a concessão do benefício requerido.
A prova testemunhal não pode ser admitida como meio exclusivo para reconhecer o tempo de exercício de atividade rural (STJ, Súmula 149 e TRF1, Súmula 27).
Dessa forma, a prova produzida não é suficiente para a concessão do benefício pedido, em razão das limitações probatórias impostas pela legislação de regência (§ 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991), conforme Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1.
Em face das aludidas circunstâncias (falta de comprovação de atividade rural, em regime de economia familiar, por prova idônea e suficiente, pelo prazo necessário à aquisição do direito referido na pretensão recursal, em situação concreta de possibilidade de prática de atos processuais supervenientes para o exaurimento da produção probatória), a conduta processual mais adequada (razoável, proporcional e justa) é a aplicação da Tese 629 do STJ, mediante a extinção do processo, sem a resolução do mérito, a fim de oportunizar à parte interessada meios para a renovação da demanda e o exaurimento da produção probatória, em termos mais amplos, inclusive apresentação de documentos adicionais e a oitiva de parte e testemunhas.
Tese 629 do STJ - A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Ante o exposto, julgo extinto o processo sem resolução do mérito e prejudicada a apelação (arts. 485, IV, do CPC/2015 c/c Tese 629 do STJ).
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em razão da assistência judiciária concedida (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Sem condenação em custas em face da isenção do INSS.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1004383-43.2022.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 5584076-77.2019.8.09.0014
RECORRENTE: FRANCISCO CHAGAS ALVES DE MORAES
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. RGPS. RURAL. PENSÃO POR MORTE.COMPANHEIRO. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL DA INSTITUIDORA DO BENEFÍCIO. REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS. INSUFICIÊNCIA DE PROVA. APLICAÇÃO DA TESE 629 DO STJ. EXTINÇÃO PROCESSUAL. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. O benefício previdenciário de pensão por morte é concedido mediante o preenchimento dos requisitos: o óbito do instituidor do benefício, a qualidade de segurado do falecido perante a Previdência Social no momento do evento morte e a condição de dependente do requerente. Além da observância das demais condições legais da legislação de regência à época do falecimento (art. 201, V, da CF e arts. 16, 74 e 79 da Lei nº 8.213/91 e arts. 4º, V; 105, I; do Decreto 3.048/99).
2. Conforme documento apresentado pela parte autora (companheiro), o óbito da instituidora da pensão por morte ocorreu em 01/03/2019 e o requerimento administrativo foi apresentado em 02/07/2019. Pleiteia o Autor a concessão do benefício de pensão por morte no contexto da atividade rural. Com o intuito de comprovar a condição de trabalhadora rural da companheira falecida, a parte autora anexou aos autos os seguintes documentos (ID 191086065 - Pág. 14 a 20): certidão de casamento da falecida, datada de 1988, com registro de averbação de divórcio, efetuado em 2017, em relação ao ex-cônjuge; cartão da família (2016 e 2017), sem constar a profissão, consta endereço urbano, consta o autor como esposo, não há registro em cartório; nota fiscal em nome do autor (2019), receita de controle especial da falecida, sem identificação de profissão, sem constar endereço e sem constar a data de emissão, certidão de óbito (2019), na qual consta a falecida como divorciada, sem identificação de profissão e o declarante foi o ex-cônjuge.
3.Não há comprovação da convivência duradoura com intuito familiar, uma vez que os documentos juntados aos autos não demonstram a existência de união estável à época do óbito e a prova testemunhal colhida (ID 191095520) não foi suficientemente para demonstrar o período de convivência alegado nos autos.
4. Insuficiência da prova documental e testemunhal para comprovar o exercício de atividade rural, na condição de segurado especial, pela alegada instituidora da pensão.
5. Aplicação da inteligência da Tese 629 do STJ, porque não houve esgotamento da produção probatória, a situação é de insuficiência de prazo de carência e não houve afastamento categórico de trabalho rural durante todos os períodos laborais pretendidos, o que possibilita complementação da prova (documental e testemunhal) por ação judicial superveniente.
6. Processo extinto sem o julgamento do mérito. Apelação Prejudicada.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, julgar extinto o processo sem a resolução do mérito e prejudicada a apelação, conforme Tese 629 do STJ, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
