
POLO ATIVO: GRAZIELY RAMOS GALVAO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JESSICA CAROLINE SILVA DE ALMEIDA - MA21614-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1017151-98.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença (ID 227478522 - Pág. 11 a 15) que não concedeu salário-maternidade por nascimento de filho próprio à segurada especial.
Sem tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos.
Nas razões recursais (ID 227478522 - Pág. 6 a 9), pediu a reforma da sentença para a concessão do benefício, sob a alegação de apresentação de provas idôneas e suficientes para comprovação da atividade rural e qualidade de segurada especial, anterior à data do parto.
Intimado, o recorrido não apresentou contrarrazões.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1017151-98.2022.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação, congruência, dialeticidade e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão do benefício previdenciário intitulado salário-maternidade à segurado especial, que tenha por base atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar ou regime equivalente, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da qualidade de segurado especial e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar ou equivalente, aplicáveis subsidiariamente à situação do salário-maternidade, observadas as devidas proporções (comparativamente à aposentadoria por idade e outros benefícios): 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991; 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tese 2, 11 e 17 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tese 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) imediatidade da atividade ao tempo abrangido pelo requerimento, respeitado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmulas 54 e 11 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 7) extensão da prova material da condição de rurícola em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Teses 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 8) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tese 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 9) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tese 23 da TNU). 10) qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, como segurado especial; 11) possibilidade de consideração das atividades rurais exercidas por menor de idade em regime de economia familiar, nos termos da Súmula 5 da TNU e da Tese 219 da TNU (entre 12 e 14 anos até o advento da Lei 8.213/1991, e a partir de 14 anos após a referida data); 12) inclusão da situação do “boia-fria” como segurado especial (Tese 554 do STJ); 13) possibilidade de estabelecimento de residência do grupo familiar do segurado especial em aglomerado urbano, fora do local de exercício das atividades agrárias (inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, redação dada pela Lei 11.718/2008).
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois, em dado caso concreto, uma única situação excepcional (quando relevante, intensa e abrangente) ou o conjunto de situações excepcionais (ainda que acessórias e menos abrangentes, quando individualmente consideradas) pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar.
Possui especial relevância as Teses 11 e 17 da TNU, nos seguintes termos:
Tema 11 da TNU. A exigência de início de prova material contemporânea para concessão do salário-maternidade à segurada especial pode ser flexibilizada.
Tema 17 da TNU. A exigência de início de prova material para concessão do salário-maternidade à segurada especial pode ser flexibilizada.
Em decorrência do nascimento do filho, Arthur Ramos Galvão, ocorrido em 20/05/2018 (ID 227478522 - Pág. 98), a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial. Apresentou requerimento administrativo com DER em 15/10/2018 (ID 227478522 - Pág. 100).
Foram juntados os seguintes documentos: nota fiscal de aquisição de produto em comércio local, no qual consta a profissão de lavradora da autora, em 02/06/2016 (ID 227478522 - Pág. 115); comprovante de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Fernando Falcão/MA, admitida em 05/04/2018 (ID 227478522 - Pág. 96 e ID 227478522 - Pág. 106 e 108); certidão de inteiro teor do nascimento do filho, em virtude do qual se postula o benefício, registrado em 11/06/2018, de onde se extrai a profissão de lavradora da autora (ID 227478522 - Pág. 97); certidão eleitoral, datada de 19/07/2018, na qual a autora informou a ocupação de agricultora (ID 227478522 - Pág. 95); declaração particular prestada por Bertolino Ferreira Barros em 25/07/2018, na qual informa que a autora exerce atividade rural em sua propriedade desde 02/09/2016 (ID 227478522 - Pág. 101); título de domínio no qual consta Bertolino Ferreira Barros como adquirente de um imóvel rural denominado Fazenda Barros, localizado no Povoado Pau de Terra, município de Fernando Falcão/MA, em 04/11/2013 (ID 227478522 - Pág. 103); declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Fernando Falcão/MA em 25/07/2018 (ID 227478522 - Pág. 110 a 112).
Os referidos documentos são idôneos, válidos e suficientes como início de prova material do exercício da atividade rural para a concessão do benefício postulado.
Para caracterizar o início de prova material, deve-se presumir a continuidade do labor rural nos períodos imediatamente próximos à data do documento, sobretudo no período anterior à comprovação, sendo inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental.
A própria certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade constitui início de prova material, segundo entendimento pacificado do STJ, no sentido de reconhecer como início probatório as certidões da vida civil, como bem se verifica.
A prova testemunhal produzida durante a instrução processual (ID . 227478522 - Pág. 28) foi idônea e suficiente para demonstrar o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, e se encontra amparada por início de prova documental contemporânea à prestação laboral que se pretende reconhecida em juízo.
Comprovada a qualidade de trabalhadora rural anterior à data do parto (20/05/2018), mediante início de prova material devidamente complementada pela prova testemunhal e a ocorrência do parto em data não alcançada pela prescrição, deve ser reconhecido o direito da parte autora ao benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial, direito que lhe é pertinente e está em conformidade com a legislação previdenciária.
A sentença recorrida deve ser reformada, porque os dispositivos constitucionais e legais referidos na fase recursal devem ser interpretados conforme o entendimento jurisprudencial dominante.
A atualização monetária e juros moratórios, incidentes sobre as parcelas pretéritas, devem ser calculados na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão vigente ao tempo da execução do julgado. O referido ato incorporou, progressivamente, as determinações legais e jurisprudenciais supervenientes (Tema 810 do STF, Tema 905 do STJ e art. 3º e conexos da EC 113/2021), o que implica perda de objeto da matéria correlata.
Honorários advocatícios de sucumbência, quando devidos, na forma da legislação de regência (art. 85, do CPC/2015, c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar-lhe provimento e reformar a sentença proferida, para condenar o INSS a conceder salário-maternidade à autora, na qualidade de segurada especial, equivalente a quatro prestações do salário mínimo vigente à época do parto.
Quanto à verba honorária, inverto-a em favor da parte autora, fixando-a em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão deste julgado, a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e art. 11, ambos do CPC/2015 c/c Súmula 111 do STJ.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1017151-98.2022.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0810406-49.2019.8.10.0027
RECORRENTE: GRAZIELY RAMOS GALVAO
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. RGPS. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. SENTENÇA REFORMADA.
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte dias), com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
2. A concessão do respectivo benefício previdenciário, na qualidade de segurado especial, que tenha por base atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar ou regime equivalente, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da condição de segurado especial, e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (art. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
3. Em decorrência do nascimento do filho, Arthur Ramos Galvão, ocorrido em 20/05/2018 (ID 227478522 - Pág. 98), a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial. Apresentou requerimento administrativo com DER em 15/10/2018 (ID 227478522 - Pág. 100).
4. Foram juntados os seguintes documentos: nota fiscal de aquisição de produto em comércio local, no qual consta a profissão de lavradora da autora, em 02/06/2016 (ID 227478522 - Pág. 115); comprovante de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Fernando Falcão/MA, admitida em 05/04/2018 (ID 227478522 - Pág. 96 e ID 227478522 - Pág. 106 e 108); certidão de inteiro teor do nascimento do filho, em virtude do qual se postula o benefício, registrado em 11/06/2018, de onde se extrai a profissão de lavradora da autora (ID 227478522 - Pág. 97); certidão eleitoral, datada de 19/07/2018, na qual a autora informou a ocupação de agricultora (ID 227478522 - Pág. 95); declaração particular prestada por Bertolino Ferreira Barros em 25/07/2018, na qual informa que a autora exerce atividade rural em sua propriedade desde 02/09/2016 (ID 227478522 - Pág. 101); título de domínio no qual consta Bertolino Ferreira Barros como adquirente de um imóvel rural denominado Fazenda Barros, localizado no Povoado Pau de Terra, município de Fernando Falcão/MA, em 04/11/2013 (ID 227478522 - Pág. 103); declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Fernando Falcão/MA em 25/07/2018 (ID 227478522 - Pág. 110 a 112).
5. Demonstradas a maternidade, a atividade rural e a qualidade de segurada especial anterior ao parto, faz jus a parte autora ao benefício de salário-maternidade.
6. Apelação provida. Sentença reformada para concessão de salário-maternidade à segurada especial em razão da satisfação dos requisitos legais.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
