
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA GEORJETA FRANCISCA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WESLEY NEIVA TEIXEIRA - GO24494-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS contra a sentença que julgou procedente o pedido e condenou a autarquia ré a conceder o benefício previdenciário de aposentadoria por idade (híbrida), desde a data do requerimento administrativo.
Em suas razões recursais, o INSS requereu preliminarmente a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. No mérito, alega, em síntese, que a qualificação da autora é solteira, não podendo ser utilizada como início de prova material documentos em nome do pai de sua filha. Aduziu, portanto, estarem ausentes os requisitos legais para concessão da aposentadoria em análise. Requereu a reforma da sentença nos termos da apelação.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONCALVES (RELATOR):
Pressupostos, remessa necessária e recebimento da apelação
A sentença não está sujeita ao reexame necessário, pois a condenação do ente público não ultrapassa o limite previsto no art. 496, § 3º do CPC/2015.
O CPC/2015, em seu artigo 1.012, §1º, inciso V, estabelece que, em se tratando de sentença em que restou confirmado o deferimento do pedido de antecipação da tutela, a apelação interposta deve ser recebida, tão somente, no efeito devolutivo. Além disso, não ficou demonstrado risco de lesão grave e de difícil reparação, tampouco fundamentação relevante para justificar a concessão de efeito suspensivo em caráter excepcional.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido.
O art. 48, §3º, da Lei de Benefícios, por sua vez, traz a previsão da aposentadoria por idade mista ou híbrida, na qual há a contagem híbrida da carência (não contributiva rural e contributiva urbana), exigindo-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, exigência integral de 65 anos, se homem, e 60 anos (ou 62 anos, após o fim da regra transitória prevista no art. 16, §1º, da EC103/2019), se mulher.
Ora, a proteção previdenciária deve abranger a todos que se encontrem em situações semelhantes e que tenham cumprido os requisitos especificados na legislação de regência, de sorte que a inovação legislativa constante nos §3º e 4º da Lei 8.213/91, trazida pela Lei 11.718/2008, veio para assegurar o benefício de aposentadoria (híbrida) para aquele trabalhador que antes, mesmo que contasse com idade avançada, não podia receber aposentadoria rural porque havia exercido atividade urbana, ao mesmo tempo em que não podia gozar de aposentadoria urbana, devido à falta de período de carência. Nesse sentido, in verbis:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. ARTIGO 48, §§ 3º E 4º DA LEI 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/2008. OBSERVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1.A Lei 11.718/2008 introduziu no sistema previdenciário brasileiro uma nova modalidade de aposentadoria por idade denominada aposentadoria por idade híbrida.
2. Neste caso, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.
3. Não atendendo o segurado rural à regra básica para aposentadoria rural por idade com comprovação de atividade rural, segundo a regra de transição prevista no artigo 142 da Lei 8.213/1991, o § 3º do artigo 48 da Lei 8.213/1991, introduzido pela Lei 11.718/2008, permite que aos 65 anos, se homem e 60 anos, mulher, o segurado preencha o período de carência faltante com períodos de Contribuição de outra qualidade de segurado, calculando-se o benefício de acordo com o § 4º do artigo 48.
4. Considerando que a intenção do legislador foi a de permitir aos trabalhadores rurais, que se enquadrem nas categorias de segurado empregado, contribuinte individual, trabalhador avulso e segurado especial, o aproveitamento do tempo rural mesclado ao tempo urbano, preenchendo inclusive carência, o direito à aposentadoria por idade híbrida deve ser reconhecido.
5. Recurso especial conhecido e não provido.
(STJ; REsp 1367479/RS; Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES; T2 – SEGUNDA TURMA; DJe 10/09/2014). Destacamos.
Nesse compasso, o benefício híbrido previsto no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, destina-se aos trabalhadores rurais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano, não importando se retornaram ou não ao campo ao tempo do implemento do requisito etário ou da apresentação do requerimento administrativo.
Ademais, não prospera a arguição quanto à exigência de que a atividade anterior ao requerimento administrativo deva ser rural, tendo em vista que o STJ em recente julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Recursos Especiais 1.674.221 e 1.788.404), fixou a seguinte tese: "O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo" (Tema 1.007). Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o. DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI 8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO.CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça (A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou, como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o período de carência (REsp. 1. 407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991 praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de aposentadoria híbrida.
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019).
O § 4º do art. 48 da Lei 8.213/91 estabelece que, no caso de aposentadoria rural mista, “o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II, do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário de contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário de contribuição da Previdência Social”.
No que diz respeito ao requisito carência, a Lei Previdenciária exige o cumprimento de, no mínimo, 180 (cento e oitenta) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria, nos termos do art. 25, inciso II da Lei 8.213/91.
Nessa modalidade de benefício, os trabalhadores que tiverem períodos de labor rural, que migraram, temporária ou definitivamente, para o meio urbano e que não têm período de carência suficiente para a aposentadoria prevista para os trabalhadores urbanos (caput do art. 48 da Lei 8.213/1991) e para os rurais (§§ 1º e 2º do art. 48 da Lei 8.213/1991), podem somar tal tempo ao de outras categorias, tendo sido determinado, unicamente, o patamar etário mais elevado.
Ademais, é irrelevante saber a natureza do labor predominantemente exercido durante o período de carência, bem como qual o labor específico exercido pelo beneficiário quando do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo. Nesse sentido, entendimento do STJ em recurso repetitivo Tema 1007:
(...)
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de aposentadoria híbrida.
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019)
Desse modo, o segurado urbano que tiver tempo rural na data do requerimento de sua aposentadoria, poderá mesclar os tempos, desde que tenha a idade exigida para o segurado urbano, inclusive para computar no cumprimento da carência.
Na hipótese em que o tempo de atividade urbana a ser considerado para fins de concessão da aposentadoria rural mista tenha sido exercida em regime diverso do RGPS, a implementação do benefício ora deferido fica condicionada à indenização das contribuições respectivas, nos termos do inciso IV, do art. 96, da Lei 8.213/91, matéria a ser dirimida, a tempo e modo, na fase de execução do julgado.
Da situação tratada
A parte autora completou idade para aposentadoria híbrida em 2019 (nascida em 2/8/1959- id 54122537- p. 15).
Houve requerimento administrativo em 18/3/2020 (id 190280051– p.23/24).
Os documentos apresentados pela parte autora, em seu intuito de comprovar o labor rural foram, dentre outros:
a) certidão de nascimento da autora (1959), constando a qualificação profissional de seu genitor como lavrador;
b) certidão de nascimento de filha da autora (1990), constando a qualificação profissional do genitor como lavrador; e
c) CNIS da autora contendo o registro de vínculos laborais urbanos.
O INSS, por sua vez, colacionou aos autos o CNIS da autora (id 190280051 - p. 39/43), contendo o registro dos vínculos laborais urbanos da autora, pelo período compreendido entre 3/8/2011 a 3/8/2012, na qualidade de segurado empregado.
A autora anexou aos autos certidão de nascimento de sua filha, em que consta a profissão do genitor como trabalhador rural. Não obstante tal documento, a princípio, configure início de prova material, verifica-se que a autora qualificou-se na exordial como solteira, o que afasta a serventia do documento para fins probatórios de regime de subsistência de economia familiar.
Ademais, só é possível o reconhecimento do labor rural a partir dos 12 anos de idade, não tendo serventia para fins probatórios a certidão de nascimento própria anexada pela autora. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL COMO SEGURADO ESPECIAL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO SOMENTE A PARTIR DOS 12 ANOS DE IDADE. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL DO MARIDO EXTENSÍVEL À ESPOSA. PROVA TESTEMUNHAL IMPRECISA E CONTRADITÓRIA. FRAGILIDADE DO CONTEXTO PROBATÓRIO. PEDIDO IMPROCEDENTE. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA. 1 - Primeiramente, cumpre registrar que não pode ser reconhecido como tempo de serviço o período anterior à data em que o segurado completou doze anos de idade: "É possível o cômputo do tempo de atividade rural do menor para fins previdenciários quando comprovado o trabalho, a partir dos seus 12 anos, em regime de economia familiar, porque, conforme entendimento do STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social." (AGRESP 200800668009, ALDERITA RAMOS DE OLIVEIRA (Des. convocada do TJ/PE), STJ - Sexta Turma, DJE de 01/07/2013) 2 - Com o intuito de comprovar o início razoável de prova material do exercício de atividade rurícola como segurada especial, a parte autora trouxe, com a inicial, os seguintes documentos: certidão de casamento lavrada em 1.978 na qual seu cônjuge está qualificado como lavrador (fl. 06); cópia de declaração de atividade rural emitida em 1.998 pelo STR de Tocantinópolis/TO (fl. 08); carteira de filiação a sindicato rural emitida em 1.998 (fl. 09); declaração de atividade rural emitida em 1.998 por seu marido (fl. 10); prontuário médico indicando a profissão de lavradora (fls. 12-13). 3 - Conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a qualificação profissional de lavrador do marido constante dos assentamentos de registro civil é extensível à esposa, em virtude das próprias condições em que se dá o desempenho do regime de economia familiar. 4 - No caso, porém, a prova oral mostrou-se imprecisa e contraditória, não sendo robusta, coerente e segura o bastante para corroborar o início de prova material apresentado e comprovar, por qualquer período, o efetivo labor rural da autora na condição de segurada especial. 5 - A primeira testemunha afirmou que conhece a autora há aproximadamente 14 anos, "que há mais ou menos 5 anos ela mora na cidade" e "não tem conhecimento se ela se afastou da roça em outro período". A segunda testemunha relatou que "não sabe dizer a quanto tempo a requerente mora na cidade (...) que não se lembra o ano em que a autora se afastou da roça; que sabe dizer que a autora é doente; que não sabe dizer o período que a autora trabalhou na fazenda Boa Esperança". Por fim, a terceira testemunha informou que a requerente é dona de casa e que mudou para a cidade há muito tempo, aproximadamente no ano de 1979 (fls. 38-39, 124-125). 6 - Remessa necessária provida.
(REO 0017491-25.2008.4.01.9199, JUIZ FEDERAL JOÃO CÉSAR OTONI DE MATOS (CONV.), TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 16/10/2018 PAG.)
Assim, verifica-se que a autora não se desincumbiu de seu ônus probatório, nos termos do art. 373, I, do CPC.
Inexistente nos autos início de prova material, não é admissível a prova exclusivamente testemunhal, nos termos da Súmula 149, do STJ.
Da extinção do feito sem resolução do mérito, ainda que de ofício.
Segundo a orientação do e. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos, “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1.352.721, Tema 629).
Ausente conteúdo probatório eficaz, é forçoso reconhecer a carência da ação em razão da falta de interesse de agir da parte autora, devendo o feito ser extinto, ainda que de ofício, sem adentrar a análise meritória. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL EFICAZ. PROVA UNICAMENTE TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE. BENEFÍCIO INDEVIDO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. 1. A comprovação do efetivo labor como trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial) se dá nos termos do art. 106 da Lei nº 8.213/91 e, na esteira de precedentes do STJ, por meio de início razoável de prova material, complementado por prova testemunhal, e, por ser apenas o início de prova, os documentos não precisam abranger todo o período a ser comprovado, como bem aponta o enunciado nº 14 da TNU. 2. "Conquanto não se exija a contemporaneidade da prova material durante todo o período que se pretende comprovar o exercício de atividade rural, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, admitida a complementação da prova mediante depoimentos de testemunhas." (AgRg no REsp 1148294/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 07/10/2014). 3. A Corte Especial do STJ, ao julgar o REsp 1.352.721/SP (Tema 629), sob o rito dos recursos repetitivos, definiu que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa". 4. No caso em análise, a autora, nascida em 11/12/1954 (fl. 11), completou 60 anos em 11/12/2014, já tendo implementando a idade mínima para obter aposentadoria híbrida por idade na data de entrada do requerimento administrativo (05/02/2016 - fl. 26). 5. A controvérsia, na esfera recursal, reside no reconhecimento do tempo de serviço rural para fins de aposentação. 6. A autora afirma que, desde os 12 anos de idade, se dedicou à lida rurícola, tendo trabalhado inicialmente com a família e depois, como empregada rural, sem a devida anotação do vínculo na CTPS. No entanto, não trouxe aos autos qualquer documento que demonstrasse sua dedicação ao labor campesino. 7. Com efeito, o único documento apresentado foi a CTPS (fls. 11/12), que possui apenas anotações de vínculos urbanos, com início em 02/10/2003. Como se nota, anteriormente a 02/10/2003 não há início de prova material do tempo de serviço rural. 8. Conquanto não se exija a contemporaneidade de todos os documentos apresentados, deve haver ao menos um início de prova contemporâneo aos fatos alegados, para fins de comprovação da atividade rural em regime de economia familiar. Precedente: AgRg no REsp 1150825/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe 23/10/2014. 9. Ressalte-se, ainda, que a prova testemunhal produzida nos autos não se presta, por si só, para comprovar o tempo de serviço rural nesse período, sendo imprescindível a existência de início de prova material contemporâneo, conforme preconiza o art. 55, §3º, da Lei 8.213/91. 10. A propósito, vale destacar que o tempo de serviço urbano da autora é insuficiente para a concessão da aposentadoria por idade nessa condição, conforme se apura do resumo de documento para cálculo de tempo de contribuição, juntado à fl. 65-v. 11. Diante desse contexto fático-jurídico, há que concluir que, na linha do que decido no já mencionado REsp 1.352.721/SP, não existindo nos autos conteúdo probatório eficaz, falece à parte autora interesse de agir, devendo o processo ser extinto sem resolução de mérito, independentemente de provocação das partes, por se tratar de matéria de ordem pública, cognoscível de ofício pelo juízo, em qualquer tempo e grau de jurisdição (CPC/1973, art. 267, VI, e §3º; CPC/2015, art. 485, VI, e §3º). 12. Tratando-se de recurso interposto contra sentença publicada na vigência do CPC/2015 (a partir de 18/03/2016, inclusive), aplicam-se as disposições deste novo diploma aos honorários advocatícios. 13. Diante do princípio da causalidade, condena-se a autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10%, sobre o valor da causa atualizado, nos termos do artigo 85, §§2º, 3º, 4º, inciso III, do CPC/15, bem como ao pagamento das custas processuais, suspendendo, contudo, a exigibilidade em razão da concessão dos benefícios da justiça gratuita, conforme artigo 98 do CPC/15. 14. Processo extinto sem resolução do mérito, de ofício. Prejudicado o recurso de apelação da autora.
(AC 0001769-96.2018.4.01.9199, JUIZ FEDERAL GUILHERME BACELAR PATRÍCIO DE ASSIS, TRF1 - 2ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 04/04/2022 PAG.)
Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício de aposentadoria híbrida pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito, conforme entendimento do STJ no precedente citado.
Fica revogado, de imediato, a tutela antecipada concedida.
Conclusão
Ante o exposto, de ofício, extingo o processo, sem resolução do mérito, e julgo prejudicada a apelação do INSS.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004042-17.2022.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5121409-51.2021.8.09.0176
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA GEORJETA FRANCISCA DA SILVA
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL NÃO DEMONSTRADA. SENTENÇA REFORMADA, DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. TEMA 629, STJ. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. A aposentadoria por idade híbrida ou mista é devida ao segurado que completar 65 anos de idade, se homem, ou 60 anos de idade (ou 62 anos, após o fim da regra transitória prevista no art. 16, §1º, da EC103/2019), se mulher, nos termos do art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, onde o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de carência legalmente exigida, nos termos do art. 142, da mesma Lei de Benefícios.
2. Na situação tratada, a parte autora, em seu intuito probatório, anexou os seguintes documentos: a) certidão de nascimento própria (1959), constando a qualificação profissional de seu genitor como lavrador; b) certidão de nascimento de filha da autora (1990), constando a qualificação profissional do genitor como lavrador; e c) CNIS da autora contendo o registro de vínculos laborais urbanos.
3. A autora anexou aos autos certidão de nascimento de sua filha, em que consta a profissão do genitor como trabalhador rural. Não obstante tal documento, a princípio, configure início de prova material, verifica-se que a autora qualificou-se na exordial como solteira, não trazendo aos autos qualquer elemento integrativo do pai da criança no seio familiar, o que afasta a serventia do documento para fins probatórios de regime de subsistência de economia familiar. Assim, verifica-se que a autora não se desincumbiu de seu ônus probatório, nos termos do art. 373, I, do CPC.
4. É inadmissível prova exclusivamente testemunhal para o reconhecimento de tempo de exercício de atividade rural (Súmulas 149/STJ e 27/TRF-1ª Região).
5. A orientação do STJ, em recurso repetitivo, é a de extinção do processo, sem resolução de mérito, quando ausente o conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, possibilitando ao autor intentar novamente a ação (Tema 629, REsp 1.352.721).
6. Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício de aposentadoria híbrida pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito.
6. Revogada, de imediato, a tutela antecipada concedida.
7. Processo extinto, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurada; apelação da parte autora prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, de ofício, sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
