
POLO ATIVO: MARIA DIVINA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: DIVINA SUCENA DA SILVA CAMARGO - GO16091-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1022783-71.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença na qual foi julgado improcedente o seu pedido de concessão de aposentadoria híbrida, por idade, com a sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade destas verbas, nos termos do art. 98, §3º, do Código de Processo Civil (fls. 253/256).
Em suas razões, a parte apelante pede a reforma da sentença para que seja julgado procedente o pedido, ao argumento de que foram comprovados os requisitos necessários para concessão do benefício (fls. 260/272).
Sem contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Aposentadoria híbrida.
O art. 48 da Lei nº 8.213/91, com as alterações impostas pela Lei nº 11.718/2008, ao disciplinar o benefício de aposentadoria por idade, determina que:
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
(Revogado)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1ºdeste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9ºdo art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)”.
Dessa forma, a inovação legislativa conferiu tanto ao trabalhador urbano, quanto ao segurado especial, que tenha contribuído em outra categoria de segurado, a possibilidade de computar período rural para implementação dos requisitos necessários à aposentadoria, desde que cumprido o requisito etário de 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que o “tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, §3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo” (Tema 1007 - REsp 1674221/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019).
Assim, impõe-se examinar se estão presentes os seguintes requisitos legais para a concessão do benefício.
Do regime de economia familiar.
Nos termos do §1º, do art. 11 da Lei do Regime Geral da Previdência Social, considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, o efetivo exercício da atividade campesino na qual “o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Das provas.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, diante da dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício de sua profissão, o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo. Assim, são admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive que estejam em nome de membros do grupo familiar (REsp n. 1.354.908/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe de 10/2/2016).
A Corte Superior também sedimentou entendimento, inclusive sob a sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil (Tema 638) - o qual deu origem ao enunciado de Súmula 577, acerca da possibilidade de extensão da eficácia probatória da prova material tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento apresentado, desde que corroborada por robusta prova testemunhal, não admitindo, nos termos da Súmula 149, a prova exclusivamente testemunhal (AgInt no REsp n. 1.949.509/MS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 14/2/2022, DJe de 17/2/2022).
Do caso em exame:
A parte autora, nascida em 05/06/1956, implementou o requisito etário para a aposentadoria hibrida em 05/06/2016 (60 anos), tendo formulado o seu requerimento administrativo de benefício em 27/06/2019.
Para a comprovação da qualidade de segurado e da carência, foram apresentados os seguintes documentos: a) Certidão do próprio nascimento (fl. 23); b) Autodeclaração do segurado especial (fls. 218/221).
Em consulta ao extrato do CNIS da promovente, vejo que este contém vínculo de trabalho formal como segurado empregado entre 21/10/1991 e 16/12/1991, 01/08/1994 e 25/11/1995, 01/02/1996 e 07/08/1996, 01/09/1997 e 31/05/1998, 01/05/1999 e 10/04/2000, 01/12/2000 e 30/03/2001, 01/09/2001 e 12/05/2002, 24/06/2002 e 16/08/2002, 02/06/2003 e 08/08/2003, 01/05/2007 e 29/07/2007, 01/12/2007 e 31/12/2007, 01/04/2011 e 30/11/2011, 01/03/2013 e 01/02/2014 e entre 01/08/2014 e 15/04/2024.
Malgrado o INSS tenha arguido que o apelado possui diversos vínculos anotados na CTPS/CNIS, alguns deles são rurais, e, portanto, considerados prova material plena do período nela registrado e início de prova documental para o restante do período de carência, uma vez que ratificam a lida rural desenvolvida pelo autor (AREsp n. 2.054.354, Relator Ministro Humberto Martins, DJe de 02/05/2022; REsp n. 1.737.695/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe de 23/11/2018; AC n. 1015848-60.2019.4.01.3304, Relator Desembargador Federal João Luiz de Sousa, Segunda Turma, PJe 01/04/2022).
Assim, embora não seja possível reconhecer a atividade exercida como segurado especial durante todo o período de carência, somando-se os vínculos registrados no CNIS ao tempo de labor rural exercido pela parte autora, constata-se a existência do preenchimento do período de carência necessário para a concessão da aposentadoria híbrida, por idade, conforme prevê o art. 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91.
Ademais, ainda que a apelante não tenha completado o tempo relativo à carência no momento de propositura da ação, ao apreciar recurso especial em sede de repetitivo (Tema 995), o Superior Tribunal de Justiça fixou o seguinte entendimento: “É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.” (REsp n. 1.727.063/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 23/10/2019, DJe de 2/12/2019.).
Dessa forma, restando demonstrado o exercício de atividade rural mediante os regisytros inseridos na CTPS da parte autora, no cargo de safrista, em 2 (dois) momentos distintos, entre 06/2002 e 08/2003, que somado ao tempo de atividade urbana, na qualidade de empregado - conforme registrado no CNIS -, superam o período de carência necessário à concessão de aposentadoria híbrida, por idade, o benefício deve ser concedido a partir da data de satisfação da carência, ou seja, 07/06/2022.
Nesse sentido, o semelhante julgado:
"CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. CTPS E CNIS QUE FAZEM PROVA PLENA. DESNECESSIDADE DE OITIVA DE TESTEMUNHAS. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. REAFIRMAÇÃO DA DER. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Pretende a parte apelante o julgamento pela improcedência do pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade rural face ao não preenchimento pela parte autora do requisito de segurada especial e por possuir vínculos urbanos no CNIS. 2. São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91). 3. Houve o implemento do requisito etário em 2018, portanto, a parte autora deveria provar o período de 2003 a 2018 de atividade rural. 4. Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e da carência, a parte autora anexou aos autos: a) CTPS e CNIS com anotações de vínculos como empregado rural totalizando em 29 anos, 7 meses e 12 dias; b) Certidão de casamento com a senhora Maria de Fátima Silva em 26/07/1980, em que a parte autora é qualificado como lavrador; c) Certidão de nascimento da filha Ronecléia de Fátima Silva, nascida em 18/03/1987, em que é qualificado como lavrador; d) Certidão de nascimento do filho Ronicley Aparecido da Silva, nascido em 11/11/1982 e e) Certidão de nascimento do filho Uenigley Aparecido da Silva, nascido em 11/03/1983, em que a parte autora é qualificada como lavrador. 5. No entanto, em análise do CNIS da parte autora, verificam-se vínculos urbanos nos períodos de 01/09/2002 a 31/12/2004 e de 12/04/2005 a 07/07/2007, o que impediria a concessão da aposentadoria por idade rural. 7. Porém, com o advento da Lei n.º 11.718/2008, a qual acrescentou os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei n.º 8.213/91, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria rural por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem. Assim, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido. Por sua ve, salienta-se que, segundo a doutrina e a jurisprudência, é aplicável o princípio da fungibilidade entre os benefícios previdenciários e, assim como o INSS deve conceder o benefício da melhor opção para o segurado, também é possível ao Judiciário conceder, de ofício, por fundamento diverso, a prestação devida ao segurado. 8. Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte autora atendido ao requisito etário, pois completou 65 anos em 20/04/2023. 9. Importa salientar que a CTPS e o CNIS fazem prova plena da qualidade de empregado rural e urbano por tempo muito superior ao necessário e não necessitam de ser corroborados pela oitiva de testemunhas, uma vez que apenas o início de prova material exige esse requisito, não ocorrendo qualquer cerceamento da defesa nesse aspecto. 10. Quanto à data de início do benefício, tem-se que os requisitos autorizadores foram preenchidos com o implemento do requisito etário em 20/04/2023, devendo ser reafirmada a DER para essa data. Sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal. 11. Apelação do INSS parcialmente desprovida"
As parcelas vencidas devem ser corrigidas monetariamente pelo INPC e acrescidas de juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgado pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905).
Ante o exposto, dou provimento à apelação interposta pela parte autora, concedendo-lhe o benefício de aposentadoria híbrida, por idade, a partir da data de satisfação da carência (07/06/2022), e a pagar as parcelas vencidas, devidamente corrigidas e acrescidas de juros de mora, nos termos da fundamentação.
Inverto os ônus de sucumbência.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
92
APELAÇÃO CÍVEL (198)1022783-71.2023.4.01.9999
MARIA DIVINA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: DIVINA SUCENA DA SILVA CAMARGO - GO16091-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA OU MISTA. ART. 48, § 3º E 4º DA LEI 8.213/91. IDADE MÍNIMA COMPROVADA. PROVA MATERIAL PLENA DO TRABALHO RURAL. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS CUMPRIDOS. CONSECTÁRIOS DA CONDENAÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA.
1. O art. 48, §3º, da Lei n. 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 11.718/08, permite a concessão de aposentadoria por idade uma vez implementadas a idade mínima e a carência, considerando o cômputo do tempo de serviço urbano e o tempo de serviço rural.
2. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido. O art. 48, §3º, da Lei de Benefícios, por sua vez, traz a previsão da aposentadoria mista, por idade, na qual há a contagem híbrida da carência (não contributiva rural e contributiva urbana), exigindo-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, exigência integral de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
3. Comprovado o implemento da idade mínima e da atividade rural, com a apresentação de prova material plena, que somados ao tempo de serviço urbano completam a carência, deve ser concedido o benefício de aposentadoria híbrida, por idade.
4. Nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905) as parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
5. Apelação interposta pela parte autora a que se dá provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação interposta pela parte autora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora
