
POLO ATIVO: SIDINEI DA SILVA NOVAIS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: CLAUDENIR ZERI MENDES DE SOUZA JUNIOR - MT27716-E e CLAUDIO LEME ANTONIO - MT12613-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1023121-45.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, com a condenação do demandante no pagamento das custas e dos honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade dessas verbas, nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil (fls. 259/266).
No seu recurso, o apelante requer a reforma da sentença para que seja julgado procedente o seu pedido, ao argumento de que houve o preenchimento de todos os requisitos legalmente exigidos para a concessão do benefício. Subsidiariamente, requer que lhe seja deferida a aposentadoria híbrida por idade (fls. 267/270).
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões (fl. 273).
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Da aposentadoria híbrida por idade
O art. 48 da Lei n. 8.213/91, com as alterações impostas pela Lei n. 11.718/2008, ao disciplinar o benefício de aposentadoria por idade, determina que:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9ºdo art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
Dessa forma, a inovação legislativa conferiu tanto ao trabalhador urbano, quanto ao segurado especial, que tenha contribuído em outra categoria de segurado, a possibilidade de computar o período rural para a implementação dos requisitos necessários à aposentadoria, desde que cumprido o requisito etário de 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
Além disso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que o “tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, §3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo” (Tema 1007 - REsp 1674221/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019).
Assim, impõe-se examinar se estão presentes os seguintes requisitos legais para a concessão do benefício.
Do regime de economia familiar
Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Das provas
Para o reconhecimento do tempo rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei n. 8.213/91 é meramente exemplificativo (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício da atividade rural, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge ou companheiro como trabalhador rural.
Do caso em exame
A parte autora, nascida em 23/03/1958, implementou o requisito etário para a aposentadoria rural em 23/03/2018 (60 anos), tendo formulado o requerimento administrativo do benefício em 05/11/2018.
Para a comprovação da qualidade de segurado e da carência, foram apresentados os seguintes documentos: a) Notas fiscais de compras de ferramentas em nome do senhor Adir Márcio da Conceição, estranho à lide, datadas entre 2016 e 2020 (fls. 32/46); b) CTPS sem anotação de contrato de trabalho (fl. 47); c) Certidão de casamento própria, realizado em 08/1984, constando a ocupação do autor como lavrador (fl. 48); d) Notas fiscais de produtor, nas quais consta o senhor Antônio Marques da Silva como comprador de gado (fls. 104/108); e e) Atestado de vacinação contra brucelose em nome de Antônio Marques da Silva (fl. 109).
Em consulta ao extrato do CNIS do promovente, vejo que este contém vínculo de trabalho formal como segurado empregado entre 06/1994 e 08/1994, 01/1996 e 03/1999, 04/1999 e 05/2003, 04/2006 e 06/2009, 12/2009 e 09/2010, 11/2010 e 11/2010, 04/2011 e 11/2015 e entre 05/2016 e 07/2019.
Malgrado o INSS tenha arguido que o apelado possui diversos vínculos anotados na CTPS/CNIS, alguns deles são rurais, e, portanto, considerados prova material plena do período nela registrado e início de prova documental para o restante do período de carência, uma vez que ratificam a lida rural desenvolvida pelo autor (AREsp n. 2.054.354, Relator Ministro Humberto Martins, DJe de 02/05/2022; REsp n. 1.737.695/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe de 23/11/2018; AC n. 1015848-60.2019.4.01.3304, Relator Desembargador Federal João Luiz de Sousa, Segunda Turma, PJe 01/04/2022).
Assim, embora não seja possível reconhecer a atividade exercida como segurado especial durante todo o período de carência, somando-se os vínculos registrados no CNIS ao tempo de labor rural exercido pelo autor, verifica-se que este preenche o período de carência necessário para a concessão da aposentadoria híbrida por idade, conforme disposto no art. 48, § 3º, da Lei n. 8.213/91.
Registre-se, também, que, ainda que o apelante não tenha satisfeito todas as exigências no momento de propositura da ação, O Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar recurso especial em sede de repetitivo (Tema 995), fixou o seguinte entendimento: “É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.” (REsp n. 1.727.063/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 23/10/2019, DJe de 2/12/2019.).
Dessa forma, restando demonstrado o exercício de atividade rural mediante extrato do CNIS, no cargo de trabalhador agropecuário em geral, entre 04/2011 e 11/2015; e no cargo de trabalhador volante da agricultura entre 05/2016 e 07/2019, que, somado ao tempo de atividade urbana, na qualidade de empregado, superam o período de carência necessário à concessão de aposentadoria por idade híbrida, o benefício deve ser concedido ao autor a partir da data de implemento do requisito etário, ou seja, 23/03/2023.
Nesse sentido, vale conferir o seguinte julgado:
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. CTPS E CNIS QUE FAZEM PROVA PLENA. DESNECESSIDADE DE OITIVA DE TESTEMUNHAS. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. REAFIRMAÇÃO DA DER. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Pretende a parte apelante o julgamento pela improcedência do pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade rural face ao não preenchimento pela parte autora do requisito de segurada especial e por possuir vínculos urbanos no CNIS. 2. São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91). 3. Houve o implemento do requisito etário em 2018, portanto, a parte autora deveria provar o período de 2003 a 2018 de atividade rural. 4. Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e da carência, a parte autora anexou aos autos: a) CTPS e CNIS com anotações de vínculos como empregado rural totalizando em 29 anos, 7 meses e 12 dias; b) Certidão de casamento com a senhora Maria de Fátima Silva em 26/07/1980, em que a parte autora é qualificado como lavrador; c) Certidão de nascimento da filha Ronecléia de Fátima Silva, nascida em 18/03/1987, em que é qualificado como lavrador; d) Certidão de nascimento do filho Ronicley Aparecido da Silva, nascido em 11/11/1982 e e) Certidão de nascimento do filho Uenigley Aparecido da Silva, nascido em 11/03/1983, em que a parte autora é qualificada como lavrador. 5. No entanto, em análise do CNIS da parte autora, verificam-se vínculos urbanos nos períodos de 01/09/2002 a 31/12/2004 e de 12/04/2005 a 07/07/2007, o que impediria a concessão da aposentadoria por idade rural. 7. Porém, com o advento da Lei n.º 11.718/2008, a qual acrescentou os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei n.º 8.213/91, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria rural por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem. Assim, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido. Por sua ve, salienta-se que, segundo a doutrina e a jurisprudência, é aplicável o princípio da fungibilidade entre os benefícios previdenciários e, assim como o INSS deve conceder o benefício da melhor opção para o segurado, também é possível ao Judiciário conceder, de ofício, por fundamento diverso, a prestação devida ao segurado. 8. Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte autora atendido ao requisito etário, pois completou 65 anos em 20/04/2023. 9. Importa salientar que a CTPS e o CNIS fazem prova plena da qualidade de empregado rural e urbano por tempo muito superior ao necessário e não necessitam de ser corroborados pela oitiva de testemunhas, uma vez que apenas o início de prova material exige esse requisito, não ocorrendo qualquer cerceamento da defesa nesse aspecto. 10. Quanto à data de início do benefício, tem-se que os requisitos autorizadores foram preenchidos com o implemento do requisito etário em 20/04/2023, devendo ser reafirmada a DER para essa data. Sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal. 11. Apelação do INSS parcialmente desprovida. (AC 1008567-47.2019.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 24/04/2024 PAG.)
No tocante à correção monetária e aos juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas, deverão ser aplicados os índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pela parte autora para, reformando a sentença, condenar o INSS a conceder ao autor o benefício de aposentadoria híbrida por idade, a partir da data do implemento etário (65 anos – 23/03/2023), bem como a pagar as parcelas vencidas, acrescidas de correção monetária e de juros de mora, nos termos da fundamentação supra.
Condeno o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em quantia equivalente a 10% (dez por cento) do valor da condenação, consistente nas parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão (Súmula 111 do STJ).
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

24
APELAÇÃO CÍVEL (198)1023121-45.2023.4.01.9999
SIDINEI DA SILVA NOVAIS
Advogados do(a) APELANTE: CLAUDENIR ZERI MENDES DE SOUZA JUNIOR - MT27716-E, CLAUDIO LEME ANTONIO - MT12613-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA OU MISTA POR IDADE. ART. 48, §§ 3º E 4º DA LEI 8.213/91. IDADE MÍNIMA COMPROVADA. PROVA MATERIAL PLENA DO TRABALHO RURAL. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS CUMPRIDOS. CONSECTÁRIOS DA CONDENAÇÃO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O art. 48, § 3º, da Lei n. 8.213/91, na redação dada pela Lei n. 11.718/08, permite a concessão de aposentadoria por idade uma vez implementadas a idade mínima e a carência, considerando o cômputo do tempo de serviço urbano e o tempo de serviço rural.
2. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido. O art. 48, § 3º, da Lei de Benefícios, por sua vez, traz a previsão da aposentadoria mista por idade, na qual há a contagem híbrida da carência (não contributiva rural e contributiva urbana), exigindo-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, exigência integral de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
3. Comprovados o implemento da idade mínima e a atividade rural, com a apresentação de prova material plena, que, somada ao tempo de serviço urbano completam a carência, deve ser concedido o benefício de aposentadoria híbrida por idade.
4. As parcelas vencidas devem ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora mediante a utilização dos índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
5. Apelação interposta pelo autor parcialmente provida para, reformando a sentença, condenar o INSS a conceder o benefício de aposentadoria híbrida por idade, a partir da data do implemento etário (65 anos – 23/03/2023).
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação interposta pela parte autora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
