
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:JOAO BATISTA FILHO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: DOUGLAS FURTADO DE OLIVEIRA - GO51051-A e DIVINO JOSE DOS SANTOS - GO20287-A
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1019574-94.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo (fls. 100/103 e 118/120).
Em suas razões, a autarquia previdenciária pretende a reforma da sentença para que o pedido inicial seja julgado improcedente, sustentando a ausência de prova material contemporânea e idônea do labor rural em regime de economia familiar. Ao final, formula pedidos subsidiários relacionados à prescrição quinquenal, bem como aos honorários advocatícios, entre outros (fls. 113/116 e 161).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 141/154).
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
A aposentadoria rural por idade
A concessão desse benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade a partir de 60 anos, para homem, e de 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Da carência
O requisito de carência deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642).
Das provas
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, diante da dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício de sua profissão, o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício da atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive aqueles que estejam em nome de membros do grupo familiar (REsp n. 1.354.908/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe de 10/2/2016).
Ademais, a Primeira Seção da Corte Superior sedimentou entendimento, inclusive sob a sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil/1973, acerca da possibilidade de extensão da eficácia probatória da prova material, tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento apresentado, desde que corroborada por robusta prova testemunhal (Súmula n. 577/STJ), não admitindo, nos termos da Súmula 149, a prova exclusivamente testemunhal (AgInt no REsp n. 1.949.509/MS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 14/2/2022, DJe de 17/2/2022.).
O caso em exame
O autor, nascido em 24/07/1962, implementou o requisito etário em 24/07/2022 (60 anos), tendo formulado o requerimento administrativo do benefício em 15/08/2022.
Para a comprovação da qualidade de segurado e do período de carência, o autor apresentou, entre outros, os seguintes documentos: a) cópia da carteira de trabalho, consignando o exercício de atividade na função de serviços gerais, na Chácara Bela Vista, referente ao período entre 2010 e 2020; b) fatura de consumo de energia elétrica, em seu nome, relativa ao ano de 2022; c) carteira emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Piracanjuba, constando sua admissão em 1986; d) contrato de comodato e parceria referente a imóvel rural, em que o autor figura como comodatário, datado em 2003; e) contrato de arrendamento de imóvel rural, em que o autor figura como locatário, datado em 2020; f) escritura pública de compra e venda de imóvel rural, em que o autor figura como outorgado comprador, datada em 2021; g) certificado de cadastro de imóvel rural – CCIR, datado em 2021; h) autodeclaração de segurado especial, referente aos períodos de 2003 a 2010, na condição de comodatário, de 2010 a 2020 na condição de empregado rural, de 2020 a 2021 na condição de arrendatário e de 2021 a 2022 na condição de proprietário; e i) notas fiscais referentes à aquisição de produtos agrícolas, datadas em 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022 (fls. 24/59).
Aliado a tais elementos, foram tomados os depoimentos das testemunhas, as quais confirmaram, de forma segura e convincente, o labor rural desenvolvido pela parte autora. Ademais, o juízo a quo solicitou a perícia socioeconômica realizada pela perita técnica, que “concluiu pela constatação do status de trabalhador rural do autor, podendo ser reconhecido o direito a aposentadoria por idade rural"[...]. "Para tal conclusão, a perita visitou a residência e além de entrevistar a parte pericianda, respondeu aos quesitos formulados pelo juízo.” Dessa forma, conforme prolatado na sentença proferida pelo juízo a quo, “de mais a mais, o INSS não fez qualquer prova documental no sentido de desconstituir as alegações da parte autora, como, por exemplo, registros no CNIS a indicar exercício de atividade empresarial ou como empregado urbano, do demandante. Por estes motivos entendo que ficou evidenciado que a parte autora faz jus ao benefício” (fl. 102).
Por sua vez, o INSS apresentou o extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS do requerente, contendo o registro de vínculo em contribuição individual no período entre 2020 e 2022, bem como vínculo empregatício no período entre 2010 e 2019.
Verifica-se, todavia, que a Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS do autor, com registros de vínculos como trabalhador rural em serviços gerais, constitui prova plena do exercício de atividade laborativa rural no período de carência necessário à concessão do benefício.
De fato, conforme entendimento jurisprudencial, a CTPS, com registros de vínculos rurais, deve ser considerada como prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (AC 1012163-68.2021.4.01.9999 Rel. Desembargador Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 13/09/2021).
Assim sendo, restando demonstrada a condição de empregado rural durante o período de carência, conforme previsão do art. 142 da Lei 8.213/91, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria rural por idade correspondente a um salário mínimo, desde a data do requerimento administrativo, conforme disposto na sentença.
Nesse sentido, o seguinte julgado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR IDADE. EMPREGADO RURAL. COMPROVAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO. PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. CNIS. VÍNCULO EMPREGATÍCIO RURAL. APELAÇÃO DESPROVIDA. (...) 2. A Constituição Federal, art. 201, § 7º, II, prevê a aposentadoria por idade com redução de 05 (cinco) anos para os trabalhadores rurais e segurados especiais, de forma que o homem faz jus a tal benefício aos 60 anos e a mulher, aos 55 anos de idade. A Lei n. 8.213/91, em seu art. 48, § 1º, utiliza a expressão trabalhadores rurais como gênero, do qual seriam espécies o empregado rural, autônomo rural, avulso rural e o segurado especial (art. 11, alínea a do inciso I, alínea g do inciso V e incisos VI e VII). A comprovação de tempo de serviço para fins previdenciários requer início de prova material (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91). Com relação à comprovação do tempo de labor rural, é interessante ressaltar que a jurisprudência já consagrou o entendimento de que este início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, apesar de que não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício. 3. A controvérsia cinge-se ao reconhecimento da qualidade de trabalhadora rural da parte autora, que possuía 55 anos de idade ao tempo do requerimento administrativo, em 22/10/2015 (nascimento em 16/12/1959), e vínculo empregatício registrado no CNIS nos períodos compreendidos entre 02/10/1989 e 03/02/1992, junto ao empregador Maria Luiza Agropecuária LTDA e 07/05/1997 a 15/10/2009 e de 03/01/2011 até 2016, junto ao empregador Euler Cesar de Freitas. O INSS alega que os vínculos empregatícios registrados no CNIS da requerente são de natureza urbana, de modo a desautorizar a conclusão de que se trata de segurada especial. 4. No entanto, verifica-se do documento ID 71532560, pág. 100, acostado pela Autarquia, que o vínculo mantido com o empregador Euler César de Freitas, inciado em 03/01/2011, é de natureza rural, na ocupação CASEIRO (AGRICULTURA) 6220-05. O empregador é o mesmo do vínculo anterior, no período compreendido entre 07/05/1997 e 15/10/2009. Por sua vez, a testemunha Valda Sebastiana Vieira afirmou que conhece a autora há mais vinte anos, desde quando a requerente já trabalhava na Fazenda Cabeceiras, de propriedade de Euler César de Freitas, desempenhando atividade rural na qualidade de funcionária. Além disso, há também vínculo anterior mantido com empregador do ramo agropecuário, entre 02/10/1989 a 03/02/1992. 5. Tal o contexto, é possível concluir que o vínculo mantido com o empregador Euler César de Freitas desde 1997 sempre foi natureza rural, circunstância que autoriza a aplicação do redutor previsto no art. 48, § 1º c/c art. 11, I, a da Lei n. 8.213/91 para a concessão da aposentadoria por idade. Assim, tendo a parte autora cumprido a carência necessária, bem assim atingido a idade de 55 anos na data do requerimento administrativo, cumpre reconhecer haver preenchido os requisitos para a aposentadoria por idade, na qualidade de empregada rural, na forma do art. 48, § 1º c/c art. 11, I, a da Lei n. 8.213/91, razão pela qual deve ser mantida a sentença recorrida. 6. Os honorários advocatícios ficam majorados em 1% (um por cento), a teor do disposto no artigo 85, §§ 2º, 3º e 11º do CPC, totalizando o quantum de 11% (onze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, em observância a Súmula 111 do STJ. 7. Apelação a que se nega provimento. Antecipação de tutela mantida. (TRF-1 - AC: 00326011520184019199, Relator: JUIZ FEDERAL SAULO JOSÉ CASALI BAHIA, Data de Julgamento: 29/04/2022, 1ª Câmara Regional da Bahia, Data de Publicação: PJe 09/05/2022 PAG PJe 09/05/2022 PAG)
Dos pedidos subsidiários
Conforme se pode observar dos termos da apelação interposta, o INSS formulou os seguintes pedidos subsidiários (fl. 116):
“a. a observância da prescrição quinquenal;
“b. a fixação dos juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, alterado pela Lei 11.960/09, bem como a fixação dos índices de correção monetária conforme Tema 905/STJ, sem prejuízo da aplicação imediata da Emenda Constitucional nº 113 , de 8 de dezembro de 2021, segundo a qual nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente;
“c. a fixação do percentual de honorários advocatícios no patamar mínimo (cf. artigo 85, § 3º, inciso I do NCPC), com a limitação da verba honorária ao comando do Súmula 111-STJ;
“d. a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias.”
Quanto a esses pedidos, importa ressaltar, de logo, que na sentença recorrida já consta a determinação de observância da prescrição quinquenal e também a declaração de isenção do INSS no tocante ao pagamento das custas processuais. Além disso, na sentença, os honorários advocatícios foram fixados no patamar mínimo de 10% (dez por) sobre o valor das parcelas vencidas, nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, razão pela qual nada há que ser provido quanto a esses pedidos.
Por fim, no tocante ao pedido constante do item “b” supra, a sentença recorrida não merece qualquer reforma, uma vez que determinou, de forma correta, a aplicação dos juros e da correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que, como se sabe, encontra-se atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
Com esses fundamentos, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS.
Fixo os honorários advocatícios recursais, devidos pelo INSS, em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da condenação.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

23APELAÇÃO CÍVEL (198)1019574-94.2023.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
JOAO BATISTA FILHO
Advogados do(a) APELADO: DIVINO JOSE DOS SANTOS - GO20287-A, DOUGLAS FURTADO DE OLIVEIRA - GO51051-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. EMPREGADO RURAL. CTPS COM REGISTRO DE ATIVIDADE RURAL DURANTE O PERÍODO DE CARÊNCIA. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.
1. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. Conforme entendimento jurisprudencial, a CTPS, com registros de vínculos rurais, deve ser considerado como prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (AC 1012163-68.2021.4.01.9999 Rel. Desembargador Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 13/09/2021).
3. Comprovado o implemento da idade mínima, bem como o exercício da atividade rural e o cumprimento da carência exigida para a concessão do benefício postulado, deve ser concedido o benefício de aposentadoria rural por idade.
4. Não merece reforma a sentença que determina a aplicação dos juros e da correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
5. Apelação interposta pelo INSS a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto da Relatora
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
