
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA FERREIRA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ADRIANA DA SILVA MARQUES FREITAS - GO14358-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1021687-89.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5329802-91.2019.8.09.0065
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA FERREIRA DA SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ADRIANA DA SILVA MARQUES FREITAS - GO14358-A
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente a pretensão para concessão de benefício de aposentadoria por idade na modalidade híbrida/mista, computando-se o tempo de labor rural com outros períodos de contribuição ao RGPS.
Em suas razões recursais, sustenta o desacerto do julgado, argumentando que a sentença proferida está lastreada apenas em prova testemunhal, pois a única prova anexada foi uma certidão de casamento de 1973. Sustenta, ademais, que a prova oral é contraditória, pois a primeira testemunha disse que a demandante teria trabalhado como doméstica e a segunda afirmou que a autora laborou em um restaurante.
Por tais argumentos, requer o provimento do recurso para que a sentença seja reformada em sua integralidade. Subsidiariamente, requer o acolhimento dos pedidos eventuais, consistentes na aplicação de juros e correção monetária nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, bem como a observância da prescrição das parcelas vencidas anteriores ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação.
Devidamente intimado, o lado recorrido apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PROCESSO: 1021687-89.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5329802-91.2019.8.09.0065
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA FERREIRA DA SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ADRIANA DA SILVA MARQUES FREITAS - GO14358-A
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao benefício de aposentadoria por idade híbrida/mista, utilizando-se a soma do tempo de labor rural com outros períodos contributivos.
De início, convém destacar que com a inclusão dos §§ 3º e 4º no art. 48 da Lei 8.213/91, pela Lei 11.718/2008, outra espécie de aposentadoria por idade passou a integrar o ordenamento jurídico, a chamada aposentadoria híbrida ou mista, confira-se:
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008).
Consoante jurisprudência assentada pelo STJ:
(...) A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher. (REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019). Sem grifos no original
Verifica-se, portanto que para a categoria de aposentadoria por idade mista ou híbrida, prevista no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, há a contagem híbrida da carência (soma-se os períodos de labor rural com urbana), destinando-se aos trabalhadores rurais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano, não importando se retornaram ou não ao campo ao tempo do implemento do requisito etário ou da apresentação do requerimento administrativo. Contudo, para a concessão do benefício exige-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.
No caso concreto, a autora contava com mais de 60 anos ao tempo da DER (23/11/2016), eis que nascida em 28/8/1953, preenchendo o requisito etário.
A autora pretende o cômputo de períodos de labor rural anterior ao ano de 2001, ano em que teria migrado para o meio urbano e vertido contribuições ao RGPS como trabalhadora urbana, consoante faz prova o seu CNIS, bem como o período posterior a 2005, quando teria retornado para o meio rural e permanecido até o momento do implemento dos requisitos legais para o benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Com efeito, o Tema Repetitivo sob o número 1007 estabeleceu que: “O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, §3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo”.
O STF, ao seu turno, na análise do RE 1.281.909 entendeu ausente a repercussão geral na matéria, julgando tratar-se de matéria infraconstitucional (Tema 1104).
Por conseguinte, o entendimento a ser aplicado é o firmado pelo STJ, que considera válido o cômputo do tempo de labor rural tanto posterior como anterior ao advento da Lei n. 8.213/91, para fins de carência de aposentadoria híbrida por idade, assim como admite total alternância entre atividades rurais e urbanas, inclusive permitindo que a última atividade desempenhada pelo segurado tenha sido urbana.
Desse modo, a atividade rural, desempenhada em períodos outros que não o imediatamente anterior ao requerimento do benefício, poderá ser considerado para a concessão de aposentadoria por idade urbana, modalidade mista/híbrida, inclusive para carência, independentemente de indenização, desde que cumpridos os requisitos para este último benefício (idade e carência), razão pela qual não há óbice ao reconhecimento do período rural remoto requerido, de 1973 a 2001.
Com o propósito de comprovar sua condição de segurada especial a autora trouxe aos autos certidão de casamento, lavrada em 1973, de onde se extrai qualificação de seu cônjuge como lavrador, bem como cópia da CTPS de seu consorte, contendo vínculo empregatício de natureza rural, firmado com início no ano de 2000, bem como extrato de informações previdenciárias constando que seu esposo é aposentado perante o RGPS como segurado especial, desde o ano de 2016.
Desse modo, não há falar em ausência de prova material da condição de segurada especial da autora quanto aos fatos alegados na inicial.
Em que pese a prova material não se revista de robustez, deve ser considerada como prova indiciária da condição de segurada especial da autora, posto que os referidos documentos não apontam qualquer inconsistência com relação aos demais elementos de prova dos autos.
Ademais, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material.
E neste ponto, a propósito, a prova testemunhal foi favorável, corroborando os demais elementos de prova dos autos, restando esclarecido que a autora de fato retira o sustento das lides rurais, com exceção do período de 2001 e 2005 em que a autora migrou para o meio urbano.
Embora uma das testemunhas tenha informado acreditar que a autora laborou no período urbano como doméstica ao passo que a outra testemunha informou que a autora trabalhou em restaurantes, diversamente do que sustenta o INSS, não há que se falar em contradições, pois não houve afirmações em sentido contrário, apenas demonstração de que uma das testemunhas desconhecia a natureza das atividades desempenhadas pela autora no período que laborou na cidade.
Ademais, no que tange ao período contributivo a prova é plena, consubstanciado no CNIS da autora, ao passo que o efetivo labor rural as testemunhas ouvidas em juízo foram firmes e coerentes, fazendo prova de que pelo menos desde 1975 a 2001 a autora manteve-se ligada ao labor rural de subsistência, desempenhando atividades em terras de terceiros, sempre na companhia de seu cônjuge, situação que se manteve após o ano de 2005 até o ano de 2017.
Assim, restam satisfatoriamente comprovado os requisitos para a concessão do benefício.
Nesse contexto, a sentença recorrida encontra-se bem fundamentada quanto à análise de todo o conjunto probatório e nada há nos autos que possa infirmar o quanto decidido.
No que tange aos pedidos subsidiários, impróprio falar em prescrição quinquenal, posto que a DER é datada em 2016 ao passo que o ajuizamento da ação se deu em 2019.
De igual modo, não há falar em correção monetária e juros nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, posto que em desacordo com o entendimento firmado pelo STJ no Tema 905, bem como com a EC 113/2021.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação supra.
Em razão do não provimento recursal, condeno o INSS ao pagamento de honorários de sucumbência que fixo em 11% sobre as parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111 STJ), eis que majoro em um ponto percentual os parâmetros fixados na origem.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1021687-89.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5329802-91.2019.8.09.0065
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA FERREIRA DA SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ADRIANA DA SILVA MARQUES FREITAS - GO14358-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ARTIGO 48, § 3º LEI 8.213/91. COMPROVAÇÃO DE PERÍODOS DE LABOR RURAL E CONTRIBUTIVOS EM OUTRAS CATEGORIAS. PROVA MATERIAL VÁLIDA. PROVA TESTEMUNHAL SATISFATÓRIA. RECURSO IMPROVIDO.
1. Para categoria de aposentadoria por idade mista ou híbrida, prevista no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, há a contagem híbrida da carência (soma-se os períodos de labor rural com urbana), destinando-se aos trabalhadores rurais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano, não importando se retornaram ou não ao campo ao tempo do implemento do requisito etário ou da apresentação do requerimento administrativo. Contudo, para a concessão do benefício, exige-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.
2. No caso concreto, a autora pretende o cômputo de períodos de labor rural anterior ao ano de 2001, ano em que teria migrado para o meio urbano e vertido contribuições ao RGPS como trabalhadora urbana, consoante faz prova o seu CNIS, bem como o período posterior a 2005, quando teria retornado para o meio rural e permanecido até o momento do implemento dos requisitos legais para o benefício de aposentadoria por idade híbrida.
3. Com o propósito de comprovar sua condição de segurada especial a autora trouxe aos autos certidão de casamento, lavrada em 1973, de onde se extrai qualificação de seu cônjuge como lavrador, bem como cópia da CTPS de seu consorte, contendo vínculo empregatício de natureza rural, firmado com início no ano de 2000, bem como extrato de informações previdenciárias constando que seu esposo é aposentado perante o RGPS como segurado especial, desde o ano de 2016. Desse modo, não há que se falar em ausência de prova material da condição de segurada especial da autora quanto aos fatos alegados na inicial.
4. Em que pese a prova material não se revista de robustez, deve ser considerada como prova indiciária da condição de segurada especial da autora, posto que os referidos documentos não apontam qualquer inconsistência com relação aos demais elementos de prova dos autos. Ademais, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material.
5. E neste ponto, a propósito, a prova testemunhal foi favorável, corroborando os demais elementos de prova dos autos, restando esclarecido que a autora de fato retira o sustento das lides rurais, com exceção do período de 2001 e 2005 em que a autora migrou para o meio urbano. Embora uma das testemunhas tenha informado acreditar que a autora laborou no período urbano como doméstica ao passo que a outra testemunha informou que a autora trabalhou em restaurantes, diversamente do que sustenta o INSS, não há que se falar em contradições, pois não houve afirmações em sentido contrário, apenas demonstração de que uma das testemunhas desconhecia a natureza das atividades desempenhadas pela autora no período que laborou na cidade. Ademais, no que tange ao período contributivo a prova é plena, consubstanciado no CNIS da autora, ao passo que o efetivo labor rural as testemunhas ouvidas em juízo foram firmes e coerentes, fazendo prova de que pelo menos desde 1975 a 2001 a autora manteve-se ligada ao labor rural de subsistência, desempenhando atividades em terras de terceiros, sempre na companhia de seu cônjuge, situação que se manteve após o ano de 2005 até o ano de 2017. Assim, restam satisfatoriamente comprovados os requisitos para a concessão do benefício.
6. Apelação a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
