
POLO ATIVO: LUCIA MARIA DE OLIVEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LEONARDO HALLEY ANTUNES NASCIMENTO - GO25004-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1034656-39.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5076544-05.2021.8.09.0123
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: LUCIA MARIA DE OLIVEIRA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: LEONARDO HALLEY ANTUNES NASCIMENTO - GO25004-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de apelação interposta pela autora em face de sentença que julgou improcedente a pretensão à concessão de benefício de aposentadoria por idade na modalidade híbrida/mista, computando-se o tempo de labor rural com outros períodos de contribuição ao RGPS, sob o fundamento de que juntou documentos não revestidos de robustez quanto a condição de segurada especial alegada pela autora, posto que seu esposo seria empregado rural, situação que não se confunde com a de segurado especial, haja vista o regime de filiação diverso.
Em suas razões recursais, a autora sustenta o desacerto do julgado, argumentando que instruiu os autos com documentos que comprovam, satisfatoriamente, sua condição de segurada especial, com destaques para sua certidão de casamento contendo qualificação de seu cônjuge como lavrador, certidão de nascimento dos filhos, datadas em 1981, 1983 e 1986, qualificando seu ex-cônjuge como lavrador, CTPS constando registros de vínculos de seu cônjuge em meio rural.
Esclarece que, a despeito de ter contraído matrimônio com o titular dos documentos no ano de 2014, trata-se de união conjugal com início em julho de 2002. Assevera, ademais, que a prova testemunhal restou robusta e convergente com as demais provas dos autos, não deixando dúvidas do labor rural em regime de subsistência.
Ao final, requereu o conhecimento e provimento do recurso para, reformando a sentença, seja o INSS condenado a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Devidamente intimado, o lado recorrido não apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PROCESSO: 1034656-39.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5076544-05.2021.8.09.0123
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: LUCIA MARIA DE OLIVEIRA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: LEONARDO HALLEY ANTUNES NASCIMENTO - GO25004-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao benefício de aposentadoria por idade híbrida/mista, utilizando-se a soma do tempo de labor rural com outros períodos contributivos.
De início, convém destacar que com a inclusão dos §§ 3º e 4º no art. 48 da Lei 8.213/91, pela Lei 11.718/2008, outra espécie de aposentadoria por idade passou a integrar o ordenamento jurídico, a chamada aposentadoria híbrida ou mista, confira-se:
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008).
Consoante jurisprudência assentada pelo STJ:
(...) A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher. (REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019). Sem grifos no original
Verifica-se, portanto que para a categoria de aposentadoria por idade mista ou híbrida, prevista no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, há a contagem híbrida da carência (soma-se os períodos de labor rural com urbana), destinando-se aos trabalhadores rurais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano, não importando se retornaram ou não ao campo ao tempo do implemento do requisito etário ou da apresentação do requerimento administrativo. Contudo, para a concessão do benefício exige-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.
No caso concreto, nascida em 29/11/1959, verifica-se que o requisito etário havia sido implementado pela autora ao tempo da DER (23/12/2019).
A autora pretende ver reconhecida sua qualidade de segurada especial, trabalhadora rural em regime de economia familiar, nos períodos de 1992 a 2000 e 2002 a 2014.
Sustenta que os referidos períodos, somados a outros períodos de contribuições vertidas ao RGPS, seria suficiente ao cumprimento da carência do benefício, que para o caso da autora é de 180 meses, ao teor do art. 25 da Lei 8.213/91.
Com o propósito de comprovar sua condição de segurada especial a autora trouxe aos autos, dentre outros documentos de menor relevo, cópia de sua certidão de casamento, lavrada em 2014, de onde se extrai a qualificação de seu cônjuge como sendo a de lavrador; cópia da CTPS de seu cônjuge/companheiro, contendo diversos vínculos empregatícios de natureza rural, situados entre os anos de 2004 a 2014, bem como cópia da CTPS de seu ex-cônjuge, com diversos vínculos laborativos situados em meio campesino, datados entre os anos de 1982 a 2000, ainda que descontínuos.
Reputo inservível como elemento de prova as certidões de nascimento dos filhos da autora, posto que, a despeito de terem sido lavrados nos idos dos anos 80, 83 e 86, a condição de trabalhador rural foi inserida em averbação realizada em data não esclarecida, tratando-se de documentos emitidos em segunda via no ano de 2014 (próxima a primeira da DER da autora), o que lhe retira a necessária segurança jurídica, não refletindo a realidade vivenciada ao tempo das lavraturas.
Por outro lado, diversamente do que sustentado pelo julgador de primeiro grau, a CTPS com anotações de trabalho rural do cônjuge/companheiro é extensível à autora, sendo considerado documento idôneo a servir como início de prova material da qualidade de segurada especial desta.
Nesse mesmo sentido, vejamos a jurisprudência do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. EMB ARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL. VERIFICAÇÃO DO ACERVO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA DA ATIVIDADE. EXTENSÃO DA CONDIÇÃO DE TRABALHADOR RURAL DE UM DOS CÔNJUGES. I. A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que constitui valoração, e não reexame de provas, a verificação do acervo probatório dos autos com vistas a confirmar o alegado exercício de atividade rurícola (AgRg no REsp 880.902/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 15/02/2007, DJ 12/03/2007, p. 329). II - O precedente indicado pela embargante como paradigma retrata, de fato, o entendimento consolidado por esta Colenda Seção, segundo o qual, diante das dificuldades encontradas pelos trabalhadores rurais para a comprovação do tempo de serviço prestado nas lides campesinas, o exame das provas colacionadas aos autos não encontra óbice na Súmula 7 do STJ, por consistir em devida revaloração do acervo probatório (AgRg no REsp 1150564/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 02/12/2010, DJe 13/12/2010). III - Este Superior Tribunal de Justiça, nas causas de trabalhadores rurais, tem adotado critérios interpretativos favorecedores de uma jurisdição socialmente justa, admitindo mais amplamente documentação comprobatória da atividade desenvolvida. IV - Seguindo essa mesma premissa, firmou posicionamento segundo o qual as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais e contratos de parceria agrícola são aceitos como início da prova material, nos casos em que a profissão rural estiver expressamente consignada. V - Da mesma forma, admite que a condição profissional de trabalhador rural de um dos cônjuges, constante de assentamento em Registro Civil, seja extensível ao outro, com vistas à comprovação de atividade rurícola. VI - Orienta ainda no sentido de que, para a concessão de aposentadoria por idade rural, não se exige que a prova material do labor agrícola se refira a todo o período de carência, desde que haja prova testemunhal apta a ampliar a eficácia probatória dos documentos (AR 4.094/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012). VII - Embargos de Divergência acolhidos (EREsp 1.171.565/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/03/2015). Sem destaques no original
Oportuno mencionar ainda que, na linha do julgado acima transcrito, o Ministro MANOEL ERHARDT (Desembargador Convocado) entendeu que a anotação na CTPS do cônjuge como empregado rural é extensível ao outro cônjuge. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. COMPROVAÇÃO DO TRABALHO CAMPESINO. DOCUMENTOS PÚBLICOS NOS QUAIS SOMENTE O CÔNJUGE É QUALIFICADO COMO RURÍCOLA. EXTENSÃO À ESPOSA. POSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO PACIFICADO POR ESTA CORTE SUPERIOR NOS ERESP 1.171.565/SP. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE EM RELAÇÃO AOS DEMAIS DISPOSITIVOS APONTADOS COMO SUPOSTAMENTE VIOLADOS. SÚMULA 284/STF. RECURSO ESPECIAL DO PARTICULAR PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO. (...) 9. Com efeito, diante da dificuldade encontrada pelo trabalhador rural em comprovar o labor campesino, por ser comum a ausência de formalização dos seus atos, esta Corte Superior tem adotado critérios interpretativos pro misero, a fim de possibilitar uma jurisdição socialmente justa. 10. No caso dos autos, o Tribunal de origem reconheceu a existência de documentos públicos nos quais o esposo da parte autora é qualificado como campesino, mas não os admitiu como início de prova material, sob os seguintes fundamentos: No caso vertente, visando constituir início de prova material, a parte autora anexou aos autos os seguintes documentos: i) certidão de casamento, em que o esposo é qualificado como campeiro (2009); ii) certidão de nascimento do filho, qualificando o esposo da autora como campeiro (1996); iii) cópias da CTPS do esposo, indicando diversos vínculos rurais entre 1994 e 2014. Ocorre que tais documentos nada provam em relação à alegada atividade laboral exercida pela parte autora, pois, nessas condições, não é possível a extensão da condição de trabalhador rural do cônjuge à esposa. Tal extensão é possível, em tese, somente aos casos em que os documentos apresentados demonstram a atividade rural do cônjuge/companheiro em regime de economia familiar, não se aplicando à hipótese em que o cônjuge/companheiro é empregado rural, conforme cópias da CTPS e extratos do CNIS (fls. 113). 11. A conclusão da Corte de origem acerca da não comprovação do labor rural é equivocada. Isso porque, a existência de anotações em CTPS demonstrando que o esposo da parte autora exercera, durante certo período, atividade rural na condição de empregado não afasta o entendimento desta Corte Superior sobre a extensibilidade da prova ao cônjuge, uma vez que não há necessidade de que se reconheça a efetiva condição de segurado especial do titular dos documentos, mas apenas de que este exerça atividade rurícola. (...) 14. Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial do particular e, nessa extensão, dou-lhe provimento, para reconhecer a existência de início de prova material. Determina-se o retorno do feito à origem, para que o Tribunal a quo realize o cotejo entre a prova material e a testemunhal, prosseguindo-se no exame do pedido, como entender de direito. (REsp n. 1.861.027, Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF-5ª Região), DJe de 07/05/2021.) Sem destaques no original
Por oportuno, vale consignar que, em exceção a regra, consoante Tema 533 do STJ, a extensibilidade do documento de um cônjuge ao outro, com vistas à comprovação de atividade rurícola, fica prejudicada somente quando o titular do documento passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana. Dessa forma, o vínculo formal, com registro em CTPS, do labor rural do cônjuge/companheiro da autora não está enquadrado na exceção da extensibilidade do documento.
Portanto, a atividade rural do cônjuge da condição de empregado não afasta o entendimento sobre a extensibilidade da prova, uma vez que não há necessidade que se reconheça a efetiva condição de segurado especial do titular do documento, mas que apenas exerça atividade rurícola.
Registra-se, por oportuno, que no meio rural é comum a contratação do homem formalmente ao passo que a mulher desenvolve trabalho em regime de auxílio ao cônjuge, visando o aumento da renda para obter melhores condições de sobrevivência do núcleo familiar.
Desse modo, não há que se falar em ausência de prova material da condição de segurada especial da autora quanto aos fatos alegados na inicial, pois a qualificação de trabalhador rural registrada nas CTPS's apresentadas constituem prova plena em favor do titular do documento e início de prova material em favor da autora.
Ademais, em que pese a prova material não se revista de robustez, deve ser considerada como prova indiciária da condição de segurada especial da autora, posto que os referidos documentos não apontam qualquer inconsistência com relação aos demais elementos de prova dos autos.
Diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material.
E neste ponto, a propósito, a prova testemunhal foi favorável, corroborando os demais elementos de prova dos autos, restando esclarecido que a autora de fato retirou o sustento das lides rurais por toda a vida laborativa, com exceção dos períodos em que a autora teria prestado serviços à prefeitura, na condição de professora primária em escola situada em meio rural, o que corrobora as informações contidas na CTPS da autora e demais elementos de prova dos autos.
Restou esclarecido, ainda, que a despeito da autora ter contraído matrimônio com Luiz Fernando da Silva somente no ano de 2014, sendo este o titular dos documentos indicativos de lides rurais no imóvel de propriedade de Sandra Lúcia, a testemunha Maria Augusta de Oliveira Rodrigues afirmou que a união conjugal iniciou-se há mais de 20 anos, o que remonta ao ano de 2001 e corroboram as alegações autorais no sentido de que após o seu divórcio com a pessoa de Osmar Gonçalvez Damacena a autora teria deixado o imóvel rural de propriedade de José Martins de Moura, onde a autora desempenhou labor rural de subsistência pelo período de 1/9/1992 a 29/2/2000, possibilitando a extensão das demais provas em seu favor.
Tal informação, de igual modo, foi corroborada pela informação prestada pela testemunha Jair Sebastião de Resende que, a despeito de não saber precisar o período de duração da união estável, afirmou tratar-se de entidade familiar iniciada há mais de dez anos, tendo afirmando, ainda, que a autora desempenhou labor rural tanto na companhia de seu ex-cônjuge (Osmar) nas terras de José Martins de Moura, quanto na companhia do atual cônjuge (Luiz Fernando).
As duas testemunhas ouvidas em juízo foram firmes e coerentes, fazendo prova de que a autora ostentou a qualidade de segurada especial pelo menos no período de 1992 a 2000, em razão do labor rural de subsistência desempenhado junto ao seu ex-cônjuge Osmar, no imóvel rural de propriedade do Sr. José Martins de Moura, assim como no período de 2004 a 2014, em razão do labor rural de subsistência desempenhado junto ao seu companheiro/cônjuge Luiz Fernando, no imóvel rural de propriedade da Sra. Sandra Lúcia Araújo Chaves Machado.
Restou satisfatoriamente afirmado pelas testemunhas que a autora manteve-se ligada ao labor rural de subsistência, desempenhado em terras de terceiros tanto na companhia de seu ex-cônjuge como na companhia de seu companheiro e atual consorte, desempenhando labor de auxílio ao cônjuge/companheiro regularmente contratado, assim como na atividade individual de criação de galinhas, porcos, cultivo de hortaliças, dentre outras atividades ligadas à lide campesina, indispensável para a complementação da renda e sobrevivência do núcleo familiar.
Registra-se, por oportuno, que a autora consta registrado em seu CNIS e em sua CTPS os seguintes vínculos de labor urbano, situados fora do período de labor rural, segurada especial, que devem ser computados para implemento da carência: 1°/11/1985 a 31/1/1986, 1°/4/1988 a 30/4/1988, 1°/6/1988 a 30/6/1988, 1°/2/2001 a 30/4/2001, 5/2/1979 a 30/5/1979, 2/2/1981 a 30/7/1981, 1°/2/2001 a 10/5/2001.
A despeito do vínculo registrado pela autora no período de 1°/2/2001 a 10/5/2001, na condição de empregada doméstica, verifica-se tratar de vínculo de curta duração, inferior a 120 dias do ano civil, o que não descaracteriza a sua condição de segurada especial, à luz do §9º, inciso III, do art. 11 da Lei 8.213/91.
Assim, restam satisfatoriamente comprovado os requisitos para a concessão do benefício.
Posto isto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pela autora para, reformando a sentença recorrida, reconhecer a qualidade de segurado especial da autora, no período de1992 a 2000 e 2004 a 2014 e, por via de consequência, condenar o INSS a obrigação de conceder aposentadoria híbrida por idade à autora, com data de início de benefício (DIB) em 23/12/2019 (DER), bem como a lhe pagar as parcelas atrasadas, sobre as quais incidirão juros e correção monetária, conforme índices do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão atualizada, em harmonia com a orientação que se extrai do Tema 905 STJ e EC 113/2021.
Em face do caráter alimentar do benefício, diante da presença da prova inequívoca a amparar a verossimilhança das alegações, antecipo a tutela quanto ao pagamento da parcelas vincendas, devendo o INSS implantar o benefício no prazo de 60 dias, sob pena das cominações legais.
Em razão do provimento recursal, inverto o ônus da sucumbência, razão pela qual condeno o INSS em honorários advocatícios que fixo em 10% sobre as prestações vencidas, nos termos da Súmula 111 do STJ.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1034656-39.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5076544-05.2021.8.09.0123
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: LUCIA MARIA DE OLIVEIRA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: LEONARDO HALLEY ANTUNES NASCIMENTO - GO25004-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ARTIGO 48, § 3º LEI 8.213/91. COMPROVAÇÃO DE PERÍODOS DE LABOR RURAL E CONTRIBUTIVOS EM OUTRAS CATEGORIAS. PROVA MATERIAL VÁLIDA. PROVA TESTEMUNHAL SATISFATÓRIA. RECURSO PROVIDO.
1. Para categoria de aposentadoria por idade mista ou híbrida, prevista no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, há a contagem híbrida da carência (soma-se os períodos de labor rural com urbana), destinando-se aos trabalhadores rurais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano, não importando se retornaram ou não ao campo ao tempo do implemento do requisito etário ou da apresentação do requerimento administrativo. Contudo, para a concessão do benefício, exige-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.
2. No caso concreto, nascida em 29/11/1959, verifica-se que o requisito etário havia sido implementado pela autora ao tempo da DER (23/12/2019). A autora pretende ver reconhecida sua qualidade de segurada especial, trabalhadora rural em regime de economia familiar, nos períodos de 1992 a 2000 e 2002 a 2014. Sustenta que os referidos períodos, somados a outros períodos de contribuições vertidas ao RGPS, seria suficiente ao cumprimento da carência do benefício, que para o caso da autora é de 180 meses, ao teor do art. 25 da Lei 8.213/91.
3. Com o propósito de comprovar sua condição de segurada especial a autora trouxe aos autos, dentre outros documentos de menor relevo, cópia de sua certidão de casamento, lavrada em 2014, de onde se extrai a qualificação de seu cônjuge como sendo a de lavrador; cópia da CTPS de seu cônjuge/companheiro, contendo diversos vínculos empregatícios de natureza rural, situados entre os anos de 2004 a 2014, bem como cópia da CTPS de seu ex-cônjuge, com diversos vínculos laborativos situados em meio rural, datados entre os anos de 1982 a 2000, ainda que descontínuos. Desse modo, não há que se falar em ausência de prova material da condição de segurada especial da autora quanto aos fatos alegados na inicial, pois a qualificação de trabalhador rural registrada na CTPS constitui prova plena em favor do titular do documento e início de prova material em favor da autora.
4. Em que pese a prova material não se revista de robustez, deve ser considerada como prova indiciária da condição de segurada especial da autora, posto que os referidos documentos não apontam qualquer inconsistência com relação aos demais elementos de prova dos autos. Ademais, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material.
5. E neste ponto, a propósito, a prova testemunhal foi favorável, corroborando os demais elementos de prova dos autos, restando esclarecido que a autora de fato retirou o sustento das lides rurais por toda a vida laborativa, com exceção dos períodos em que a autora teria prestado serviços à prefeitura, na condição de professora primária em escola situada em meio rural, o que corrobora as informações contidas na CTPS da autora e demais elementos de prova dos autos. As duas testemunhas ouvidas em juízo foram firmes e coerentes, fazendo prova de que pelo menos nos períodos de 1992 a 2000 e 2004 a 2014 a autora manteve-se ligada ao labor rural de subsistência, desempenhado em terras de terceiros na companhia de seu companheiro, tanto em labor de auxílio ao cônjuge/companheiro regularmente contratado, quanto na atividade individual de criação de galinhas, porcos, cultivo de hortaliças, dentre outras atividades ligadas à lide campesina, indispensável para a complementação da renda e sobrevivência do núcleo familiar. Assim, restam satisfatoriamente comprovado os requisitos para a concessão do benefício.
6. Apelação a que se dá provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação interposta pela autora, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
