
POLO ATIVO: HONORIO FRANCISCO TEIXEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ANNETTE DIANE RIVEROS LIMA - TO3066-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1016255-89.2021.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se apelação interposta pela parte autora em face de sentença (ID 129858061 - Pág. 4 a 11) que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade híbrida pelo RGPS.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos (§ 1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015).
Nas razões recursais (ID 129858061 - Pág. 29 a 37), foi pedida a reforma da sentença para a concessão do benefício, sob a alegação de apresentação de provas idôneas e suficientes para comprovação da atividade rural exercida.
Intimado, o recorrido não apresentou contrarrazões.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1016255-89.2021.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação, congruência, dialeticidade e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A aposentadoria por idade híbrida é a obtida com a utilização de tempo de serviço/contribuição rural e urbana para efeito de cumprimento de carência, observada a idade mínima prevista na legislação vigente ao tempo do cumprimento de todos os requisitos legais para implementação do benefício (art. 48, §3º, da Lei 8.213/91; Tese 1007 do STJ e arts. 257, 316 e 317 da IN Pres/INSS nº 128/2022).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar ou equivalente, aplicável a parte rural da carência do benefício de aposentadoria por idade híbrida: 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991; 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tema 2 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tema 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) prescindibilidade da qualidade de segurado, na hipótese da aposentadoria por idade, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício (§ 1º do art. 3º da Lei 10.666/2003 ); 7) não simultaneidade entre o implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja esta urbana ou rural; 8) período de labor rural remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade (TESE 1007 do STJ); 9) extensão da prova material da condição de rurícola em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Temas 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 10) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tema 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 11) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tema 23 da TNU); 12) qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, no prazo de carência do segurado especial; 13) possibilidade de consideração das atividades rurais exercidas por menor de idade em regime de economia familiar, nos termos da Súmula 5 da TNU e da Tese 219 da TNU (entre 12 e 14 anos até o advento da Lei 8.213/1991, e a partir de 14 anos após a referida data); 14) inclusão da situação do “bóia-fria” como segurado especial (Tese 554 do STJ); 15) possibilidade de estabelecimento de residência do grupo familiar do segurado especial em aglomerado urbano, fora do local de exercício das atividades agrárias (inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, redação dada pela Lei 11.718/2008); 16) possibilidade de utilização do tempo rural para fins de carência de aposentadoria urbana ou do RPPS (Súmulas 10 e 24 da TNU c/c Tese 1007 e 168 da TNU).
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois o conjunto de situações excepcionais em dado caso concreto pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar e, consequentemente, permitir a exclusão dos períodos descaracterizados do prazo de carência do referido benefício.
O autor nasceu em 24/04/1952 e completou 65 anos em 24/04/2017 (ID 129858055 - Pág. 20 a 22). Apresentou requerimento administrativo (DER em 03/07/2017, conforme ID 129858055 - Pág. 24).
O labor urbano foi comprovado pela apresentação do CNIS (ID 129858055 - Pág. 13 a 15), com registro de contribuição de 12/07/1983 a 16/01/1985. Total de 18 contribuições para efeito de carência.
Resta a comprovação de 162 meses de tempo rural em regime de economia familiar para a complementação do período de carência (180 meses). Reconhecido administrativamente pelo INSS o total de 77 meses de carência como rural, no período de 02/12/2008 a 05/04/2015 (ID 129858056 - Pág. 31 e 32).
O início de prova material da atividade rural está presente nos seguintes documentos: comprovante de endereço rural em nome da esposa do autor, em 27/03/2012 e em 08/04/2016 (ID 129858055 - Pág. 60 e 80); certidão eleitoral, na qual o autor informou sua ocupação de trabalhador rural em 09/06/2015 (ID 129858055 - Pág. 61); certidão de nascimento de filhos do autor e de Cleuza França Barros, nascidos em 29/07/1977, 06/07/1979 e 21/06/1980, comprovando a relação conjugal de longa data (ID 129858055 - Pág. 74 a 76); certidão do INCRA, na qual informa que a companheira do autor é assentada no Projeto de Assentamento PA Setecentos, localizado no município de Couto Magalhães, inscrito no Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (SIPRA), onde desenvolve atividades rurais em regime de economia familiar no lote nº 9, que lhe foi destinado desde 02/12/2008 (ID 129858055 - Pág. 77); espelho da unidade familiar no sistema do INCRA, na qual consta o nome do autor como companheiro de Cleuza França de Barros (ID 129858055 - Pág. 78); nota fiscal de aquisição de insumos agrícolas, em 2013 e 2014 (ID 129858055 - Pág. 79 e ID 129858056 - Pág. 24); cadastro no Sistema Informatizado de Defesa Agropecuária, no qual consta informação do total de 6 suínos e 80 galinhas caipiras pertencentes ao autor, em 22/05/2015 (ID 129858055 - Pág. 82); INFBEN de auxílio-doença previdenciário, forma de filiação segurado especial, em nome da companheira do autor, com DIB em 25/05/2012 e DCB em 25/09/2012 (ID 129858056 - Pág. 7); entrevista rural (ID 129858056 - Pág. 13 e 14); contrato de concessão de uso, sob condição resolutiva celebrado com o INCRA, no qual o autor figura como beneficiário de um imóvel rural com área de 52,3397 hectares e está qualificado como agricultor, em 03/08/2009 (ID 129858056 - Pág. 18 e 19); prontuário médico, no qual o autor está qualificado como lavrador, em 15/09/2010 (ID 129858056 - Pág. 22); qualificação para acesso ao Pronaf (ID 129858056 - Pág. 47, 50, 51 e 52); contrato de concessão de crédito de instalação, modalidade de recuperação material de construção, em 2014(ID 129858056 - Pág. 48); declaração de atividade rural, na qual terceiro informa que o autor e sua companheira trabalharam em sua propriedade rural no período de 03/03/2000 até 30/11/2008 (ID 129858057 - Pág. 33)
Esse substrato, conjuntamente analisado, atende ao início razoável de prova material, para a comprovação do labor rural em regime de economia familiar no período de 01/2004 a 02/07/2017.
A prova testemunhal produzida durante a instrução processual (ID 129858062) foi idônea e suficiente para demonstrar o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, e se encontra amparada por início de prova documental contemporânea à prestação laboral que se pretende reconhecida em juízo.
O tempo de serviço rural acima referido (na condição de segurado especial), acrescido do tempo já certificado pelo CNIS, pode ser utilizado para o cumprimento da carência mínima necessária para concessão de aposentadoria por idade híbrida.
Foram alcançadas a carência mínima de 180 contribuições e a idade mínima, necessárias para a concessão do benefício previdenciário.
A sentença recorrida deve ser reformada, porque os dispositivos constitucionais e legais referidos na fase recursal devem ser interpretados conforme o entendimento jurisprudencial dominante a seguir transcrito.
TESE 1007 do STJ: O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
A atualização monetária e juros moratórios, incidentes sobre as parcelas pretéritas, devem ser calculados na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão vigente ao tempo da execução do julgado. O referido ato incorporou, progressivamente, as determinações legais e jurisprudenciais supervenientes (Tema 810 do STF, Tema 905 do STJ e art. 3º e conexos da EC 113/2021), o que implica perda de objeto da matéria correlata.
O recebimento anterior do benefício de Amparo Social ao Idoso não impede a concessão de aposentadoria por idade híbrida, desde que sejam observados os requisitos para tanto e não haja a cumulação de benefícios (art. 20, § 4º, da Lei n. 8.742 /93 - LOAS). “As parcelas recebidas a este título, no mesmo período, deverão ser compensadas à época da execução do julgado..." (AC 00260436620144019199, Desembargador Federal João Luiz de Souza, TRF1 – Segunda Turma, e-DJF1 26/02/2016).
Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação processual de regência (§11 do art. 85, do CPC do c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar-lhe provimento, reformar a sentença e condenar o INSS a:
1. implantar o benefício de aposentadoria por idade híbrida desde o requerimento administrativo (03/07/2017);
2. pagar os valores devidos a serem calculados pela autarquia previdenciária, com aplicação de correção monetária e juros nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, na versão vigente ao tempo da execução do julgado, ressalvados os valores alcançados pela prescrição quinquenal e o montante pago administrativamente ou em cumprimento de tutela.
O benefício de Amparo Social ao Idoso deve ser cancelado a partir do implemento do benefício de aposentadoria por idade híbrida e os valores recebidos a este título serem compensados com os valores pagos como benefício assistencial, eventualmente recebidos dentro do mesmo período.
Quanto à verba honorária, inverto-a em favor do autor, fixando-a em 10% (dez por cento) sobre o valor das diferenças vencidas até a data do acórdão deste julgado, a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e art. 11, ambos do CPC/2015 c/c Súmula 111 do STJ.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1016255-89.2021.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0002497-39.2018.8.27.2714
RECORRENTE: HONORIO FRANCISCO TEIXEIRA
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. APOSENTADORIA POR IDADE. HÍBRIDA. COMPROVADA ATIVIDADE LABORAL RURAL E URBANA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. APLICAÇÃO DA TESE 1007 DO STJ. RECEBIMENTO DE LOAS. BENEFÍCIOS INACUMULÁVEIS. COMPENSAÇÃO COM PARCELAS DEVIDAS A TÍTULO DE APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A aposentadoria por idade híbrida é a obtida com a utilização de tempo de serviço/contribuição rural e urbana para efeito de cumprimento de carência, observada a idade mínima prevista na legislação vigente ao tempo do cumprimento de todos os requisitos legais para implementação do benefício (art. 48, §3º, da Lei 8.213/91; Tese 1007 do STJ e arts. 257, 316 e 317 da IN Pres/INSS nº 128/22).
2. Período de labor rural remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade (TESE 1007 do STJ).
3. Quando do requerimento administrativo (03/07/2017) o autor já havia implementado todos os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida, visto que nasceu em 24/04/1952 e completou 65 anos em 24/04/2017.
4. A controvérsia restringe-se a ver reconhecido o tempo de labor rural, pelo período necessário de 162 meses de carência, o qual somado ao tempo de labor urbano seria o suficiente para a concessão do benefício pretendido. Reconhecido administrativamente pelo INSS o total de 77 meses de carência como rural, no período de 02/12/2008 a 05/04/2015 (ID 129858056 - Pág. 31 e 32).
5. Para comprovar o trabalho rural, foram acostados aos autos: certidão de nascimento de filhos do autor e de Cleuza França Barros, nascidos em 29/07/1977, 06/07/1979 e 21/06/1980, comprovando a união estável; declaração de atividade rural, período de 03/03/2000 até 30/11/2008; certidão do INCRA, na qual informa que a companheira do autor é assentada no Projeto de Assentamento PA Setecentos, localizado no município de Couto Magalhães, inscrito no Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (SIPRA), onde desenvolve atividades rurais em regime de economia familiar no lote nº 9, que lhe foi destinado desde 02/12/2008; espelho da unidade familiar no sistema do INCRA, na qual consta o nome do autor como companheiro de Cleuza França de Barros; contrato de concessão de uso, sob condição resolutiva celebrado com o INCRA, no qual o autor figura como beneficiário de um imóvel rural com área de 52,3397 hectares e está qualificado como agricultor, em 03/08/2009; comprovante de endereço rural em nome da esposa do autor, em 27/03/2012 e 08/04/2016; nota fiscal de aquisição de insumos agrícolas, em 2013 e 2014; cadastro no Sistema Informatizado de Defesa Agropecuária, no qual consta informação do total de 6 suínos e 80 galinhas caipiras pertencentes ao autor, em 22/05/2015; INFBEN de auxílio-doença previdenciário, forma de filiação segurado especial, em nome da companheira do autor, com DIB em 25/05/2012 e DCB em 25/09/2012; entrevista rural; prontuário médico, no qual o autor está qualificado como lavrador, em 15/09/2010; qualificação para acesso ao Pronaf; contrato de concessão de crédito de instalação, modalidade de recuperação material de construção, 2014, e outros documentos.
6. O recebimento anterior do benefício de Amparo Social ao Idoso não impede a concessão de aposentadoria por idade híbrida, desde que sejam observados os requisitos para tanto e não haja a cumulação de benefícios (art. 20, § 4º, da Lei n. 8.742 /93 - LOAS). “As parcelas recebidas a este título, no mesmo período, deverão ser compensadas à época da execução do julgado..." (AC 00260436620144019199, Desembargador Federal João Luiz de Souza, TRF1 – Segunda Turma, e-DJF1 26/02/2016).
7. Sentença reformada para concessão de aposentadoria por idade híbrida pelo RGPS em razão da satisfação dos requisitos legais, ressalvados os valores alcançados pela prescrição quinquenal e o montante pago administrativamente ou em cumprimento de tutela.
8. Apelação provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
