
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:JOSE PEREIRA LIMA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ROMULO CASTRO SILVA - TO7804-S e MARCILIO GOMES DE SOUSA - TO6493-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011074-78.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE PEREIRA LIMA
Advogados do(a) APELADO: MARCILIO GOMES DE SOUSA - TO6493-A, ROMULO CASTRO SILVA - TO7804-S
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria por idade híbrida, retroagindo à data do requerimento administrativo em 16/05/2018.
O recorrente sustenta que a parte autora não apresentou início razoável de prova material capaz de comprovar o seu labor rural. Diz que na ação judicial sob o nº 0000956-55.2015.827.2720 a esposa do autor pleiteou aposentadoria por idade rural, juntado declaração de sindicato indicando o trabalho rural em propriedade diferente daquela em que o autor informa trabalhar no mesmo período. Aduz ainda que o autor e sua esposa possuem endereço urbano. Requer a reforma da sentença com o indeferimento do pedido. Caso eventualmente mantida a sentença, requer seja conhecido e provido o presente recurso, reformando-se a sentença a fim de que os honorários sejam fixados em 10% e, ainda, seja integralmente aplicado o do art. 1-F, da Lei nº 9.494/97, com a redação pela Lei nº 11.960/2009 quanto aos juros e correção monetária.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011074-78.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE PEREIRA LIMA
Advogados do(a) APELADO: MARCILIO GOMES DE SOUSA - TO6493-A, ROMULO CASTRO SILVA - TO7804-S
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Apelação que preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade “mista” ou “híbrida” está condicionada à verificação de dois requisitos legais básicos, a saber: a) idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos para os homens e 60 (sessenta) anos para as mulheres; e b) comprovação do efetivo exercício de atividade rural em conjunto com períodos de contribuição prestados sob outras categorias de segurado por tempo equivalente ao da carência do benefício pretendido (180 contribuições mensais), não se exigindo, neste caso, que o segurado esteja desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo ou do implemento do requisito etário.
O art. 48, §3º, da Lei n. 8.213/1991, assim dispõe:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
(...)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)
Para comprovação do exercício da atividade rural, exige-se início razoável de prova material, além de prova testemunhal, conforme se verifica do disposto no artigo 55, § 3º, da referida Lei, não se admitindo, portanto, prova exclusivamente testemunhal (Súmulas 149/STJ e 27/TRF1).
A jurisprudência do STJ admite, inclusive, que essa demonstração possa ser feita com base em dados do registro civil, como em certidão de casamento ou de nascimento dos filhos e, ainda, em assentos de óbito, em suma, por meio de quaisquer documentos que contenham fé pública, o que é extensível, inclusive, ao cônjuge do segurado, sendo certo que o art. 106 da Lei nº 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo.
Ademais, conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal, não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
São idôneos, portanto, dentre outros documentos: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS), declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada.
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indicam a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
Além disso, a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008; AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
Caso dos autos (aposentadoria híbrida)
A parte autora, nascida em 11/10/1952, completou 65 anos em 2017 e requereu em 16/05/2018 aposentadoria por idade rural, a qual restou indeferida por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 14/08/2018, pleiteando a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte trouxe aos autos os seguintes documentos: Declaração de atividade rural emitida pelo sindicato dos trabalhadores rurais; Escritura de compra e venda da Fazenda Sambaíba, em 1980, parcialmente ilegível, sem indicação do nome dos compradores; certidão de casamento dos sogros, constando a profissão do sogro como lavrador, em 1980; ficha de matrícula escolar das filhas nascidas em 1979 e 1980, constando a profissão do autor como lavrador; ITR 2017 em nome de Adelaide Morais Neto (avô da sua esposa); declaração de proprietário (Vetura Morais Dias), informando que o autor e sua esposa Izabel Francisca Morais, residem e exercem atividade rural na sua propriedade (Fazenda Sambaiba) de 8/3/1993 a 30/06/2003 e de 20/08/2009 até a data da declaração (maio de 2018); ficha do sindicato dos trabalhadores rurais.
Da análise dos documentos apresentados, tem-se que o comprovante de ITR em nome de Adelaide Morais Neto (avô da sua esposa – o que se constata da certidão de casamento dos seus sogros acostada aos autos) pode constituir início de prova material do exercício de atividade rural em imóvel da família.
Conquanto seja possível reconhecer o exercício de trabalho rural em propriedade da família a partir de 2017 (ITR), quando há início de prova material, este não é suficiente para, somado aos períodos de trabalho urbano (de 1999 e 2002, conforme declaração de exercício de atividade junto à Prefeitura Municipal de Goiatins – Tocantins e de 2003 a 2004 e de 2007 a 2009, de acordo com a sua CTPS), computar o prazo de carência de 180 meses necessário à concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Importante registrar que, apesar de a sentença informar que a esposa do requerente obteve sentença favorável quanto à concessão de aposentadoria por idade rural nos autos n. 0000956-55.2015.827.2720, em consulta pública ao referido processo verificou-se que foi publicado acórdão (autos nº nº0047573-58.2016.4.01.9199) dando provimento à apelação interposta pelo INSS e julgando improcedente o pedido de concessão de aposentadoria idade rural à esposa do autor, com baixa definitiva do processo em 22/09/2022.
Ressalta-se que o autor não acostou aos autos nenhum documento que demonstre o desempenho do labor rural entre 2009 e 2017.
A declaração de atividade rural emitida pelo sindicato dos trabalhadores rurais, sem homologação pelo órgão competente, não serve como início de prova material. Da mesma forma, a ficha sindical, desacompanhada dos comprovantes de pagamento de mensalidades, não representa início de prova material.
As fichas de matrícula escolar das filhas, embora indiquem a profissão do autor como lavrador, por não se revestirem de maiores formalidades, não servem como início de prova material da condição de trabalhador rural.
A escritura de compra e venda de imóvel rural se encontra ilegível, sem indicação do nome dos compradores da propriedade, e a declaração de atividade rural emitida por terceiro denominado Vetura Morais Dias, equivale a prova testemunhal instrumentalizada e, por esta razão, não serve como início de prova material.
Nessa seara, inexistindo outras provas materiais válidas a comprovar a qualidade de trabalhador rural, a fim de que sejam somadas aos recolhimentos urbanos efetuados, não é possível conceder o benefício de aposentadoria por idade híbrida ao requerente.
Ademais, é inadmissível prova exclusivamente testemunhal para o reconhecimento de tempo de exercício de atividade rural, conforme dispõe a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que “a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.352.721 na sistemática dos recursos repetitivos (Tema 629), firmou a tese de que “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”.
Logo, faz-se necessária a extinção do processo sem julgamento do mérito.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CUSTAS PROCESSUAIS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em custas e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus, que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa. Suspensa sua exigibilidade em caso de assistência judiciária gratuita deferida.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado, e JULGO PREJUDICADA a apelação do INSS.
Eventuais valores pagos indevidamente a título de tutela provisória estarão sujeitos a restituição, conforme Tema 692/STJ: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475-O, II, do CPC/73)".
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011074-78.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE PEREIRA LIMA
Advogados do(a) APELADO: MARCILIO GOMES DE SOUSA - TO6493-A, ROMULO CASTRO SILVA - TO7804-S
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. FALTA DE PROVA MATERIAL SUFICIENTE DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO COMPROVADO. SÚMULA 149/STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
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A concessão da aposentadoria por idade híbrida exige a comprovação do exercício de atividade rural por meio de início razoável de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, sendo inadmissível prova exclusivamente testemunhal, nos termos da Súmula 149 do STJ.
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No caso, a parte autora não apresentou início de prova material suficiente para comprovar o exercício de atividade rural. Os documentos apresentados são insuficientes, não havendo comprovação do trabalho rural durante o período de carência exigido para a concessão do benefício.
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Declaração emitida por sindicato dos trabalhadores rurais, sem homologação pelo órgão competente, não constitui início de prova material. Da mesma forma, a ficha sindical, desacompanhada dos comprovantes de pagamento de mensalidades, não representa início de prova material. As fichas de matrícula escolar das filhas, embora indiquem a profissão do autor como lavrador, por não se revestirem de maiores formalidades, não servem como início de prova material da condição de trabalhador rural.
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Inexistindo provas suficientes, faz-se necessária a extinção do processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC.
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Apelação do INSS prejudicada.
Tese de julgamento:
"1. Para a concessão de aposentadoria por idade híbrida, exige-se início razoável de prova material do trabalho rural, corroborada por prova testemunhal idônea. A prova exclusivamente testemunhal não é suficiente."
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/91, art. 48, §3º, e art. 55, §3º.
CPC, art. 485, IV.
Súmula 149/STJ.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, AgRg no REsp 967344/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJe 07/04/2008
STJ, REsp 1.352.721, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, DJe 28/4/2016 (Tema 629)
TNU, Súmula 34.
STJ, Tema 692.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, de ofício, sem resolução do mérito, e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
