
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:CLEUSA MARIA DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: GILMAR STEFFENS - GO45484-A, KERLY JOANA CARBONERA - GO29987-A e JAQUESON DOS SANTOS CASTRO - GO29515-A
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1000203-81.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em face de Cleusa Maria dos Santos, com a finalidade de obter a reforma da sentença (ID 180947541 - Pág. 138 a 143) que concedeu aposentadoria por idade híbrida pelo RGPS
Foi concedida a tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos (§ 1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015), a exceção da tutela provisória mencionada, que foi executada independente da preclusão da decisão que a concedeu.
Nas razões recursais (ID 180947541 - Pág. 148 a 152), o INSS alegou: 1) ausência de provas materiais suficientes para comprovação da atividade rural pelo tempo necessário para complementação da carência mínima; 2) reconhecimento de períodos de labor rural remotos, anteriores a Lei 8.213/91; 3) imprescindibilidade do trabalho rural no momento em que completada a idade mínima exigida ou, ao menos, no momento do requerimento administrativo; 4) o último vínculo laboral da parte autora é urbano e hoje é aposentada por invalidez urbana.
Nas contrarrazões (ID 180947541 - Pág. 155 a 163), foi pedida a manutenção da sentença recorrida.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1000203-81.2022.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A aposentadoria por idade híbrida é a obtida com a utilização de tempo de serviço/contribuição rural e urbana para efeito de cumprimento de carência, observada a idade mínima prevista na legislação vigente ao tempo do cumprimento de todos os requisitos legais para implementação do benefício (art. 48, §3º, da Lei 8.213/91; Tese 1007 do STJ e arts. 257, 316 e 317 da IN Pres/INSS nº 128/2022).
A concessão do benefício previdenciário referido na causa depende da demonstração, por prova idônea e suficiente de tempo de serviço/contribuição, efetivada por prova documental plena ou início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal. A Súmula 27 do TRF1 estabelece que “Não é admissível prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de exercício de atividade urbana e rural (Lei 8.213/1991, art. 55, § 3º)”.
A parte rural da carência não se encontrar sujeita ao recolhimento das contribuições correspondentes para efeito de sua utilização para obtenção do benefício de aposentadoria por idade no RGPS, conforme entendimento jurisprudencial dominante (EDcl no REsp n. 1.674.221/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 27/11/2019, DJe de 2/12/2019).
A parte autora nasceu em 15/07/1960 e completou 61 anos, de acordo com a regra de transição prevista no artigo 18 da EC 103/2019, em 15/07/2021 (ID 180947540 - Pág. 18). Apresentou requerimento administrativo (DER em 22/06/2020, conforme ID 180947540 - Pág. 75).
No caso em apreço, o labor urbano foi comprovado pela apresentação do CNIS (ID 180947540 - Pág. 62 a 66 e ID 180947541 – Pág. 23), com registro de contribuição de 01/04/1992 a 31/01/1993, 16/01/2005 a 12/2008, 01/01/2009 a 31/03/2010, 01/01/2009 a 06/2010, 01/05/2010 a 31/05/2010, 01/02/2011 a 31/05/2011, 01/09/2018 a 31/05/2019. Total de 88 contribuições mensais como carência, das quais 58 foram reconhecidas pelo INSS (ID 180947541 - Pág. 29), insuficiente por si só.
Necessária a comprovação de 92 meses de tempo rural em regime de economia familiar para a complementação do período de carência (180 meses).
Para fins de comprovação da atividade rural, a autora juntou aos autos os seguintes documentos: certidão de nascimento de filho, nascido em 25/08/1983, registrado em 20/10/1986, na qual o genitor da criança, Sr. Lázaro Borges Teixeira, está qualificado como lavrador (ID 180947540 - Pág. 21); certidão de casamento da autora, realizado em 20/11/2017, na qual tanto o cônjuge Divino Domingos Gonçalves, quanto a autora, estão qualificados como lavradores (ID 180947540 - Pág. 18); comprovante de filiação de Divino Domingos Gonçalves ao Sindicato dos trabalhadores Rurais de Doverlândia/GO, admitido em 01/09/1986, anterior ao casamento com a autora (ID 180947540 - Pág. 22); inscrição estadual de Divino Domingos Gonçalves, como produtor de bovinocultura de corte, com validade até 31/12/1999, anterior ao casamento com a autora (ID 180947540 - Pág. 22) CTPS de Divino Domingos Gonçalves com registros de trabalho rural em data anterior ao casamento celebrado com a autora (ID 180947540 - Pág. 24 a 31); fichas de cadastro hospital com preenchimento manuscrito, nas quais consta a inserção do nome do esposo da autora como Divino Domingos Gonçalves, e sua profissão de lavrador, em 1991 (ID 180947540 - Pág. 44); comprovante de inscrição de Divino Domingos Gonçalves como produtor rural, na criação de bovinos para corte, desde 26/10/1998 (ID 180947540 - Pág. 52); escritura pública de compra e venda de imóvel urbano, na qual figura como compradores Divino Domingues Gonçalves e a autora, qualificados como lavradores e com estado civil de solteiros, em 31/05/2001 (ID 180947540 - Pág. 54 e 55); escritura pública de compra e venda de um imóvel urbano, na qual figura como vendedor Divino Domingues Gonçalves, qualificado como lavrador e estado civil de solteiro, como compradora a parte autora, qualificada como lavradora, em 08/01/2003 (ID 180947540 - Pág. 56 e 57); pedido de inscrição da autora em serviços e seguros funerários, na qual informa o estado civil de casada e como cônjuge o Sr. Divino Domingos Gonçalves, em 11/06/2013 (ID 180947540 - Pág. 58); INFBEN de aposentadoria por idade rural na condição de segurado especial, em nome de Divino Domingos Gonçalves, com DIB em 22/02/2013 (ID 180947540 - Pág. 60); certidão de óbito de Divino Domingos Gonçalves, falecido em 03/11/2019 (ID 180947541 - Pág. 43).
O conjunto probatório não se assenta em comprovar o início da prova material suficiente a amparar o direito do benefício pleiteado, por tempo suficiente da carência exigida em lei.
No caso vertente, em que pese a documentação apresentada, não foi anexado aos autos nenhum documento em nome da parte autora capaz de comprovar o seu efetivo labor rural por todo período de carência necessário à concessão do benefício pleiteado, nos termos preconizados pela legislação previdenciária.
Não há um único documento juntado aos autos em nome da autora, com indicação como lavradora, anterior a 20/11/2017, sendo que os documentos relativos a este período estão em nome de seu esposo (em data anterior ao casamento, não se aproveitando a ela).
Assim, a fim de fazer início de prova material, a autora trouxe aos autos documentação em nome de terceiro, contudo, sem acostar provas suficientes que demonstrasse o vínculo conjugal em data anterior ao casamento celebrado em 20/11/2017.
Igualmente, apesar da certidão de nascimento do filho da autora se extrair a qualificação de lavrador do genitor da criança, Sr. Lázaro Borges Teixeira, não há provas do vínculo conjugal existente com a autora, apto a reconhecer o labor rural, bem como, a prova testemunhal não faz referência às lides rurais desempenhada pela autora no ano de 1986.
As fichas de atendimento médico por si só, não servem como início de prova material do labor rural, eis que são documentos que não se revestem das formalidades legais, sendo declaração unilateral da parte autora.
Na espécie, não há provas materiais a serem corroboradas pelo depoimento de testemunhas.
A prova testemunhal produzida durante a instrução processual (ID 396363656) não pode ser admitida como meio exclusivo para reconhecer o tempo de exercício de atividade rural (STJ, Súmula 149 e TRF1, Súmula 27).
Nesse contexto, não restou comprovado o exercício de atividade rural da parte autora no período postulado.
Constatada a ausência de “conteúdo probatório” em situação em que é possível a renovação da demanda para o exaurimento da produção probatória.
Segundo Tese 629 do STJ, firmada em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos, aplicável as ações previdenciárias:
“A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”.
Hipótese em que a escassez de provas materiais impede o reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria híbrida, porquanto não preenchidos os requisitos contidos no artigo 48, §3º da Lei nº 8.213 /91.
Honorários advocatícios, quando devidos, na forma da legislação de regência art. 85 do CPC c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região, observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, e prejudicada a apelação (arts. 485, IV, e 932 do CPC/2015 c/c Tese 629 do STJ).
Revogo a decisão que antecipou os efeitos da tutela.
Arbitro os honorários advocatícios de sucumbência, em favor do INSS, no valor de R$ 1.000,00, corrigíveis a partir da data do acórdão pelos índices do Manual de Cálculos da Justiça Federal, cuja exigibilidade fica suspensa em face da assistência judiciária concedida (§ 3º do art. 98 do CPC/2015).
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1000203-81.2022.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 5475481-20.2020.8.09.0023
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: CLEUSA MARIA DOS SANTOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. APOSENTADORIA POR IDADE. HÍBRIDA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. ATIVIDADE LABORAL RURAL NÃO COMPROVADA. PROVA TESTEMUNHAL EXCLUSIVAMENTE. VIOLAÇÃO SÚMULA 149 DO STJ. APLICAÇÃO DA TESE 629 DO STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. A aposentadoria por idade híbrida é a obtida com a utilização de tempo de serviço/contribuição rural e urbana para efeito de cumprimento de carência, observada a idade mínima prevista na legislação vigente ao tempo do cumprimento de todos os requisitos legais para implementação do benefício (art. 48, §3º, da Lei 8.213/91; Tese 1007 do STJ e arts. 257, 316 e 317 da IN Pres/INSS nº 128/22).
2. A autora nasceu em 15/07/1960 e completou 61 anos, de acordo com a regra de transição prevista no artigo 18 da EC 103/2019, em 15/07/2021. Apresentou requerimento administrativo em 22/06/2020. A controvérsia restringe-se a ver reconhecido o período de labor rural, pelo período necessário de 92 meses de carência, o qual somado ao tempo de labor urbano seria o suficiente para a concessão do benefício pretendido. Para comprovar o trabalho rural, foram acostados aos autos: certidão de nascimento de filho registrado em 20/10/1986, na qual o genitor da criança, Sr. Lázaro Borges Teixeira, está qualificado como lavrador; certidão de casamento da autora, realizado em 20/11/2017, na qual tanto o cônjuge Divino Domingos Gonçalves, quanto a autora, estão qualificados como lavradores; comprovante de filiação de Divino Domingos Gonçalves ao Sindicato dos trabalhadores Rurais de Doverlândia/GO, admitido em 01/09/1986, anterior ao casamento com a autora; inscrição estadual de Divino Domingos Gonçalves, como produtor de bovinocultura de corte, com validade até 31/12/1999, anterior ao casamento com a autora; CTPS de Divino Domingos Gonçalves com registros de trabalho rural em data anterior ao casamento celebrado com a autora; escritura pública de compra e venda de um imóvel urbano, na qual figura como vendedor Divino Domingues Gonçalves, qualificado como lavrador e estado civil solteiro, como compradora a parte autora, qualificada como lavradora, em 08/01/2003; e outros.
3. Não há um único documento juntado aos autos em nome da autora, com indicação como lavradora, anterior a 20/11/2017, sendo que os documentos relativos a este período estão em nome de seu esposo (em data anterior ao casamento, não se aproveitando a ela).
4. Igualmente, apesar da certidão de nascimento do filho da autora se extrair a qualificação de lavrador do genitor da criança, não há provas do vínculo conjugal existente com a autora, apto a reconhecer o labor rural, bem como, a prova testemunhal não faz referência às lides rurais desempenhada pela autora no ano de 1986.
5. O reconhecimento de falta de “conteúdo probatório” em causa previdenciária possibilita a extinção processual sem a resolução do mérito, nos termos da Tese 629 do STJ, a fim de assegurar o ajuizamento de nova causa em que se possibilite renovação ou complemento da prova para o julgamento adequado da causa.
6. A diligência pelo exaurimento da produção probatória assegura a tutela dos interesses das partes na prestação previdenciária mais adequada e vantajosa.
7. Processo extinto sem a resolução do mérito. Apelação prejudicada. Revogada a decisão de antecipação de tutela.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, de ofício julgar extinto o processo, sem resolução do mérito, e prejudicada a apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
