
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LENIRA MARIA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: RICARDO ZEFERINO PEREIRA - MT12491-A e FREDERICO STECCA CIONI - MT15848-A
RELATOR(A):LUIS GUSTAVO SOARES AMORIM DE SOUSA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença, que julgou procedente o pedido, referente à concessão do benefício previdenciário de aposentadoria hibrida concedido à parte autora.
Em suas razões recursais, defende a reforma da sentença, sustentando não ter demonstrado, em síntese, a existência dos requisitos legais necessários à concessão do benefício pleiteado.
É o relatório.
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
Processo Judicial Eletrônico
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM (RELATOR):
Admissibilidade
Conheço do recurso interposto, por entender preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade.
Na hipótese, tratando-se de causa de natureza previdenciária incide o disposto no art. 496, §3º, inciso I, do CPC: "Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;" (AgInt no REsp n. 1.797.160/MS, rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 9/8/2021, DJe de 16/8/2021).
A prescrição atinge as prestações anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ.
Mérito
A questão discutida nos autos refere-se ao direito do Autor, contagem mista da carência (não contributiva rural e contributiva urbana), para fins de aposentadoria por idade híbrida.
Dispõe a Lei 8.213/91 que os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, são os seguintes: a) a idade completa de 55 anos, se mulher, e 60 anos, se homem (art. 48, § 1º); b) a comprovação do exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício (art. 48, § 2º, c/c 143); e (c) a condição de empregado prestador de serviço de natureza rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado (art. 11, I, a), ou de trabalhador autônomo rural (art. 11, V, ‘g’), trabalhador avulso rural (art. 11, VI) ou de segurado especial (art. 11, VII).
A jurisprudência do STJ admite, inclusive, que a comprovação da condição de rurícola seja feita com base em dados do registro civil, como em certidão de casamento ou de nascimento dos filhos e, ainda, em assentos de óbito, no caso de pensão, em suma, por meio de quaisquer documentos que contenham fé pública, o que é extensível, inclusive, ao cônjuge do segurado, sendo certo que o art. 106 da Lei n. 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo, (REsp 1081919/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 03/08/2009).
A existência de nascimento de filhos em comum do casal é prova da existência de união estável, transmitindo-se, assim, a condição de rurícola do companheiro à companheira (AC- 0002043-51.2004.4.01.9199, Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, DJ de 29.4.2010).
Assim como a condição de rurícola do companheiro é extensível à companheira. Precedentes: AC-2004.01.99.054025-8; AC-2004.01.99.021835-5; e AC-1999.01.00.051827-2.
Dessa forma a concessão do benefício especial de aposentadoria rural por idade obriga o cumprimento de 3 (três) requisitos fundamentais: a idade mínima necessária à concessão do benefício, a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova por robusta prova testemunhal, para formar o convencimento do juízo sobre a condição de trabalhador rural, ressaltando que não é admissível a prova meramente testemunhal para o deferimento do benefício (Súmulas 149 do STJ e 27 do TRF da 1ª Região).
Com o advento da Lei n.º 11.718/2008, a qual acrescentou os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei n.º 8.213/91, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria rural por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem. Assim, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.
Sobre a questão em exame, importante destacar que em sessão realizada no dia 14 de agosto de 2019, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou o Tema Repetitivo nº 1007, sobre a possibilidade de concessão de aposentadoria híbrida prevista no art. 48, § 3º da Lei 8.213/1991, mediante o cômputo de período de trabalho rural remoto exercido antes de 1991, sem necessidade de recolhimentos, ainda que não haja comprovação de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo.
O relator da matéria, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em seu voto, destacou que a tese do INSS, de não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o segurado não tenha retornado ao meio rural, tornaria a norma do art. 48, §3º da Lei de Benefícios sem efeito, em razão de a realidade desses trabalhadores é de exercerem a atividade rural quando jovens e posteriormente migrarem para a atividade urbana.
Destacou ainda que a tese do INSS seria contrária não somente à orientação jurisprudencial do próprio Superior Tribunal de Justiça, como também o objetivo da legislação previdenciária.
Desse modo, foi fixada a seguinte tese sobre a matéria:
“o tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.”
Situação constante dos autos
Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte Autora, atendido ao requisito etário, da Lei 8.213/91, pois completou 60 anos em 27/02/2016.
Para comprovar a atividade rural, a requerente trouxe aos autos: certidão de casamento dos pais da parte autora, celebrado em 26/07/1963, com a qualificação de lavrador de seu genitor e Instrumento Particular de Contrato de Compra e Venda de propriedade rural, datado de 27/10/1983, tendo como vendedor o sogro da autora, que o qualifica como agricultor.
A documentação apresentada não configura início razoável de prova material de atividade rurícola, consoante previsão do art. 39, I, da Lei 8.213/91, bem como entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais.
A parte autora não possui direito ao benefício postulado, ante a impossibilidade de concessão fundada apenas em prova testemunhal.
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo 629, firmou a tese de que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa" (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, j. 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
Dispositivo
Ante o exposto, extingo o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC, julgo prejudicada a apelação do INSS e não conheço da remessa oficial.
É como voto.
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1035504-26.2021.4.01.9999
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL GUSTAVO SOARES AMORIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LENIRA MARIA DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: FREDERICO STECCA CIONI - MT15848-A, RICARDO ZEFERINO PEREIRA - MT12491-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. HÍBRIDA OU MISTA. TEMPO RURAL E URBANO. ART. 48 § 3º, LEI 8.213/91. NÃO HÁ COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1. Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença, que julgou procedente pedido, referente ao benefício previdenciário de aposentadoria rural por idade híbrida.
2. Na hipótese, tratando-se de causa de natureza previdenciária incide o disposto no art. 496, §3º, inciso I, do CPC: "Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;" (AgInt no REsp n. 1.797.160/MS, rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 9/8/2021, DJe de 16/8/2021).
3. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido. O art. 48, §3º, da Lei de Benefícios, por sua vez, traz a previsão da aposentadoria por idade mista ou híbrida, na qual há a contagem híbrida da carência (não contributiva rural e contributiva urbana), exigindo-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, exigência integral de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
4. A concessão do benefício especial de aposentadoria rural exige idade completa de 55 anos, se mulher, e 60 anos, se homem (art. 48, § 1º da Lei 8.213/91); o cumprimento da carência prevista no art. 142 da mesma Lei, mediante a existência de prova documental plena ou início de prova material da atividade rural exercida corroborada por robusta prova testemunhal, não sendo admissível a prova meramente testemunhal para o deferimento do benefício.
5. Com o advento da Lei n.º 11.718 de 20.06.2008, a qual acrescentou os §§ 3º e 4º ao art. 48 da Lei n.º 8.213/91, o ordenamento jurídico passou a admitir expressamente a soma do tempo de exercício de labor rural ao período de trabalho urbano, para fins de concessão do benefício da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) anos, se mulher, e aos 65 (sessenta e cinco) anos.
6. Na hipótese, verifica-se que os documentos de identificação existentes nos autos comprovam haver a parte Autora, atendido ao requisito etário, da Lei 8.213/91, pois completou 60 anos em 27/02/2016.
7. Para comprovar a atividade rural, a requerente trouxe aos autos: certidão de casamento dos pais da parte autora, celebrado em 26/07/1963, com a qualificação de lavrador de seu genitor e Instrumento Particular de Contrato de Compra e Venda de propriedade rural, datado de 27/10/1983, tendo como vendedor o sogro da autora, que o qualifica como agricultor.
8. A documentação apresentada não configura início razoável de prova material de atividade rurícola, consoante previsão do art. 39, I, da Lei 8.213/91, bem como entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais.
9. A parte autora não possui direito ao benefício postulado, ante a impossibilidade de concessão fundada apenas em prova testemunhal.
10. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo 629, firmou a tese de que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa" (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, j. 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
11. Processo extinto sem resolução do mérito. Apelação do INSS prejudicada e remessa oficial não conhecida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, sem resolução do mérito, julgar prejudicada a apelação e não conhecer da remessa oficial, nos termos do voto do Relator.
Brasília-DF,
Desembargador Federal GUSTAVO SOARES AMORIM
Relator
