
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PEDRO BEZERRA DE SOUZA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: THIAGO MOREIRA RODRIGUES - MT21494-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1027461-66.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO BEZERRA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: THIAGO MOREIRA RODRIGUES - MT21494-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria por idade híbrida, retroagindo à data da citação ou do requerimento administrativo, o que se deu primeiro.
O recorrente sustenta que a parte autora desempenhou atividade de natureza urbana, como empresário, e que não juntou aos autos prova material suficiente do labor rural. Assim, requer a reforma da sentença com o indeferimento do pedido.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1027461-66.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO BEZERRA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: THIAGO MOREIRA RODRIGUES - MT21494-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Apelação que preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade “mista” ou “híbrida” está condicionada à verificação de dois requisitos legais básicos, a saber: a) idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos para os homens e 60 (sessenta) anos para as mulheres; e b) comprovação do efetivo exercício de atividade rural em conjunto com períodos de contribuição prestados sob outras categorias de segurado por tempo equivalente ao da carência do benefício pretendido (180 contribuições mensais), não se exigindo, neste caso, que o segurado esteja desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo ou do implemento do requisito etário.
O art. 48, §3º, da Lei n. 8.213/1991, assim dispõe:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
(...)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)
Para comprovação do exercício da atividade rural, exige-se início razoável de prova material, além de prova testemunhal, conforme se verifica do disposto no artigo 55, § 3º, da referida Lei, não se admitindo, portanto, prova exclusivamente testemunhal (Súmulas 149/STJ e 27/TRF1).
A jurisprudência do STJ admite, inclusive, que essa demonstração possa ser feita com base em dados do registro civil, como em certidão de casamento ou de nascimento dos filhos e, ainda, em assentos de óbito, no caso de pensão, em suma, por meio de quaisquer documentos que contenham fé pública, o que é extensível, inclusive, ao cônjuge do segurado, sendo certo que o art. 106 da Lei nº 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo.
Ademais, conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal, não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
São idôneos, portanto, dentre outros documentos: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS), declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada.
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indicam a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
Além disso, a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008; AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
Caso dos autos (aposentadoria híbrida)
A parte autora, nascida em 4/5/1954, completou 65 anos em 2019 e requereu em 14/6/2021 aposentadoria por idade rural, a qual restou indeferida por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 1/10/2021, pleiteando a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte trouxe aos autos certidão do INCRA declarando que o autor é assentado no PA Santa Helena em terra que lhe foi destinada desde 25/3/1996.
Conquanto tenha apresentado certidão do INCRA informando o seu labor rural em assentamento desde 1996, vê-se que o INSS acostou aos autos pesquisas externas que demonstram que o requerente atuou como empresário por longo período, iniciando suas atividades em 1979.
O INSS alega em suas razões que o autor atuou como sócio da empresa Auto Posto Bela Vila Ltda, com início de atividade em 1993, permanecendo ativa até 2018. Não obstante, no documento acostado à fl. 124 - Id 263941604, vê-se que o autor figura como sócio-gerente com data de início e fim da sociedade em 11/1/1995. Logo, não restou demonstrado que o requerente foi de fato sócio da referida empresa.
Entretanto, há nos autos documento de fl. 145 - Id 263941604, em que o autor consta como responsável da empresa TRANSPORTE RODOVIARIO LACERDA LTDA, com início da atividade em 31/10/1986 e situação cadastral “baixada” em 27/9/2002.
Há também registro da empresa POSTO AEREO BEZERRA LTDA em seu nome, com início da atividade em 03/12/2007, com situação cadastral “baixada” em 19/06/2019. Referente a esta empresa, constata-se pelo documento de fl. 127 - Id 263941604, que o autor atuou como sócio administrador desde 18/3/2011.
Ainda, verifica-se a existência da empresa PEDRO BEZERRA DE SOUZA & CIA LTDA, com início da atividade em 14/04/1980 e situação cadastral “baixada” em 27/09/2002, e da empresa SERRARIA SAO PEDRO LTDA, com início da atividade em 13/12/1979 e situação cadastral “baixada” em 27/09/2002, ambas com indicação do requerente como responsável.
Por fim, consta nos autos pesquisa externa que indica que o autor é sócio de empresa ativa na data de 5/1/2018, denominada BEZERRA DE SOUZA & FERREIRA DE SOUZA LTDA, cujo início das atividades se deu em 27/10/2009.
Dessa forma, vê-se que antes e após receber a terra outorgada pelo INCRA, o autor atuou como empresário por intermédio de várias empresas com atividades desvinculadas da lida campesina, o que descaracteriza a condição de segurado especial, mesmo que haja atividade rurícola concomitante com a atividade empresarial urbana.
Consta também do CNIS recolhimento como contribuinte individual, na função de administrador, relativamente a duas pessoas jurídicas, de 08/2010 a 02/2017 e de 09/2017 a 11/2018, o que afasta sua caracterização como segurado especial durante todo esse período.
Nessa seara, inexistindo outras provas materiais válidas a comprovar a qualidade de trabalhador rural, a fim de que sejam somadas aos recolhimentos urbanos efetuados, não é possível conceder o benefício de aposentadoria por idade híbrida ao requerente.
Ademais, é inadmissível prova exclusivamente testemunhal para o reconhecimento de tempo de exercício de atividade rural, conforme dispõe a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que “a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.352.721 na sistemática dos recursos repetitivos (Tema 629), firmou a tese de que “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”.
Logo, faz-se necessária a extinção do processo sem julgamento do mérito.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CUSTAS PROCESSUAIS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em custas e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa. Suspensa sua exigibilidade em caso de assistência judiciária gratuita deferida.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado, e JULGO PREJUDICADA a apelação do INSS.
Eventuais valores pagos a título de tutela provisória estarão sujeitos a restituição, conforme Tema 692/STJ: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1027461-66.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO BEZERRA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: THIAGO MOREIRA RODRIGUES - MT21494-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. QUALIDADE DE SEGURADO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NÃO COMPROVA 15 ANOS DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade “mista” ou “híbrida” está condicionada à verificação de dois requisitos legais básicos, a saber: a) idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos para os homens e 60 (sessenta) anos para as mulheres; e b) comprovação do efetivo exercício de atividade rural em conjunto com períodos de contribuição prestados sob outras categorias de segurado por tempo equivalente ao da carência do benefício pretendido (180 contribuições mensais), não se exigindo, neste caso, que o segurado esteja desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo ou do implemento do requisito etário.
2. A parte autora, nascida em 4/5/1954, completou 65 anos em 2019 e requereu em 14/6/2021 aposentadoria por idade rural, a qual restou indeferida por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 1/10/2021, pleiteando a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
3. Conquanto tenha apresentado certidão do INCRA informando o seu labor rural em assentamento desde 1996, vê-se que o INSS acostou aos autos pesquisas externas que demonstram que o requerente atuou como empresário desde 1979, por intermédio de várias empresas, uma delas ativa na data 5/1/2018, com atividades desvinculadas da lida campesina. Consta também do CNIS recolhimento como contribuinte individual, na função de administrador, relativamente a duas pessoas jurídicas, de 08/2010 a 02/2017 e de 09/2017 a 11/2018, o que afasta sua caracterização como segurado especial durante todo esse período.
4.Inexistindo outras provas materiais válidas a comprovar a qualidade de segurado especial, a fim de que sejam somadas aos recolhimentos urbanos efetuados, não é possível conceder o benefício de aposentadoria por idade híbrida ao requerente.
5. Ademais, é inadmissível prova exclusivamente testemunhal para o reconhecimento de tempo de exercício de atividade rural, conforme dispõe a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que “a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
6. O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.352.721 na sistemática dos recursos repetitivos (Tema 629), firmou a tese de que “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”.
7. Processo extinto, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado pelo tempo necessário. Apelação prejudicada.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, de ofício, sem resolução do mérito, e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
