
POLO ATIVO: MARIA DE FATIMA MACHADO BARROS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: TAYNARA BASTOS MENEZES - PA23274-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1008588-18.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: MARIA DE FATIMA MACHADO BARROS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MARIA DE FÁTIMA MACHADO BARROS contra sentença (ID 200147114, fls. 79-82), na qual foi julgado improcedente o pedido de benefício de aposentadoria por idade rural, com fundamento na inexistência de prova material a justificar a concessão do benefício, considerando o registro de vínculos de emprego urbano do marido.
Requer a autora, em suas razões, a reforma da decisão para que seja julgado procedente o pedido, sustentando a caracterização da qualidade de segurada especial (ID 200147114, fls. 84-95).
Foram apresentadas contrarrazões (ID 200147114, fls. 98-99).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1008588-18.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: MARIA DE FATIMA MACHADO BARROS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Sentença proferida na vigência do CPC/2015, remessa necessária não aplicável.
São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (cento e oitenta contribuições) correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91).
A concessão do benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material outros documentos além daqueles da Lei n. 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
Ressalte-se, ainda, que “para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea” (STJ, AgInt no AREsp 852.494/SP, rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 09/12/2021).
No presente caso, para fins de comprovação da atividade rural, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos: carteira de identidade com registro de nascimento em 17/10/63; certidão de casamento, celebrado em 05/09/80, e certidão de nascimento de seus filhos, nascidos em 1981, 1984, 1986 e 1987, nas quais consta a qualificação do seu marido como lavrador; Declaração de Atividade Rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Garrafão do Norte/PA, no período de 16/04/99 a 26/10/2018, com filiação em Nov/2003; cadastro do referido Sindicato, com registro de pagamento integral das mensalidades referentes ao período de 2003 a 2018; cadastro da Secretaria Municipal de Saúde, com sua qualificação como agricultora; contrato de comodato, na qual consta sua qualificação como agricultora, para cultivo de lavoura em imóvel rural de seu pai, denominado “Colônia São Sebastião”, na zona rural de Garrafão do Norte/PA, a partir de 16/04/99 por tempo indeterminado; contrato de crédito rural com o Banco do Brasil, celebrado em 2009 para quitação até 2013; comprovantes de residência rural.
Tais documentos demonstram que a autora pertence à família de lavradores e sempre viveu na zona rural, trabalhando em atividade campesina, em regime de economia familiar.
A postulante nascida em 17/10/63 completou o requisito etário em 2018 (55 anos), portanto, deveria comprovar suas atividades rurais no período de carência que compreende de 2003 a 2018. Nesses sentido, os documentos juntados comprovaram o início de prova material necessário no período assinalado, especialmente o registro de pagamento integral ao Sindicato, das mensalidades referentes ao período de 2003 a 2018; cadastro da Secretaria Municipal de Saúde, com sua qualificação como agricultora; contrato de comodato, para cultivo de lavoura a partir de 16/04/99; e contrato de crédito rural com o Banco do Brasil em seu nome.
Quanto ao argumento do INSS de que o marido da autora possui longo vínculo de trabalho urbano com o Município, registrado em seu CNIS, observa-se que as atividades urbanas exercidas se limitaram a remunerações em torno de 1 (um) salário-mínimo, informação que não é capaz de infirmar a qualidade de segurada especial da autora, não sendo possível prescindir da atividade rural para o sustento de sua família com 4 (quatro) filhos.
Em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, a Primeira Seção do STJ registrou que “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar” (REsp 1.304.479/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe de 19/12/2012).
Sobre essa matéria, também já se pronunciou a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais: “A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto” (TNU, Súmula 41).
Portanto, o exercício de atividade urbana por parte do cônjuge não descaracteriza, por si só, a qualidade de segurada especial da mulher e o regime de economia familiar, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 1218286/PR, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 28/02/2011; AgRg no REsp 1221591/PR, Rel. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador Convocado do TJ/CE), Sexta Turma, DJe 28/03/2011; AgRg no REsp 1118677/SP, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 29/03/2010; AgRg no REsp 885.695/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, DJe 01/12/2008).
Além dos documentos juntados aos autos, as testemunhas ouvidas em Juízo foram firmes e convincentes em atestar o trabalho rural da parte autora pelo período de carência previsto na Lei n. 8.213/91. Informaram que conhecem a autora há mais de 40 anos, que ela sempre morou e trabalhou na roça de seu pai, na Vila da Boa Esperança, onde cultiva milho, feijão e maniva em regime de economia familiar, atualmente com a ajuda dos filhos.
Dessa forma, o conjunto probatório revela o cumprimento do requisito etário, o exercício do labor rural, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91, de modo que atendidos os requisitos indispensáveis à concessão do benefício previdenciário - início de prova material apta a demonstrar a condição de rurícola da parte autora, corroborada por prova testemunhal, e idade mínima -, é devido o benefício de aposentadoria por idade.
O termo inicial deve ser fixado a partir do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir do ajuizamento da ação, em observância ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmado no RE 631240, respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.
Correção monetária e juros moratórios conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai dos julgamentos do STF (Tema 810) e do STJ (Tema 905) e, após 09/12/2021, com o disposto na EC 113/2021, art. 3º.
Honorários advocatícios invertidos em favor da parte autora, fixados no percentual de 10% (dez por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data deste acórdão, em consonância com o disposto nos arts. 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da autora para, reformando a sentença, julgar procedente o pedido, nos termos do voto do Relator.
É como voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1008588-18.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: MARIA DE FATIMA MACHADO BARROS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE URBANA DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovação de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (180 contribuições mensais) correspondentes à carência do benefício pretendido a teor do art. 48, §§ 1º e 2º, c/c art. 142 da Lei n. 8.213/91.
2. O trabalho rural, observado o período de carência, deve estar demonstrado por início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
3. Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material, outros documentos além daqueles constantes do art. 106 da Lei n. 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
4. Ressalte-se, ainda, que “para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea” (STJ, AgInt no AREsp 852.494/SP, rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 09/12/2021).
5. “A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto” (TNU, Súmula 41) Precedentes do STJ.
6. No caso, para comprovar atividade rurícola, a autora juntou aos autos inúmeros documentos, tais como: cadastro do sindicato de trabalhadores rurais, com registro de pagamento integral das mensalidades referentes ao período de 2003 a 2018; cadastro da Secretaria Municipal de Saúde, com sua qualificação como agricultora; contrato de comodato, para cultivo de lavoura a partir de 16/04/99; contrato de crédito rural com o Banco do Brasil em seu nome, entre outros.
7. Desta forma, a parte autora comprovou o efetivo exercício de atividade rural, cumprindo-se a carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, confirmada pela prova testemunhal, consoante o entendimento jurisprudencial já sedimentado nesta Corte.
8. O termo inicial deve ser fixado a partir do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir do ajuizamento da ação, em observância ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmado no RE 631240, respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.
9. A correção monetária e juros de mora devem observar o disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai dos julgamentos do STF (Tema 810) e do STJ (Tema 905) e, após 09/12/2021, com o disposto na EC 113/2021, art. 3º, observada a prescrição quinquenal.
10. Honorários advocatícios invertidos em favor da parte autora, no percentual de 10% (dez por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data deste acórdão, em consonância com o disposto no art. 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC.
11. Apelação provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
