
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:AIR QUEIROZ CORREIA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CARITA PEREIRA ALVES - MT10531-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1017130-88.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AIR QUEIROZ CORREIA
Advogado do(a) APELADO: CARITA PEREIRA ALVES - MT10531-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria por idade rural à autora, Sra. AIR QUEIROZ CORREIA.
O recorrente sustenta em suas razões que a autora não comprovou a qualidade de segurado especial nem o cumprimento da carência mínima exigida para a percepção do benefício de aposentadoria por idade rural.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1017130-88.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AIR QUEIROZ CORREIA
Advogado do(a) APELADO: CARITA PEREIRA ALVES - MT10531-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, no período imediatamente anterior à formulação do requerimento administrativo ou ao implemento do requisito etário (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado, no mínimo, mediante razoável início de prova material corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que ateste a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Por fim, convém registrar que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar etc., não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
A autora, nascida em 27/05/1964 (fl.16, ID 347200641), preencheu o requisito etário em 27/05/2019 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurado especial em 03/06/2019 (fl. 45, ID 347200641), que foi indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 04/12/2019, pleiteando a concessão do benefício supracitado, a contar do requerimento administrativo.
Assim, como atingiu a idade em 2019, para ter direito ao benefício postulado, deve comprovar o exercício de atividade campesina por 180 meses (15 anos) no período imediatamente anterior à data do requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima (Súmula 54 da TNU).
Para comprovar sua qualidade de segurado especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos (ID 347200641):
a) Certidão de nascimento da filha (24/06/1982) sem qualificação profissional dos genitores (fl. 19);
b) certidão de nascimento do filho (27/11/1985) sem qualificação profissional dos genitores (fl. 20);
c) comprovante de endereço rural em nome da autora (fl. 21);
d) autodeclaração de exercício de atividade rural (fl. 25/26);
e) certidão da Superintendência Regional do Estado de Mato Grosso - SR (13), emitida em 27/05/2019, declarando que o Sr. José Soares de Souza, companheiro da autora, foi assentado no Projeto de Assentamento PA Independente I, no município de Confresa, desenvolvendo atividades rurais em regime de economia familiar no Período de 24/07/1998 a 10/08/2004 (fl.27);
f) notas fiscais de compra de produtos (fls. 28/29).
Entretanto, o CNIS da autora revela diversos vínculos empregatícios de natureza não ocasional nem de curta duração durante o período em que deveria comprovar o labor rurícola (carência) (fl. 68, ID 347200641):
a) Costa e Souza Coelho Consultoria LTDA - Período: 21/03/2005 a 19/11/2005;
b) Indústria e Comércio de Carnes Estrela do Araguaia LTDA -Período: 14/11/2005 a 30/12/2006;
c)Bertin S.A -Período: 09/01/2008 a 05/2010;
d)JBS S/A -Período: 09/01/2008 a 05/08/2010;
e)JBS S/A - Período: 04/11/2013 a 08/02/2016.
Acrescento ainda que, conforme consta no CNIS da autora, ela recebeu Auxílio-Doença Urbano nos períodos de 09/12/2009 a 26/12/2009 e de 18/07/2015 a 21/01/2016.
Além disso, o CNIS do companheiro revela diversos vínculos empregatícios de natureza não ocasional e de longa duração durante o período em que a autora deveria comprovar o trabalho rural para fins de carência (fl. 69, ID 347200641):
a) Indústria e Comércio de Carnes Estrela do Araguaia LTDA - Período: 12/04/2005 a 16/05/2005;
b) Indústria e Comércio de Carnes Estrela do Araguaia LTDA -Período: 02/05/2006 a 30/12/2006;
c) Bertin S.A - Período: 09/01/2008 a 05/2010;
d)JBS S/A - Período: 09/01/2008 a 06/06/2011;
e) Maurício Costa de Camargo Soares -Período: 01/07/2011 a 09/09/2013;
f) Agropecuária Camargo Soares LTDA - Período: 01/07/2011 a 12/2012;
g) Companhia do Vale do Araguaia - Período: 11/04/2014 a 23/03/2016.
Portanto, verifica-se que, posteriormente ao período indicado na certidão emitida pela Superintendência Regional do Estado de Mato Grosso, compreendido entre 24 de julho de 1998 e 10 de agosto de 2004, tanto a parte autora quanto seu cônjuge mantiveram diversos vínculos empregatícios em áreas urbanas.
Assim, a análise dos vínculos empregatícios urbanos, concomitantes ao período em que a autora deveria demonstrar a carência exigida, revela a impossibilidade de reconhecimento da condição de segurado especial, o que, consequentemente, inviabiliza a concessão do benefício previdenciário solicitado.
Inaplicável o Tema 629/STJ, pois não se trata de simples ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, mas, sim, de efetiva demonstração da não caracterização da parte autora como segurada especial durante o período de carência.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CUSTAS PROCESSUAIS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em custas e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa. Suspensa sua exigibilidade em razão da assistência judiciária gratuita deferida.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, para reformar a sentença e julgar improcedente a concessão do benefício previdenciário pleiteado, nos termos acima explicitados.
Revoga-se a tutela de urgência.
Eventuais valores pagos a título de tutela provisória estarão sujeitos a restituição, conforme Tema 692/STJ: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1017130-88.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AIR QUEIROZ CORREIA
Advogado do(a) APELADO: CARITA PEREIRA ALVES - MT10531-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA DENTRO DO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TEMA 629/STJ. INAPLICÁVEL. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, no período imediatamente anterior à formulação do requerimento administrativo ou ao implemento do requisito etário (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
2. A autora, nascida em 27/05/1964 (fl.16, ID 347200641), preencheu o requisito etário em 27/05/2019 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurado especial em 03/06/2019 (fl. 45, ID 347200641), que foi indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ato contínuo, ajuizou a presente ação em 04/12/2019, pleiteando a concessão do benefício supracitado, a contar do requerimento administrativo.
3. Para comprovar sua qualidade de segurado especial e o exercício de atividade rural pelo prazo de carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos (ID 347200641): a) Certidão de nascimento da filha (24/06/1982) sem qualificação profissional dos genitores (fl. 19); b) certidão de nascimento do filho (27/11/1985) sem qualificação profissional dos genitores (fl. 20); c) comprovante de endereço rural em nome da autora (fl. 21); d) autodeclaração de exercício de atividade rural (fl. 25/26); e) certidão da Superintendência Regional do Estado de Mato Grosso - SR (13), emitida em 27/05/2019, declarando que o Sr. José Soares de Souza, companheiro da autora, foi assentado no Projeto de Assentamento PA Independente I, no município de Confresa, desenvolvendo atividades rurais em regime de economia familiar no Período de 24/07/1998 a 10/08/2004 (fl.27); f) notas fiscais de compra de produtos (fls. 28/29).
4. Caso em que o CNIS da autora revela diversos vínculos empregatícios de natureza não ocasional nem de curta duração durante o período em que deveria comprovar o labor rurícola (carência) (fl. 68, ID 347200641): a) Costa e Souza Coelho Consultoria LTDA - Período: 21/03/2005 a 19/11/2005; b) Indústria e Comércio de Carnes Estrela do Araguaia LTDA -Período: 14/11/2005 a 30/12/2006; c)Bertin S.A -Período: 09/01/2008 a 05/2010; d)JBS S/A -Período: 09/01/2008 a 05/08/2010; e)JBS S/A - Período: 04/11/2013 a 08/02/2016. Além disso , a requerente recebeu Auxílio-Doença Urbano nos períodos de 09/12/2009 a 26/12/2009 e de 18/07/2015 a 21/01/2016.
5. De igual modo, o CNIS do companheiro revela diversos vínculos empregatícios de natureza não ocasional e de longa duração durante o período em que a autora deveria comprovar o trabalho rural para fins de carência (fl. 69, ID 347200641): a) Indústria e Comércio de Carnes Estrela do Araguaia LTDA - Período: 12/04/2005 a 16/05/2005; b) Indústria e Comércio de Carnes Estrela do Araguaia LTDA -Período: 02/05/2006 a 30/12/2006; c) Bertin S.A - Período: 09/01/2008 a 05/2010; d)JBS S/A - Período: 09/01/2008 a 06/06/2011; e) Maurício Costa de Camargo Soares -Período: 01/07/2011 a 09/09/2013; f) Agropecuária Camargo Soares LTDA - Período: 01/07/2011 a 12/2012; g) Companhia do Vale do Araguaia - Período: 11/04/2014 a 23/03/2016.
6. Verifica-se que, posteriormente ao período indicado na certidão emitida pela Superintendência Regional do Estado de Mato Grosso, compreendido entre 24 de julho de 1998 e 10 de agosto de 2004, tanto a parte autora quanto seu cônjuge mantiveram diversos vínculos empregatícios em áreas urbanas.
7. Assim, a análise dos vínculos empregatícios urbanos, concomitantes ao período em que a autora deveria demonstrar a carência exigida, revela a impossibilidade de reconhecimento da condição de segurado especial, o que, consequentemente, inviabiliza a concessão do benefício previdenciário solicitado.
8. Inaplicável o Tema 629/STJ, pois não se trata de simples ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, mas, sim, de efetiva demonstração da não caracterização da parte autora como segurada especial durante o período de carência.
9. Apelação do INSS provida. Tutela antecipada revogada.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
