
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ALCILENE LIRA BRITO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A e MICHELLE FASCINI XAVIER - MT11413-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011753-05.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALCILENE LIRA BRITO
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em face de sentença que julgou procedente o pedido para condenar o INSS a implantar o benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural desde a data do requerimento administrativo. Houve antecipação de tutela.
Nas suas razões recursais (ID 420470780, fls. 315/318), o INSS sustenta, em síntese, que a parte autora não pode ser qualificada como segurada especial, uma vez que não há início de prova material da atividade campesina em regime de economia familiar correspondente à carência do benefício.
Em caso de manutenção da sentença, requer a observância da prescrição quinquenal, fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, isenção de custas e o desconto dos valores já pagos administrativamente.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 420470803, fls. 347/369).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011753-05.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALCILENE LIRA BRITO
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp 1.735.097/RS e REsp 1.844.937/PR).
Consigno, ainda, que a prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ.
Em suas razões, a parte apelante sustenta, em síntese, que a parte autora não pode ser qualificada como segurada especial, uma vez que não há início de prova material da atividade campesina em regime de economia familiar correspondente à carência do benefício. Em caso de manutenção da sentença, requer a observância da prescrição quinquenal, fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, isenção de custas e o desconto dos valores já pagos administrativamente.
São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: ter 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/1991).
Para a comprovação do tempo de serviço na qualidade de rurícola, o exercício de atividade rural alegado deve estar alicerçado em produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, quando se fizer necessária ao preenchimento de eventuais lacunas.
Quanto aos documentos que fazem início de prova material, a jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer das suas formas, permite que documentos, mesmo que não dotados de fé pública e não especificados no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário, desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais como: a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ, AgRG no REsp 967.344/DF), a certidão de casamento queatesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1.067/SP, AR 1.223/MS), a declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3.202/CE), contanto que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/1991).
Além disso, a Súmula 34 da TNU dispõe que, para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar e a Súmula 149 do STJ disciplina que a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Esse é o entendimento do STJ pacificado quanto à necessidade de se estar atuando como rurícola ao tempo do requerimento administrativo:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmenteprevistos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(STJ - REsp: 1354908 SP 2012/0247219-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 09/09/2015, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/02/2016 RT vol. 967 p. 584).
Impende então averiguar se há substrato probatório idôneo a ensejar o reconhecimento do exercício de atividade rural pelo tempo minimamente necessário ao gozo do benefício em questão, que, no caso, corresponde a 180 (cento e oitenta) meses, nos termos do art. 25, II, da Lei nº 8.213/1991.
No caso dos autos, houve o implemento do requisito etário pela parte autora em 2021. Portanto, a carência a ser cumprida é de 180 (cento e oitenta) meses, no período imediatamente anterior ao requerimento ou à data do implemento da idade mínima (Súmula 54 da TNU), ou seja, entre 2006 a 2021.
Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e carência, a parte autora anexou aos autos: a) certidão de nascimento de filhos, nascidos em 31/10/1999 e 17/03/2002, estando a parte autora e o genitor qualificados como agricultores; b) carteira de filiação junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Manacapuru com expedição em 06/11/2020; c) contrato particular de comodato firmado pela parte autora e Ademar de Oliveira Brito em 28/07/2003, com reconhecimento em cartório na mesma data, referente ao período de 1983, sem data de término; d) declaração de ITR/2022 em nome do comodante Ademar de Oliveira Brito; e) consulta de cadastro eleitoral no qual consta residência em localidade rural; f) notas fiscais referentes a compra de produtos agropecuários, datadas de 2010 e 2015; g) prontuário médico no qual a parte autora está qualificada como agricultora; h) certidão eleitoral, datada de 2021, na qual foi declarada a ocupação de agricultora; i) autodeclaração de segurada especial na qual a parte autora afirma trabalho rural como comodatária no período de 2000 a 2023 (ID 420470768, fls. 33/34, 35/36, 37, 39, 42, 43/44, 45/46, 52, 53/57).
Houve a colheita de prova testemunhal que corroborou as alegações autorais (ID 420470780, fls. 302/307).
O INSS, por sua vez, acostou aos autos comprovante de inscrição e de situação cadastral no qual há registro de inscrição da parte autora como empresária individual no período de 09/12/2010 a 10/08/2017, bem como consulta ao CNIS na qual se vê vínculo de trabalho urbano nos períodos de 08/11/1988 a 12/1988, 17/07/2006 a 02/2007 e 1º/05/2021 a 09/2021, recolhimento como empregado doméstico de 1º/08/2009 a 31/08/2009, como contribuinte individual de 1º/09/2009 a 30/09/2010 e 1º/12/2010 a 31/12/2013 (ID 420470771, fls. 68/69).
Assim, não há prova do exercício de atividade campesina pelo período correspondente à carência do benefício vindicado.
Ausentes os requisitos legais exigidos, a concessão do benefício se revela indevida.
Em razão do deferimento da tutela antecipada, é devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
Inverto o ônus de sucumbência. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em face do entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.059 (REsp 1.865.663/PR), segundo o qual a aplicação da norma inserta no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal. Fica mantida a suspensão da exigibilidade da cobrança das verbas de sucumbência, nos termos do § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS para, reformando a sentença, julgar improcedente o pedido formulado na inicial. Revogo a ordem de antecipação dos efeitos da tutela. Fica o INSS autorizado a cobrar os valores pagos em razão da tutela antecipada ora revogada.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011753-05.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALCILENE LIRA BRITO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. IDADE MÍNIMA COMPROVADA. VÍNCULO URBANO REGISTRADO NO CNIS NO PERÍODO DA CARÊNCIA. BENEFÍCIO INDEVIDO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA REVOGADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
1. A questão discutida nos autos refere-se à qualidade de segurado especial, para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, uma vez que há registro de vínculos urbanos no CNIS, no período da carência.
2. Dispõe a Lei nº 8.213/1991 que os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade são os seguintes: a) a idade completa de 55 anos, se mulher, e 60 anos, se homem (art. 48, § 1º); b) a comprovação do exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício (art. 48, § 2º, c/c 143); e (c) a condição de empregado prestador de serviço de natureza rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado (art. 11, I, a), ou de trabalhador autônomo rural (art. 11, V, ‘g’), trabalhador avulso rural (art. 11, VI) ou de segurado especial (art. 11, VII).
3. Houve o implemento do requisito etário em 2021. Portanto, a parte autora deveria provar o período de 180 (cento e oitenta) meses de atividade rural, conforme tabela progressiva do INSS.
4. Para constituir início de prova material de suas alegações a parte autora anexou nos autos: a) certidão de nascimento de filhos, nascidos em 31/10/1999 e 17/03/2002, estando a parte autora e o genitor qualificados como agricultores; b) carteira de filiação junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Manacapuru com expedição em 06/11/2020; c) contrato particular de comodato firmado pela parte autora e Ademar de Oliveira Brito em 28/07/2003, com reconhecimento em cartório na mesma data, referente ao período de 1983, sem data de término; d) declaração de ITR/2022 em nome do comodante Ademar de Oliveira Brito; e) consulta de cadastro eleitoral no qual consta residência em localidade rural; f) notas fiscais referentes a compra de produtos agropecuários, datadas de 2010 e 2015; g) prontuário médico no qual a parte autora está qualificada como agricultora; h) certidão eleitoral, datada de 2021, na qual foi declarada a ocupação de agricultora; i) autodeclaração de segurada especial na qual a parte autora afirma trabalho rural como comodatária no período de 2000 a 2023.
5. O INSS, por sua vez, acostou aos autos comprovante de inscrição e de situação cadastral no qual há registro de inscrição da parte autora como empresária individual no período de 09/12/2010 a 10/08/2017, bem como consulta ao CNIS na qual se vê vínculo de trabalho urbano nos períodos de 08/11/1988 a 12/1988, 17/07/2006 a 02/2007 e 1º/05/2021 a 09/2021, recolhimento como empregado doméstico de 1º/08/2009 a 31/08/2009, como contribuinte individual de 1º/09/2009 a 30/09/2010 e 1º/12/2010 a 31/12/2013.
6. Assim, não há prova do exercício de atividade campesina pelo período correspondente à carência do benefício vindicado.
7. Ausentes os requisitos legais, o benefício se revela indevido. Tutela provisória revogada.
8. Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
