
POLO ATIVO: ANA NUNES DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MAYRA CAROLINE DE ARAUJO SILVA - GO55359-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora, Sra. ANA NUNES DA SILVA, em face de sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade de trabalhadora rural.
Em suas razões, a apelante sustenta, em síntese, que o juízo de origem negligenciou a análise quanto ao cômputo de labor rural anterior ao matrimônio da autora. Aduz não haver comprovação de que eventual fonte de renda decorrente do labor urbano (auferida pelo seu cônjuge) tenha sido suficiente para desqualificar a essencialidade do labor rural para o sustento do grupo familiar. Afirmou estarem presentes os requisitos para concessão do benefício de aposentadoria por idade rural. Requereu a reforma da sentença para concessão do benefício almejado na inicial. Subsidiariamente, pleiteou o cômputo do período compreendido entre seus doze anos de idade até a data imediatamente anterior ao matrimônio e os períodos em que seu marido não trabalhou na zona urbana (de 23/01/1976 à 20/11/1985; de 19/12/1986 à 13/11/1989; de 08/03/1990 à 30/06/1990, de 03/08/1990 a 31/12/1990; de 25/04/1991 a 31/05/1992; de 01/02/1996 a 31/10/1996; de 22/02/1997 a 09/01/2000) como período de labor rural em regime de economia familiar e a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Requer a reforma da sentença, bem como o pagamento das prestações retroativas à data do requerimento administrativo.
Sem contrarrazões.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Dos pressupostos jurídicos necessários para concessão da aposentadoria rural por idade
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade de 60 anos para homem e 55 anos para mulher (art. 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública), não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário.
Ademais, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
Consoante jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça: “os documentos trazidos aos autos pelo autor, caracterizados como início de prova material, podem ser corroborados por prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como posteriores aos das provas apresentadas.” (REsp 1.642.731/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/06/2017).
Além disso, ressalte-se o teor da Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
Também não há necessidade de contemporaneidade da prova material em relação a todo o período do exercício da atividade rural que se pretende provar. No entanto, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, desde que complementada por prova testemunhal. Assim, conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
Não configuram início de prova material os documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário.
Da situação tratada
A autora alega, em síntese, que propôs requerimento administrativo em 19/10/2018 (rolagem única PJe/TRF-1 – p. 125) sendo este indeferido pela Autarquia Previdenciária (objeto da presente ação). Há nos autos ainda, registros de requerimentos administrativos realizados em 14/1/2019 (rolagem única PJe/TRF-1 – p. 119) e 17/2/2023 (rolagem única PJe/TRF-1 – p. 127).
Conforme documento apresentado pela parte autora (rolagem única PJe/TRF-1 – p. 26/27) constata-se que o requisito de idade mínima foi atendido em 7/3/2016 (nascida em 7/3/1961).
O início de prova material deve ser contemporâneo aos fatos e abranger, pelo menos parcela do período de carência legal, que, na situação tratada, é de 180 meses, nos termos do art. 142 e 143, ambos da Lei 8.213/91, podendo tal indício ter seus efeitos ampliados para período anterior ou posterior, a depender do conjunto probatório apresentado (demais documentais e provas testemunhais).
Assim, a parte autora deve apresentar início de prova material que demonstre o exercício de labor rural, ainda que descontínuo, em pelo menos parcela dos 180 meses anteriores ao implemento etário ou ao requerimento administrativo. Portanto, o início de prova material a ser comprovado deve abranger parte da carência, que, na situação é de 2001 a 2016 (considerando o implemento do requisito etário, hipótese passível de configuração do instituto do direito adquirido) ou 2003 a 2018 (levando em consideração o requerimento administrativo).
Os documentos apresentados pela parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, foram, dentre outros, os seguintes:
a) Certidão eleitoral, constando a qualificação profissional da autora como trabalhadora rural;
b) Certidão de casamento (celebrado em 1983), constando a qualificação profissional do cônjuge da autora como lavrador;
c) CNIS do cônjuge da autora (anexado por ela);
d) Certidão de nascimento do filho Alessandro Pereira da Silva (1982), sem registro de qualificação profissional dos genitores;
e) Certidão de nascimento da filha Cristiane Nunes da Silva (1981), constando o registro de qualificação profissional do genitor como lavrador;
f) Contrato de comodato de imóvel rural, constando como comodante o Sr. Durvalino Pereira da Silva e, como comodatária, a autora (datado de 20 de fevereiro de 1982, todavia com firma reconhecida tão somente em 1 de abril de 2016);
g) Escritura de compra e venda de imóvel rural (Boqueirão da Fazenda Santana), constando o cônjuge da autora como outorgante comprador de fração do terreno. Ademais, consta ainda a qualificação profissional dele como lavrador (1981);
h) Autodeclaração de trabalhador rural;
i) Declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santana – BA, afirmando que a autora exerceu atividade rural, na qualidade de segurada especial, no período compreendido entre 20/1/1982 e 11/4/2016 (documento datado de 5/12/2018);
j) Recibo de doação feita ao Sindicato do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santana – BA (abril de 2016);
k) Declaração e recibos de entrega de ITR (2000; de 2002 a 2018), constando como contribuinte o Sr. Durvalino Pereira da Silva;
l) Declaração de terceiros, vizinhos à Fazenda Boqueirão, afirmando que a autora exerceu atividades agrícolas na propriedade do Sr. Durvalino Pereira da Silva, desde 1982 (datadas de 31/3/2016);
m) Declaração do proprietário da terra (Fazenda Boqueirão), Sr. Durvalino Pereira da Silva, afirmando que a autora exerceu atividades agrícolas em seu território, desde 2003 (datada de 21/2/2019);
n) Recibo de compra de produtos agrícola (entre outros: latas de óleo, arroz, e enxada), constando a autora como compradora (emissão em 2004); e
o) Recibo de compra de produtos agrícola (entre outros: saca de milho, feijão, e facão), constando a autora como compradora (emissão em 7/2016).
Em análise da documentação anexada, verifica-se que os documentos trazidos apresentam as seguintes características: são extemporâneos (itens 'b', 'd', 'e' e 'g') pois se referem a momentos ocorridos fora do período de carência. Há ainda documentos não revestidas de formalidades suficientes a ensejar segurança jurídica (itens 'a', 'h', 'm', 'n' e 'o'). Por fim, verifica-se que alguns documentos foram produzidos próximo (ou até mesmo posteriormente) ao implemento do requisito etário (itens ‘f’, 'j', 'l', e ‘m’).
Eis o entendimento desta Turma acerca da ausência de formalidade de documentos colacionados aos autos para fins probatórios de início de prova material de exercício de atividade campesina:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO PERÍODO DE CARÊNCIA. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. INADMISSIBILIDADE. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. 1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser realizada mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27). 2. Não servem como início de prova material do labor rural durante o período da carência, pois não revestidos das formalidades legais para comprovar a autenticidade, a segurança jurídica e quando tiverem sido confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou à data do nascimento da criança. A certidão eleitoral (retificável a qualquer tempo) com anotação indicativa da profissão de rurícola, certidão de nascimento da criança e/ou certidão de casamento sem qualificação profissional, prontuários médicos, cartão da gestante, cartão de vacinas, carteira e ficha de filiação a sindicato de trabalhadores rurais, desacompanhado dos recolhimentos, CTPS sem anotações de vínculos rurais, documentos de terras em nome de terceiros, bem como declaração de terceiros. 3. O pleito encontra óbice na ausência de início de prova material, pois não ficou comprovado o exercício de atividade rural no período de carência (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91), tendo em vista que os documentos apresentados pela autora não são suficientes para comprovar o efetivo exercício campesino em regime de economia familiar. 4. A autora postula o benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento de seu filho, ocorrido em 11/03/2016 certidão de nascimento de fl. 21, sem qualificação profissão dos genitores, e, com o propósito de comprovar a sua condição de trabalhadora rural, juntou os seguintes documentos: certidão de nascimento de outro filho sem qualificação profissional dos pais; declaração de atividade rural, emitida pelo sindicato, com data de filiação em 26.04.2018, após o parto da criança; Declaração do proprietário, Sr. José Maria de Sousa, em que autora exerce atividade agrícola, em regime de economia familiar, datada após o parto da criança. 5. O Reconhecimento de tempo de serviço rural exige início razoável de prova material corroborada por prova testemunhal robusta, não sendo admissível prova exclusivamente testemunhal. 6. A coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationis, permitindo a renovação do pedido ante novas circunstâncias ou novas provas. 7. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 4, III, do CPC, ficando suspensa a execução, enquanto perdurar a situação de pobreza da requerente pelo prazo máximo de cinco anos, quando estará prescrita.. 8. Apelação do INSS provida para julgar improcedente o pedido inicial.
(AC 1002990-83.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 17/08/2022 PAG.)
Ainda, vejamos o entendimento deste e. TRF1 em julgado quanto à apresentação de documentos não contemporâneos para a comprovação da atividade rural:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. AUSENTE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CONTEMPORANEIDADE COM PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO CARACTERIZADA. IMPOSSIBILIDADE PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. RECURSO REPETITIVO. RESP N. 1.352.721-SP. AÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se a carência prevista no art. 142 da Lei de Benefícios, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Exige-se, simultaneamente, idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (art. 48, § 1º, da mesma lei). 2. Os documentos apresentados certidão de casamento, ocorrido em 1977, onde consta a profissão do seu ex-cônjuge como lavrador, com averbação de divórcio ocorrido em 2004, e matrícula de um imóvel rural onde consta a profissão de seu esposo como pecuarista, datada de 18/09/1996 são insuficientes para comprovarem o exercício da atividade alegada, sob regime de economia familiar, por tempo suficiente a cumprir a carência exigida em lei. Verifico que os documentos apresentados não são contemporâneos ao período de carência que se pretende provar, a certidão de casamento se refere a fato ocorrido há mais de 24 anos antes do início da carência, além de constar o divórcio que, por si só, já impede a extensão da possível qualidade de segurado do ex-cônjuge à autora.Precedente. 3. Assim, a não comprovação da qualidade de segurado especial da parte autora, na condição de trabalhador rural, e pelo menos durante o cumprimento do prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213, de 1991, impossibilita o deferimento do benefício postulado na petição inicial. 4. É inadmissível prova exclusivamente testemunhal para o reconhecimento de tempo de exercício de atividade rural (Súmulas 149/STJ e 27/TRF-1ª Região). 5. Segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, inciso IV do CPC), e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe 28/4/2016). 6. A sentença previdenciária, de um modo geral, é proferida secundum eventum litis ou secundum eventum probationis; porém, a orientação fixada no referido repetitivo agrega a vantagem processual de afastar eventual discussão relativa à ocorrência ou não de coisa julgada material em caso de nova ação. 7. Processo extinto, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado. Apelação da parte autora prejudicada, ressalvados os entendimentos dos demais julgadores que negavam provimento à apelação com efeito secundam eventum litis."
(AC 1010623-82.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 07/07/2022 PAG.)
No mesmo sentido, esse é o entendimento desta Segunda Turma, quanto aos documentos produzidos próximo ao implemento do requisito etário ou ao ajuizamento da ação:
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. CONTEMPORANEIDADE DAS PROVAS COM O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO PROVIDO. 1. A comprovação da qualidade de trabalhador rural ocorre mediante início de prova material devidamente corroborado pela prova testemunhal produzida em juízo, bem assim a implementação do requisito etário exigido. 2. Muito embora a jurisprudência tenha flexibilizado o posicionamento no tocante aos documentos que podem servir como início de prova documental, a jurisprudência já firmou entendimento de que não possuem integridade probante documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, produzidos tão somente com o intuito de servir como meio de prova em ações de índole previdenciária. Não são aceitos como início de prova material, assim, certidões de cartório eleitoral com anotação da profissão da parte autora, prontuários médicos, certidões relativas à filiação a sindicatos de trabalhadores rurais etc contemporâneos ao ajuizamento da ação. 3. A parte autora cumpriu o requisito etário, eis que completou 55 anos em 2017 (nascimento em 01/11/1962), cuja carência é de 160 meses (2003-2017). Todavia, não se desincumbiu de comprovar a sua qualidade de segurada especial, haja vista que os documentos trazidos inicialmente não são suficientes como indício de prova material, eis que o único documento compatível com o pedido é sua conta de energia elétrica, esta com data posterior ao requerimento administrativo e contemporânea ao ajuizamento da ação (ID 293465561: contas de energia elétrica de 09-12/2018 – fl. 10/11; requerimento administrativo apresentado em 27/08/2018 – fl. 15/16 e ajuizamento da ação em 27/02/2019 – fl. 01). A certidão de casamento fora lavrada em 11/05/1984 (ID 293465561- fl. 12), ou seja, extemporânea ao período de carência. 4. Diante da ausência de documentos que demonstrem a qualidade de segurado especial da parte autora e da insuficiência da prova testemunhal produzida não se reconhece o direito ao benefício de aposentadoria rural por idade (Súmula 27 do TRF/1ª Região e 149/STJ). 5. Considerado o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationis, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes. 6. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, a serem pagos pela parte autora ao INSS, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, §3º do CPC. 7. Apelação do INSS a que se dá provimento para julgar improcedente o pedido formulado na inicial.
(AC 1003294-48.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 10/08/2023 PAG.)
Por outro lado, são aceitos como início de prova material: certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que estabeleçam, indiquem ou apenas indiciem a ligação da parte autora com o trabalho no meio rural, bem como CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p. 33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p. 191 de 02/03/2011).
Portanto, os recibos de entrega de declaração de ITR (2000; de 2002 a 2018) são aceitos como início de prova material.
Não obstante o início de prova material apresentado pela autora, verifica-se que o INSS anexou aos autos CNIS do cônjuge da autora contendo o registro de diversos vínculos laborais urbanos (rolagem única PJe/TRF-1, p. 133/148).
Outrossim, não se pode reconhecer o período anterior ao matrimônio da autora como de labor rural, eis que fora da carência e não amparado em prova documental, mas tão somente em prova testemunhal. Explica-se: O documento que a autora pretende ter a eficácia probatória retroagida se refere justamente à certidão de casamento (em que consta a profissão de seu cônjuge como lavrador). Não se pode estender tal eficácia probatória por dois motivos: primeiro, em razão do fato de que tal documento, como supramencionado, é extemporâneo; e segundo, porque a parte deseja retroagir a eficácia probatória de uma documento em nome de seu cônjuge para um período em que sequer o grupo familiar estava constituído.
Quanto aos períodos em que o cônjuge da autora não estava laborando com vínculos urbanos, tais períodos também não podem ser computados pela autora como rural, pois, na situação, os documentos tiveram sua eficácia probatória afastada ante a ausência de essencialidade do labor rural para os fins de subsistência do grupo familiar.
Outrossim, consta nos autos o registro de concessão de auxílio doença previdenciário ao cônjuge da autora pelo período compreendido entre 26/6/2014 a 13/7/2014, constando a forma de filiação dele como empregado e o ramo de sua atividade como comerciário (rolagem única PJe/TRF-1, p. 191).
Ademais, conforme fundamentado pelo juízo de origem, a prova oral foi colhida, porém frágil e contraditória. Nesse sentido (rolagem única PJe/TRF-1, p. 276/):
"[...] Ademais, durante o seu depoimento, a autora faltou com a verdade. A primeira testemunha também mentiu em juízo. A autora, no início da narrativa, afirmou que sempre se dedicou ao trabalho agropastoril na Fazenda Tabuleirinho, Município de Santana, BA, com o apoio dos filhos e esposo, Josino Pereira da Silva. Disse que o marido também se dedicou a esse trabalho até 4 ou 5 anos antes de sua vinda para Anápolis, fato ocorrido em 2019. Depois, quando questionada sobre a idade de seus filhos quando o esposo veio para Goiás, mudou a versão, dizendo que na verdade ele veio para a cidade de Anápolis quando a filha mais velha tinha 9 ou 10 anos de idade, indicando que a mudança, portanto, ocorreu em 1990. Por fim, depois de confrontada com os dados do CNIS relativos a Josino, que indicam que ele, na verdade, deixou o meio rural em 1985, a autora se mostrou reticente e incorreu em contradição. A primeira testemunha ouvida, VALDINEIA DA CONCEIÇÃO DE SOUZA CARACIOLA, apresentou versão completamente distinta da segunda versão da autora. Afirmou de forma enfática que Josino e Ana se dedicaram ao trabalho rural na Fazenda Tabuleirinho, pertencente a Dorvalino, até 4 ou 5 anos atrás e que ambos vieram juntos para Anápolis. A versão, como visto, é incoerente com o que afirmou a autora e também com os documentos anexados aos autos. Quando confrontada, a testemunha apenas afirmou que “não tinha conhecimento sobre os vínculos urbanos de Josino”. De fato, examinando as informações do espelho do CNIS, vê-se que Josino possui longo histórico de vínculos urbanos pelo menos desde o ano de 1985, e todos em Goiás, o que contradiz a alegação contida na inicial de que a autora e sua família exerceram atividade rural em regime de economia familiar no sertão da Bahia. Josino foi empregado da Encol, Matadouro Santana Ltda., Santa Barbara S/A, Eletroengenharia Com. de Material Eletrico, Edifício 10 Moradas, Clube Recreativo Anapolino (CRA), empresas com sede em Goiás. Ademais, a segunda testemunha afirmou que a autora veio com o marido para Goiás por ocasião de alguns desses vínculos, o que explica o emprego urbano como empregada doméstica referido no documento de fl. 31. Portanto, resta descaracterizado o alegado trabalho rural. O longo histórico de Josino em grandes empresas mostra que o trabalho rural desempenhado pela autora era dispensável como meio de subsistência. Veja-se que as atividades em construtoras e frigorífico, considerando a existência de convenções coletivas de trabalho para fixação de piso salarial, quanto às primeiras, e a natureza especial do serviço, quanto ao segundo, proporcionavam o pagamento de salário superior ao mínimo. Ademais, os dados constantes do CNIS (fl. 40) demonstram que o salário de Josino era, de fato, superior ao mínimo (https://www.oabsp.org.br/subs/saoluizdoparaitinga/noticias/valoresdo-salario-minimo-nacional-desde-sua). [...]"
A conclusão que se impõe é a de que fica descaracterizada, na espécie, a condição de rurícola da parte autora, uma vez que não configurado o trabalho rural em regime de economia familiar, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91. Sentença mantida.
Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício pleiteado. Portanto, deve ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp n. 1865663/PR, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido, como no caso dos autos, desse modo, conforme disposição o art. 85, § 11, do CPC, os quais ficam suspensos em caso de deferimento da gratuidade de justiça, nos termos do art. 98, §§ 2º e 3º do CPC/2015.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação da autora, nos termos da fundamentação supra.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1007055-18.2022.4.01.3502
PROCESSO REFERÊNCIA: 1007055-18.2022.4.01.3502
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: ANA NUNES DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NÃO CORROBORAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL. VÍNCULOS URBANOS DO CÔNJUGE. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL NÃO DEMONSTRADA. SENTENÇA MANTIDA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria rural por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).
2. Na situação, os documentos apresentados pela parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, foram, dentre outros, os seguintes: a) Certidão eleitoral, constando a qualificação profissional da autora como trabalhadora rural; b) Certidão de casamento (celebrado em 1983), constando a qualificação profissional do cônjuge da autora como lavrador; c) CNIS do cônjuge da autora (anexado por ela); d) Certidão de nascimento do filho Alessandro Pereira da Silva (1982), sem registro de qualificação profissional dos genitores; e) Certidão de nascimento da filha Cristiane Nunes da Silva (1981), constando o registro de qualificação profissional do genitor como lavrador; f) Contrato de comodato de imóvel rural, constando como comodante o Sr. Durvalino Pereira da Silva e, como comodatária, a autora (datado de 20 de fevereiro de 1982, todavia com firma reconhecida tão somente em 1 de abril de 2016); g) Escritura de compra e venda de imóvel rural (Boqueirão da Fazenda Santana), constando o cônjuge da autora como outorgante comprador de fração do terreno. Ademais, consta ainda a qualificação profissional dele como lavrador (1981); h) Autodeclaração de trabalhador rural; i) Declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santana – BA, afirmando que a autora exerceu atividade rural, na qualidade de segurada especial, no período compreendido entre 20/1/1982 e 11/4/2016 (documento datado de 5/12/2018); j) Recibo de doação feita ao Sindicato do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santana – BA (abril de 2016); k) Declaração e recibos de entrega de ITR (2000; de 2002 a 2018), constando como contribuinte o Sr. Durvalino Pereira da Silva; l) Declaração de terceiros, vizinhos à Fazenda Boqueirão, afirmando que a autora exerceu atividades agrícolas na propriedade do Sr. Durvalino Pereira da Silva, desde 1982 (datadas de 31/3/2016); m) Declaração do proprietário da terra (Fazenda Boqueirão), Sr. Durvalino Pereira da Silva, afirmando que a autora exerceu atividades agrícolas em seu território, desde 2003 (datada de 21/2/2019); n) Recibo de compra de produtos agrícola (entre outros: latas de óleo, arroz, e enxada), constando a autora como compradora (emissão em 2004); e o) Recibo de compra de produtos agrícola (entre outros: saca de milho, feijão, e facão), constando a autora como compradora (emissão em 7/2016).
3. Não obstante o início de prova material apresentado pela autora, verifica-se que o INSS anexou aos autos CNIS do cônjuge da autora contendo o registro de diversos vínculos laborais urbanos. Outrossim, não se pode reconhecer o período anterior ao matrimônio da autora como de labor rural, eis que fora do período de carência e não amparado em prova documental, mas tão somente em prova testemunhal.
4. O conjunto probatório revela o cumprimento do requisito etário. A prova testemunhal foi colhida, porém não corroborou o início de prova material apresentado. Ademais, os longos vínculos urbanos no CNIS do cônjuge da autora afastam a eficácia probatória dos documentos anexados que contenham o registro do labor rural em nome dele.
5. Fica descaracterizada, na espécie, a condição de rurícola da parte autora, uma vez que não configurado o trabalho rural em regime de economia familiar, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
6. Ausência do preenchimento dos requisitos da Lei 8.213/91, inviável reconhecer o direito da parte autora à concessão do benefício de aposentadoria rural por idade pleiteado.
7. Honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015 e da tese fixada no Tema 1.059/STJ, os quais ficam suspensos em caso de deferimento da gratuidade de justiça, conforme art. 98, §§ 2º e 3º do CPC/2015.
8. Apelação da autora não provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
