
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARCIO DE OLIVEIRA MEIRELES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FERNANDO NOLETO MARTINS - GO11110
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARCIO DE OLIVEIRA MEIRELES
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FERNANDO NOLETO MARTINS - GO11110
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural, com DIB fixada na DER e condenação do recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% da condenação, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Em suas razões, requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de existência de registros no CNIS do autor na condição de trabalhador urbano, o que seria suficiente para descaracterizar a qualidade de segurado especial do autor.
Informou que o autor apresenta endereço urbano, bem como possui patrimônio incompatível com a condição de segurado especial e imóvel rural maior que 4 módulos fiscais.
A parte apelada, regularmente intimada, apresentou contrarrazões.
É o relatório.

CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARCIO DE OLIVEIRA MEIRELES
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FERNANDO NOLETO MARTINS - GO11110
V O T O
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente à aposentadoria rural.
Nada obstante o ditame do art. 38-B, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 rezar que “a partir de 1º de janeiro de 2023, a comprovação da condição e do exercício da atividade rural do segurado especial ocorrerá, exclusivamente, pelas informações constantes do cadastro a que se refere o art. 38-A desta Lei” - sendo que o aludido repositório é o Cadastro Nacional de Informações Sociais, CNIS -, admite-se, para momentos anteriores de labor o uso de outras modalidades probatórias (art. cit, § 2º). Tal se mostra compreensível dada a precariedade da inserção efetiva de elementos testificadores de trabalho campesino a quem o desenvolve, sobretudo quando se tratar de exercício da atividade em localidades afastadas, insertas a grandes distâncias dos centros urbanos.
Consignada dita premissa, convém destacar que a jurisprudência admite como requisitos para a aposentadoria rural: 1) a idade (se homem 60 anos e se mulher 55 anos, conforme art. 201, § 7º, II, da Lei Maior e art. 48,§ 1º, da Lei nº 8213/91); 2) a carência (arts. 48, 142 e 143 todos da Lei de Benefícios da Previdência Social). Nesta trilha conferir, todos do STJ e da lavra do Min. Herman Benjamin: REsp1803581, 2ª T, DJE de 18/10/2019; AREsp 1539221, 2ª T, DJE 11/10/2019; AREsp 1539106, 2ª T, DJE 11/10/2019; e AREsp 1538240, 2ª T. DJE 11/10/2019.
De outra perspectiva, não se olvide que o(a) trabalhador(a) deve permanecer “...nas lides campesinas até o momento imediatamente anterior ao requerimento ou até às vésperas do preenchimento do requisito etário(...”), pois, o STJ, através da Primeira Seção, no julgamento do REsp. 1.354.908/SP, sob o rito do art. 543-C do CPC, DJe 10/02/2016, Rel. Min. MAURO CAMBPELL MARQUES, consolidou o entendimento no sentido de que apenas se revela possível excetuar a regra que impõe o exercício de atividade rural até o momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo na hipótese em que o segurado tenha desenvolvido seu mister no campo pelo número de meses correspondente ao exigido para fins de carência, até o momento em que implementado o requisito etário. Trata-se de resguardar o direito adquirido daquele que, não obstante o cumprimento dos requisitos necessários, não tenha requerido, de imediato, a aposentadoria rural por idade”. (AIREsp 1786781, STJ, Rel. Min. Sergio Kukina, 1ª T, DJE de 02/09/2019).
No que tange a controvérsia recursal, argumenta o INSS que o autor possui registrado em seu CNIS atividades/vínculos empregatícios descaracterizadores do regime de economia familiar rural. Sustenta que o autor possui endereço urbano, bem como possui patrimônio incompatível com a condição de segurado especial, sendo 02 veículos em seu nome e o tamanho do imóvel rural maior que 4 módulos fiscais.
No que tange à alegação do INSS de o autor possui 02 veículos em seu nome, patrimônio incompatível com a condição de segurado especial, tal tese não pode ser levada em consideração no julgamento do presente recurso, sob pena de ofensa ao contraditório, pois se trata de verdadeira tentativa de inovação em sede recursal, obstada pelo art. 336 do Código de Processo Civil, circunstância que conduz ao não conhecimento do recurso de apelação, nesta parte.
A inovação em sede recursal caracteriza-se, portanto, como supressão de instância, motivo pelo qual a matéria que não foi submetida ao crivo do juízo a quo, não tendo sido decidida na sentença, não pode ser analisada pelo Tribunal, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do duplo grau de jurisdição, do contraditório e da ampla defesa.
Adiante, no que diz respeito ao tamanho do imóvel rural maior que 04 módulos fiscais, verifica-se dos autos que as propriedades rurais constantes nas certidões de inteiro teor, não mais pertencem ao apelado, desde a década de 90, conforme registros de transmissão de propriedade constantes nos referidos documentos. Já a Fazenda Martinez é de propriedade de terceiros, local em que o autor possui registro de empregado rural desde o ano de 2009, circunstância que não retira sua condição de segurado especial.
Quanto ao fato de que o autor apresenta registrado em seu CNIS atividades/vínculos empregatícios, tal fato, igualmente, não desqualifica sua condição de segurado especial, tendo em vista que os referidos vínculos se deram na condição de trabalhador rural, conforme faz prova a cópia da CTPS do autor, colacionada às (ID. 155699058 - fls.55/57), de onde se extrai que o autor laborou com serviço rural pelo período de 03/2009 a 08/2020.
Vale registrar, a propósito, que a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves Da Silva, Segunda Turma,e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo De Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar,e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
A propósito, a sentença de primeiro grau se encontra bem fundamentada, razão pela qual deverá ser mantida, pois além de razoável, proporcional e ampla é suficientemente harmônica frente ao contexto fático-jurídico, cuja fundamentação é aqui invocada per relationem, em prestígio, aliás, à atividade judicante do 1º grau de jurisdição. Vejamos:
“Na espécie, a prova oral colhida foi suficiente a confirmar as declarações da parte requerente sobre a atividade rural, de que trata o artigo 11, VII, § 1º da Lei 8.213/91, pelo período correspondente ao de carência exigido.
Com efeito, o depoimento pessoal da requerente, corroborado pelo depoimento da testemunha PEDRO GONÇALVES MARTINS FILHO foi uníssono no sentido de que o requerente é empregado desde 2009 da Fazenda Martinez, onde trabalha com trator, construção de cerca, gado, serviços braçais, dentre outros serviços gerais; em serviços gerais, que o mesmo possui esposa e filhos; que não é proprietário de fazenda; que sua esposa já é aposentada (evento 25, TERMOAUD1).
De mais a mais, o linguajar do requerente, a par da evidente ausência de instrução, demonstram que se trata de pessoa do meio campesino.
Frise-se que nos atos consta um registro empregatício do requerente oriundo da Fazenda Martinez, proprietário Marco Elisio Nunes Cunha, constando função do requerente como vaqueiro, com admissão em 02/03/2009, o qual permanece vigente (evento 1, CPS10).
Por consectário lógico, implementado o requisito etário no ano de 2020 e apresentado início de prova material nos anos de1991, ainda que de forma descontínua, tudo devidamente corroborado por prova oral (STJ, AREsp 577.360/MS), reputa-se configurada a carência mínima exigida pelo art. 142 da Lei de Benefícios, a qual se consubstancia na espécie. (Sem grifos no original)
Desse modo, a sentença de primeiro grau se encontra bem fundamentada e não existem elementos nos autos que possam infirmar o quanto ali consignado.
Quanto a prova do efetivo labor em regime de subsistência, é de se salientar que “...para o reconhecimento do labor agrícola é desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele (início) seja ampliada por prova testemunhal” (AIREsp 1579587, STJ, 1ª T, Min. Gurgel de Faria, DJE 21/09/217), situação externada no particular.
Ademais, apesar de o INSS afirmar que a parte autora possui endereço urbano, anoto que esse fato não é suficiente para descaracterizar o labor rural, principalmente diante do disposto no inciso VII do art. 11, da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:...
Em conclusão, considera-se provada a atividade rural de segurado especial do autor mediante prova material complementado por idônea prova testemunhal, restando suficientemente comprovada à atividade campesina do recorrido no número de meses necessários ao cumprimento da carência, razão pela qual o benefício lhe é devido desde a DER.
No que diz respeito à correção monetária, vejo que o julgado recorrido fixou o IPCA-E, todavia, o referido índice é incorreto tratando-se de benefício previdenciário, sendo matéria já pacificada, consoante Tema 905 do STJ, que fixou o INPC como índice para fins de correção monetária no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Por se tratar de questão alusiva à ordem pública (conferir AgInt nos EDcl no AREsp 2088555) e, portanto, passível de cognição a qualquer tempo e grau, mister deliberar, desde já, temática condizente à correção monetária da matéria previdenciária.
E, nesta órbita, entende-se em determinar que a atualização monetária será efetivada conforme as diretrizes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, já atualizado em consonância com o Tema 905 do STJ.
De conseguinte, mediante atuação ex officio, altero a sentença de primeiro grau para ordenar que seja aplicado o Manual de Cálculos já reportado para juros e correção monetária do benefício previdenciário em discussão.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO interposto e, de ofício, reformo a sentença prolatada no que tange a modificação do índice de correção monetária.
Fixo os honorários recursais em 11%, posto que majoro o valor fixado em primeira instância em um ponto percentual.
É o voto.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator Convocado

CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARCIO DE OLIVEIRA MEIRELES
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FERNANDO NOLETO MARTINS - GO11110
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INOVAÇÃO PROCESSUAL EM FASE RECURSAL. VEDAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DE MATÉRIA NÃO LEVADA AO JUÍZO A QUO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. CTPS COM ANOTAÇÕES DE TRABALHO RURAL. PROVA PLENA. ÁREA SUPERIOR A 04 MODULOS FISCAIS. ENDEREÇO URBANO. UTILIZAÇÃO DO INPC PARA CORREÇÃO DE DÉBITOS PREVIDENCIÁRIOS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. A juntada ao recurso de fatos não arguidos em primeira instância infringe diretamente o disposto no art. 1.014 do CPC, já que não levado a conhecimento do magistrado a quo, tampouco se tratando de fato superveniente à sentença.
3. No que tange à caracterização da condição de segurado especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
4. A CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves Da Silva, Segunda Turma,e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo De Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar,e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
5. Quanto ao mais, considera-se provada a atividade rural de segurado especial do autor mediante prova material complementado por idônea prova testemunhal, restando suficientemente comprovada à atividade campesina do autor no número de meses necessários ao cumprimento da carência, razão pela qual o benefício lhe é devido.
6. Imóvel rural maior que 04 módulos fiscais, verifica-se dos autos que as propriedades rurais constantes nas certidões de inteiro teor, não mais pertencem ao apelado, desde a década de 90, conforme registros de transmissão de propriedade constantes nos referidos documentos. Já a Fazenda Martinez é de propriedade de terceiros, local em que o autor possui registro de empregado rural desde o ano de 2009, circunstância que não retira sua condição de segurado especial.
7.A respeito da alegação do recorrido apresentar endereço urbano, tenho que essa circunstância também não é suficiente para descaracterizar o labor rural em regime de subsistência, quando comprovado por início de prova material corroborado por idônea prova testemunhal.
8. Por se tratar de questão alusiva à ordem pública, altero de ofício a sentença para determinar a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal para atualização de juros e correção monetária, posto que atualizado em consonância com o Tema 905 do STJ.
9. Apelação a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação interposta, nos termos do voto do relator.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator Convocado
