
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:JOSEFA SELMA FRANCISCA PESSOA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: DANILO TENORIO DOS SANTOS - MT23996/O
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1003964-76.2024.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA SELMA FRANCISCA PESSOA
Advogado do(a) APELADO: DANILO TENORIO DOS SANTOS - MT23996/O
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo.
O recorrente suscita a prejudicial de prescrição da pretensão de rever o ato de indeferimento/cessação de benefício praticado há mais de cinco anos. No mérito, alega que a parte autora não comprovou os requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado. Pugna pela improcedência dos pedidos. Eventualmente, requer a observância da prescrição quinquenal, a intimação da parte autora para firmar autodeclaração quanto à acumulação de benefícios, a fixação de honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, a declaração de isenção de custas e taxas judiciárias e o desconto de valores pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável.
A parte autora não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1003964-76.2024.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA SELMA FRANCISCA PESSOA
Advogado do(a) APELADO: DANILO TENORIO DOS SANTOS - MT23996/O
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Da prescrição
A parte recorrente suscita a prejudicial de mérito de prescrição da pretensão de rever o ato de indeferimento/cessação de benefício praticado há mais de cinco anos.
Consoante o entendimento pacífico deste Tribunal, não há prescrição de fundo do direito em relação à concessão de benefício previdenciário, por ser este um direito fundamental, em razão de sua natureza alimentar.
Assim, a prescrição atinge apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação.
No caso, não ocorre a prescrição quinquenal das parcelas vencidas, tendo em vista que não transcorreu o prazo de cinco anos entre a data do ajuizamento da ação e da apresentação do requerimento administrativo.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 12/2/1966, preencheu o requisito etário em 12/2/2021 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 22/2/2021, o qual restou indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 3/10/2022, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: Saldo de exploração de bovinos (2022); Cartão de identificação do contribuinte, com início da atividade em 2014; Certidão de casamento, em 2003, com a indicação da profissão do esposo como lavrador; Escritura Pública de Convenção de Pacto Antenupcial de Separação de Bens, constando a profissão do esposo como lavrador (2016); Autodeclaração de segurado especial; Contrato de assentamento constando como beneficiária a parte autora, com firma reconhecida, datado de 2007; Comprovante de endereço rural; notas fiscais de produtora rural (2009/2008/2015/2018/2019).
Da análise dos documentos apresentados, vê-se que a certidão de casamento com a qualificação do esposo como lavrador em 2003; o contrato de assentamento constando como beneficiária a parte autora, com firma reconhecida, datado de 2007; e as notas fiscais de produtora rural (2009/2008/2015/2018/2019), constituem início razoável de prova material da sua condição de segurada especial.
Vale ressaltar que a qualificação de trabalhador rural do esposo estende-se à parte autora (regra de experiência comum), desde a data do casamento em 2003.
Recolhimentos como contribuinte individual (6/2005 a 12/2005; 5/2011 e 10/2011 a 11/2011), por curtos períodos, não descaracterizam a sua condição de segurada especial.
O início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pela parte autora pelo prazo necessário. Veja-se teor da sentença:
“Ainda, as testemunhas Nelson Camargo Lopes, Regina Pereira da Silva e Margarida Marcelino da Silva, ouvidas em Juízo, confirmaram que a autora exerce atividade rural em regime de economia familiar, notadamente cultivando hortaliças e criação de animais, através do que retira seu sustento, desde meados de 2002.”
Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurada especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
Dos pedidos eventuais
Não assiste razão ao INSS no que tange à exigência judicial de apresentação de autodeclaração, pois se trata de procedimento a ser realizado na esfera administrativa, inclusive por meio dos canais remotos de atendimento do INSS, nos termos do art. 62, parágrafo único da Portaria 450/2020.
A sentença já fixou os honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ.
Não há nos autos demonstração de recebimento pela parte autora de outro benefício inacumulável para fins de compensação. De todo modo, a sentença não obsta o desconto de valores pagos administrativamente ou a título de benefícios inacumuláveis, o que deverá ser demonstrado pelo INSS na fase de cumprimento do julgado.
Não cabe no caso a declaração de isenção de custas à autarquia, diante da alteração implementada pela Lei Estadual nº 11.077/2020 no artigo 3°, inciso I, da Lei Estadual n° 7.603/2001, que deixou de conferir isenção de custas à União no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
A sentença não merece reparo, pois já determinou a observância da jurisprudência atualizada quanto à incidência da correção monetária.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Ressalvando meu ponto de vista pessoal sobre a questão, “é cabível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais (art. 85, § 11, do CPC), impondo-se a majoração do percentual já fixado, relativo aos honorários advocatícios, independentemente de comprovação do efetivo trabalho adicional pelo advogado da parte recorrida, sendo devida mesmo quando não apresentadas contrarrazões” (AgInt nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 2.236.428/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 23/10/2023, DJe de 26/10/2023).
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, nos temos da fundamentação do voto.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1003964-76.2024.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA SELMA FRANCISCA PESSOA
Advogado do(a) APELADO: DANILO TENORIO DOS SANTOS - MT23996/O
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO.APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Consoante o entendimento pacífico deste Tribunal, não há prescrição de fundo do direito em relação à concessão de benefício previdenciário, por ser este um direito fundamental, em razão de sua natureza alimentar.
2. A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
3. O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material.
4. A parte autora, nascida em 12/2/1966, preencheu o requisito etário em 12/2/2021 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 22/2/2021, o qual restou indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 3/10/2022, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
5. Da análise dos documentos apresentados, vê-se que a certidão de casamento com a qualificação do esposo como lavrador em 2003; o contrato de assentamento constando como beneficiária a parte autora, com firma reconhecida, datado de 2007; e as notas fiscais de produtora rural (2009/2008/2015/2018/2019), constituem início razoável de prova material da sua condição de segurada especial. Vale ressaltar que a qualificação de trabalhador rural do esposo estende-se à parte autora (regra de experiência comum), desde a data do casamento em 2003.
6. Recolhimentos como contribuinte individual (6/2005 a 12/2005; 5/2011 e 10/2011 a 11/2011), por curtos períodos, não descaracterizam a sua condição de segurada especial.
7. O início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida que confirmou o exercício da atividade rural pela parte autora pelo prazo necessário.
8. Tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurada especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
9. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
