
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:IVONE FLAVIO DA CRUZ
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ROSENILDA PEREIRA DO LAGO - MT23616-A e JOAO RICARDO FILIPAK - MT11551-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009753-90.2023.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVONE FLAVIO DA CRUZ
Advogados do(a) APELADO: JOAO RICARDO FILIPAK - MT11551-A, ROSENILDA PEREIRA DO LAGO - MT23616-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria rural por idade, com termo inicial na data do requerimento administrativo.
O recorrente sustenta que os documentos apresentados pela parte autora são insuficientes para provar a sua condição de segurado especial. Assim, requer a reforma da sentença com a improcedência do pedido inicial.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009753-90.2023.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVONE FLAVIO DA CRUZ
Advogados do(a) APELADO: JOAO RICARDO FILIPAK - MT11551-A, ROSENILDA PEREIRA DO LAGO - MT23616-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 2/1/1959, preencheu o requisito etário em 2/1/2014 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 24/2/2019, o qual restou indeferido. Ajuizou a presente ação em 27/5/2020, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: Certidão de casamento, ocorrido em 26/7/1976, contendo a profissão do seu esposo de lavrador; e CTPS do seu esposo com registro de vínculos.
Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a certidão de casamento, contendo a qualificação profissional do seu esposo como lavrador, e a CTPS do esposo contendo vínculos rurais, registrados em seu CNIS entre: 6/1990 a 2/1993; 9/1994 a 12/1995; 5/1997 a 6/1997; 5/1999 a 7/2001; 7/2002 a 11/2005; 8/2006 a 8/2009; 10/2010 a 9/2011 e 8/2012 a 4/2017, constituem início razoável de prova material da sua condição trabalhador rural, a qual se estende à requerente desde a data do casamento, em 1976.
Ressalte-se que, consoante a jurisprudência deste Tribunal, a CTPS com anotações de trabalho rural é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. IDADE E ATIVIDADE RURAL COMPROVADAS. PROVA MATERIAL PLENA CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Comprovada a qualidade de trabalhador rural mediante prova material plena devidamente corroborada pela prova testemunhal produzida em juízo e a implementação do requisito etário exigido, deve ser reconhecido o direito do segurado à percepção do benefício.
2. As anotações contidas na CTPS da parte-autora, constando vínculos rurais, constituem prova plena do período nela registrado e podem projetar efeitos para períodos anteriores ou posteriores para fins de comprovação da atividade rural, não sendo necessário que a prova cubra todo o período de carência, desde que corroborada pela prova testemunhal firme e consistente.
3. Na hipótese, constata-se que a parte-autora atingiu a idade mínima e cumpriu o período equivalente ao prazo de carência exigidos em lei. A prova material plena, representada pelas anotações na CTPS/CNIS e o início razoável de prova material, representado pelos demais documentos catalogados à inaugural, corroborados por prova testemunhal idônea e inequívoca, comprovam a condição de segurada especial da parte-autora.
4. O termo inicial deve ser fixado a partir do requerimento administrativo, e, na sua ausência, a partir da citação, conforme definição a respeito do tema em decisão proferida pelo e.STJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, nos termos do art. 1.036, do CPC (REsp 1369165/SP), respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.
5. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% das prestações vencidas até a prolação da sentença de procedência ou do acórdão que reforma o comando de improcedência da pretensão vestibular.
6. Juros de mora e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
7. Apelação da parte-autora provida. (AC 1012163-68.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 13/09/2021).
No tocante à alegação do INSS de que a parte autora possui endereço urbano, registro, por oportuno, o entendimento adotado por este e. Tribunal no sentido de que o fato de a parte autora possuir endereço urbano não descaracteriza a sua qualidade de segurada especial, uma vez que a própria redação do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 prevê expressamente que o trabalhador rural pode residir tanto em imóvel rural quanto em aglomerado urbano próximo a área rural (AC 1000402-69.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 31/03/2023 PAG.).
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pela autora pelo prazo necessário à concessão do benefício. Veja-se teor da sentença:
“Segundo a testemunha ELIANE LOBO (ID 65744927): “Conheço a autora há uns 20 anos. Conheci em Ouro Branco, ela trabalhava na Fazenda. Ela era merendeira da Fazenda. Ela era casada com o Sr. Carmindo, ele também trabalhava na Fazenda. Ela morou e trabalhou nessa Fazenda há uns 20 anos. Eles têm galinhas, uma horta simples. As pessoas compram os produtos deles Eu já comprei produtos deles. Hoje eles moram na cidade, em Ouro Branco.”
A testemunha SILVIO AUGUSTO ALVES, também ouvido em audiência (ID 65744927), relatou: “Conheço a autora de 2000 a 2005. Eu trabalhava em plantações lá. Ela e o marido dela. Nessa época eles trabalhavam na região do Mineirinho, Fazenda Santa Maria. Eles trabalhavam em serviços gerais. Ela varria o terreiro. Depois de 2005, só encontrava ela vendendo ovo, hortaliças, quando ela ia até a cidade. Na Fazenda ela plantava hortaliças. Ela vendia para moradores. Minha esposa comprava ovos dela.”
Por fim, em juízo, a testemunha DJALMA PEREIRA DA SILVA confirmou: “Conheço a autora há uns 14, 15 anos. Conheci ela na Fazenda do Bustamante. Ela e o marido moravam na Fazenda. Ela mexia com porta, plantação e frangos. No momento, não sei se ela ainda planta e vende produtos.”
Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurada especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
DESPESAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Ressalvando meu ponto de vista pessoal sobre a questão, “é cabível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais (art. 85, § 11, do CPC), impondo-se a majoração do percentual já fixado, relativo aos honorários advocatícios, independentemente de comprovação do efetivo trabalho adicional pelo advogado da parte recorrida, sendo devida mesmo quando não apresentadas contrarrazões” (AgInt nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 2.236.428/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 23/10/2023, DJe de 26/10/2023).
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009753-90.2023.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVONE FLAVIO DA CRUZ
Advogados do(a) APELADO: JOAO RICARDO FILIPAK - MT11551-A, ROSENILDA PEREIRA DO LAGO - MT23616-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
2. A parte autora, nascida em 2/1/1959, preencheu o requisito etário em 2/1/2014 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 24/2/2019, o qual restou indeferido. Ajuizou a presente ação em 27/5/2020, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
3. Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: Certidão de casamento, ocorrido em 26/7/1976, contendo a profissão do seu esposo de lavrador; e CTPS do seu esposo com registro de vínculos.
4. Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a certidão de casamento, contendo a qualificação profissional do seu esposo como lavrador, e a CTPS do esposo contendo vínculos rurais, registrados em seu CNIS entre: 6/1990 a 2/1993; 9/1994 a 12/1995; 5/1997 a 6/1997; 5/1999 a 7/2001; 7/2002 a 11/2005; 8/2006 a 8/2009; 10/2010 a 9/2011 e 8/2012 a 4/2017, constituem início razoável de prova material da sua condição trabalhador rural, a qual se estende à requerente desde a data do casamento, em 1976.
5. Ressalte-se que, consoante a jurisprudência deste Tribunal, a CTPS com anotações de trabalho rural é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência, estendendo-se ao cônjuge.
6. No tocante à alegação do INSS de que a parte autora possui endereço urbano, registro, por oportuno, o entendimento adotado por este e. Tribunal no sentido de que o fato de a parte autora possuir endereço urbano não descaracteriza a sua qualidade de segurada especial, uma vez que a própria redação do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 prevê expressamente que o trabalhador rural pode residir tanto em imóvel rural quanto em aglomerado urbano próximo a área rural (AC 1000402-69.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 31/03/2023).
7. Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida que confirmou o exercício da atividade rural pelo autor, pelo prazo necessário à concessão do benefício.
8. Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurada especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
9. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
