
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ILTON DA SILVA GOMES e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CARITA PEREIRA ALVES - MT10531-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1021411-24.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ILTON DA SILVA GOMES, CLEIDIANE PINHEIRO DA SILVA COSTA
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DE SEGURIDADE SOCIAL em face da sentença que deferiu o benefício de pensão por morte ao cônjuge da parte autora desde a data do indeferimento administrativo do benefício de aposentadoria por idade rural formulado em 27/07/2018. Houve antecipação dos efeitos da tutela. Foi realizada audiência de instrução e julgamento em 19/04/2022 (Fl. 84).
Nas razões recursais (ID 247493019, Fls. 100/103), o recorrente alega, preliminarmente, a nulidade da sentença, uma vez que o pedido inicial se trata de aposentadoria por idade rural e não de pensão por morte. Sustenta que a sentença está eivada de vício (sentença extra petita), não havendo correlação entre o pedido e a decisão (art. 492 do Código de Processo Civil). No mérito, alega que o esposo da autora possui diversos vínculos de natureza urbana registrados no CNIS e que as notas fiscais apresentadas nos autos estão em nome de terceiros e que a certidão do INCRA informa que o casal desenvolveu atividades rurais no período de 09/07/1999 a 26/05/2003.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 247493019, Fls. 109/116).
É o relatório.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1021411-24.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ILTON DA SILVA GOMES, CLEIDIANE PINHEIRO DA SILVA COSTA
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Pretende a parte apelante o julgamento pela improcedência do pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade rural em face da não comprovação da qualidade de segurado especial, assim como seja anulada a sentença, uma vez que o pedido inicial foi de aposentadoria por idade rural e não de pensão por morte.
Não assiste razão ao apelante quanto à preliminar de nulidade da sentença por julgamento extra petita.
Conforme entendimento majoritário no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Federal, tratando-se de questões previdenciárias, é possível o magistrado ou o órgão colegiado conceder benefício diverso daquele pleiteado, sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita, atendidos os requisitos legais, em face da relevância da questão social que envolve a matéria e em tutela aos interesses da parte hipossuficiente.
Ressalta-se, também, que cabe ao INSS analisar o pedido da parte autora na esfera administrativa de acordo com os fins sociais a que se destina, inclusive, orientando-a pelo direito a benefício diverso ao que requerido. Assim, a autoridade judiciária condutora do feito deve sempre atentar para o deferimento do benefício que melhor corresponda à situação demonstrada nos autos, ainda que, tecnicamente, outro tenha sido postulado inicialmente, sendo de se aplicar, no direito previdenciário, dado seu caráter marcantemente social, a fungibilidade dos pedidos de benefício.
Quanto ao mérito, são requisitos para a concessão de aposentadoria ao trabalhador rural: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
Para a comprovação do tempo de serviço na qualidade de rurícola, o exercício de atividade rural alegado deve estar alicerçado em produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, quando se fizer necessária ao preenchimento de eventuais lacunas.
No que concerne aos documentos que fazem início de prova material, a jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer das suas formas, permite que documentos, ainda que não dotados de fé pública e não especificados no art. 106 da Lei n. 8.213/91, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário, desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais como: a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), a certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS), a declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Além disso, a Súmula 34 da TNU dispõe que, para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar e a Súmula 149 do STJ disciplina que "a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário."
Esse é o entendimento do STJ pacificado quanto à necessidade de se estar atuando como rurícola ao tempo do requerimento administrativo:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil. (STJ - REsp: 1354908 SP 2012/0247219-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 09/09/2015, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/02/2016 RT vol. 967 p. 584)
No caso dos autos, houve o implemento do requisito etário pela parte autora em 2017. Portanto, a carência a ser cumprida é de 180 meses, no período imediatamente anterior ao requerimento ou à data do implemento da idade mínima (Súmula 54 da TNU), ou seja, entre 2002 a 2017.
Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e da carência, a parte autora anexou aos autos: certidão de nascimento do filho no ano 1980, em que o genitor consta como lavrador, cuja fragilidade é patente, não se prestando a fazer prova do exercício da atividade rural no período de 2002 a 2017. As notas fiscais de compras de produtos agrícolas estão em nome de terceiros.
Ainda que o início de prova não precise corresponder a todo o período equivalente à carência do benefício (Súmula 14 da TNU), o tempo de exercício de atividade equivalente à carência deve ser aferido no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo 27/07/2018 - ou à data do implemento da idade mínima - 2017 - (Súmula 54 da TNU), o que não ocorreu no caso em concreto.
Observo, portanto, que as provas apresentadas não constituem início de prova material suficiente à comprovação da atividade rurícola alegada, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, ainda que corroboradas por prova testemunhal.
Nesse contexto, destaco que o STJ fixou no Tema Repetitivo nº 629 a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial (art. 283 do CPC/1973 e art. 320 do CPC/2015) implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC/1973 e art. 486 do CPC/2015), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Em 20/11/2019, foi noticiado o falecimento da parte autora Maria do Carmo de Jesus Pinheiro Gomes, ocorrido em 06/07/2019, e requerido a habilitação dos herdeiros na presente demanda. Em face da extinção da ação de aposentadoria por idade rural, fica prejudicada a apreciação do pedido de pensão por morte.
Mantenho a verba honorária fixada na sentença. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em face do entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.059 (Resp. n. 1865663/PR), segundo o qual a aplicação da norma inserta no art. 85, §11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal. Mantenho a concessão do benefício da justiça gratuita, ante a presença dos requisitos processuais autorizadores e, portanto, suspendo a exigibilidade da cobrança das verbas de sucumbência aqui fixadas, nos termos do § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil.
Assim, dou parcial provimento à apelação do INSS e extingo o processo, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade do segurado, nos termos do art. 485, IV, CPC/2015.
É como voto.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1021411-24.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ILTON DA SILVA GOMES, CLEIDIANE PINHEIRO DA SILVA COSTA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. FALTA DE QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Pretende a parte apelante a nulidade da sentença, uma vez que o pedido inicial foi de aposentadoria por idade rural e não de pensão por morte, o que representa em julgamento extra petita. Requer, ainda, o julgamento pela improcedência do pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade rural em face da não comprovação da qualidade de segurado especial.
2. Não assiste razão à parte apelante quanto ao pedido de nulidade da sentença por julgamento extra petita. Isso porque o entendimento majoritário no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Federal é o de que, caso se trate de questões previdenciárias, é possível ao magistrado ou ao órgão colegiado conceder benefício diverso daquele pleiteado, sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita, atendidos os requisitos legais, em face da relevância da questão social que envolve a matéria e em tutela aos interesses da parte hipossuficiente.
3. Assim, a autoridade judiciária condutora do feito deve sempre atentar para o deferimento do benefício que melhor corresponda à situação demonstrada nos autos, ainda que, tecnicamente, outro tenha sido postulado inicialmente, sendo de se aplicar, no direito previdenciário, dado seu caráter marcantemente social, a fungibilidade dos pedidos de benefício.
4. No mesmo sentido, cabe ao INSS analisar o pedido na esfera administrativa de acordo com os fins sociais a que se destina, inclusive orientando a parte requerente pelo direito de benefício diverso ao que requerido.
5. Passo à análise do mérito. São requisitos para a concessão de aposentadoria ao trabalhador rural: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
6. Houve o implemento do requisito etário em 2017; portanto, a parte autora deveria provar o período de 180 meses de atividade rural, conforme tabela progressiva do INSS (2002 a 2017).
7. Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e da carência, a parte autora anexou aos autos a certidão de nascimento do filho no ano 1980, em que o genitor está qualificado como lavrador, cuja fragilidade é patente, não se prestando a fazer prova do exercício da atividade rural no período de 2002 a 2017. Por sua vez, as notas fiscais de compras de produtos agrícolas estão, de fato, em nome de terceiros.
8. Observa-se, portanto, que as provas apresentadas não constituem início de prova material suficiente à comprovação da atividade rurícola alegada, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, ainda que corroboradas por prova testemunhal.
9. Assim, ausente o início de prova material, a sentença deve ser reformada, devendo a tutela antecipada ser revogada.
10. Nesse contexto, assento que o STJ fixou no Tema Repetitivo nº 629 a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial (art. 283 do CPC/1973 e art. 320 do CPC/2015) implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC/1973 e art. 485, IV, do CPC/2015) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC/1973 e art. 486 do CPC/2015), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
11. Desse modo, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade do segurado, nos termos do art. 485, IV, CPC/2015.
12. Em 20/11/2019, foi noticiado o falecimento da parte autora Maria do Carmo de Jesus Pinheiro Gomes, ocorrido em 06/07/2019. Foi deferida a habilitação do cônjuge Ilton da Silva Gomes na presente demanda. Em face da extinção da ação do benefício de aposentadoria por idade rural, fica prejudicada a apreciação do pedido do benefício de pensão por morte.
13. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para EXTINGUIR o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, IV, do CPC, nos termos do voto da relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
Desembargadora Federal CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
Relatora
