
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DOMINGAS LEITE ORTIZ DE CAMARGO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CELUTA CURADO BARROS FRANCO - GO20088
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011957-49.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DOMINGAS LEITE ORTIZ DE CAMARGO
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL em face de sentença que concedeu o benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural, desde a data do requerimento administrativo formulado em 28/09/2023. A tutela provisória foi deferida. A audiência de instrução e julgamento realizou-se em 16/06/2024.
Nas suas razões recursais (ID 420615997), a autarquia sustenta a preliminar de ausência de interesse de agir, pois no caso houve o indeferimento administrativo forçado. Afirma que a parte autora não apresentou a autodeclaração retificada pelo INSS, razão pela qual o processo deve ser extinto sem resolução do mérito. Alega, no mérito, que a parte autora não faz jus à qualificação de segurada especial, uma vez que o cônjuge possui veículo em nome próprio, assim como registros de vínculos formais de emprego no CNIS, o que descaracteriza o regime de economia familiar alegado.
Por fim, pede o provimento do recurso e a reforma da sentença a fim de julgar improcedentes os pedidos da inicial.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 420615997).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011957-49.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DOMINGAS LEITE ORTIZ DE CAMARGO
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Pretende o apelante a reforma da sentença que concedeu a aposentadoria por idade à segurado especial.
Quanto à preliminar de ausência de interesse de agir, embora o INSS alegue a necessidade de apresentação da autodeclaração por ele ratificada, em razão da alteração legislativa introduzida pela MP nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846/2019, que modificou os arts. 106 e 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e acrescentou os artigos 38-A e 38-B, não se mostra necessária a apresentação de prova documental específica, como pretende a autarquia. O exercício da atividade campesina pode ser comprovado mediante prova documental, ainda que inicial, corroborado por prova testemunhal, quando necessária. Preliminar de falta de interesse de agir rejeitada.
São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: ter 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
Para a comprovação do tempo de serviço na qualidade de rurícola, o exercício de atividade rural alegado deve estar alicerçado em produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, quando se fizer necessária ao preenchimento de eventuais lacunas.
Quanto aos documentos que fazem início de prova material, a jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer das suas formas, permite que documentos, mesmo que não dotados de fé pública e não especificados no art. 106 da Lei n. 8.213/91, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário, desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Impende então averiguar se há substrato probatório idôneo a ensejar o reconhecimento do exercício de atividade rural pelo tempo minimamente necessário ao gozo do benefício em questão, que, no caso, corresponde a 180 (cento e oitenta) meses, nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/1991.
O implemento do requisito etário ocorreu em 2023. Portanto, a parte autora deveria provar o período de 180 meses de atividade rural, conforme tabela progressiva do INSS (2008 a 2023).
Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e da carência, a parte autora anexou aos autos: notas de compras de produtos agropecuários datadas de 10/2020, 06/2021 (Fls. 14); notas promissórias das empresas Sementes Cambui, Agrotorres de 09/09/2021, 06/12/2021 e 04/07/2023 (Fl. 15); nota fiscal Casa do Criador de 13/10/2023 (Fl. 16); certificados - SENAR de 05/09/2005, 25/01/2006, 08/05/2017 e 27/06/2017 (Fls. 18/20, 22); comprovante de endereço rural referente a 06/2023 (Fl. 117); certidões de nascimento dos filhos, Aparecida Camargo de Brito, Divino Camargo de Brito e Adolfo Camargo de Brito Filho, ocorridos em 06/12/1984, 16/06/1986 e 04/06/1987, nas quais o genitor está qualificado como lavrador (Fls. 121/123); CTPS do cônjuge Cleomar de Jesus Rodrigues com anotações de vínculos como empregado rural de 01/11/1997 a 30/10/2022 (Fls. 146/151).
Embora a autora alegue viver somente da atividade campesina, da análise da CTPS do cônjuge, verifica-se que ele possui vínculos como empregado rural. Esses vínculos não aproveitam à parte autora, já que ele também não é segurado especial, não podendo ser extensível vínculos como empregado rural ao cônjuge. Em relação às anotações contidas na CTPS em estabelecimentos rurais, é importante fazer distinção entre empregado rural e segurado especial. Quanto ao primeiro, são necessárias as contribuições, ao passo que na segunda hipótese não. Para que fosse considerada segurada especial, seria necessário o exercício do trabalho rural em regime de economia familiar, artigo 11, § 1º, da Lei n.º 8.213/91, o que não ocorreu no caso dos autos. Some-se a isso o fato da existência de vínculo urbano anotado na CTPS da autora no período de 18/05/2007 a 01/04/2008, como auxiliar geral na empresa Bertin Ltda (Fl. 120).
Ressalta-se que o simples fato de a pessoa ter ligação com o campo, efetuar plantios e criar animais, por si só, não caracteriza a condição de lavradora de subsistência, quando fica comprovado que a parte não se enquadra nessa condição e que a fonte de renda da família provém de emprego alheio ao labor campesino, caso dos autos.
Assim, a situação demonstrada nos autos descaracteriza a alegada condição de segurada especial, tendo em vista que não houve a indispensabilidade do labor rural para a sobrevivência do grupo familiar. Tais elementos permitem concluir que, se a parte autora efetivamente exerceu alguma atividade rural, esta não era essencial para a subsistência do grupo familiar.
Ausentes os requisitos legais exigidos, o benefício se revela indevido.
No caso presente, houve deferimento da tutela antecipada, sendo, portanto, devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ, em que ficou decidido que: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
Inverto o ônus de sucumbência. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em face do entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.059 (Resp. n. 1865663/PR), segundo o qual a aplicação da norma inserta no art. 85, §11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal. Fica mantida a suspensão da exigibilidade da cobrança das verbas de sucumbência, nos termos do § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido formulado na inicial.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011957-49.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DOMINGAS LEITE ORTIZ DE CAMARGO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. FALTA DE QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. CÔNJUGE EMPREGADO RURAL. NÃO EXTENSÍVEL À ESPOSA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
1. Pretende o recorrente o acolhimento da preliminar de ausência de interesse de agir, em razão da existência de indeferimento administrativo forçado. Afirma que a parte autora não apresentou a autodeclaração por ele ratificada. No mérito, alega que a parte autora não é segurada especial, uma vez que o cônjuge possui veículo em nome próprio, assim como registros de vínculos formais de emprego no CNIS, o que descaracteriza o regime de economia familiar.
2. Quanto à preliminar de ausência de interesse de agir, embora o INSS alegue a necessidade de apresentação da autodeclaração por ele ratificada, em razão da alteração legislativa introduzida pela MP nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846/2019, que modificou os arts. 106 e 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e acrescentou os artigos 38-A e 38-B, não se mostra necessária a apresentação de prova documental específica, como pretende a autarquia. O exercício da atividade campesina pode ser comprovado mediante prova documental, ainda que inicial, corroborado por prova testemunhal, quando necessária. Preliminar de falta de interesse de agir rejeitada.
3. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador rural: ter 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
4. Houve o implemento do requisito etário em 2023. Portanto, a parte autora deveria provar o período de 180 meses de atividade rural, conforme tabela progressiva do INSS (2008 a 2023).
5. Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e da carência, a parte autora anexou aos autos: notas de compras de produtos agropecuários datadas de 10/2020, 06/2021; notas promissórias das empresas Sementes Cambui, Agrotorres de 09/09/2021, 06/12/2021 e 04/07/2023; nota fiscal Casa do Criador de 13/10/2023; certificados - SENAR de 05/09/2005, 25/01/2006, 08/05/2017, 27/06/2017; comprovante de endereço rural referente a 06/2023; certidões de nascimento dos filhos, Aparecida Camargo de Brito, Divino Camargo de Brito e Adolfo Camargo de Brito Filho, ocorridos em 06/12/1984, 16/06/1986 e 04/06/1987, nas quais o genitor está qualificado como lavrador e CTPS do cônjuge Cleomar de Jesus Rodrigues com anotações de vínculos como empregado rural de 01/11/1997 a 30/10/2022.
6. Embora a autora alegue viver somente da atividade campesina, da análise da CTPS do cônjuge, verifica-se que ele possui vínculos como empregado rural. Esses vínculos não aproveitam à parte autora, já que ele também não é segurado especial, não podendo ser extensível vínculos como empregado rural ao cônjuge. Em relação às anotações contidas na CTPS em estabelecimentos rurais, é importante fazer distinção entre empregado rural e segurado especial. Quanto ao primeiro, são necessárias as contribuições, ao passo que na segunda hipótese não. Para que fosse considerada segurada especial, seria necessário o exercício do trabalho rural em regime de economia familiar, artigo 11, § 1º, da Lei n.º 8.213/91, o que não ocorreu no caso dos autos. Some-se a isso o fato da existência de vínculo urbano anotado na CTPS da autora no período de 18/05/2007 a 01/04/2008, como auxiliar geral na empresa Bertin Ltda.
7. Ressalta-se que o simples fato de a pessoa ter ligação com o campo, efetuar plantios e criar animais, por si só, não caracteriza a condição de lavradora de subsistência, quando fica comprovado que a parte não se enquadra nessa condição e que a fonte de renda da família provém de emprego alheio ao labor campesino, caso dos autos.
8. Assim, a situação demonstrada nos autos descaracteriza completamente a alegada condição de segurada especial que se pretende demonstrar, tendo em vista que não houve a indispensabilidade do labor rural para a sobrevivência do grupo familiar. Tais elementos permitem concluir que, se a parte autora efetivamente exerceu alguma atividade rural, esta não era essencial para a subsistência do grupo familiar.
9. Ausentes os requisitos legais exigidos, o benefício se revela indevido, devendo o pedido ser julgado improcedente e a tutela antecipada ser revogada.
10. Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
