
POLO ATIVO: MARIA DE FATIMA PEREIRA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: PEDRO HENRIQUE GONCALVES - MT11999-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009805-28.2024.4.01.9999
APELANTE: MARIA DE FATIMA PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO HENRIQUE GONCALVES - MT11999-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MARIA DE FATIMA PEREIRA DA SILVA contra sentença na qual foi julgado improcedente o pedido de aposentadoria rural por idade, por ausência de prova material da condição de segurado especial.
A parte recorrente sustenta em suas razões que restou comprovado o exercício de atividade rural pelo tempo necessário ao deferimento do benefício. Assim, requer o provimento do recurso para que seja concedida a aposentadoria rural por idade.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009805-28.2024.4.01.9999
APELANTE: MARIA DE FATIMA PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO HENRIQUE GONCALVES - MT11999-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material, corroborado por prova oral.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 22/02/1958, preencheu o requisito etário em 22/02/2013 (55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 26/03/2014, o qual restou indeferido por ausência de comprovação de efetivo exercício de atividade rural. Ajuizou a presente ação em 23/05/2023, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos, entre outros, os seguintes documentos: cópia da ação previdenciária de concessão de aposentadoria por idade rural (nº 0002046-58.2013.811.0087), ajuizada pelo esposo da autora, julgada procedente para determinar a implantação do benefício de aposentadoria rural por idade desde 13/09/2013; notas fiscais de venda de leite in natura em nome do esposo emitidas em 2007, 2008, 2010; Termo de reconhecimento de dispensa de inscrição estadual de micro produtor rural (TDI) emitido pela Secretaria de Estado da Fazenda de Guarantã do Norte (MT) em 2007, informando que o esposo da autora apresentou documentos comprobatórios de que explora atividades rurais em área inferior a 100 hectares; certidão de casamento, em 22/03/1974, com indicação da profissão do esposo como comerciante; contrato de compra e venda de imóvel rural, constando o esposo da autora como vendedor do Sítio São Caetano, com firma reconhecida em 2011; contrato de compra e venda de imóvel rural (lote nº 606), constando a autora como vendedora, com firma reconhecida em 2011.
Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que as notas fiscais de venda em nome do esposo da autora; o Termo de reconhecimento de dispensa de Inscrição estadual de micro produtor rural (TDI) emitido pela Secretaria de Estado da Fazenda de Guarantã do Norte (MT) em 2007, informando que o esposo da autora apresentou documentos comprobatórios de que explora atividades rurais em área inferior a 100 hectares; os contratos de compra e venda de imóvel rural em nome da autora e do seu esposo, em 2011, constituem início razoável de prova material da condição de segurada especial da autora.
Ainda, a decisão judicial que concedeu o benefício de aposentadoria rural ao cônjuge da autora a partir de 2013 (autos nº 0002046-58.2013.811.0087), comprova a condição de trabalhador rural do seu esposo nos 180 meses anteriores (desde 1998), qualidade extensível à requerente pela regra de experiência comum, tendo em vista que se encontra casada desde o ano de 1974.
Vale ressaltar que os vínculos da autora com o Município em 1978 e 1980, não afastam a sua condição de trabalhadora rural, rural pelo período correspondente à carência do benefício, pois são anteriores ao início do exercício da atividade rural.
Registra-se ainda que a existência de veículo em nome do esposo da requerente (HYUNDAI/CRETA 20A PRESTIGE 2017/2017) não descaracteriza a condição de segurada especial. Isso porque, tratando-se de pequeno proprietário rural (segurado especial em regime de economia familiar), é razoável que, ao longo da vida, e após acréscimo de renda decorrente de aposentadoria, consiga adquirir veículos utilitários, compatíveis com as necessidades atinentes à atividade rurícola, tal como o de propriedade do seu esposo.
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova oral colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pelo prazo necessário à concessão do benefício.
A primeira testemunha declarou que conhece a autora há 18 anos, afirmou que a autora possui imóvel rural, com aproximadamente 30 alqueires; disse que a autora vendia leite; afirmou que o esposo da autora é aposentado e que eles possuem um veículo seminovo. A segunda testemunha declarou que conhece a autora desde os anos 2000, disse que ela possui imóvel rural, localizado a 30 quilômetros da cidade, medindo 30 alqueires, onde cria gado, galinha, tira leite e faz queijo; disse que conhece o esposo da autora que é aposentado.
Há, portanto, comprovação da qualidade de segurado especial da parte autora, na condição de trabalhador rural, durante o cumprimento do prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213, de 1991, possibilitando o deferimento do benefício postulado a partir da data do requerimento administrativo formulado 26/03/2014, ocasião em que a autora já cumpria todos os requisitos legais.
Da prescrição quinquenal
Tendo em vista que a presente ação foi ajuizada em 23/05/2023 e o requerimento administrativo foi apresentado em 26/03/2014, há de ser reconhecida a ocorrência de prescrição quinquenal das parcelas anteriores a 23/05/2018, nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991.
Logo, diante da robustez do conjunto probatório, a sentença deve ser reformada.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
CUSTAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
O INSS é isento de custas na Justiça Federal.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus, que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a prolação do acórdão de procedência.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora, a fim de lhe conceder aposentadoria por idade rural, a partir do requerimento administrativo apresentado em 26/03/2014, observada a prescrição quinquenal, nos termos da fundamentação acima.
Devem ser compensadas parcelas eventualmente pagas administrativamente e parcelas decorrentes de benefícios inacumuláveis recebidos no mesmo período.
Desnecessária a imposição de preenchimento de declaração de inacumulabilidade na esfera judicial.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009805-28.2024.4.01.9999
APELANTE: MARIA DE FATIMA PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO HENRIQUE GONCALVES - MT11999-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADA ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA ORAL. APOSENTADORIA DO CÔNJUGE COMO TRABALHADOR RURAL. DOCUMENTOS QUE INDICAM ATIVIDADE RURÍCOLA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. REFORMA DA SENTENÇA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. APELAÇÃO PROVIDA.
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Para a concessão de aposentadoria por idade rural, exige-se o preenchimento da idade mínima e a comprovação do exercício de atividade rural pelo período correspondente à carência, conforme art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142 da Lei nº 8.213/91.
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A qualidade de segurado especial pode ser comprovada por início de prova material, como documentos que indiquem a prática de atividades rurais, e prova testemunhal que corrobore o efetivo exercício da atividade campesina.
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A concessão de aposentadoria rural ao cônjuge como trabalhador rural constitui início de prova material para a requerente, conforme a regra de experiência comum, sendo extensível à autora.
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A prescrição quinquenal incide sobre as parcelas anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação, conforme art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991.
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Apelação provida para conceder a aposentadoria por idade rural desde a data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
Tese de julgamento:
“1. A concessão de aposentadoria rural por idade depende da comprovação de início de prova material, corroborada por prova oral, demonstrando o exercício de atividade rurícola pelo período de carência.
2. A concessão de aposentadoria rural ao cônjuge como trabalhador rural pode ser considerada como prova extensível ao requerente.
3. A prescrição quinquenal atinge as parcelas anteriores aos cinco anos que antecederam o ajuizamento da ação.”
Legislação relevante citada:
Lei nº 8.213/1991, art. 48, §§ 1º e 2º
Lei nº 8.213/1991, art. 142
Lei nº 8.213/1991, art. 103, parágrafo único
Emenda Constitucional nº 113/2021, art. 3º
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.719.021/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 23/11/2018
STF, RE 870.947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, j. 20/09/2017 (Tema 810)
STJ, REsp 1.495.146/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/02/2018 (Tema 905)
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator