
POLO ATIVO: RAIMUNDA MACEDO DOS REIS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MARCIO AUGUSTO MALAGOLI - TO3685-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCIO AUGUSTO MALAGOLI - TO3685-A
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003150-16.2019.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: RAIMUNDA MACEDO DOS REIS e outros
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS em face da sentença (ID 12411960, fls. 54-57), na qual foi julgado procedente o pedido de benefício de aposentadoria por idade rural, devido a partir do indeferimento do requerimento administrativo, correção monetária de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal e honorários sucumbenciais fixados em 10% (dez por cento) sobre a condenação.
Em suas razões, o INSS afirma não haver provas suficientes de exercício de atividade rural para configurar o direito ao benefício pleiteado, além de pugnar pela correção monetária com base no art. 1º-F da Lei n. 9.4941/91, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009 (ID 12411960, fls. 71-81).
Também foi apresentada apelação pela autora, pleiteando a reforma parcial da sentença, a fim de que o benefício lhe seja concedido a partir do ajuizamento da ação, e não do requerimento administrativo. Requereu, ainda, a majoração dos honorários para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação (ID 12411960, fls. 65-69).
Foram apresentadas contrarrazões (ID 12411960, fls. 87-93).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003150-16.2019.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: RAIMUNDA MACEDO DOS REIS e outros
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Sentença proferida na vigência do CPC/2015, remessa necessária não aplicável.
São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (cento e oitenta contribuições) correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91).
A concessão do benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material outros documentos além daqueles da Lei n. 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
Ressalte-se, ainda, que “para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea” (STJ, AgInt no AREsp 852.494/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 09/12/2021).
No presente caso, para fins de comprovação da atividade rural, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos: carteira de identidade com registro de nascimento em 15/02/43; sua certidão de nascimento, na qual consta a profissão do seu pai como “lavrador”; certidão de casamento celebrado em 22/06/72; declaração do proprietário da Fazenda Cachoeira, na zona rural de Araguacema/TO, de que a autora trabalhava como lavradora, cultivando lavoura para subsistência da família de 18/06/93 a 14/10/97; Declaração de atividade rural no período de 18/06/93 a 14/10/97, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Araguacema/TO; informação do INSS certificando a aposentadoria rural por idade de seu marido em 08/10/2004; certidão de óbito de seu marido em 03/08/2005, qualificado como lavrador aposentado.
Tais documentos demonstram que a autora nasceu em família de lavradores, sempre morou e trabalhou na roça, juntamente com seu marido, em atividade rural para subsistência.
Ademais, pelo sistema de informações do INSS, verifica-se que o marido da autora recebia aposentadoria rural por idade desde 08/10/2004, reconhecida de sua qualidade de segurado especial, que é extensível à esposa. Também consta, em sua certidão de óbito de 03/08/2005, a sua qualificação de lavrador aposentado.
As testemunhas ouvidas em Juízo foram firmes e convincentes em atestar o trabalho rural da parte autora pelo período de carência previsto na Lei n. 8.213/91.
Dessa forma, o conjunto probatório revela o cumprimento do requisito etário, o exercício do labor rural, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91, de modo que atendidos os requisitos indispensáveis à concessão do benefício previdenciário - início de prova material apta a demonstrar a condição de rurícola da parte autora, corroborada por prova testemunhal, e idade mínima -, é devido o benefício de aposentadoria por idade, devendo ser mantida a sentença de procedência.
Quanto à apelação da autora, pleiteando que o benefício seja concedido a partir do ajuizamento da ação (19/08/2011), e não do pedido administrativo (19/08/2016), razão lhe assiste.
Nos termos da Lei n. 8.213/91, art. 49, II, o benefício previdenciário pleiteado é devido a partir da data do requerimento administrativo - observada a prescrição quinquenal - e, na sua ausência, a partir do ajuizamento da ação, em observância ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmado no RE 631240, respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.
Com efeito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida, firmou entendimento no sentido de que o prévio requerimento administrativo é condição para o acesso ao Judiciário. Ressalvou, todavia, a necessidade de modulação no período de transição, referente àquelas ações protocoladas antes da publicação do julgado (Tema 350). Vejamos:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima – itens (i), (ii) e (iii) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora – que alega ser trabalhadora rural informal – a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.”
(RE 631240-MG, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, DJe 10/11/2014). (grifo nosso)
Assim, o termo inicial do benefício (DIB) deve ser fixado a partir do ajuizamento da ação, nas hipóteses em que o requerimento administrativo foi formulado apenas no curso do processo, em observância ao entendimento do Supremo Tribunal Federal firmado no RE 631.240.
No caso, a ação foi proposta sem o prévio requerimento administrativo, que somente foi protocolado no curso do processo, após determinação desta Corte em sede recursal. Assim, após o retorno dos autos à origem, foi apresentado o requerimento administrativo e seu indeferimento, para o prosseguimento do feito, quando então foi proferida a sentença ora recorrida.
Dessa forma, deve-se reconhecer à parte autora o direito ao recebimento das diferenças do seu benefício previdenciário a partir do ajuizamento da ação (19/08/2011), observada a prescrição quinquenal.
Correção monetária e juros moratórios conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai dos julgamentos do STF (Tema 810) e do STJ (Tema 905) e, após 09/12/2021, com o disposto na EC 113/2021, art. 3º.
Mantidos os honorários advocatícios sucumbenciais arbitrados pelo juízo a quo, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, a incidirem sobre as prestações vencidas até a sentença (Súmula 111/STJ).
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS, e dou parcial provimento à apelação da autora, para constar na sentença a data do ajuizamento da ação como termo inicial do benefício previdenciário, respeitada a prescrição quinquenal.
É como voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003150-16.2019.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: RAIMUNDA MACEDO DOS REIS e outros
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADA ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR COMPROVADO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. BENEFÍCIO DEVIDO. REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 350/STF - RE 631.240/MG). REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO FORMULADO NO CURSO DO PROCESSO. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovação de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (180 contribuições mensais) correspondentes à carência do benefício pretendido a teor do art. 48, §§ 1º e 2º, c/c art. 142 da Lei n. 8.213/91.
2. O trabalho rural, observado o período de carência, deve estar demonstrado por início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
3. Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material, outros documentos além daqueles constantes do art. 106 da Lei n. 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
4. Ressalte-se, ainda, que “para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea” (STJ, AgInt no AREsp 852.494/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 09/12/2021).
5. Pelo sistema de informações do INSS, verifica-se que o marido da autora recebia aposentadoria rural por idade desde 08/10/2004, reconhecida de sua qualidade de segurado especial, que é extensível à esposa. Também consta, em sua certidão de óbito de 03/08/2005, a sua qualificação de lavrador aposentado.
6. No caso dos autos, a parte autora comprovou o efetivo exercício de atividade rural, cumprindo-se a carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, reforçada pela prova testemunhal, consoante o entendimento jurisprudencial já sedimentado nesta Corte, devendo ser mantida a sentença de procedência.
7. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida, firmou entendimento no sentido de que o prévio requerimento administrativo é condição para o acesso ao Judiciário. Ressalvou, todavia, a necessidade de modulação no período de transição, referente àquelas ações protocoladas antes da publicação do julgado (Tema 350).
8. Assim, o termo inicial do benefício (DIB) deve ser fixado a partir do ajuizamento da ação, nas hipóteses em que o requerimento administrativo foi formulado apenas no curso do processo, em observância ao entendimento do Supremo Tribunal Federal firmado no RE 631.240/MG, respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.
9. Correção monetária e juros moratórios conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai dos julgamentos do STF (Tema 810) e do STJ (Tema 905) e, após 09/12/2021, com o disposto na EC 113/2021, art. 3º.
10. Mantidos os honorários advocatícios sucumbenciais arbitrados pelo juízo a quo, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, a incidirem sobre as prestações vencidas até a sentença (Súmula 111/STJ).
11. Apelação do INSS desprovida, e apelação da autora parcialmente provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, e dar parcial provimento à apelação da autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
