
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:FRANCISCO PEREIRA DE FRANCA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1010764-57.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0600789-51.2022.8.04.3700
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:FRANCISCO PEREIRA DE FRANCA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural.
Em suas razões, requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de que o autor não preenche os requisitos necessários à concessão da aposentadoria rural por idade.
Regularmente intimado, o recorrido apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PROCESSO: 1010764-57.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0600789-51.2022.8.04.3700
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:FRANCISCO PEREIRA DE FRANCA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente à aposentadoria rural.
Nada obstante o ditame do art. 38-B, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 rezar que “a partir de 1º de janeiro de 2023, a comprovação da condição e do exercício da atividade rural do segurado especial ocorrerá, exclusivamente, pelas informações constantes do cadastro a que se refere o art. 38-A desta Lei” - sendo que o aludido repositório é o Cadastro Nacional de Informações Sociais, CNIS -, admite-se, para momentos anteriores de labor o uso de outras modalidades probatórias (art. cit, § 2º). Tal se mostra compreensível dada a precariedade da inserção efetiva de elementos testificadores de trabalho campesino a quem o desenvolve, sobretudo quando se tratar de exercício da atividade em localidades afastadas, insertas a grandes distâncias dos centros urbanos.
Consignada dita premissa, convém destacar que a jurisprudência admite como requisitos para a aposentadoria rural: 1) a idade (se homem 60 anos e se mulher 55 anos, conforme art. 201, § 7º, II, da Lei Maior e art. 48,§ 1º, da Lei nº 8213/91); 2) a carência (arts. 48, 142 e 143 todos da Lei de Benefícios da Previdência Social). Nesta trilha conferir, todos do STJ e da lavra do Min. Herman Benjamin: REsp1803581, 2ª T, DJE de 18/10/2019; AREsp 1539221, 2ª T, DJE 11/10/2019; AREsp 1539106, 2ª T, DJE 11/10/2019; e AREsp 1538240, 2ª T. DJE 11/10/2019.
De outra perspectiva, não se olvide que o(a) trabalhador(a) deve permanecer “...nas lides campesinas até o momento imediatamente anterior ao requerimento ou até às vésperas do preenchimento do requisito etário(...”), pois, o STJ, através da Primeira Seção, no julgamento do REsp. 1.354.908/SP, sob o rito do art. 543-C do CPC, DJe 10/02/2016, Rel. Min. MAURO CAMBPELL MARQUES, consolidou o entendimento no sentido de que apenas se revela possível excetuar a regra que impõe o exercício de atividade rural até o momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo na hipótese em que o segurado tenha desenvolvido seu mister no campo pelo número de meses correspondente ao exigido para fins de carência, até o momento em que implementado o requisito etário. Trata-se de resguardar o direito adquirido daquele que, não obstante o cumprimento dos requisitos necessários, não tenha requerido, de imediato, a aposentadoria rural por idade”. (AIREsp 1786781, STJ, Rel. Min. Sergio Kukina, 1ª T, DJE de 02/09/2019).
No caso dos autos, a sentença de primeira instância reconheceu o labor rural exercido pelo autor levando em consideração a instrução do processo com início de prova material do efetivo labor rural, o que, corroborado pelas provas testemunhais, seria suficiente para a comprovação da alegada condição de segurado especial pelo período de carência necessário.
A controvérsia recursal, portanto, reside na comprovação ou não do exercício de atividade rural pelo período de carência a ser demonstrado no caso.
De acordo com o disposto no art. 142 da Lei 8.213/91, o segurado deverá comprovar a carência respectiva de contribuições mensais, de acordo com a tabela estabelecida e com o ano da implementação do requisito (que pode variar de 60 meses a 180 meses).
Vale registrar que o autor, nascido em 7/11/1948, implementou o requisito etário para aposentadoria rural no ano de 2008, razão pela qual, para fazer jus ao benefício deve comprovar carência pelo período de 162 meses imediatamente anterior ao adimplemento do requisito etário ou da DER.
Embora sustente que preenche os requisitos para aposentadoria rural por idade, verifica-se que o autor implementou requisito etário no ano de 2008, quando em gozo do benefício assistencial de amparo ao deficiente – BPC LOAS.
Conforme CNIS acostado pelo próprio autor às fls. 31 e 32 da rolagem única, ele recebeu BPC-LOAS ao deficiente de 11/2002 até 10/2021.
O benefício em questão, por sua própria natureza, é incompatível com a qualidade de segurado especial, descaracterizando-a em razão do impedimento (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos), incompatível com o árduo labor rural.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO DE APELAÇÃO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. LEI 8.213/91. INICÍO DE PROVA MATERIAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL NÃO COMPROVADA. AUTOR RECEBEU LOAS DEFICIENTE ENTRE 1996 E 2009. PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. JUSTIÇA GRATUITA. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o seu pedido de aposentadoria por idade rural, nos termos do art. 487, I, do CPC. 2. São requisitos para aposentadoria de trabalhador (a) rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91). 3. Na hipótese dos autos, a parte autora, nascida em 03/04/1948, completou 60 anos em 03/04/2008, e requereu o benefício na via administrativa em 29/04/2009, correspondendo o período de carência, portanto, a 162 meses, a contar de 1995 2008. Entretanto, em que pese o cumprimento do requisito etário, não há como reconhecer o direito pleiteado. 4. Com a finalidade de comprovar o exercício de atividade rural durante o período de carência, por meio de início de prova material, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos: certidão de casamento realizado em 08/10/1969, contando sua profissão como lavrador; certidão de nascimento da filha do autor, ocorrido em 22/10/1990, indicando o autor como lavrador; carteira de filiação ao sindicato dos trabalhadores rurais desde 2005; carteira de vinculação à Associação Comunitária desde 1995; contrato particular de compra e venda; ITRs em nome próprio a partir do ano de 1992. 5. No caso dos autos, embora a parte autora tenha juntado documentação que, em princípio, pode configurar início de prova material de atividade rurícola, consoante previsão do art. 39, I, da Lei 8.213/91, bem como entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais, a concessão de benefício de amparo social à pessoa portadora de deficiência ao autor, durante treze anos ininterruptos, entre 1996 a 2009, conforme se observa do extrato de CNIS e o espelho do INFBEN juntado aos autos, justamente no período de carência, desqualifica o alegado exercício de atividade rurícola em regime de economia familiar. 6. Com efeito, os argumentos apresentados pela parte autora não infirmam os fundamentos da sentença, que assim dispôs: “[...] Contudo, em que pese os fartos documentos atestando a qualidade de segurado especial do requerente, a referida documentação não é suficiente para comprovação de que até a data de entrada do requerimento administrativo o demandante já tinha implementado os requisitos necessários para a aposentadoria rural, cumprido o período mínimo de carência exigido pela legislação. 26 - Em verdade, investigando o fólio é possível se constatar que gozou de benefício de amparo social concedido à pessoa portadora de deficiência durante treze anos ininterruptos, entre 1996 a 2009, conforme se observa do extrato de CNIS e o espelho do INFBEN, ambos de ID 28722784. 27- Pela natureza jurídica do referido benefício assistencial, por óbvio o requerente não possuía condições do exercício de qualquer atividade labora. É o que se observa, inclusive, do seu depoimento pessoal, quando o demandante afirma, explicitamente, "que que ficou encostado por treze anos e depois o benefício foi cortado, apesar do problema de saúde; que durante o período que ficou encostado não podia trabalhar" (Termo de Audiência de ID 28722812).”. 7. Publicada a sentença na vigência do atual CPC (a partir de 18/03/2016, inclusive) e desprovido o recurso de apelação, majoro os honorários arbitrados na origem em 1% (um por cento), cuja exigibilidade fica suspensa em razão do deferimento da gratuidade de justiça. 8. Apelação da parte autora desprovida. (AC 1023275-97.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIS GUSTAVO SOARES AMORIM DE SOUSA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 03/05/2023 PAG.)
PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL. LOAS-DEFICIENTE. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. A comprovação da qualidade de trabalhador rural ocorre mediante início de prova material devidamente corroborado pela prova testemunhal produzida em juízo, bem assim a implementação do requisito etário exigido. 2. Na hipótese, a parte-autora cumpriu o requisito etário. Todavia, o início de prova material apresentado não serviu para a comprovação da sua qualidade de segurada especial no período equivalente ao prazo de carência, eis que a parte-autora recebeu benefício de LOAS-Deficiente em período compreendido no prazo de carência. O benefício em questão é incompatível com qualidade de segurado especial, pois descaracteriza a condição de trabalhador rural em regime de economia familiar, em razão dos impedimentos (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos) haja vista que o óbice físico é incompatível com o árduo labor rural. Tendo em conta a ausência da prova material hábil a comprovar o exercício da atividade campesina, a parte-autora não faz jus ao benefício vindicado. 3. Diante da ausência de documentos que demonstrem atividade rural da parte-autora não se reconhece o direito ao benefício de aposentadoria rural por idade, eis que não é admitida prova exclusivamente testemunhal para tal fim (Súmula 27 do TRF/1ª Região e 149/STJ). 4. Considerado o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationais, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes. 5. A concessão ex-ofício da tutela antecipada na sentença não autoriza a devolução do valores desembolsados pelo INSS, haja vista se tratar de verba de natureza alimentar. Precedentes do STF. 6. Os honorários advocatícios devem ser fixados em R$ 300,00 (trezentos reais), a serem pagos pela parte autora ao INSS, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do CPC. 7. Apelação do INSS provida para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido. (AC 1000808-61.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 28/10/2021 PAG.)
Assim, a parte autora não se desincumbiu de comprovar a sua qualidade de segurado especial, a exercer atividade rural em regime de economia familiar no período de carência exigido para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Posto isto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO do INSS para, reformando a sentença, julgar improcedentes os pedidos iniciais por falta de comprovação da qualidade de segurado especial no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário.
Em razão do provimento recursal, inverto o ônus da sucumbência, consignando que a exigibilidade fica suspensa em razão de ser o apelado beneficiário da assistência judiciária gratuita.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1010764-57.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0600789-51.2022.8.04.3700
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:FRANCISCO PEREIRA DE FRANCA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. QUALIDADE NÃO COMPROVADA. PERCEPÇÃO DE LOAS-DEFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. Embora sustente que preenche os requisitos para aposentadoria rural por idade, verifica-se que o autor implementou requisito etário no ano de 2008, quando em gozo do benefício assistencial de amparo ao deficiente – BPC LOAS, percebido de 11/2002 até 10/2021, conforme CNIS colacionado aos autos pelo próprio autor (fls. 31 e 32 da rolagem única).
3. O benefício em questão, por sua própria natureza, é incompatível com a qualidade de segurado especial, pois descaracteriza a condição de segurado especial em razão do impedimento (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos), incompatível com o árduo labor rural. Precedentes.
4. Apelação a que se dá provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação interposta, nos termos do voto do relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
