
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LUZIA ROMERO PAULINO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: NATHALIA FILGUEIRAS FIGUEIREDO YAMAMOTO - GO39059-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1022444-49.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido inicial de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo (fls. 148/149).
Em suas razões, a autarquia previdenciária requer o recebimento do seu recurso no duplo efeito. No mérito, pretende a reforma da sentença para que o pedido que seja julgado improcedente, sustentando a ausência de prova material contemporânea e idônea do labor rural em regime de economia familiar (fls. 156/161).
Contrarrazões apresentadas às fls. 163/167.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo, portanto, ser conhecido.
Mérito
Da aposentadoria rural por idade
A concessão desse benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade a partir de 60 anos, para homem, e de 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Da carência
Esse requisito legal deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida:
“O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Do regime de economia familiar
Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Das provas
Para o reconhecimento do tempo rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei n. 8.213/91 é meramente exemplificativo (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício da atividade rural, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge ou companheiro como trabalhador rural.
O caso em exame
A parte autora, nascida em 10/07/1962, implementou o requisito etário em 10/07/2017 (55 anos), tendo formulado o requerimento administrativo do benefício em 05/09/2019.
Para a comprovação da qualidade de segurada e do período de carência, a autora apresentou, entre outros, os seguintes documentos: a) Certidão de casamento com Cilso Porfírio Paulino, realizado em 1979, com qualificação deste como lavrador; b) Cópia da carteira de trabalho do seu esposo, consignando o exercício de atividades em pecuária nos anos de 1986, 1996 e 2013; c) Documento de concessão de benefício do seu esposo, datado em 2019; e d) Fatura de consumo de energia elétrica com endereço rural, do ano de 2019.
Além disso, verifica-se que a Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS do cônjuge da parte autora, com registros de vínculos como trabalhador rural em agropecuária, constitui prova plena do exercício de atividade laborativa rural no período de carência necessário à concessão do benefício, a saber: de 01/1980 a 10/1981, de 07/1986 a 12/1992, de 12/1996 a 09/2008, de 04/2009 a 08/2012 e entre 03/2013 e 02/2019.
De fato, conforme entendimento jurisprudencial, a CTPS, com registros de vínculos rurais, deve ser considerada como prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (AC 1012163-68.2021.4.01.9999 Rel. Desembargador Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 13/09/2021).
Assim sendo, restando demonstrada a condição de empregado rural do cônjuge da parte autora durante o período de carência, conforme previsão do art. 142 da Lei 8.213/91, torna-se evidente o direito da demandante na percepção do benefício de aposentadoria rural por idade, correspondente a um salário mínimo, conforme disposto na sentença.
Sobre o tema, merece destaque o seguinte julgado desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO INSS. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. VÍNCULOS URBANOS CURTOS INTERCALADOS COM ATIVIDADE RURAL. POSSIBILIDADE. ESPOSO COM VINCULOS RURAIS NA CTPS CONDIÇÃO EXTENSÍVEL AO CÔNJUGE. BENEFÍCIO DEVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovação de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (180 contribuições mensais) correspondentes à carência do benefício pretendido a teor do art. 48, §§ 1º e 2º, c/c art. 142 da Lei 8.213/91. 2. O trabalho rural, observado o período de carência, deve estar demonstrado por início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. 3. Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material, outros documentos além daqueles constantes do art. 106 da Lei 8.213/91 (rol meramente exemplificativo). 4. Ressalte-se, ainda, que para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea.. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 16/11/2021, DJe de 9/12/2021.). 5. No presente caso, não há dúvidas quanto ao preenchimento do requisito etário. Para comprovar a qualidade de trabalhador rural, foram acostados aos autos: CTPS da autora com alguns registros de vínculos em estabelecimentos voltados à pecuária e outros como doméstica, certidão de casamento da autora com Valdivino Rodrigues da Silva e certidão de nascimento do filho do casal. 6. Consta dos autos, ainda, extrato de CNIS do esposo da autora, no qual estão inseridos diversos vínculos como trabalhador da agropecuária nos anos de 2007, 2011, 2012, 2013, 2020, 2021 e 2022. 7.A jurisprudência dominante deste Tribunal entende que a CTPS com anotações de trabalho rural é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (AC 1012163-68.2021.4.01.9999 Rel. Desembargador Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 13/09/2021). 8. Está pacificado nesta Corte o entendimento de que a condição de rurícola é extensível ao cônjuge, razão pela qual a prova da atividade rural de Valdivino Rodrigues da Silva beneficia a autora. 9. O exercício de atividade rural intercalado com curtos períodos de atividade urbana da parte autora, não descaracteriza a condição de segurado especial, ou seja, não se tornam empecilhos para seu reconhecimento. Nesse sentido: ...eventuais registros no CNIS de vínculos urbanos esparsos e exíguos não infirmam a condição de trabalhador rural do segurado nessa condição, na hipótese em que o acervo probante presente nos autos aponte para essa direção. (TRF 1ª R.; AC 0033317-76.2017.4.01.9199; Câmara Regional Previdenciária da Bahia; Rel. Juiz Fed. Conv. Saulo José Casali Bahia; DJF1 29/01/2020). 10. A prova testemunhal corroborou o início de prova material, o que, aliado ao requisito etário, assegura o direito ao benefício. 11. Juros e correção monetária fixados de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810 da repercussão geral) e do REsp. 1.495.146-MG (Tema 905). 12. Manutenção dos honorários advocatícios arbitrados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC. 13. Apelação do INSS a que se nega provimento. (AC 1015212-49.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 10/04/2024 PAG.)
Ademais, cumpre ressaltar que a prova testemunhal confirmou o labor rural da demandante, conforme se pode constatar dos seguintes termos da sentença (fls. 148/149):
“Em audiência de instrução, as testemunhas ouvidas foram suficientes para comprovar que a autora exerce atividade rural. Aliada a prova testemunhal a esses documentos, tenho como atendida a exigência do § 3º do art. 55 da Lei em foco, que tão-só admite a comprovação do tempo de serviço quando baseada em início de prova material, prova esta que reputo consubstanciada nos aludidos documentos, de índole rural, que, por certo, se prestam a demonstrar a existência de labor rural, aliada à prova testemunhal, que foi uníssona em afirmar que a parte autora sempre exerceu o labor rural.”
Sendo assim, não merece reforma a sentença no tocante à concessão do benefício de aposentadoria rural por idade à parte autora.
Finalmente, em relação à correção monetária e aos juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas, deverão ser aplicados os índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
Com esses fundamentos, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS. Altero, de ofício, a sentença recorrida, para que os índices dos juros e da correção monetária incidentes sobre as parcelas vencidas sejam aplicados em conformidade com o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Fixo os honorários advocatícios recursais, devidos pelo INSS, em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da condenação.
É como voto.
Brasília,
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
145APELAÇÃO CÍVEL (198)1022444-49.2022.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
LUZIA ROMERO PAULINO
Advogado do(a) APELADO: NATHALIA FILGUEIRAS FIGUEIREDO YAMAMOTO - GO39059-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. SENTENÇA JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO. CTPS DO CÔNJUGE COM REGISTRO DE ATIVIDADE RURAL DURANTE O PERÍODO DE CARÊNCIA. PROVA PLENA DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
1. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91).
2. Conforme entendimento jurisprudencial, a CTPS, com registros de vínculos rurais, deve ser considerado como prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (AC 1012163-68.2021.4.01.9999 Rel. Desembargador Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 13/09/2021). Ademais, "Está pacificado nesta Corte o entendimento de que a condição de rurícola é extensível ao cônjuge[...]" (AC 1015212-49.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 10/04/2024 PAG.).
3. Restando demonstrada a condição de empregado rural do cônjuge da parte autora, durante o período de carência, conforme previsão do art. 142 da Lei 8.213/91, torna-se evidente o direito da demandante à percepção do benefício de aposentadoria rural por idade, correspondente a um salário mínimo, conforme disposto na sentença.
4. Com efeito, comprovado o implemento da idade mínima, o exercício de atividade rural e o cumprimento da carência exigida para a concessão do benefício postulado, deve ser concedida aposentadoria rural por idade.
5. As parcelas vencidas devem ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora mediante a utilização dos índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
6. Apelação interposta pelo INSS a que se nega provimento. Alteração, de ofício, da sentença recorrida, apenas para determinar a aplicação dos índices do Manual de Cálculos da Justiça Federal sobre as parcelas vencidas.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
