
POLO ATIVO: DINAIR DE FATIMA PIO GONCALVES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LAIRA CRISTINA RODRIGUES - GO38318-A e DENISE OLIVEIRA ALVES TRINDADE - GO13074-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício previdenciário de aposentadoria rural por idade.
Em suas razões recursais, a apelante arguiu ter comprovado a sua qualidade de segurada especial com o início de prova material corroborada por prova testemunhal produzida nos autos. Requereu a reforma da sentença para que seja julgado procedente o pedido inicial.
Sem contrarrazões do INSS.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA (RELATOR CONVOCADO):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido.
Além disso, a concessão do benefício independe do recolhimento de contribuição previdenciária, nos termos do art. 26, III c/c art. 39, da Lei 8.213/91; porém, quanto ao tempo de exercício de atividade rural, exige-se início razoável de prova material, completada por prova testemunhal idônea, não se admitindo, portanto, prova meramente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, Súmulas 149 e 27 do STJ e TRF da 1ª Região, respectivamente).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
Não configuram início de prova material os documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário e demais provas que não trazem a segurança jurídica necessária à concessão do benefício.
Da situação tratada
A parte autora alega, em síntese, que interpôs requerimento administrativo em 08/12/2021 (rolagem única Pje/TRF-1, p. 105/106) sendo este indeferido pela Autarquia Previdenciária.
Conforme documento apresentado pela parte autora (rolagem única Pje/TRF-1, p. 16/17) constata-se que o requisito de idade mínima foi atendido em 20/2/2021, pois contava com idade superior à exigida quando do ajuizamento da ação (nascida em 20/2/1966).
O início de prova material deve ser contemporâneo aos fatos e abranger, pelo menos parcela do período de carência legal, que, na situação tratada é de 180 meses, nos termos do art. 142 e 143, ambos da Lei 8.213/91, podendo tal indício ter seus efeitos ampliados para período anterior ou posterior, a depender do conjunto probatório apresentado (demais documentais e provas testemunhais).
Assim, a parte autora deve apresentar início de prova material que demonstre o exercício de labor rural, ainda que descontínuo, em pelo menos parcela dos 180 meses anteriores ao implemento etário ou ao requerimento administrativo. Portanto, o início de prova material a ser comprovado deve abranger parte da carência, que, na situação é de 2006 a 2021.
Os documentos apresentados pela parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, foram, dentre outros, os seguintes:
a) certidão de casamento (1995), constando a qualificação profissional do cônjuge da autora como lavrador;
b) Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS – sem registro de anotações;
c) Certidão de nascimento da filha Apoliane de Fátima Gonçalves (2001), sem registro de qualificação profissional dos genitores;
d) Certidão de Casamento dos genitores da autora (1965), constando a profissão do genitor como lavrador;
e) Certidão de registro de matrícula de imóvel (1973), constando a profissão do genitor da autora como lavrador;
f) Escritura pública de compra e venda de imóvel (1973), constando a profissão do genitor da autora como lavrador;
g) Contrato de comodato (assinado em 2000, com reconhecimento de firma em 2021);
h) Certidão de registro cartorário de imóvel rural (denominado “Volta Grande”), constando a informação de cadastramento do bem junto ao INCRA, constando a qualificação profissional do genitor da autora como lavrador (12/2021);
i) Documento de Arrecadação Fiscal – Darf – referente ao ITR da Fazenda Volta Grande (2002, 2020, 2021);
j) Protocolo de preenchimento para inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR – finalizado em 2015, constando o genitor da autora como proprietário/possuidor;
k) Certificado de cadastro de imóvel rural – CCIR – (2015, 2016 e 2021);
l) Recibo de declaração de entrega do ITR (2002, 2020, 2021);
m) Ficha de matrícula escolar;
n) Carteira de acompanhamento de prevenção contra o câncer de colo uterino;
o) Cartão de gestante;
p) Cartão da criança;
q) Ficha de matrícula escolar (1995);
r) Ficha de atendimento médico ;
s) Notas discais de aquisição de produtos agrícolas; e
t) Recibo de pagamento de contribuição sindical, em nome do genitor da autora (2000 a 2002).
Analisando os documentos anexados, constata-se que o pleito da autora não merece prosperar eis que as provas juntadas aos autos digitais são extemporâneas (pois se referem a fatos ocorridos fora do período de carência legal exigido), não revestidas de formalidades suficientes a ensejar segurança jurídica ou se referem ao genitor da autora. Nesse último caso, constata-se que a eficácia probatória da documentação restou afastada, eis que em 1995, quando da ocasião do matrimônio da autora, constatou-se a formação de novo núcleo familiar, tendo o INSS produzido contraprova ao direito da autora, pois anexou o CNIS do cônjuge dela (rolagem única PJe/TRF-1, p. 247) contendo diversos vínculos laborais urbanos, na qualidade de segurado empregado, durante longo lapso temporal do período de carência legal, o que afasta a essencialidade do labor rural para a subsistência do grupo econômico familiar e, por conseguinte, a qualidade de segurado especial almejada.
Cabe salientar que, ausente início de prova material, não se admite prova meramente testemunhal, a teor do disposto nas Súmulas 149 do STJ e 27 do TRF da 1ª Região, razão pela qual não podem ser considerados, para concessão do benefício, apenas os depoimentos prestados (AgRg no REsp 944.486/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe de 24/11/2008).
A conclusão que se impõe é a de que fica descaracterizada, na espécie, a condição de rurícola da parte autora, uma vez que não configurado o trabalho rural em regime de economia familiar, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
Segundo a orientação do e. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos, “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1.352.721, Tema 629).
Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou improcedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito, conforme entendimento do STJ no precedente citado.
Conclusão
Ante o exposto, de ofício, extingo o processo, sem resolução do mérito, e julgo prejudicada a apelação da parte autora.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1023415-97.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5184528-08.2022.8.09.0028
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: DINAIR DE FATIMA PIO GONCALVES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MAERIAL. IMPOSSIBILIDADE DA PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA, DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PREJUDICADA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria rural por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).
2. Na situação, o implemento etário ocorreu em 2021. A carência legal, por sua vez, é de 180 meses. A parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, anexou aos autos, dentre outros, os seguintes documentos: a) certidão de casamento (1995), constando a qualificação profissional do cônjuge da autora como lavrador; b) Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS – sem registro de anotações; c) Certidão de nascimento da filha Apoliane de Fátima Gonçalves (2001), sem registro de qualificação profissional dos genitores; d) Certidão de Casamento dos genitores da autora (1965), constando a profissão do genitor como lavrador; e) Certidão de registro de matrícula de imóvel (1973), constando a profissão do genitor da autora como lavrador; f) Escritura pública de compra e venda de imóvel (1973), constando a profissão do genitor da autora como lavrador; g) Contrato de comodato (assinado em 2000, com reconhecimento de firma em 2021); e h) Certidão de registro cartorário de imóvel rural (denominado “Volta Grande”), constando a informação de cadastramento do bem junto ao INCRA, constando a qualificação profissional do genitor da autora como lavrador (12/2021).
3. O conjunto probatório revela o cumprimento do requisito etário, porém, mesma sorte não teve o início de prova material de exercício de atividade campesina, pois as provas anexadas ao autos são extemporâneas, não formais ou constam em nome do genitor da parte autora. Nesse último caso, constata-se que a eficácia probatória da documentação restou afastada, eis que em 1995, quando da ocasião do matrimônio da autora, constatou-se a formação de novo núcleo familiar, tendo o INSS produzido contraprova ao direito alegado, pois anexou o CNIS do cônjuge da requerente, contendo diversos vínculos laborais urbanos, na qualidade de segurado empregado, durante longo lapso temporal do período de carência legal, o que afasta a essencialidade do labor rural para a subsistência do grupo econômico familiar e, por conseguinte, a qualidade de segurado especial almejada.
3. Ausente início de prova material, não se admite prova meramente testemunhal, a teor do disposto nas Súmulas 149 do STJ e 27 do TRF da 1ª Região, razão pela qual não podem ser considerados, para concessão do benefício, apenas os depoimentos prestados (AgRg no REsp 944.486/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe de 24/11/2008).
4. Fica descaracterizada, na espécie, a condição de rurícola da parte autora, uma vez que não configurado o trabalho rural em regime de economia familiar, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
5. A orientação do STJ, em recurso repetitivo, é a de extinção do processo, sem resolução de mérito, quando ausente o conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, possibilitando ao autor intentar novamente a ação (Tema 629, REsp 1.352.721).
6. Ausência do preenchimento dos requisitos da Lei 8.213/91, inviável reconhecer o direito da parte autora à concessão do benefício de aposentadoria rural por idade pleiteado.
7. Processo extinto, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado; apelação da parte autora prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir, de ofício, o processo, sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juiz Federal RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA
Relator Convocado
