
POLO ATIVO: SEBASTIANA RODRIGUES CARDOSO SIQUEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GRACIELA PARREIRA COSTA REZENDE - GO57170-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1020978-10.2023.4.01.0000
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença na qual foi julgado improcedente o seu pedido de concessão de aposentadoria por idade, na qualidade de trabalhador rural, com a sua condenação no pagamento das custas e honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade destas verbas, nos termos do art. 98, §3º, do Código de Processo Civil (fls. 271/273).
Em suas razões, a apelante pede a reforma da sentença para que seja julgado procedente o seu pedido, ao argumento de que houve o preenchimento de todos os requisitos legalmente exigidos para a concessão do benefício (fls. 292/299).
Sem contrarrazões.
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
No mérito, impõe-se examinar a presença, ou não, dos requisitos legalmente estabelecidos para a concessão do benefício pleiteado.
Da aposentadoria rural, por idade.
Nos termos do art. 48 da Lei nº 8.213/91, a concessão do benefício de aposentadoria rural, por idade, exige a demonstração do efetivo exercício do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91 mediante prova documental plena ou, ao menos, um início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal. Como requisito etário, a lei exige idade superior a 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher.
Período de carência.
Este requisito deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida: “O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Regime de economia familiar.
Conforme dispõe o art. 11 da Lei do RGPS, considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, a atividade na qual o efetivo labor campesino dos membros da família é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, sendo indispensável, sobretudo, à sua própria subsistência.
Início de prova material.
Para o reconhecimento de tempo do efetivo exercício da atividade rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior àquele a que especificamente se refira, desde que seja contemporânea à época da ocorrência dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Aliando-se a esse aspecto, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), tornando admissíveis, portanto, a utilização de outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, com indicação da parte autora, do seu cônjuge ou companheiro, na qualidade de trabalhador rural.
Do caso em exame:
A parte autora, nascida em 07/10/1965, implementou o requisito etário em 07/10/2020 (55 anos), tendo formulado o seu requerimento administrativo de benefício em 08/07/2021.
Para a comprovação da qualidade de segurado e da carência, trouxe aos autos os seguintes documentos: a) CTPS própria e do marido sem anotação de contrato de trabalho (fls. 25/26); b) Certidão de casamento da parte autora, realizado em 05/1981, constando o marido como lavrador (fl. 28); c) Declaração de exercício de atividade rural emitida pelo sindicato dos trabalhadores rurais (fls. 29/30); d) Certidão de transcrição de inventário e registro de imóvel cujo sogro da requerente figura como herdeiro de propriedade rural (fls. 32/34); e) Certidão de transcrição de escritura pública de compra e venda de imóvel rural, datada de 10/2009, na qual contem o cônjuge como comprador (fls. 37/38); f) Declaração particular, emitida em 12/2014 pela senhora Maria Salomé Coelho de Siqueira, sogra da requerente, na qual informa a atividade rural desempenhada pelo casal entre 11/1999 e 10/2009 (fl. 39); g) Recibo de entrega da declaração do ITR e certificado de cadastro de imóvel rural em nome do consorte (fls. 43/88); h) Contribuição sindical (fls. 90/92); i) Notas fiscais de venda de milho, datadas de 01/2014, 11/2014, 03/2015, 07/2015, 09/2015, 08/2016, 08/2017, 01/2018 e de 11/2018, constando o esposo como vendedor (fls. 94/97); j) Notas de compras de vacinas e insumos (fls. 99/103);
Analisando os autos, verifico que, apesar de haver indícios de que o núcleo familiar já foi vinculado à lida rural, os documentos apresentados pela parte autora não representam um início razoável de prova material da condição de segurada especial durante todo o período de carência.
Nesse sentido, o INSS apresentou o CNIS da apelante, no qual demonstra que ela foi beneficiária de auxílio-doença entre 01/04/2017 e 16/12/2021.
Dessa forma, do conjunto probatório, conclui-se que não há informação sobre a manutenção da sua condição de rurícola após a cessação do benefício em dezembro de 2021. Ademais, a data de entrada do requerimento administrativo pleiteando a aposentadoria rural (08/07/2021) ocorreu enquanto gozava do benefício por incapacidade temporária.
À vista disso, segue o seguinte julgado deste Tribunal:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. CÔMPUTO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO INTERCALADO COM PERÍODO CONTRIBUTIVO. TEMA 1125 STF. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. O benefício previdenciário de aposentadoria por idade do trabalhador urbano exige o cumprimento do requisito etário, carência mínima exigida e qualidade de segurado. 2. As anotações da Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) constituem, para efeitos previdenciários, prova suficiente do tempo de serviço, gozando de presunção relativa de veracidade, ainda que as anotações não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), conforme Súmula 75 da TNU 3. O entendimento do eg. STJ é no sentido de que somente é possível a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão de aposentadoria por idade, se intercalados com períodos contributivos. (Resp 1.422.081 SC Ministro Mauro Campbell Marques - Segunda Turma, julgado em 24/04/2014, DJ-e 02/05/2014) 4. No caso dos autos, a parte autora, embora tenha gozado de benefício por incapacidade do período de 21/02/2019 a 10/11/2022, conforme CNIS, este período não foi intercalado por contribuição. 5. Não atendidos os requisitos necessários para concessão do benefício de aposentadoria por idade, deve ser mantida a sentença nos moldes como prolatada. 6. Manutenção dos honorários advocatícios arbitrados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, cuja exigibilidade encontra-se suspensa por cuidar-se de beneficiário da Justiça Gratuita. 7. Apelação da parte autora a que se nega provimento.
(AC 1012672-28.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, TRF1 - NONA TURMA, PJe 22/05/2024 PAG.)
Assim sendo, torna-se impossível o reconhecimento desta qualidade apenas e tão somente com base em prova testemunhal, valendo a transcrição do enunciado da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, nesse sentido:
“A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário”.
No julgamento doREsp1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016).
Nesse contexto, ausente um dos requisitos necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada especial, qual seja, o início de prova material da atividade rural exercida, carece a autora de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Com esses fundamentos, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, e declaro prejudicada a apelação interposta pela parte autora.
É como voto.
Brasília, 28 agosto de 2024.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

APELAÇÃO CÍVEL (198)1020978-10.2023.4.01.0000
SEBASTIANA RODRIGUES CARDOSO SIQUEIRA
Advogado do(a) APELANTE: GRACIELA PARREIRA COSTA REZENDE - GO57170-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE.TRABALHADOR RURAL.CÔMPUTO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE QUANDO NÃO INTERCALADO COM PERÍODO CONTRIBUTIVO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. IRRELEVÂNCIA DA PROVA TESTEMUNHAL.CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DOPROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXAME DA APELAÇÃO PREJUDICADO.
1. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador(a) rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. Decidiu o STF no RE 1.298.832/RS, com repercussão geral reconhecida, restando fixada a seguinte tese: "É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalados com atividade laborativa". (Rel. Ministro Luiz Fux, DJe de 25/02/2021 Tema 1125).
3. Não tendo sido apresentado, ao menos, um início razoável de prova material suficiente para a comprovação do retorno ao exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, resta afastado o direito à aposentadoria rural, por idade, porque a condição de segurado especial não pode ser reconhecida apenas e tão somente com base em prova testemunhal (Súmula nº 149, Superior Tribunal de Justiça).
4. Em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que, nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção, sem apreciação do mérito, permitindo ao autor ajuizar novamente a ação, desde que reúna novos elementos probatórios (Tema 629).
5. Processo julgado extinto, sem resolução do mérito. Exame do recurso de apelação da parte autora prejudicado.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, sem resolução do mérito, e declarar prejudicado o exame do recurso de apelação interposto pela parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 28 de agosto de 2024.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
