
POLO ATIVO: ARLETE MARIA PARREIRA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ERIC TEOTONIO TAVARES - GO21091-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora, Sra. ARLETE MARIA PARREIRA SILVA, em face de sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade (rural) em razão de inexistência de início de prova material de exercício de labor campesino.
Sustenta a apelante que estão presentes os requisitos jurídicos necessários para concessão do benefício. Requereu a reforma da sentença.
Sem contrarrazões do INSS.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade de 60 anos para homem e 55 anos para mulher (art. 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública), não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário.
Ademais, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
Consoante jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça: “os documentos trazidos aos autos pelo autor, caracterizados como início de prova material, podem ser corroborados por prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como posteriores aos das provas apresentadas.” (REsp 1.642.731/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/06/2017).
Além disso, ressalte-se o teor da Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
Também não há necessidade de contemporaneidade da prova material em relação a todo o período do exercício da atividade rural que se pretende provar. No entanto, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, desde que complementada por prova testemunhal. Assim, conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
Registre-se, outrossim, que não configuram início de prova material os documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário.
Destaque-se, ainda, que o elemento diferenciador da natureza da classificação do empregado (urbano ou rural) é o da prestação de seus serviços, eis que, consoante o art. 7º, "b", da CLT, não se aplicam os preceitos daquela Consolidação aos trabalhadores rurais, considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas ao campo, não executam atividades que, pelos métodos de execução ou pela finalidade, se classifiquem como industriais ou comerciais.
Assim, estando o trabalhador exercendo tarefas diretamente vinculadas à atividade campesina, é rurícola para todos os efeitos legais. Ademais, nos termos do art. 106, I, da Lei 8.213/91, os empregados rurais são abrangidos pelo regime previdenciário deferido aos segurados especiais, não cabendo impor-lhes o ônus de, em face da formalização do vínculo eminentemente rural, serem alijados dos benefícios deferidos à categoria (TRF1, 0036459-25.2016.4.01.9199; 0050435-41.2012.4.01.9199; 1011044-43.2019.4.01.9999; 0013410-28.2011.4.01.9199).
Da situação tratada
A autora alega, em síntese, que interpôs requerimento administrativo em 16/8/2017 (rolagem única - PJe/TRF-1, p. 15) sendo este indeferido pela Autarquia Previdenciária.
Conforme documento apresentado pela parte autora (rolagem única - PJe/TRF-1, p. 9) constata-se que o requisito de idade mínima foi atendido em 4/2/2015, pois contava com idade superior à exigida quando do ajuizamento da ação (nascida em em 4/2/1960).
O início de prova material deve ser contemporâneo aos fatos e abranger, pelo menos parcela do período de carência legal, que, na situação tratada é de 180 meses, nos termos do art. 142 e 143, ambos da Lei 8.213/91, podendo tal indício ter seus efeitos ampliados para período anterior ou posterior, a depender do conjunto probatório apresentado (demais documentais e provas testemunhais).
Assim, a parte autora deve apresentar início de prova material que demonstre o exercício de labor rural, ainda que descontínuo, em pelo menos parcela dos 180 meses anteriores ao implemento etário ou ao requerimento administrativo. Portanto, o início de prova material a ser comprovado deve abranger parte da carência, que, na situação é de 2000 a 2015 (considerando o implemento do requisito etário) ou de 2002 a 2017 (considerando o requerimento administrativo).
Os documentos apresentados pela parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, foram, dentre outros, os seguintes:
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Certidão de Casamento da autora, constando o registro da qualificação profissional de seu cônjuge como lavrador (1978);
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Certidão de nascimento da filha Carla Cristina Parreira Lemes (1978) e do filho Ricardo Parreira Lemes (1979) constando a profissão do cônjuge da autora como agricultor;
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Certidão de Imóvel Rural no qual a requerente é herdeira e ficou como proprietária de imóvel rural, no ano de 1993;
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Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS da requerente, na qual consta que filiado na categoria de segurado especial, contribuinte Individual, porém o vínculo de contribuinte individual não quebra o vínculo rural visto que já tinha mais de19 anos de trabalho rural.
Inicialmente, observa-se que as certidões de registro de imóveis anexadas demonstram tão somente a propriedade de tais bens (e não o exercício da atividade rural alegada). Ademais, as certidões de nascimento e de casamento anexadas são extemporâneas pois se referem a fatos ocorridos fora do período de carência legal. Outrossim, o CNIS da autora p. 26/27 não revela início de prova material de exercício de atividade campesina ou prova plena de tal labor. Ademais, não há nada que prove eventual retorno às lides campesinas após o labor urbano desempenhado entre 2008 e 2010, não havendo prova de que a autora se encontrava exercendo atividade rural quando do implemento do requisito etário ou mesmo na ocasião do requerimento administrativo.
Ausentes, portanto, elementos probatórios quanto ao desempenho de atividade rural pelo período mínimo de carência, não tendo a autora se desincumbido de seu ônus probatório, nos termos do art. 373, I, do CPC.
Assim, não é possível o reconhecimento da qualidade de segurada da parte autora como trabalhadora rural em regime de economia familiar na carência exigida ao tempo do requerimento administrativo ou do implemento etário.
Segundo a orientação do e. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos, “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1.352.721, Tema 629).
Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou improcedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito, conforme entendimento do STJ no precedente citado.
Conclusão
Ante o exposto, de ofício, extingo o processo, sem resolução do mérito, e julgo prejudicada a apelação da parte autora.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1002630-17.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5162413-68.2019.8.09.0134
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: ARLETE MARIA PARREIRA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL AFASTADO. INADMISSIBLIDADE DE PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. SENTENÇA REFORMADA, DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÃO DA AUTORA NÃO PROVIDA.
1. A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena.
2. Conforme documento apresentado pela parte autora constata-se que o requisito de idade mínima foi atendido, pois contava com idade superior à exigida, quando do ajuizamento da ação.
3. No caso dos autos, a parte autora, em seu intuito probatório, anexou entre outros os seguintes documentos: A) Certidão de Casamento da autora, constando o registro da qualificação profissional de seu cônjuge como lavrador (1978); B) Certidão de nascimento da filha Carla Cristina Parreira Lemes (1978) e do filho Ricardo Parreira Lemes (1979) constando a profissão do cônjuge da autora como agricultor; C) Certidão de Imóvel Rural no qual a requerente é herdeira e ficou como proprietária de imóvel rural, no ano de 1993; D) Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS da requerente, na qual consta que filiado na categoria de segurado especial, contribuinte Individual, porém o vínculo de contribuinte individual não quebra o vínculo rural visto que já tinha mais de19 anos de trabalho rural.
4. Ausente início de prova material, não se admite prova meramente testemunhal, a teor do disposto nas Súmulas 149 do STJ e 27 do TRF da 1ª Região, razão pela qual não podem ser considerados, para concessão do benefício, apenas os depoimentos prestados (AgRg no REsp 944.486/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe de 24/11/2008).
6. Fica descaracterizada, na espécie, a condição de rurícola da parte autora, uma vez que não configurado o trabalho rural em regime de economia familiar, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
7. 8. A orientação do STJ, em recurso repetitivo, é a de extinção do processo, sem resolução de mérito, quando ausente o conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, possibilitando ao autor intentar novamente a ação (Tema 629, REsp 1.352.721).
8. Ausência do preenchimento dos requisitos da Lei 8.213/91, inviável reconhecer o direito da parte autora à concessão do benefício de aposentadoria rural por idade pleiteado.
9. Processo extinto, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado; apelação da autora prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
