
POLO ATIVO: ARLINDO PERES DE SOUSA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GILMAR STEFFENS - GO45484-A e JAQUESON DOS SANTOS CASTRO - GO29515-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício previdenciário de aposentadoria rural por idade.
Em suas razões recursais, o apelante arguiu ter comprovado a sua qualidade de segurada especial com o início de prova material corroborada por prova testemunhal produzida nos autos. Requereu a reforma da sentença para que seja julgado procedente o pedido inicial.
Sem contrarrazões do INSS.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido.
Além disso, a concessão do benefício independe do recolhimento de contribuição previdenciária, nos termos do art. 26, III c/c art. 39, da Lei 8.213/91; porém, quanto ao tempo de exercício de atividade rural, exige-se início razoável de prova material, completada por prova testemunhal idônea, não se admitindo, portanto, prova meramente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, Súmulas 149 e 27 do STJ e TRF da 1ª Região, respectivamente).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
Não configuram início de prova material os documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário e demais provas que não trazem a segurança jurídica necessária à concessão do benefício.
Da situação tratada
A autora alega, em síntese, que interpôs requerimento administrativo em 16/10/2020 (rolagem única Pje/TRF-1, p. 111) sendo este indeferido pela Autarquia Previdenciária.
Conforme documento apresentado pela parte autora (rolagem única Pje/TRF-1, p. 150) constata-se que o requisito de idade mínima foi atendido em 9/10/2020, pois contava com idade superior à exigida quando do ajuizamento da ação (nascido em 9/10/1960).
O início de prova material deve ser contemporâneo aos fatos e abranger, pelo menos parcela do período de carência legal, que, na situação tratada é de 180 meses, nos termos do art. 142 e 143, ambos da Lei 8.213/91, podendo tal indício ter seus efeitos ampliados para período anterior ou posterior, a depender do conjunto probatório apresentado (demais documentais e provas testemunhais).
Assim, a parte autora deve apresentar início de prova material que demonstre o exercício de labor rural, ainda que descontínuo, em pelo menos parcela dos 180 meses anteriores ao implemento etário ou ao requerimento administrativo. Portanto, o início de prova material a ser comprovado deve abranger parte da carência, que, na situação é de 2005 a 2020.
Os documentos apresentados pela parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, foram, dentre outros, os seguintes:
a) certidão de casamento (2011), com registro de qualificação profissional do autor como lavrador;
b) carteira de filiação junto a Sindicato Rural (1996);
c) cadastro de contribuintes junto à Secretaria do Estado de Goiás; e
d) cédula rural pignoratícia (1999);
e) contrato de assentamento junto ao INCRA;
f) Guia de trânsito animal referente ao transporte de 20 gados (2003);
g) nota fiscal de compra e venda de animais emitida pela Agência Fiscal de Atendimento de Piranhas referente à aquisição pelo autor de 18 (dezoito) semoventes;
h) atestado de vacinação contra brucelose em 2004 (referente à vacinação de dez bezerras);
i) contrato de aquisição de crédito junto ao INCRA para instalação, na modalidade aquisição de material de construção, no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais);
j) contrato de abertura de crédito rural junto ao Banco do Brasil (2006);
k) recibo de contribuição sindical (2006).
Não obstante a parte autora tenha anexado aos autos documentos que poderiam consubstanciar início de prova material de labor campesino, verifica-se que o INSS, por sua vez, fez contraprova ao direito alegado pelo autor e anexou aos autos prova de que a atividade por ele desempenhada se assemelha a de grande fazendeiro, afastando assim o regime de subsistência aduzido. Verifica-se que o autor possui alto número de semoventes em sua propriedade (rolagem única Pje/TRF-1, p. 128), qual seja: 74 bovinos e 4 equinos. Portanto, configurada a atividade rural em larga escala, resta afastado o regime de economia familiar arguido. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. PRODUTOR AGRÍCOLA DE LARGA ESCALA. DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO INDEVIDO. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. 1. Pretende a parte apelante o julgamento pela reforma da sentença que concedeu a aposentadoria por incapacidade permanente para a concessão do auxílio por incapacidade temporária da parte autora na qualidade de segurada especial. 2. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de incapacidade temporária ou incapacidade permanente são: a) qualidade de segurado; b) carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, inciso II, da Lei n. 8.213/1991; c) incapacidade para o trabalho ou atividade habitual por mais de 15 dias ou, na hipótese da aposentadoria por invalidez, incapacidade (permanente e total) para atividade laboral. O nível da incapacidade e a possibilidade de reabilitação são o que diferenciam os benefícios. 3. Quanto à qualidade de segurada especial, a parte autora juntou: a) Certidão de Casamento de 1967 em que é qualificado como lavrador; b) CNIS com período reconhecido como segurado especial de 2001 até 2008, não havendo outros vínculos ou contribuições realizados em qualquer outra qualidade de segurado obrigatório. 4. No entanto, o INSS trouxe aos autos a informação que a parte autora é proprietário de duas Fazendas, sendo que um delas possui mais de 5 módulos fiscais. Além disso, a parte autora possui mais de 300 (trezentas) cabeças de gado, o que descaracteriza a condição de segurado especial. 5. De fato, a Legislação Previdenciária vem a proteger o segurado que trabalha no campo e é muitas vezes desamparado e vulnerável perante empregadores ou mesmo pela sociedade, estando desprotegido no momento de requerer benefícios e por isso foi adotada solução pro misero visando proteger esses trabalhadores. Porém, os trabalhadores rurais que não vertem contribuições à seguridade social são os segurados especiais, que são pessoas que trabalham em regime de economia familiar, o que não é o caso da parte autora. 6. Vejamos o artigo 11, parágrafo 1º, da Lei n.º 8.213/91, que define o conceito de regime de economia familiar "como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes". 7. A mesma legislação define que a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária, a qualquer título, em caráter permanente ou temporário, em área superior a 4 (quatro) módulos fiscais, com auxílio de empregados ou por intermédio de prepostos, deve contribuir com a Previdência Social na qualidade de contribuinte individual. 8. Assim, a parte autora não é segurado especial e não contribuiu para a Previdência Social, não fazendo jus a qualquer benefício da Seguridade Social. 9. Ausentes os requisitos legais exigidos, o benefício se revela indevido, devendo a tutela concedida ser revogada. E visando coibir esse tipo de conduta em que grandes agropecuaristas buscam benefícios previdenciários dirigidos aos mais pobres, indo em audiências fazendo alegações falsas de serem meros trabalhadores rurais em regime de subsistência, aplico multa por litigância de má-fé de 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, nos termos do artigo 81 do CPC. 10. No caso presente, houve deferimento da tutela antecipada, sendo, portanto, devida a restituição dos valores porventura recebidos, tendo em vista a conclusão do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça na revisão do Tema Repetitivo 692/STJ, em que ficou decidido que: A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago. 11. Apelação do INSS provida.
(AC 1015206-42.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 11/03/2024 PAG.)
Assim, não é possível o reconhecimento da qualidade de segurada da parte autora como trabalhador rural em regime de economia familiar na carência exigida ao tempo do requerimento administrativo.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp 1.864.633/RS, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido, como no caso dos autos, desse modo, conforme disposição o art. 85, § 11, do CPC, os honorários devem ser majorados em dois pontos percentuais, os quais ficam suspensos em caso de deferimento da gratuidade de justiça, nos termos do art. 98, §§ 2º e 3º do CPC/2015.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1023762-33.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5129197-90.2021.8.09.0023
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: ARLINDO PERES DE SOUSA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. PRODUÇÃO EM LARGA ESCALAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL AFASTADO. PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO CONFIGURADO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA NÃO PROVIDA.
1. A concessão do benefício de aposentadoria rural por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).
2. Na situação, o implemento etário ocorreu em 2020. A carência legal, por sua vez, é de 180 meses. A parte autora, em seu intuito de demonstrar o início de prova material de exercício de atividade campesina, anexou aos autos os seguintes documentos: a) certidão de casamento (2011), com registro de qualificação profissional do autor como lavrador; b) carteira de filiação junto a Sindicato Rural (1996); c) cadastro de contribuintes junto à Secretaria do Estado de Goiás; e d) cédula rural pignoratícia (1999); e) contrato de assentamento junto ao INCRA; f) Guia de trânsito animal referente ao transporte de 20 gados (2003); g) nota fiscal de compra e venda de animais emitida pela Agência Fiscal de Atendimento de Piranhas referente à aquisição pelo autor de 18 (dezoito) semoventes; h) atestado de vacinação contra brucelose em 2004 (referente à vacinação de dez bezerras); i) contrato de aquisição de crédito junto ao INCRA para instalação, na modalidade aquisição de material de construção, no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais); j) contrato de abertura de crédito rural junto ao Banco do Brasil (2006); k) recibo de contribuição sindical (2006).
3. Não obstante a parte autora tenha anexado aos autos documentos que, em princípio, possam consubstanciar início de prova material, verifica-se que consta nos autos prova de que o autor é proprietário de alto número de semoventes (74 bovinos e 4 equinos). Portanto, configurada a atividade rural em larga escala, resta afastado o regime de economia familiar arguido.
4. Fica descaracterizada, na espécie, a condição de rurícola da parte autora, uma vez que não configurado o trabalho rural em regime de economia familiar, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
5. Ausência do preenchimento dos requisitos da Lei 8.213/91, inviável reconhecer o direito da parte autora à concessão do benefício de aposentadoria rural por idade pleiteado.
6. Honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015 e da tese fixada no Tema 1.059/STJ, os quais ficam suspensos em caso de deferimento da gratuidade de justiça, conforme art. 98, §§ 2º e 3º do CPC/2015.
7. Negado provimento à apelação da parte autora.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
