
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LUCIENE PEREIRA DE OLIVEIRA LOPES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: SANDOVAL DE QUEIROZ ALBERNAZ - GO27087-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1006507-96.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido inicial de concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo mensal, a partir da data do requerimento administrativo (fls. 135/138).
Em suas razões, a autarquia previdenciária requer o recebimento do seu recurso no duplo efeito. No mérito, pretende a reforma da sentença para que o pedido seja julgado improcedente, sustentando a ausência de prova material contemporânea e idônea do labor rural em regime de economia familiar. Ademais, formulou pedidos subsidiários relacionados à prescrição quinquenal, aos juros moratórios e à correção monetária, bem como aos honorários advocatícios (fls. 143/149).
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Da aposentadoria rural por idade
A concessão desse benefício exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade a partir de 60 anos, para homem, e de 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Da carência
O requisito de carência deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida:
“O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Do regime de economia familiar
Considera-se trabalho rural em regime de economia familiar, conforme dispõe o art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Das provas
Para o reconhecimento do tempo rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149), não é necessário que a prova documental alcance todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a comprovar (TNU, Súmula 34).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol previsto no art. 106 da Lei n. 8.213/91 é meramente exemplificativo (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício da atividade rural, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge ou companheiro como trabalhador rural.
O caso em exame
A parte autora, nascida em 16/08/1963, implementou o requisito etário em 16/08/2018 (55 anos), tendo formulado o seu requerimento administrativo em 04/11/2019.
Para a comprovação da qualidade de segurada e do período de carência, a autora apresentou, entre outros, os seguintes documentos: a) certidão de casamento com Francisco Antônio Lopes, qualificando seu esposo como lavrador, realizado em 1980; b) faturas de consumo de energia elétrica, em nome de Bras Aparecido Praxedes, com endereço rural, relativas aos anos de 2017 e 2019; c) comprovante do protocolo de requerimento, datado em 2019; d) certidões de nascimento dos filhos, qualificando o genitor como lavrador, datadas em 1983 e 1986; e) extrato do CNIS; f) cópia da carteira de trabalho do seu esposo, consignando o exercício de atividades em pecuária nos anos de 1997, 1999, 2001, 2005, 2008, 2012, 2014 e 2017 e como autônomo de 09/1985 a 10/1985 e de 10/1987 a 11/1988.
Aliado a tais elementos, foi tomado o depoimento de uma testemunha, que confirmou, de forma segura e convincente, o labor rural desenvolvido pela parte autora. Com efeito, a testemunha ouvida em audiência, conhecida da autora há cerca de vinte anos, corroborou a narrativa inicial, afirmando que a requerente e seu esposo residem na roça e dela tiram o seu sustento. Nesse sentido, vale conferir o que consta da sentença recorrida (fl. 137):
“Em seu depoimento pessoal a requerente relatou que sempre trabalhou na roça, permanecendo nessa situação após seu casamento. Informou que até os dias atuais reside e labora na roça, na Fazenda Via Láctea.
“Afirmou que ela e seu esposo sobrevivem do que plantam e colhem, como lavoura de milho e criação de galinha e porcos.
“Através de seu depoimento é possível perceber a simplicidade de uma típica trabalhadora rural. De mais a mais, soube responder com segurança as perguntas que lhe foram feitas relativas ao labor rural.
“A testemunha ouvida em audiência, conhecida da autora há cerca de vinte anos corroborou a narrativa inicial, afirmando que a requerente e seu esposo residem e tiram o seu sustento da roça.
“Dentro desse contexto, tenho que a prova testemunhal acostada aos autos, reforçada pelo início de prova material (como acima ressaltado), comprovam, o exercício de atividade rurícola pela autora.” (sem o grifo original)
No caso do trabalhador rural, o exercício de curtos períodos de trabalho urbano intercalados com o serviço campesino não descaracteriza a sua condição de trabalhador dedicado às lides do campo, isso porque desde a promulgação da Lei 11.718/2008, passou-se a permitir literalmente que, durante a entressafra, o segurado especial possa trabalhar em outra atividade por até 120 (cento e vinte) dias por ano.
Assim sendo, restando demonstrada a condição de segurada especial rural durante o período de carência, conforme previsão do art. 142 da Lei 8.213/91, faz jus a autora ao benefício de aposentadoria rural por idade, com proventos correspondentes a um salário mínimo mensal, nos termos da sentença.
Dos pedidos subsidiários
Conforme se observa dos autos, o INSS formulou os seguintes pedidos subsidiários em sua peça recursal (fl. 149):
“4.1 PRESCRIÇÃO: Eventualmente, na hipótese de acolhimento total ou parcial dos pedidos contidos na inicial, argui o INSS a prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91.
“4.2 PREQUESTIONAMENTO: Caso sejam julgados procedentes os pedidos da parte autora, o que se admite tão somente para argumentar, a matéria fica desde já PREQUESTIONADA para fins recursais, requerendo expressa manifestação quanto à violação dos dispositivos acima citados.
“4.3 JUROS E CORREÇÃO: JUROS, A PARTIR DA CITAÇÃO VÁLIDA, DE ACORDO COM ART. 1º F DA LEI 9.494/1997, COM REDAÇÃO QUE LHE FOI DADA PELA LEI Nº 11.960/2009. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC, NOS TERMOS DO TEMA 905 DO STJ, ITEM 3.2.
“4.4 HONORÁRIOS: REQUER A APLICAÇÃO DA SÚMULA 111 DO STJ, QUE LIMITA A BASE DE CÁLCULO DA VERBA HONORÁRIA ÀS PARCELAS VENCIDAS ATÉ A SENTENÇA.”
Ora, a sentença recorrida tratou especificamente da prescrição quinquenal na sua parte dispositiva, razão pela qual não merece qualquer reforma neste ponto. O mesmo ocorre, ainda, com os honorários advocatícios, porquanto há, no julgado, referência expressa à Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
No tocante, porém, à correção monetária e aos juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas, deverão ser aplicados os índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, visto que este se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
Com esses fundamentos, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS, apenas para determinar que os juros moratórios e a correção monetária incidentes sobre as parcelas vencidas sejam calculados pelos índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Em face da sucumbência mínima da parte autora em seu pedido (CPC, art. 86, parágrafo único), condeno o INSS no pagamento de honorários advocatícios recursais em quantia equivalente a 1% (um por cento) do valor da condenação.
Indefiro o pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação do INSS, porquanto não vislumbro configurada a hipótese prevista no art. 1.012, § 4º, do Código de Processo Civil.
É como voto.
Brasília,
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
133APELAÇÃO CÍVEL (198)1006507-96.2022.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
LUCIENE PEREIRA DE OLIVEIRA LOPES
Advogado do(a) APELADO: SANDOVAL DE QUEIROZ ALBERNAZ - GO27087-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. SENTENÇA JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO. DEMONSTRAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE CAMPESINA. COMPROVAÇÃO ATRAVÉS DE UM INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. São requisitos para a aposentadoria de trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91).
2. Comprovado o implemento da idade mínima e a atividade rural, com a apresentação de início de prova material complementada por prova testemunhal sólida, deve ser concedido o benefício de aposentadoria rural por idade.
3. As parcelas vencidas devem ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora mediante a utilização dos índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE 870.947 - Tema 810) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG - Tema 905), bem como com a Emenda Constitucional n. 113/2021 (Resolução 784/2022 - CJF, de 08/08/2022, Anexo, itens “4.2” e “4.3”).
4. Apelação interposta pelo INSS provida parcialmente, apenas para determinar a aplicação dos índices do Manual de Cálculos da Justiça Federal sobre os juros moratórios e a correção monetária das parcelas vencidas.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
