
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:ALTEMAR FONSECA DE ANDRADE
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: GEFERSON BATISTA PINHEIRO - AM11931-A e NUBIA BATISTA PINHEIRO - AM11184-A
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1002781-49.2019.4.01.3200
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
1. A parte autora propôs ação de procedimento comum contra o INSS, objetivando o restabelecimento do seu benefício de aposentadoria por invalidez desde julho de 2018, bem como o pagamento das parcelas em atraso e a declaração de inexistência de débito.
2. Sentença prolatada pelo MM. Juiz a quo julgou o pedido procedente para: a) restabelecer em definitivo o benefício de aposentadoria por invalidez do autor; b) pagar todas as parcelas em atraso, desde à data de cessação do benefício; c) Declarar nulo o débito administrativo imputado ao autor.
3. Apela a parte ré sustentando, em síntese, que a parte autora retornou ao trabalho, o que denota, por si só, a reabilitação profissional automática. Sustenta que a má fé do segurado é patente, sendo equivocada a conclusão do juízo a quo sobre a existência da boa-fé na acumulação do benefício por incapacidade permanente com o exercício de outra atividade.
4. A parte apelada foi intimada para contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1002781-49.2019.4.01.3200
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
1. Segundo os termos do Enunciado Administrativo n. 3/STJ, aprovado pelo Plenário da Corte na sessão de 9/3/2016: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.”
2. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC. A matéria remanescente nos autos, portanto, fica limitada à controvérsia objeto da apelação.
3. A sentença recorrida se fundamentou, nos pontos objeto da controvérsia recursal, em síntese, no seguinte: “(...) não há dúvida, portanto, da situação do autor, cuja incapacidade laboral é irreversível e atestada por perito do próprio INSS em 2017 e 2018, o que lhe confere o direito ao restabelecimento à aposentadoria por invalidez. Ainda que o autor tenha, entre a data da sua aposentadoria em 1994 e a data do cancelamento do benefício em julho/2018, exercido atividades junto à Secretaria Estadual de Educação - SEDUC e à Secretaria Estadual de Saúde - SUSAM, essas atividades foram exercidas como Pessoa Portadora de Deficiência - PCD e findaram antes mesmo do cancelamento do benefício, que ocorreu em julho/2018: o vínculo com a SEDUC cessou em 06/2009 e com a SUSAM em 12/2017, conforme se vê pelo histórico de recolhimentos previdenciários no CNIS (documento datado de 18/07/2019) de id 71290564. Não havendo mais os vínculos mencionados e mantida a incapacidade definitiva do autor, não havia justificativa para se cancelar o benefício como fez o INSS. Ademais, é compreensível que o autor, pessoa com grave deficiência (cegueira em ambos os olhos desde 1994) que lhe dificulta o conhecimento de normas e de baixo poder aquisitivo, não tivesse ciência da impossibilidade do exercício de atividade remunerada, ainda que em cargo de PCD, concomitante com a percepção de aposentadoria por invalidez. Não há má fé no caso em exame, mas sim desconhecimento justificável. Além disso, o réu demorou dezoito anos para atentar para o exercício dessas atividades de PCD, que estavam cadastradas no CNIS desde o seu início: ano 2000 para a SEDUC e ano 2009 para a SUSAM. É de se registrar que o réu concorreu para que a irregularidade se prolongasse no tempo, já que tinha registro dela em seu sistema informatizado e demorou tanto tempo para apurá-la. Essa situação induz o beneficiário a pensar que está agindo dentro das normas previdenciárias, já que não é crível que o órgão permita que uma irregularidade se prolongue por tanto tempo. Tendo a acumulação da aposentadoria por invalidez com o exercício irregular das atividades de PCD ocorrido de boa-fé, não há que se falar em cobrança de débito, como quer o INSS”. (grifamos)
4. A matéria objeto da controvérsia recursal se refere ao conjunto fático-probatório constante nos autos e a sua valoração pelo juízo primevo, a qual considero acertada. Há provas nos autos de que o INSS reconheceu a Incapacidade permanente do autor pela via da perícia médica. O fato de o autor ter laborado em curto espaço de tempo, tal como demonstrado no contexto probatório dos autos, não leva à conclusão automática de que aquele tinha automaticamente se reabilitado para o exercício profissional.
5. Era ônus do INSS provar que chamou o segurado para perícia médica reavaliativa, o incluiu em programa de reabilitação profissional e o habilitou para se exercer alguma outra atividade compatível com sua incapacidade/deficiência. Não se pode, por simples juizo ilativo, entender que alguém considerado Portador de Deficiência, que exerce em curtos períodos atividade laboral, esteja, de fato, reabilitado para o exercício profissional.
6. A Lei 8.213/1991 regulamenta os institutos da Habilitação e reabilitação nos seguintes termos: “Art. 89. A habilitação e a reabilitação profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de trabalho e do contexto em que vive” (grifamos). A Convenção 159 d OIT (norma internacional da qual o Brasil é signatário), diz, no item 2 do art. 1º, o seguinte: “Para efeitos desta Convenção, todo o País-Membro deverá considerar que a finalidade da reabilitação profissional é a de permitir que a pessoa deficiente obtenha e conserve um emprego e progrida no mesmo, e que se promova, assim a integração ou a reintegração dessa pessoa na sociedade”. (Grifamos)
7. Está claro, pois, nos autos, que o INSS não convocou o segurado e nem mesmo promoveu um programa adequado para que aquele obtivesse, conservasse e progredisse no emprego. Como bem exposto na sentença recorrida, o recorrido conseguiu apenas algumas oportunidades de trabalho, por conta própria, em pequenos períodos, no lapso temporal em que recebeu a aposentadoria por invalidez, na condição de Portador de Deficiência, não conseguindo se manter nos cargos em que trabalhou e nem mesmo progredir no emprego. Por conseguinte, a reabilitação profissional não se efetivou, como quis fazer parecer o recorrente.
8. A boa fé do recorrido, na acumulação do benefício por incapacidade permanente com o exercício de atividade laboral, é evidente, quando se constata que o benefício foi concedido pela Autarquia Previdenciária e permaneceu ativo por quase 20 (vinte) anos, criando-se uma esfera de segurança e legitimidade na concessão (mesmo diante do registro dos vínculos que o segurado teve no lapso temporal) que só poderia ser relativizada por prova de fraude ou má fé. Ademais, a boa-fé se presume e a má fé deve ser provada. Nesse sentido, é o trecho da tese fixada pelo STJ no julgamento do seu tema repetitivo 243: “1.3. A presunção de boa-fé é princípio geral de direito universalmente aceito, sendo milenar parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova”.
9. Honorários de advogado majorados em um ponto percentual sobre o valor arbitrado na origem, consoante a previsão do art. 85, §11, do CPC.
10. Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o voto
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002781-49.2019.4.01.3200
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: ALTEMAR FONSECA DE ANDRADE
Advogados do(a) APELADO: GEFERSON BATISTA PINHEIRO - AM11931-A, NUBIA BATISTA PINHEIRO - AM11184-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EXERCICIO DE ATIVIDADE LABORATIVA EM CURTOS PERÍODOS COMO PCD. INEXISTÊNCIA DE PROVAS SOBRE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL COORDENADA PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECER REABILITAÇÃO PROFISSIONAL AUTOMÁTICA PELO SIMPLES EXERCICIO DA ATIVIDADE, SEM MANTUENÇÃO DO EMPREGO E PROGRESSÃO NO MESMO. ÕNUS DO INSS DE DEMONSTRAR A APTIDÃO DO SEGURADO PARA O RETORNO AO MERCADO DE TRABALHO E CESSAÇÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BOA FÉ COMPROVADA. CESSAÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
1. Segundo os termos do Enunciado Administrativo n. 3/STJ, aprovado pelo Plenário da Corte na sessão de 9/3/2016: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.”
2. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC. A matéria remanescente nos autos, portanto, fica limitada à controvérsia objeto da apelação.
3. A sentença recorrida se fundamentou, nos pontos objeto da controvérsia recursal, em síntese, no seguinte: “(...) não há dúvida, portanto, da situação do autor, cuja incapacidade laboral é irreversível e atestada por perito do próprio INSS em 2017 e 2018, o que lhe confere o direito ao restabelecimento à aposentadoria por invalidez. Ainda que o autor tenha, entre a data da sua aposentadoria em 1994 e a data do cancelamento do benefício em julho/2018, exercido atividades junto à Secretaria Estadual de Educação - SEDUC e à Secretaria Estadual de Saúde - SUSAM, essas atividades foram exercidas como Pessoa Portadora de Deficiência - PCD e findaram antes mesmo do cancelamento do benefício, que ocorreu em julho/2018: o vínculo com a SEDUC cessou em 06/2009 e com a SUSAM em 12/2017, conforme se vê pelo histórico de recolhimentos previdenciários no CNIS (documento datado de 18/07/2019) de id 71290564. Não havendo mais os vínculos mencionados e mantida a incapacidade definitiva do autor, não havia justificativa para se cancelar o benefício como fez o INSS. Ademais, é compreensível que o autor, pessoa com grave deficiência (cegueira em ambos os olhos desde 1994) que lhe dificulta o conhecimento de normas e de baixo poder aquisitivo, não tivesse ciência da impossibilidade do exercício de atividade remunerada, ainda que em cargo de PCD, concomitante com a percepção de aposentadoria por invalidez. Não há má fé no caso em exame, mas sim desconhecimento justificável. Além disso, o réu demorou dezoito anos para atentar para o exercício dessas atividades de PCD, que estavam cadastradas no CNIS desde o seu início: ano 2000 para a SEDUC e ano 2009 para a SUSAM. É de se registrar que o réu concorreu para que a irregularidade se prolongasse no tempo, já que tinha registro dela em seu sistema informatizado e demorou tanto tempo para apurá-la. Essa situação induz o beneficiário a pensar que está agindo dentro das normas previdenciárias, já que não é crível que o órgão permita que uma irregularidade se prolongue por tanto tempo. Tendo a acumulação da aposentadoria por invalidez com o exercício irregular das atividades de PCD ocorrido de boa-fé, não há que se falar em cobrança de débito, como quer o INSS”. (grifamos)
4. A matéria objeto da controvérsia recursal se refere ao conjunto fático-probatório constante nos autos e a sua valoração pelo juízo primevo, a qual considero acertada. Há provas nos autos de que o INSS reconheceu a Incapacidade permanente do autor pela via da perícia médica. O fato de o autor ter laborado em curto espaço de tempo, tal como demonstrado no contexto probatório dos autos, não leva à conclusão automática de que aquele tinha automaticamente se reabilitado para o exercício profissional.
5. Era ônus do INSS provar que chamou o segurado para perícia médica reavaliativa, o incluiu em programa de reabilitação profissional, e o habilitou para se exercer alguma outra atividade compatível com sua incapacidade/deficiência. Não se pode, por simples juizo ilativo, entender que alguém considerado Portador de Deficiência, que exerce em curtos períodos atividade laboral, esteja, de fato, reabilitado para o exercício profissional.
6. A Lei 8.213/1991 regulamenta os institutos da Habilitação e reabilitação nos seguintes termos: “Art. 89. A habilitação e a reabilitação profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de trabalho e do contexto em que vive” (grifamos). A Convenção 159 d OIT (norma internacional da qual o Brasil é signatário), diz, no item 2 do art. 1º, o seguinte: “Para efeitos desta Convenção, todo o País-Membro deverá considerar que a finalidade da reabilitação profissional é a de permitir que a pessoa deficiente obtenha e conserve um emprego e progrida no mesmo, e que se promova, assim a integração ou a reintegração dessa pessoa na sociedade”. (Grifamos)
7. Está claro, pois, nos autos, que o INSS não convocou o segurado e nem mesmo promoveu um programa adequado para que aquele obtivesse, conservasse e progredisse no emprego. Como bem exposto na sentença recorrida, o recorrido conseguiu apenas algumas oportunidades de trabalho, por conta própria, em pequenos períodos, no lapso temporal em que recebeu a aposentadoria por invalidez, na condição de Portador de Deficiência, não conseguindo se manter nos cargos em que trabalhou e nem mesmo progredir no emprego. Por conseguinte, a reabilitação profissional não se efetivou, como quis fazer parecer o recorrente.
8. A boa fé do recorrido, na acumulação do benefício por incapacidade permanente com o exercício de atividade laboral, é evidente, quando se constata que o benefício foi concedido pela Autarquia Previdenciária e permaneceu ativo por quase 20 (vinte) anos, criando-se uma esfera de segurança e legitimidade na concessão (mesmo diante do registro dos vínculos que o segurado teve no lapso temporal) que só poderia ser relativizada por prova de fraude ou má fé. Ademais, a boa-fé se presume e a má fé deve ser provada. Nesse sentido, é o trecho da tese fixada pelo STJ no julgamento do seu tema repetitivo 243: “1.3. A presunção de boa-fé é princípio geral de direito universalmente aceito, sendo milenar parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova”.
9. Honorários de advogado majorados em um ponto percentual sobre o valor arbitrado na origem, consoante a previsão do art. 85, §11, do CPC.
10. Apelação improvida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA